Quatro das 85 obras de Miró podem vir a ser alvo de um processo de classificação sem acordo do proprietário, uma vez que a Parvalorem detém os quadros desde a criação da empresa, após a nacionalização do ex-BPN em 2008, e não desde a importação das obras, em 2004. Estas quatro obras deixaram de estar ao abrigo do artigo 68 da Lei do Património Cultural, no passado dia 5 de outubro.

Um guache e tinta-da-china sobre cartão, sem título, de 1938, um desenho a lápis e tinta-da-china, intitulado “Mulher sentada II”, de 1939, e mais duas obras, também sem título, em tinta-da-china sobre papel, de 1949 e de 1950, são as obras em causa.

De acordo com os documentos de importação destas obras, a que a agência Lusa teve acesso, as quatro deram entrada em Portugal a 5 de outubro de 2004, enquanto as restantes 81 obras têm datas posteriores, a partir de dezembro de 2005. Segundo o artigo 68 da Lei de Bases do Património Cultural de 2001 “salvo acordo do proprietário, é vedada a classificação como de interesse nacional ou de interesse público do bem, nos dez anos seguintes à importação ou admissão”.

Em julho deste ano, o secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, pediu à Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), a abertura do processo de classificação e inventariação das 85 obras de Joan Miró (1893-1983) na posse do Estado, na sequência da nacionalização do antigo Banco Português de Negócios (ex-BPN). No final de agosto, a DGPC decidiu arquivar esse processo, depois de a Parvalorem ter comunicado oficialmente que não reconhecia “nos termos legais, interesse ou necessidade de se proceder à classificação das obras Miró”.

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Contactada pela agência Lusa sobre o facto de as quatro obras deixarem de estar ao abrigo do artigo 68 da Lei de Bases do Património Cultural, o presidente da Parvalorem, Francisco Nogueira Leite, escusou-se a comentar. “Não faremos qualquer declaração até conhecermos as decisões do Tribunal Administrativo de Lisboa, que aguardamos há longo tempo”, disse.

No Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa (TACL) correm, desde o início do ano, três processos interpostos pelo Ministério Público contra a saída das obras do país para venda em leilão, em Londres. Foram esses processos que levaram a leiloeira Christie’s a adiar o leilão por duas vezes este ano, apesar de a Parvalorem ter obtido uma autorização de saída do país por parte da DGPC.

A coleção de desenho e pintura do artista catalão Joan Miró do ex-BPN tem gerado polémica. Suscitou uma petição pública com mais de dez mil assinaturas e debates no parlamento, com a oposição a defender a manutenção das obras em Portugal.

Na semana passada o Grupo Parlamentar do PCP entregou no parlamento um novo projeto de resolução, recomendando ao Governo que classifique as obras de Miró na posse do Estado e que sejam exibidas ao público. A Lusa questionou a DGCP e o gabinete do secretário de Estado da Cultura sobre a possibilidade de existir a intenção de reabrir o processo de classificação para estas quatro obras, que deixaram de estar abrangidas pelo artigo 68 da Lei do Património, mas até agora não obteve uma resposta.