O Presidente da República tinha acabado de visitar a Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, no primeiro ponto de agenda em que não foi acompanhado por António Costa. “Paris é uma festa”, comentou com Artur Santos Silva, o presidente da fundação, assim que chegou às instalações da mais importante instituição cultural portuguesa na capital de França. À saída, falou dos consensos e apontou os dois setores onde era mais difícil os partidos chegarem a um entendimento: a Educação e a Segurança Social.
Marcelo Rebelo de Sousa falou da boa relação pessoa com o primeiro-ministro, mas destacou as visões diferentes que ambos têm do mundo. Também comentou a visão positiva que François Hollande e os franceses têm hoje de Portugal, que parece estar na moda por terras francófonas.
Ao referir-se ao aparente bom entendimento com o primeiro-ministro ao longo destes dias em Paris, Marcelo disse que era “bom que esta convergência continuasse pelo maior período de tempo possível e se alargasse a outros setores da sociedade portuguesa. E aos partidos”. “E fosse possível [entendimentos] em questões fundamentais, da Política Externa, Defesa, como o funcionamento do Estado e na Saúde. Infelizmente, não é possível para já na Educação, e vai demorar tempo na Segurança Social, mas era bom que houvesse entendimento no maior número de domínios porque é o que se passa noutras democracias mais avançadas na Europa.”
Marcelo Rebelo de Sousa sublinhava, em declarações aos jornalistas, que Portugal tem “prioridades” que “exigem uma grande estabilidade e uma grande convergência dos órgãos de soberania e dos vários setores da opinião pública”. Sob pena de o país não se conseguir fortalecer: “Em relação à Europa – continuou o Presidente — temos de estar juntos, porque se não estivermos juntos ficamos mais fracos”, afirmou. A seguir, enumerou como exemplo algumas das áreas em que os dois maiores partidos não têm divergências profundas: “Em relação a questões como os refugiados e segurança temos de estar juntos. Em relação à CPLP temos de estar juntos. Em relação a pontos fundamentais da política portuguesa como a política externa, é cada vez mais importante estarmos juntos”.
Quanto à cumplicidade que Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa parecem ter revelado durante a viagem a Paris para as comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades, o Presidente explicou que ambos os titulares dos órgãos de soberania estavam “irmanados no mesmo objetivo nacional, das comunidades portuguesas no estrangeiro e no relacionamento com a França.” No entanto, e apesar de tudo, têm as suas diferenças: “Depois há diversidades. Eu vou à missa, e o sr. primeiro-ministro não vai à missa. Temos visões diversas sobre vários aspetos e maneiras de encarar o mundo.”
Hollande “muito bem informado sobre Portugal”
Ao fazer um balanço da vista a França – que entra este domingo no último dia – o Presidente da República considerou positivos tanto os aspetos bilaterais, de relação com o Estado francês, como os contactos com a comunidade portuguesa. “Ultrapassámos as expectativas em vários domínios. Primeiro, no convívio com os portugueses. A comunidade portuguesa aderiu em peso, em todos os momentos, desde o primeiro encontro mais formal, com as condecorações dos heróis [na Câmara de Paris], até à homenagem daqueles que foram precursores da emigração”.
“O segundo aspeto positivo” – enfatizou Marcelo Rebelo de Sousa – “foi o encontro com as autoridades francesas, mais concretamente com o presidente François Hollande, que também ultrapassou as expectativas, no sentido de que está muito bem informado sobre Portugal.” O Presidente da República português diz ter percebido, através das conversas com Hollande, que “há uma moda de Portugal em França, assim como há uma redescoberta da França e dos franceses em Portugal. Há um turismo que já não tínhamos há 50 anos, um investimento imobiliário e relações comerciais que os dois países nunca tiveram com esta expressão.”
A questão mais decisiva abordada nas conversas com Hollande teve a ver com a União Europeia: “Houve uma convergência de posições sobre a Europa, desde logo numa parte importante que é a questão o financeira e orçamental, depois sobre todos os temas europeus e isso é muito bom”, afirmou o Presidente da República. O Observador já tinha noticiado, aliás, que durante a reunião no Palácio do Eliseu, François Hollande disse que era importante cumprir as regras europeias, mas estas não podiam asfixiar os países. “Também ficou patente o prazer com que presidente francês estava na reunião como os portugueses”, disse Marcelo, que pôs Hollande a condecorar as porteiras que socorreram as vítimas do atentado terrorista de novembro na sala de espetáculos Bataclan. Para sublinha a existência de uma empatia que se verificou no decorrer da cerimónia das condecorações no Hôtel de Ville, Marcelo sublinhou que “a política se faz de empatias pessoais, faz-se com pessoas, não se faz só com ideias.”
Guterres é “bom demais” e isso “cria dificuldades
Aparentemente, pelo menos segundo as palavras cautelosas de Marcelo Rebelo de Sousa, não parece que a França (um dos países com assento permanente no Conselho de Segurança da ONU) seja um dos apoios com que António Guterres possa contar para a eleição como secretário-geral das Nações Unidas. Ou, pelo menos, deu a entender que a candidatura pode estar a enfrentar dificuldades. “Sabemos que Guterres tem sido um pré-candidato assumido e notável, mas uma coisa curiosa na vida é que, às vezes, para certos lugares o ser-se bom demais cria dificuldades, porque muitas vezes a escolha é feita por exclusão de partes.” E acrescentou que muitas vezes para os cargos internacionais, as escolhas são feitas em cima do momento: “Houve, no passado, escolhas para os órgãos internacionais feitas à última da hora, na base de quem levantava o menor número de problemas. E nós apostamos numa candidatura que resolva o maior número de problemas”.