O que se diz ao país que, ao título de Campeão Europeu, junta uma Medalha de Ouro conquistada numa espécie de Jogos Olímpicos da Europa? Diz-se que tem a sorte de ter os jogadores que formam a melhor equipa do continente a jogar ténis de mesa. É isto, portanto, que se tem de dizer Marcos Freitas, Tiago Apolónia e João Geraldo, os três mesa-tenistas portugueses que venceram esta segunda-feira o ouro na primeira edição dos Jogos Europeus, que estão a decorrer em Baku, no Azerbaijão.
Se tem raquetes, uma rede e uma bola a ser batida pelo meio, a história tem de ser contada aos pontos. São eles que metem ordem num tu cá, tu lá frenético entre duas pessoas a verem quem maneja melhor uma bola que nem chega a pesar três gramas. Os portugueses são bons nisto e nem precisavam de sair do Azerbaijão com medalhas penduradas no pescoço — porque, em setembro, Portugal já tinha conquistado pela primeira vez o Campeonato Europeu de ténis de mesa, em Lisboa.
Primeiro jogo. A cara séria de Tiago Apolónia não demora muito a desfazer-se. O primeiro jogo é frenético, como qualquer um que se jogue em ténis de mesa, mas também é nervoso. Percebe-se. Tiago é o primeiro português a jogar e quer começar bem as coisas, certinho e sem erros. A princípio não o faz e arranca o primeiro set hesitante, sem atacar e a ver o que Adrien Mattenet (46.º do ranking mundial de ténis de mesa) atira para o seu lado.
O português, o 22.º melhor mesa-tenista do mundo, nem treme a cara séria, nem mesmo quando as bolas lhe começam a sair e encontra o andamento que não tem no início do primeiro set. Vai, controla-se, recupera e faz o 1-0 nas vantagens (13-11). Celebra, mas não muito. O segundo set também é dele e demora apenas seis minutos a ir ter com Tiago (11-9). O último é o da pancada final (11-6) e, aí sim, o português liberta-se das amarras e festeja à brava. O primeiro jogo da final dura 21 minutos, Tiago Apolónia sorri, troca um passou-bem com Marcos Freitas e deseja-lhe sorte para o que aí vem.
Segundo jogo. E o que aí vinha não era nada fácil. Quando o ténis de mesa se joga por equipas é normal que os melhores joguem contra os melhores. Que quem esteja lá em cima no ranking jogue contra alguém, do outro país, que também ande por lá. Mas a França não o faz e prefere que seja o 43.º lugar de Simon Gauzy a jogar contra o 10.º de Marcos Freitas. A escolha até podia ser suspeita, mas os gauleses tinham razão.
O francês é esperto e matreiro o suficiente para insistir em bater bolas para a direita do português, que é canhoto e nem sempre lida bem com isso. Marcos vence o primeiro set (11-8), mas perde o segundo nas vantagens (10-12) e fica logo a saber que aquele duelo ia durar mais uns quantos minutos. O terceiro set volta a ser do português (11-8), mas depois Gauzy decide mudar de estratégia. O francês testa o lado bom de Marcos e descobre que é dali que saem mais erros. Tanto que o quarto set acaba a falar francês porque Freitas perde tarde a timidez — ganha cinco pontos seguidos e reduz de 4-10 para 9-10 — e volta a errar quando não pode.
Isso obriga-o a ir ao quarto parcial e a suar para dar um 2-0 a Portugal na final. Consegue-o e fá-lo bem (11-5), não dando hipótese a Simon Gauzy de tornar renhido o último set deste jogo. Nenhuma, mesmo — o francês até chega a pontapear a mesa e a levar um puxão de orelhas do juiz de cadeira. E Portugal passa a liderar a final com um 2-0.
Terceiro jogo. Aqui a coisa complica-se. A final, dizem as regras, tem de ter um jogo a pares pelo meio e isso é como uma lomba no caminho dos portugueses. João Geraldo pega na raquete para fazer companhia a Tiago Apolónia e esta parceria não corre bem. O primeiro set demora cinco minutos a ser dos franceses (11-5) e tanto Gauzy como Emmanuel Lebesson carregam os ataques quando é João, o benjamim da seleção (19 anos), quem espera pela bola do outro lado da mesa.
Os festejos continuam a ter sotaque francês no segundo parcial (11-6) e não parece haver maneira de dupla portuguesa atinar. No terceiro também parece não haver até os portugueses salvarem cinco match points e prolongarem e, nas vantagens, fazerem com que os nervos passem para o outro lado da rede e contribuam para a vitória nacional (13-11). De repente, tudo muda.
Este jogo é a pares, sim, mas o ténis de mesa é um desporto mais individual do que coletivo. E quando assim o é, o que cada jogador tem dentro da cabeça manda muito. O psicológico tem força e os portugueses foram buscá-la ao ânimo de continuarem vivos neste jogo e de assim quererem ficar. O quarto parcial é tão ou mais renhido como o anterior e a decisão é de novo nas vantagens, onde João e Tiago voltam a ganhar (13-11). Era o 2-2 e o bilhete para Portugal fazer do próximo set a negra que lhe podia dar logo ali a Medalha de Ouro. Mas isso não acontece: os franceses voltam a ser melhores (11-6) e obrigam João Geraldo a jogar sozinho.
Quarto jogo. É o miúdo que substituiu o graúdo — uma lesão tirou João Monteiro dos Jogos Europeus — que fica com a responsabilidade de poder ser o primeiro a acabar com isto tudo. O canhoto sabe disso e começa bem, aliás, muito bem — ataca bastante e obriga Adrien Mattenet, o francês a quem Tiago Apolónia ganhara no primeiro jogo, a defender muito. O primeiro set é dele em quatro minutos (11-4) e o segundo só não é tão rápido porque o gaulês se lembra que o ténis de mesa não é só defender e, às tantas, começa a atacar até tudo só se decidir nas vantagens (11-10).
O terceiro parcial é um fartote. Está tudo em jogo e isso nota-se em quem tem 19 anos e joga para dar o ouro a um país. Mattenet até ataca mais que o costume, mas Geraldo obriga-o a fazer o que está habituado — a defender. Veem-se muitas bolas a serem trocadas com ambos a dois metros da mesa: o português a batê-la forte, e o francês a ampará-la para o ar. A estratégia resulta e o marcador vai ficando empatado mesmo até ao fim, até o gaulês bater mal na bola e dar o último dos pontos a João Geraldo e a Portugal.
O miúdo berra, ajoelha-se, grita mais um pouco e olha para os restantes membros da seleção que, tal como em Lisboa, em setembro, desatam a trocar abraços no chão do pavilhão. A festa é portuguesa, outra vez. E, pelos vistos, ténis de mesa mais Portugal é igual a campeões europeus.
PORTUGAL DE OURO EM BAKU !A equipa nacional de ténis de mesa acaba de fazer história ao trazer para Portugal a...
Posted by Federação Portuguesa de Ténis de Mesa on Monday, 15 June 2015