Quando a psicóloga Rute Agulhas, coordenadora da nova equipa constituída pela Igreja Católica em Portugal para acompanhar as vítimas de abusos sexuais, terminou a apresentação do grupo de trabalho, o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, o bispo D. José Ornelas, saiu da sala do Hotel Mundial, no centro de Lisboa, onde a apresentação decorria. A saída tinha sido previamente anunciada pelo bispo: a ideia era deixar o protagonismo a Rute Agulhas e à sua equipa, mostrar por gestos a independência do grupo de trabalho e evitar que as muitas perguntas dos jornalistas se desviassem do foco da atenção do dia — a nova comissão — para se concentrarem no bispo, recentemente reeleito para mais um mandato de três anos à frente da Conferência Episcopal.
É um gesto especialmente simbólico quando se tem em conta as questões levantadas, nos últimos meses, sobre se a Igreja Católica iria efetivamente dar seguimento a uma das principais recomendações deixadas no relatório final da comissão independente que ao longo do ano de 2022 estudou a realidade dos abusos sexuais de menores no contexto eclesiástico, e que concluiu que desde 1950 até à atualidade terão existido pelo menos 4.815 vítimas de abuso no contexto da Igreja em Portugal: a criação de uma nova comissão que pudesse dar continuidade ao trabalho realizado pela equipa coordenada pelo psiquiatra Pedro Strecht, recebendo denúncias e acompanhando as vítimas — não só as de eventuais casos no futuro, mas também aquelas que, tendo sido vítimas no passado, só agora se sintam preparadas para contar a sua história.
Desde a publicação do relatório final, em fevereiro deste ano, só a conta-gotas se foi sabendo quais os planos da Igreja Católica para cumprir as recomendações da comissão independente: ainda em fevereiro, o Observador noticiou que a Igreja estava a preparar-se para criar uma bolsa de psicólogos para ajudar as vítimas de abusos, uma ideia que viria a ser alvo de críticas da parte do psiquiatra Daniel Sampaio, membro da antiga comissão independente; em março, a Conferência Episcopal anunciou que iria criar um “grupo específico” para “acolher” as vítimas, e que seria articulado com a equipa de coordenação nacional das comissões diocesanas de proteção de menores, o que gerou dúvidas sobre a sua real independência; mais recentemente, tal como o Observador avançou inicialmente, a Igreja Católica anunciou a intenção de escolher a psicóloga Rute Agulhas para liderar a nova equipa, que já não seria classificada como “independente”, mas como “autónoma”, por ter de estar articulada com as estruturas da Igreja para ser verdadeiramente eficaz.
Esta quarta-feira, na apresentação do plano de ação da nova equipa, batizada com o nome “Grupo VITA: Grupo de Acompanhamento das situações de abuso sexual de crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja Católica em Portugal”, D. José Ornelas e Rute Agulhas procuraram clarificar a questão: a nova equipa é autónoma, isenta e independente na sua ação, mas articula-se com as estruturas da Igreja Católica para poder ter capacidade de ação local (nas paróquias e dioceses) e para poder assegurar o encaminhamento dos casos para as instâncias mais adequadas.
Segundo explicou Rute Agulhas aos jornalistas, entre as principais missões da nova equipa encontra-se a receção de denúncias e relatos de casos de abusos, o encaminhamento das vítimas que assim o desejem e precisem para apoios especializados, a criação de uma bolsa nacional de profissionais em colaboração com a Ordem dos Psicólogos e a Ordem dos Médicos e a capacitação das equipas diocesanas para o processo de acompanhamento das vítimas, mas também um trabalho de proximidade com os agressores, acompanhando-os, encaminhando-os para apoio especializado que permita impedir reincidências, e ainda um forte trabalho na área da prevenção, criando documentos de apoio, um programa de prevenção e capacitar as comissões diocesanas para todo o processo de prevenção.
Na prática, sintetizou Rute Agulhas, a ideia é que esta comissão possa deixar de ser necessária num horizonte temporal de dois a três anos: até lá, as suas competências técnicas e humanas, bem como as suas funções práticas, deverão gradualmente ser assimiladas pelas comissões diocesanas, para quem todo este trabalho passará de modo permanente para o futuro. Também até lá, assumiu Rute Agulhas, é necessário garantir que é criado, em torno das comissões diocesanas, um clima de confiança que permita a futuras vítimas sentirem-se à vontade para se dirigirem a uma estrutura da Igreja Católica para denunciar um crime que sofreram dentro da instituição.
Novo grupo é rosto de uma “nova fase” para a Igreja
Repetindo muito do que tinha dito na semana passada em Fátima, na conferência de imprensa em que anunciou formalmente a criação do Grupo VITA, o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. José Ornelas, fez uma breve intervenção antes de passar a palavra a Rute Agulhas para reiterar que a Igreja Católica em Portugal está agora numa nova fase de um caminho de combate aos abusos sexuais de menores no contexto eclesiástico.
“Esta comissão surge na sequência do que já foi antes realizado, a começar sobretudo pela constituição da comissão independente, que surge, também essa, no caminho que a Igreja está a fazer em todo o mundo”, sustentou D. José Ornelas, referindo-se à comissão liderada por Pedro Strecht, criada por decisão da Conferência Episcopal no final de 2021 e que esteve em funções até fevereiro deste ano. “A primeira questão que se punha era conhecer a dimensão, as características, dos abusos na Igreja em Portugal“, continuou, sublinhando que esse trabalho, realizado pela comissão de Strecht, está “publicado” e as suas conclusões “causaram muito impacto” na Igreja e na sociedade.
