Fernando Aguiar
Ex-jogador do Benfica
"Nós estávamos a vencer. Fui eu que marquei o golo. Vi-o cair praticamente à minha frente. E percebi logo que se passava algo de grave. Fui a correr para lá mal vi o Sokota a gritar para o banco, a chamar o nosso médico. O Sokota virou o Miki de lado até o médico chegar. Mas o Miki não reagia a nada. Ele esteve a ser assistido durante muitos minutos. E comecei a pensar que, mesmo que se safasse, poderia ficar com mazelas para a vida. Ele saiu na ambulância e nós voltámos a jogar. Mas o que queríamos era sair rapidamente dali e ir para o hospital ter com ele. O jogo já não importava nada. A vitória e o meu golo não importavam nada. Felizmente o árbitro foi sensível aos nossos apelos e terminou o jogo pouco depois. O pior é que nós não sabíamos se ele tinha morrido ou não. Ninguém nos dizia. No balneário toda a gente tinha esperança que o Miki se ia safar. Estávamos a chorar, mas ninguém dizia nada. Não era preciso dizer nada. Depois, quando chegámos ao hospital, é que os médicos nos disseram o que ninguém queria ouvir."
Ricardo Rocha
Ex-jogador do Benfica
"Quando o Miki caiu, não estava a olhar para ele. Estava na defesa, longe dele, e mais concentrado num jogador do Guimarães que tinha de marcar. Só o vi caído no chão mais tarde e, confesso, pensei logo que estivesse a fingir uma lesão para ‘queimar’ tempo. E até achei bem: estávamos a vencer 1-0, o jogo estava quase a terminar, jogar com o Vitória é sempre difícil, e sempre dava para recuperarmos o fôlego. Só quando vi o Sokota a aproximar-se dele e, depois, a gritar por ajuda, é que percebi que a situação do Miki seria muito mais grave. E, infelizmente, foi."
Romeu
Ex-jogador do V. Guimarães
"O Miki caiu longe de mim. Eu estava no outro lado do relvado. E nem o vi a cair. Só quando me aproximei e vi os jogadores do Benfica aflitos é que percebi que seria algo de grave. Ao início até julguei que o Miki tivesse uma lesão ligeira, muscular, porque o jogo estava quase a terminar e chovia muito, o relvado estava ‘pesado’. Cheguei e vi-o inanimado. Fiquei ali, à espera que ele recuperasse, mas ele não recuperava. Tudo aquilo foi assustador para mim. Sentia-me impotente: estava ao pé dele e não podia fazer nada para o salvar. Os próprios médicos não podiam fazer muito mais do que fizeram, porque chovia muito e, segundo me disseram, não se podia usar o desfibrilhador com ele molhado. No entanto, como o hospital é mesmo ao lado do estádio, acreditei que ele sobrevivesse."
Rogério Matias
Ex-jogador do V. Guimarães
"Fui o primeiro a ver o Fehér estendido no chão. Antes de ele cair, disputou a bola comigo. Depois, fui fazer o lançamento, o Fehér meteu-se à frente e o árbitro mostrou-lhe o cartão amarelo. Quando voltei a fazer o lançamento, ele afastou-se, recuou uns passos, sorridente, e caiu. A minha primeira reação foi pensar: ‘Mas porque é que ele foi para o chão agora?! Está a queimar tempo!' – na altura o Benfica estava a ganhar 1-0 e o jogo estava a acabar. Mas ao fim de uns segundos, quando o Sokota se aproximou dele e gritou para o banco, percebi que era muito mais grave. Aproximei-me, vi-o inanimado e comecei a saltar, a gritar para o banco também. Vieram logo os médicos, os do Benfica e os do Vitória. Estava a chover muito. Os médicos queriam usar o desfibrilhador, mas tinham medo de o electrocutar. Ninguém pode imaginar o pânico que se vivia no relvado. O que me faz mais confusão até hoje é que eu disputei a bola com ele, senti que estava a bater num muro, porque ele era muito alto e forte, e depois caiu, sozinho, como se tivesse caído com um sopro."
Manuel José
Ex-jogador do V. Guimarães
"Lembro-me de estar sentado no banco. E, como a bola estava do outro lado do relvado, ninguém no banco se apercebeu da queda do Fehér. Só mais tarde é que percebi que ele não caiu como habitualmente se cai quando há, por exemplo, uma lesão muscular. Quando caímos, usamos as mãos para suportar a queda. Ele não, ele caiu desamparado. Mas ao fim de alguns segundos percebi logo que ele não estava bem e que não era somente uma lesão. Fez-se tudo o que era possível para o ajudar. Mas não chegou. Naquele momento o futebol não interessa nada. O resultado e o jogo não interessam nada. Foi um colega de profissão que morreu à nossa frente. Lembro-me de sair do banco e ir a correr para lá. Toda a gente foi a correr até ele. Comecei a perguntar aos jogadores do Benfica se ele se tinha sentido mal durante o dia ou no balneário. Eles diziam-me que não, que estava tudo bem com ele antes do jogo. E quando o jogo acabou – houve consenso por parte do Vitória e do Benfica ao pedir ao árbitro para acabar – fui a correr para o hospital, para saber como é que ele estava. Nós não sabíamos se tinha morrido ou não."
