A Arábia Saudita parece estar a tentar empatar as negociações na Conferência do Clima em Paris (COP21), ou pelo menos a travar as medidas mais ambiciosas do acordo. A notícia é do jornal britânico The Guardian, mas está de acordo com as “acusações” do Fóssil do Dia – um prémio atribuído diariamente aos países que têm as piores prestações em relação ao ambiente. Ainda esta terça-feira, a Germanwatch tinha apresentado o país como o pior no desempenho no que diz respeito às alterações climáticas.

“Continua sem haver mudanças nas políticas climáticas da Arábia Saudita”, escrevem os autores do relatório The Climate Change Performance Index 2016, da Germanwatch. “O reino depende fortemente dos combustíveis fósseis. Apesar de as energias renováveis estarem a crescer lentamente nos últimos anos, isto ainda não tem um impacto significativo no fornecimento de energia da Arábia Saudita.” E aqui reside o problema.

Os 195 países e a União Europeia estão reunidos em Paris para discutir como se pode travar o aumento da temperatura média global – que não deveria ultrapassar os 2º C até 2100 quando comparada com os níveis do período pré-industrial. Esse aumento da temperatura é causado principalmente pela emissão de gases com efeito de estufa. Um desses gases é o dióxido de carbono emitido, por exemplo, pela queima de combustíveis fósseis para produção de energia. O ideal era que todos os países usassem 100% de energias renováveis, mas é natural que um dos maiores exportadores de petróleo, e um dos maiores poluidores, não tenha qualquer interesse nesse objetivo.

A posição pouco favorável parece ter sido espelhada pelo próprio ministro do Petróleo, Ali al-Naimi, que disse na sessão ministerial que a Arábia Saudita não pode diferenciar as energias “limpas” das “sujas”. Uma atitude tida como uma antítese do objetivo da COP21 e que lhe valeu o Fóssil do Dia a 7 de dezembro, conforme relata a ECO – a newsletter diária da Climate Action Network, uma rede de organizações não-governamentais.

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“Está toda a gente a tentar puxar a corda ao máximo”, disse ao Observador Pedro Barata, membro da delegação portuguesa em Paris. Como ainda existem muitas questões em aberto, o antigo negociador considera que é normal que cada país tente ver os seus desejos satisfeitos. “Os países da Península Arábica vão ter sempre uma posição extrema. Mas eu não daria grande importância, parece-me complicado que pudessem bloquear a negociação.”

Já no dia 4 de dezembro, a Arábia Saudita tinha conquistado o Fóssil do Dia. E não foi só um, mas três. Primeiro, por não querer que o limite do aumento médio global da temperatura acordado entre os países passe de 2º C para 1,5º C. Aqui, o prémio foi partilhado com a China e a Índia, que também não se mostram interessados num limite mais restritivo, e com o grupo árabe por não fazer frente à posição da Arábia Saudita – ainda que sofram as consequências disso.

O segundo foi partilhado com a Noruega e os Estados Unidos por tentarem boicotar a transição dos combustíveis fósseis para as energias renováveis. E o terceiro, só para a Arábia Saudita, pela falta de interesse em rever as contribuições propostas por cada país (Intended Nationally Determined Contributions, INDC) até 2018.

“Nós, os países em desenvolvimento, não temos capacidade para fazer isto [a revisão das contribuições] a cada cinco anos. Somos muito pobres e temos outras prioridades”, disse o delegado da Arábia Saudita citado pelo The Guardian. Mas muitos países pobres e em desenvolvimento já aceitaram esta revisão das metas, incluindo países do grupo árabe, como o Egito ou Marrocos. Estão especialmente comprometidos em contribuir para o combate às alterações climáticas os países que já começaram a sentir os seus efeitos, como os pequenos Estados-ilha.

Apesar da alegação de pobreza feita pelo delegado, a Arábia Saudita é a décima quinta maior economia do mundo. Mas embora esteja bem classificada no ranking, recusou-se a contribuir para o fundo para apoiar os países pobres a lidar com as alterações climáticas – Green Climate Fund -, alegando que só os países industrializados o deveriam fazer, refere o The Guardian.

No que diz respeito às compensações, a Arábia Saudita vai mais longe e defende que se os pequenos Estados-ilha merecem ser compensados pelas perdas devido às alterações climáticas, o reino também deve ser compensado por vir a perder nas vendas de petróleo no futuro e por ter de investir em tecnologia verde. Pedro Barata já tinha explicado ao Observador que esse desejo, sempre recusado por todos os outros negociadores, foi conseguido em Copenhaga 2009.