Os hospitais de Santa Maria, São José e São Francisco Xavier vão condicionar, a partir desta quinta-feira, o acesso à urgência geral de adultos. As três unidades decidiram aderir ao programa Ligue Antes, Salve Vidas (implementado já noutros 22 hospitais do SNS), o que significa que apenas vão aceitar — com algumas exceções — utentes previamente referenciados pela linha SNS 24, pelos centros de saúde ou pelo INEM, confirmou ao Observador a Direção Executiva do SNS. No Santa Maria, o projeto estende-se também à urgência de Pediatria.

Desta forma, os utentes que pensarem dirigir-se às urgências de um destes hospitais são aconselhados a ligarem para a linha SNS24, para que seja feita uma primeira triagem. Uma vez contactada a linha, e se a situação for considerada urgente, são encaminhados para o hospital. Caso contrário, ou seja, se se tratar de uma situação não urgente, a linha SNS24 agendará uma consulta num centro de saúde no próprio dia ou no dia seguinte.

Lisboa. Atendimento nas urgências de Obstetrícia só com referenciação ou em situações de risco de vida

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Caso os utentes recorram às urgências sem essa pré-triagem telefónica, serão convidados, já no hospital, a contactarem a linha. Se o utente se recusar, será triado na urgência, sendo que, caso lhe seja atribuída uma pulseira de cor azul ou verde (o que indica um caso clínico não urgente) é agendada uma consulta no centro de saúde. Se o utente não quiser ser encaminhado para o centro de saúde, será visto na urgência — estando o atendimento sujeito ao tempo de espera de uma pulseira azul ou verde (e que é, habitualmente, elevado).

A capacidade dos centros de saúde para receberem estas doentes é, contudo, uma das dúvidas que se colocam na extensão do projeto (até agora concentrado nas regiões norte e centro) à zona de Lisboa. A carência de médicos de família em Lisboa— que assegurem as chamadas consultas abertas, para os doentes pouco graves reencaminhados pelos hospitais — pode ser uma dificuldade acrescida. O Observador sabe que as direções dos centros de saúde de Lisboa mostraram desagrado pelo início do projeto nesta fase, devido à falta de médicos de família — um problema que não ficará resolvido a curto prazo, devido à dificuldade que existe em atrair clínicos para esta região.

Há, no entanto, exceções. As novas regras de referenciação obrigatória não se aplicam em casos graves, como situações cardiovasculares agudas, hemorragias, traumas, situações urgentes do foro psiquiátrico e também a utentes acamados, doentes oncológicos, com doença renal crónica ou com mais de 70 anos.

No caso do Hospital de Santa Maria, a urgência pediátrica também passa a funcionar, a partir de amanhã, por referenciação, confirmou ao Observador fonte oficial da Unidade Local de Saúde de Santa Maria. No caso das crianças, as regras não se aplicam aos bebés com menos de um ano de idade, que continuam, assim, a ter acesso livre à urgência.

Sindicatos questionam destino dos utentes sem médico. “Para onde serão orientados?”

Ao Observador, os sindicatos médicos criticam a medida, e questionam o que acontecerá aos doentes que não têm médico de família atribuído (que são 110 mil na ULS de Santa Maria, 62 mil na ULS de Lisboa Ocidental e 90 mil na ULS de São José) e que, por isso, não são reencaminhados para os centros de saúde ao abrigo do projeto Ligue Antes, Salve Vidas. “Olhamos para isto com preocupação. Lisboa e Vale do Tejo é a região onde se encontra a esmagadora maioria dos utentes sem médico de família. Para onde é que estes doentes serão orientados?”, questiona a presidente da Federação Nacional dos Médicos, Joana Bordalo e Sá, lembrando que existe, nesta zona, uma “enorme falta de médicos de família”.

Projeto Ligue antes, Salve vidas arrancou no hospital São João

Uma preocupação também manifestada pelo Sindicato Independente dos Médicos. “Este projeto em Lisboa terá um impacto limitado, porque os únicos doentes que poderão ser encaminhados para as USF serão os seus próprios utentes. Os que não têm médico continuarão a ter de ir à urgência“, avisa a Secretária Regional de Lisboa e Vale do Tejo do SIM, Maria João Tiago. “As USF servem uma população e têm uma carta de compromisso com os seus doentes, e não poderão ver outros, sob pena de estarem a violar a legislação”, sublinha a dirigente sindical, acrescentando que, caso contrário, os centros de saúde ficariam “ainda mais sobrecarregados”.

“Isto é uma excelente ideia no norte e no centro, onde 99% da população tem médico de família. Aqui no sul temos de continuar a trabalhar para garantir médico aos 1,1 milhões que não têm”, defende Maria João Tiago.

A presidente da FNAM critica o espírito do projeto Ligue Antes, Salve Vidas. “As linhas telefónicas não substituem, de forma alguma, a observação de um doentes em serviços de urgência. Isto coloca os utentes e os doentes em risco”, alerta. “É também uma tentativa de reduzir as equipas, de uma forma inaceitável e superficial. As pessoas têm direito a serem vistas no SNS”, defende Joana Bordalo e Sá.