Fernando Eurico
Jornalista da Antena 1
"O meu pai também morreu assim, tal como o Fehér, à minha frente. A morte do jogador foi delicada porque me vez reviver o drama pessoal. Estava na tribuna de imprensa, a narrar o jogo, e percebi logo pelo gestos veementes dos jogadores o que tinha acontecido. O Miki Fehér foi suplente e ainda me recordo de o ver entrar, a sorrir, tranquilo – ele aparentava sempre tranquilidade. Quanto à queda, vi-a pelo canto do olho esquerdo, porque estava a seguir a trajetória da bola, mas apercebi-me que alguém tinha caído. Era o Miki Fehér. Profissionalmente, foi-me difícil gerir o que estava a acontecer, o que estava a ver. A situação era grave. E o jornalista sente dificuldades para a descrever. Quase que me tentava convencer de que a situação não era tão grave quanto realmente foi. O drama maior é o de não saber, à distância, o que realmente se estava a passar. Nem eu, nem o comentador ao meu lado, nem o repórter de pista. Ninguém sabia. Eu olhava para eles, o público para nós, e ninguém sabia. Primeiro, tentei transmitir uma mensagem de esperança. Depois, quando se soube da morte do Fehér, aí tive que dar a notícia como ela é."
Frederico Mendes Oliveira
Jornalista da TVI
"Eu tinha-me iniciado na profissão há pouco tempo. Aquilo foi para mim uma espécie de prova de fogo. Infelizmente teve que ser uma prova de fogo. Lembro-me de estar na bancada de imprensa. O jogo estava na parte final e o Benfica estava a vencer por 1-0. Quando vi o Fehér cair, pensei que era ‘teatro’ – algo que é habitual em alturas como aquela. Ao fim de alguns segundos, e ao presenciar o pânico no rosto dos jogadores – quer do Vitória, quer do Benfica –, a gesticular para o banco, desesperados, aí percebi que seria grave. Em Guimarães, os adeptos são fervorosos. E o estádio estava completamente cheio. O que mais me marcou foi o silêncio a que se assistiu depois. Lá de cima, da bancada de imprensa, ouvia-se perfeitamente o que se dizia no relvado: o choro dos jogadores, os médicos a dizerem para fazer isto, aquilo, para se dar um choque. Ouvia-se como se se estivesse a um metro."
Júlio Fernandes
Bombeiros Voluntários de Guimarães
"Nós estávamos, como sempre, de serviço, entre os dois bancos de suplentes. De repente, olhei e vi os jogadores à volta do Fehér, aos gritos, de mãos na cabeça. Corremos para lá e ele estava estendido no chão, de lado e sem reação. Os médicos estavam a tentar fazer a reanimação logo ali. O que fiz primeiro foi afastar os jogadores que estavam à volta dele. Era preciso espaço para fazer as manobras de reanimação. Naquele momento, como bombeiro, não podia fazer muito mais. O médico estava a tomar conta do caso e não podia fazer mais. Para além dos médicos e dos massagistas dos dois clubes, também vieram para o relvado médicos que estavam nas bancadas. Vinham ajudar."
Ricardo Gonçalves
Adepto do Benfica
"Não estava a olhar para o Fehér. Mas rapidamente, depois de ele cair, vi os jogadores a correr para lá. Os jogadores do Benfica e do Vitória. E, mesmo da bancada, percebi pelo gestos deles que pediam para os médicos entrarem depressa, que se passava algo grave. Mas estava longe de imaginar que seria um problema cardíaco. A primeira coisa que pensei foi que o Fehér – que tinha disputado a bola uns minutos antes –, tinha caído mal e sofrido uma lesão grave. Depois, recordo-me do silêncio no estádio. No estádio todo. Na bancada, ficámos a olhar uns para os outros, sem perceber o que se passava. Os jogadores estavam abraçados, a chorar, de mãos na cabeça. Foi aí que começámos a cantar o nome do Fehér. A ambulância entrou, levou-o, e os adeptos do Vitória cantaram connosco, enquanto aplaudíamos a saída do jogador do estádio."