Os governos não devem fugir à responsabilidade de assumir, de forma “realista”, que os cidadãos terão de ter um papel mais ativo na preparação da sua própria reforma. Um especialista da gestora de ativos Fidelity reconhece que a mudança de mentalidades “não é um trabalho fácil”, mas é algo crucial – caso contrário haverá “alterações bem mais radicais no futuro“.
Julian Webb, um dos principais responsáveis pelos produtos de poupança para a reforma da Fidelity, foi nesta quarta-feira um dos principais oradores de uma conferência em Londres que dedicou parte da discussão à “questão global” que é o sistema de pensões.
Outro orador foi Nick Peters, que falou num estudo recente que diz que em 2060, estima-se que os cidadãos passarão um terço das suas vidas aposentados. “Isso são ótimas notícias. Mas é preciso perceber como é que os custos associados a isso serão suportados”, afirmou o gestor de fundos da Fidelity.
O envelhecimento da população europeia torna este um problema crucial para os governos, para os cidadãos e para quem ajuda a sociedade a investir os seus recursos, ou seja, gestoras de ativos como a Fidelity. Além dos clientes particulares, “muitos dos clientes da Fidelity são empresas que são responsáveis pelas reformas de trabalhadores de vários países, que têm regras diferentes para as reforma”, afirma Julian Webb.
“O desafio comum a todos é perceber como é que se irá financiar as responsabilidades crescentes com as reformas dos cidadãos”, constata o especialista. “Tendo em conta que os sistemas de segurança social em vários países vivem uma situação de desequilíbrio (défice), os governos estão a perceber a importância de equilibrar a situação através de um maior papel dos cidadãos na preparação da sua reforma, em complemento ao que o Estado pode oferecer”.
“Há bons exemplos de países que estão a fazer um trabalho de adaptação ótimo – como os EUA, Austrália, Nova Zelândia -, outros estão a começar – como a Holanda e outros países europeus -, e outros ainda não começaram”, afirma Julian Webb. “Mas esses países vão precisar de o fazer muito rapidamente, porque estamos todos a viver muito mais tempo e a ideia de um Estado que providencia tudo já não corresponde à realidade”, alerta.
Mas como se sensibiliza os cidadãos e os eleitores para essa questão, perguntou o Observador a Julian Webb. “Não é fácil”, reconhece o especialista da Fidelity. “As pessoas cresceram com uma ideia de que o Estado se responsabiliza por todas as providências, não há um incentivo para que se adotem comportamentos diferentes”, acrescenta.
Porém, “se não fizermos alguma coisa, estaremos a sujeitar-nos a que, num dado momento no futuro, teremos de fazer alterações muito mais radicais” para as pessoas e para a sociedade, avisa Julian Webb.
Porquê? “Há que ser realista sobre aquilo que é suportável pelo sistema – o que tem passado muitas vezes, como já vimos, por aumentar a idade da reforma – mas é importante que se incentive as pessoas a tomarem uma maior responsabilidade na preparação das suas reformas”.
Uma das formas de o fazer, diz Julian Webb, é fazer com que “essa provisão não influencie negativamente aquilo que será, um dia, a provisão de reforma estatal”, ou seja, a definição de que se os planos privados são um complemento. E para estimular a preparação desse complemento, “os benefícios fiscais são uma ferramenta”, mas “os empregadores terão um papel crucial”, porque são alguém em quem os empregados confiam, afirma Julian Webb.
Uma questão-chave, contudo, na opinião de Julian Webb, é que “os governos têm de primar é pela consistência. Não se pode estar constantemente a mudar as regras”.
Esta foi uma das principais conclusões de um debate intitulado O desafio das Reformas. Há uma solução, promovido pela gestora de ativos internacional. E essa solução passa, na opinião de Nick Peters, por olhar além das classes de ativos tradicionais e criar carteiras diversificadas, com algum risco – “porque só mais risco garante maior retorno” – para suportar os custos da reforma de cada um.
*O jornalista viajou para Londres a convite da Fidelity.