O Governo vai aumentar a taxa de imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP) em janeiro para compensar o efeito da descida da taxa de carbono cobrada nos combustíveis. A informação foi avançada esta quinta-feira pelo ministro das Finanças durante uma audição no Parlamento onde Joaquim Miranda Sarmento assegurou que a alteração será neutra do ponto de vista dos preços e da carga fiscal e recusou a acusação de que estava a subir impostos. “Se é uma reversão de um desconto, não pode ser um aumento”.
Numa audição pedida pelo PS, o ministro das Finanças acabou por admitir que: “entendemos que o desconto no imposto petrolífero” — aprovado no Executivo de António Costa em 2022 — “deve ser revertido”, até por causa da recente reserva feita pela Comissão Europeia à política de apoio fiscal aos combustíveis. Miranda Sarmento não se comprometeu com um calendário, mas “não exclui tomar esse passo”, indicando que o objetivo do Governo é que essa reversão não tenha efeito no preço final. O que significa aumentar a carga fiscal em conjuntura de descida de preços antes de impostos.
Esta evolução na posição do Governo foi duramente atacada pela oposição. Para o deputado socialista Mendonça Mendes, o ministro “omitiu” este aumento da taxa durante o debate orçamental. Mariana Mortágua do Bloco de Esquerda acusa o ministro das Finanças de ter enviesado o debate com números deturpados.
Este desconto fiscal nos combustíveis representa uma perda de receita fiscal de mais de 600 milhões de euros até outubro e estima-se que em 2024 essa perda possa atingir mais de mil milhões de euros numa base anual. A esta perda corresponde um desconto de cerca de 15 cêntimos por litro no imposto petrolífero. Com a reversão parcial deste desconto a partir de janeiro do próximo ano, entre três a quatro cêntimos por litro, faltariam recuperar ainda 10 cêntimos, segundo contas do Observador. À saída da audição, o ministro das Finanças e a secretária de Estado dos Assuntos Fiscais, Cláudia Reis Duarte, recusaram indicar qual o valor atual do desconto.
Sobre o aumento do ISP que irá substituir uma parte da taxa de carbono cobrada a partir de janeiro, Sarmento garantiu na audição: “Os portugueses não pagarão mais impostos, mas haverá um mix diferente da carga fiscal” nos combustíveis. Esta alteração resulta da aplicação da lei que obriga à atualização anual da taxa de carbono com base na evolução dos preços do CO2 registados no ano que começa em setembro e acabou em outubro de 2024. Acontece que ao contrário do que sucedeu em anos passado, os preços do CO2 baixaram o que determina uma taxa de carbono mais baixa do que a que está em vigor.
Para além de não responder a perguntas dos jornalistas sobre o tema, o Governo tem demorado a publicar a taxa de carbono para 2025 que o ministro das Finanças afirma estar em fase final de análise para publicação de portaria. No entanto, os dados para fazer as contas são já conhecidos há mais de um mês e o deputado do PS ( ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais), António Mendonça Mendes, confrontou o ministro com os cálculos que ele próprio fez e que dão uma cotação de 67,39 euros por tonelada quando o valor que está a ser cobrado atualmente é de 83 euros por tonelada de CO2. Miranda Sarmento confirma.
A aplicação da lei que resultaria numa redução da taxa de carbono na casa dos três a quatro cêntimos por litro face ao valor atualmente cobrado e que resultou do descongelamento realizado em três tempos pelo Governo este verão sem efeito nos preços.
Taxa de carbono subiu três vezes e 7 cêntimos por litro, mas “sem dor” para quem abastece
Neste cenário, Mendonça Mendes pergunta ao ministro se o ano vai arrancar com um buraco orçamental de mais de 500 milhões de euros, uma vez que o próprio Miranda Sarmento confirma que a previsão de crescimento da receita do imposto petrolífero tinha como base uma taxa de carbono mais alta, correspondente aos 83 euros por tonelada que estão em vigor.
Mas o ministro das Finanças explica que irá baixar a taxa de carbono e subir a taxa de ISP na mesma proporção. O que, garante, não terá impacto no preço final nem na carga fiscal sobre os combustíveis.
Ministro das Finanças acusado de omissão e deturpação na política fiscal para os combustíveis
Para António Mendonça Mendes, esta decisão corresponde a um aumento de impostos, acusando o ministro e o Governo de “omissão, para ser simpático” no debate do Orçamento do Estado onde o Governo garantiu que não ia aumentar os impostos indiretos em 2025 e que o crescimento da receita fiscal em mais de 500 milhões de euros previsto era devido apenas ao efeito do consumo. Para o deputado socialista, e que foi o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que congelou a taxa de carbono, está em causa um aumento do imposto petrolífero porque a taxa de carbono teria sempre de baixar para cumprir a lei. “Não podia ficar cristalizada no valor deste ano”.
Miranda Sarmento corrige: “Não vamos aumentar o ISP, vamos é reduzir o desconto”, lembrando que o PS enquanto estava no Governo sempre sinalizou que este desconto no imposto petrolífero introduzida em 2022 para responder à crise dos preços da energia seria sempre temporário. O ministro das Finanças também argumentou com a necessidade de responder às crescentes pressões da Comissão Europeia que, na avaliação ao último plano orçamental pressionou Portugal para por fim a esses apoios fiscais ao preço dos combustíveis.
Daí que, defende, a recomposição da carga fiscal dos combustíveis a partir de janeiro será neutra do ponto de vista dos preços e da carga fiscal e permitirá ao país começar a resolver o diferendo com Bruxelas. Segundo Miranda Sarmento, a Comissão colocou uma reserva clara ao plano orçamental de longo prazo apresentado por Portugal.
Explicações que não convencem a coordenadora do Bloco de Esquerda. Mariana Mortágua confronta o ministro com as respostas que deu durante a apresentação e discussão do OE e nas quais afastou a reversão dos descontos no imposto petrolífero. “O que acabou por admitir é que a receita do ISP não vem apenas do aumento do consumo e do descongelamento da taxa de carbono. Vem do que não disse que ia fazer que é a reversão do desconto no ISP. Todo o debate sobre o Orçamento do Estado foi enviesado por uma apresentação deturpada de números”.
Miranda Sarmento admite que quando apresentou a proposta orçamental não previa mexer no tal desconto do imposto petrolífero, apesar de na altura já se saber que as cotações do CO2 que determinam a evolução da taxa de carbono iam baixar. O que fez o Governo mudar de opinião, diz o ministro das Finanças, foi a reserva da Comissão Europeia. E a redução do desconto na mesma proporção em que a taxa de carbono baixa. “Parece-nos uma solução virtuosa de resolver uma parte do problema sem os portugueses pagarem mais pelos combustíveis”.