Chamam-lhe Queen B por alguma razão — foram poucas as vezes em que a coroa caiu da cabeça de Beyoncé, irrepreensível e sempre a marcar o passo tanto no mundo da música como na moda, ainda nos tempos das icónicas Destiny’s Child. Este sábado, Beyoncé apaga as velas dos seus 40 anos e marca o início de uma nova década com desejos de que seja “divertida e cheia de liberdade”, uma década que se quer de descoberta do seu eu e da sua família, uma década de “celebração, alegria, de dar e receber amor”, confessou. “O meu desejo para o futuro é poder continuar a fazer tudo o que os outros acham que eu não posso fazer”. Até porque se há alguém que pode fazer tudo é Beyoncé.
Começou cedo no mundo do espetáculo, ainda com 10 anos, em Houston, onde nasceu em 1981, inscreveu-se em aulas de dança e deu nas vistas pelas suas habilidades junto dos professores. Impressionados também com as capacidades vocais de Beyoncé Giselle Knowles, que começou por ter aulas de voz com uma professora de ópera aos 9 anos. Acabou por ir parar ao coro da igreja local onde fez amizade com Kelly Rowland, já a fazer a caminha para aquilo que viriam a ser as Destiny ‘s Child, a banda que marcou uma geração, não só pela música, mas pelo estilo irreverente que na década de 90 só elas sabiam envergar. Crop tops, vestidos mini, calças cargo ou macacões, quase sempre em coordenados matchy-matchy, era assim que se apresentavam em palco grande parte das vezes.
É difícil encontrar outro artista que se tenha dedicado tanto à sua própria evolução na sua carreira, à sua arte, às suas performances, à sua comunidade, e ao seu estilo pessoal, tudo com mérito muito próprio. A carreira a solo arrancou em 2003, ainda integrada nas DC que acabaram por ver o seu fim chegar em 2005. Sozinha, Beyoncé lançou seis álbuns, incluindo os lançamentos surpresa Beyoncé (2013) e Lemonade (2016), e outro álbum em conjunto com Jay Z, Everything Is Love (2018), tendo sido produtora executiva de The Lion King (2018) e de Black Is King (2020).
As suas inigualáveis décadas de carreira musical culminaram em 28 Grammys, tendo-se Beyoncé tornado na artista mais premiada de sempre nos Grammys Awards. Dos maiores sucessos da sua carreira saltam ao ouvido “Single Ladies”, “Crazy in Love”, “Irreplaceable”, “Love on Top”, “Drunk in Love” ou “Formation”.
Quando Beyoncé enveredou por uma carreira a solo também o seu estilo mudou de alguma maneira, sobretudo porque começou a trabalhar com designers e casas de luxo — Gucci, Dolce & Gabanna e Balmain são dos favoritos da cantora—, tendo alguns desses looks ficado eternizados nos livros de memórias de passadeiras vermelhas ao longo destes anos.
“Passei tantos anos a tentar melhorar e melhorar o que quer que tenha feito, que estou num ponto em que já não preciso de competir comigo mesma”, disse à Harper’s Bazaar da qual foi capa do mês de setembro. “Não tenho qualquer interesse em olhar para trás. O passado é o passado. Sinto que muitos aspectos daquela jovem e menos evoluída Beyoncé nunca poderiam interferir com a mulher que sou hoje!”
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Conhecida por manter no privado aquilo que é privado, Beyoncé já tem doutoramento em fugir dos paparazzi ou em fazer aparições bem calculadas, quase sempre junto do seu mais que tudo Jay Z. O casamento dos dois está no top dos casamentos super-secretos entre celebridades, daqueles que só se veio a saber depois. Beyoncé e Jay-Z foram apanhados a levantar uma licença de matrimónio em Nova Iorque, em abril de 2008, e só depois confirmaram publicamente que tinham dado o nó no dia 4 desse mês.
O casal partilha Ivy, de 9 anos, e os gémeos Rumi e Sir, de 4, e desde o início da relação que a privacidade é um dos pilares que Beyoncé defende com unhas e dentes. “Eu queria que o foco fosse a minha música, porque se a minha arte não é suficientemente forte ou significativa para manter as pessoas interessadas e inspiradas, então estou no negócio errado”, disse à mesma publicação recentemente. “Lutei para proteger a minha sanidade e a minha privacidade, porque a minha qualidade de vida dependia disso. Muito do que sou está reservado às pessoas que amo e em quem confio. A razão pela qual outras pessoas não veem certas coisas sobre mim é porque o meu rabo Virgem [signo] não quer que as vejam… Não é porque não existem!”
E apesar de ser uma das mulheres mais poderosas do mundo da música, nem sempre tudo foi um mar de rosas para Beyoncé. O documentário da Netflix, “Homecoming”, espelha de forma real a pressão a que esteve sujeita — pouco tempo depois de ter tido os seus filhos gémeos —, a dificuldade nas coreografias, a dieta pós-parto, a intensidade insana do ritmo de trabalho, tudo isso levou Beyoncé a um estado de exaustão total. “Puxei por mim, definitivamente, mais longe do que sabia que podia, e aprendi uma lição muito valiosa: nunca mais…nunca mais me vou obrigar a ir tão longe”, admitiu no documentário que mostrou aquela que foi uma atuação histórica dado que Beyoncé foi a primeira mulher negra a atuar como cabeça de cartaz no Coachella, onde teve consigo mais de 100 bailarinos e interpretou a sua música com uma banda marcial.
