O PS vai mesmo apresentar um diploma próprio com vista à legalização da adoção de crianças por casais do mesmo sexo, juntando-se assim ao Bloco de Esquerda e aos Verdes que na passada quarta-feira conseguiram voltar a pôr o tema na agenda parlamentar. No dia 21 de janeiro as propostas dos três partidos sobre esta matéria serão assim discutidas em plenário, a par dos projetos legislativos sobre procriação medicamente assistida.
“Os dois projetos de lei [sobre adoção e procriação medicamente assistida] estão prontos”, confirmou na sexta-feira a deputada socialista Isabel Moreira ao Observador. Os diplomas vão ser analisados na próxima reunião do grupo parlamentar socialista, que acontece na quinta-feira, e só depois darão entrada na Mesa da Assembleia da República – o que deverá acontecer no dia seguinte. Isto porque a iniciativa, que recupera diplomas já apresentados pelos socialistas anteriormente, vai ser de todo o grupo parlamentar, e não apenas de um grupo de deputados. “Nem podia ser de outra forma”, confirmou Isabel Moreira.
A decisão surge depois de os socialistas terem hesitado sobre se deviam ou não avançar já com uma iniciativa sobre esta matéria, sabendo que terão pelo meio o muro da maioria PSD/CDS. Na quinta-feira, a deputada socialista Isabel Moreira confirmava ao Observador a notícia do Público de que o PS estava a ponderar avançar com um projeto próprio, mas remeteu uma decisão para sexta-feira. A questão, disse, era saber se “valia a pena” avançar agora, nos últimos meses da legislatura, ou esperar. Mas antes, na quarta-feira, depois de a conferência de líderes ter colocado os projetos do BE e dos Verdes na agenda, a deputada socialista tinha reiterado ao Observador que o PS não deveria avançar com um diploma próprio. “Apresentaremos um projeto de lei quando for para ganhar”, disse. Ou seja, na próxima legislatura onde o PS espera ser Governo.
Trata-se apenas de uma questão de timing. A verdade é que a apresentação de um projeto de lei sobre esta que é considerada uma questão fraturante numa altura em que o Parlamento entra na reta final da legislatura, e já com sentimentos de pré-campanha eleitoral, pode ser arriscado para os socialistas. Apesar de a intenção de alterar a lei nestes pontos estar vincada na Agenda para a Década de António Costa, a adoção de crianças por casais gay é uma matéria que assenta no eleitorado socialista mais à esquerda, mas que pode não agradar à outra parte do eleitorado que se coloca mais ao centro do espetro político.
Mas a discussão sobre a adoção de crianças por casais do mesmo sexo (casados ou unidos de facto) vai mesmo voltar à Assembleia depois do debate parlamentar sobre a coadoção (prevista para os casos em que um dos cônjuges já é pai ou mãe biológico e pretende estender o vínculo ao outro elemento do casal), que foi um dos temas mais polémicos desta legislatura.
O processo, no entanto, deverá ser diferente do anterior. Ao que o Observador apurou, o projeto de lei socialista não terá hipóteses de ser viabilizado no Parlamento, apesar de os deputados do PSD terem liberdade na votação e de, por isso, alguns dos que votaram a favor anteriormente irem provavelmente manter o sentido de voto. É que na equação entra também o aproximar das eleições, que deverá ser motivo suficiente para os partidos da maioria não aprovarem diplomas que dividem o eleitorado. Além de que o atual projeto incide sobre a adoção plena, e não sobre a coadoção, o que dificultará ainda mais a sua aprovação.
A apresentação de uma nova proposta de referendo sobre o tema, como a que foi apresentada pelo PSD na altura da discussão sobre a coadoção, não está desta vez em cima da mesa, confirmou ao Observador o deputado social-democrata Hugo Soares, que foi o autor da iniciativa em 2013.
Na altura, os socialistas apresentaram a proposta sobre a coadoção, e, não havendo disciplina de voto nas várias bancadas, chegou mesmo a ser aprovada na generalidade em maio de 2013. Mas a discussão na especialidade prolongou-se durante largos meses, acabando por voltar ao plenário em março para ser chumbada. Pelo meio, um grupo de deputados do PSD que tinha votado contra propôs fazer-se uma consulta popular sobre a matéria – uma proposta que foi estendida a toda a bancada por imposição de disciplina de voto e que acabou por ser declarada inconstitucional pelo TC.