Lembra-se de Beyoncé no Coachella? O documentário está a chegar à Netflix
Na entrevista com a Harper’s Bazaar, a cantora admite também que a idade a tem feito refletir sobre as reais preocupações da vida e diz que deixou de se focar tanto nas dietas e mais na sua saúde mental. A estrela pop sempre mostrou que qualquer um pode ser aquilo que quer ser, independentemente do seu aspeto, uma “liberdade” que deseja a todos. “Podes ser ao mesmo tempo elegante e provocador. Podes ter curvas e ainda seres um ícone da moda”, afirmou a cantora.
Quem tem uma mãe tem tudo
E Beyoncé tem uma mãe que lhe desenhou alguns dos modelitos mais importantes da sua carreira. Quando ganhou o galardão Fashion Icon da CFDA Awards, em 2016, Beyoncé falou do impacto que a sua mãe teve na sua carreira através da moda, sobretudo numa altura em que várias marcas se recusaram a vestir ao grupo Destiny’s Child. “A minha mãe e o meu tio Jonny desenharam todos os nossos primeiros fatos da banda e fizeram cada peça à mão…cosendo individualmente centenas de cristais e pérolas…pondo tanta paixão e amor em cada pequeno detalhe”, confessou.
A cantora contou também que Tina Knowles assinou mais criações importantes da sua vida — é o caso do vestido de noiva e o vestido que vestiu quando ganhou o seu primeiro Grammy, todo ele brilhante e verde esmeralda.
No mesmo discurso, Queen B fala da sua ligação de sempre com a moda, que esteve presente desde que se lembra até porque a sua avó era costureira. A cantora conta que as dificuldades financeiras da sua família levaram a avó a costurar fatos para padres e freiras e uniformes de estudantes para poder pagar os estudos à sua mãe, Tina Knowles. E assim se passou um saber de geração em geração — Tina aprendeu com a sua mãe e assumiu depois o papel de stylist das Destiny ‘s Child.
“Isto para mim é o verdadeiro poder e potencial da moda. É um instrumento para encontrares a tua própria identidade, expressão, e força. Transcende o estilo e é uma cápsula do tempo dos nossos maiores êxitos”, disse ainda a cantora de “Formation” que hoje em dia usa o seu Instagram como uma montra de modelitos bem coordenados, quase como se se tratasse sempre de uma produção fotográfica.
A verdade é que Tina Knowles foi uma das responsáveis pela estética das DC ser muito à frente daquele tempo, sempre com muitas lantejoulas, ganga e padrão camuflado. Mas nem todos viam aquele estilo com bons olhos.
Numa entrevista com o The Washington Post, Tina Knowles falou de alguns dos desafios que enfrentou como designer das Destiny’s Child no final dos anos 90 e início dos anos 2000. “A editora delas, depois de começarem a ter muito reconhecimento, disse que eu seria a razão pela qual elas estariam limitadas, porque eram um pouco vistosas demais, um pouco Motown demais, mas o que eles realmente queriam dizer era que eram um pouco negras demais”, revelou, citada pela W Magazine. “Disseram-me que elas deviam ser mais parecidas com a Britney Spears e a Christina Aguilera.”
A verdade é que Tina quis manter-se fiel ao seu estilo e à identidade que tinha criado para os membros da banda, e ainda bem — foi essa estética que as definiu e que as levou mais longe a par dos grandes êxitos.
Mulher, cantora, mãe e…empresária do mundo da moda
Foi em 2016 que Beyoncé se lançou à séria na indústria da moda ao lançar em nome própria a sua marca Ivy Park. O nome traz consigo referências óbvias à sua filha mais velha, Ivy Blue, mas também é inspirado no Parkwood Park, em Houston, onde a cantora costumava praticar exercício. A marca, dedicada à roupa desportiva com alguns lançamentos mais casuais, foi lançada por Queen B com o objetivo de inspirar mulheres a praticarem exercício físico e a aceitarem os seus corpos tal como são.
A Ivy Park foi lançada primeiro numa parceria com a Topshop, no ano de lançamento, e em 2018, Beyoncé acabou por comprar a empresa na totalidade e em 2020 anunciou uma nova parceria com a Adidas, que tem dado um boost generoso à marca. A Adidas disse na altura que esta parceria faria de Beyoncé a primeira mulher negra a ser proprietária única de uma marca desportiva desta dimensão.
A última coleção — a quarta desde que selou acordo com a gigante alemã — saiu precisamente em agosto e traz de volta a temática western. Apelidada de Rodeo, a coleção presta homenagem à comunidade negra que continuou a influenciar a cultura de cowboy e cowgirl, apesar de ter sido frequentemente excluída da história ocidental americana. “Depois de compreender de onde veio a palavra ‘cowboy’, apercebi-me de quantas histórias de cowboys negros e nativos faltam na história americana”, Beyoncé contou ao Houston Chronicle, citada pela Teen Vogue.
O sucesso das coleções é tal que acabam por esgotar, e não se trata apenas das peças à venda, trata-se quase sempre da produção que está por detrás de cada lançamento — Beyoncé é especialista em tornar cada momento em que dá a cara um momento que fica para a história. Desta vez, vimo-la vestida de cowboy numa sela de cavalo e num cenário pitoresco (e simulado) do que seria um cenário western a sério.