D. José Ornelas sublinhou, por outro lado, a “autonomia desta comissão“, que terá “as suas próprias competências definidas”, mas que “não é como a comissão independente”. O Grupo VITA, disse o bispo de Leiria-Fátima, “é um grupo virado para ter uma vertente operativa clara dentro da Igreja”. Por um lado, frisou D. José Ornelas, o grupo “precisa de ter uma face de acolhimento bem autónoma e definida perante as vítimas e perante a sociedade”; por outro lado, “tem de articular-se para dentro da Igreja, de forma eficiente”.
Lembrando que, tal como sucedeu com a comissão independente de Pedro Strecht, este grupo de trabalho de Rute Agulhas “é da iniciativa da CEP” e tem “todo o apoio” dos bispos portugueses, D. José Ornelas realçou a “importância especial” da nova comissão para o “processo” iniciado pela Conferência Episcopal “tratar dos abusos de menores” — e agradeceu também aos jornalistas pelo papel “determinante em fases anteriores deste caminho” da Igreja em Portugal.
Grupo VITA é “isento e autónomo”, garante Rute Agulhas
Rute Agulhas apresentou o Grupo VITA — nome emprestado do latim para “vida” — munida de uma extensa apresentação em PowerPoint e ladeada pelos restantes elementos da nova comissão: a psicóloga Alexandra Anciães (especializada em avaliação e intervenção com vítimas adultas), a psicóloga Joana Alexandre (investigadora na área da prevenção primária dos abusos sexuais), o assistente social Jorge Neo Costa (que intervém com crianças e jovens e perigo), a psiquiatra Márcia Mota (especialista em sexologia clínica) e o psicólogo Ricardo Barroso (especialista em intervenção com agressores sexuais).
Na plateia estavam também o advogado David Silva Ramalho, o padre João Vergamota e a especialista em análise de dados Helena Carvalho — que vão constituir o grupo consultor da comissão, para questões relacionadas com o direito penal, o direito canónico e a estatística.
Sem esconder a “surpresa” por ter sido convidada pelos bispos para coordenar a nova equipa, a psicóloga Rute Agulhas, que é professora no ISCTE e no ISPA e conta com uma reputada carreira na área das crianças e jovens e intervenção familiar, descreveu o Grupo VITA como “um grupo isento e autónomo que procura uma intervenção sistémica, que visa acolher, escutar, acompanhar e prevenir as situações de abuso sexual de crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja Católica em Portugal”.
Apesar da isenção e autonomia prometidas, Rute Agulhas explicou que o objetivo do grupo é trabalhar “em rede” com todas as instituições que compõem o universo da Igreja Católica em Portugal, sobretudo com as dioceses (por vias das comissões diocesanas de proteção de menores) e com os institutos religiosos, com o objetivo de capacitar as equipas já existentes nestas estruturas para um trabalho de fundo para o futuro — já que esta equipa, embora não tenha uma data concreta para terminar as suas funções (os dois a três anos são meramente indicativos), é “um grupo temporário cujas ações serão gradualmente assumidas” pela Igreja.
“Não pretendemos esvaziar as comissões diocesanas, depois são as comissões que ficam”, clarificou Rute Agulhas, procurando sublinhar a credibilidade destas comissões, que são compostas por “profissionais igualmente competentes”. Aliás, tanto Rute Agulhas como Pedro Strecht pertenciam à comissão diocesana de proteção de menores do Patriarcado de Lisboa, antes de serem chamados a assumir a liderança das comissões independentes, como lembrou José Souto Moura, o antigo procurador-geral da República que hoje chefia a equipa nacional de coordenação destas comissões diocesanas, sentado na primeira fila da apresentação da equipa de Agulhas.
A psicóloga assumiu que pode haver menor à-vontade da parte das vítimas para abordarem uma comissão que está diretamente ligada a uma diocese (algo que se verificou, por exemplo, no facto de as comissões diocesanas terem recebido muito menos denúncias do que a comissão independente), mas destacou que a ideia do trabalho deste novo grupo é ajudar a que “as pessoas passem a olhar para essas comissões com a mesma confiança que já tiveram na comissão independente“.
Canais para denúncias abertos a partir de 22 de maio
À semelhança do que sucedeu com a comissão independente liderada por Pedro Strecht, um dos principais trabalhos do Grupo VITA será o acolhimento de relatos de situações de abuso sexual no contexto da Igreja Católica. Para isso, também serão ativados canais de comunicação específicos para o assunto: o número de telemóvel 915 090 000 e o email geral@grupovita.pt são as duas formas de contacto já divulgadas, embora Rute Agulhas tenha especificado que estes contactos passarão a estar disponíveis a partir de 22 de maio. Inicialmente, os telefonemas serão atendidos diretamente, e de forma rotativa, pelos seis elementos do grupo — mas Rute Agulhas não deixou de parte a possibilidade de vir a ser contratada mais uma pessoa, também da área da saúde mental, para colaborar nos atendimentos, consoante o volume de chamadas.
Uma novidade em relação à comissão independente anterior é que o Grupo VITA não estará apenas à espera de contacto por parte das vítimas, uma vez que a ideia é uma abordagem global a todo o problema dos abusos no contexto da Igreja. Por isso, os contactos do Grupo VITA estão abertos a vítimas, a outras pessoas que tenham relatos a fazer, a jovens e adultos em risco, a elementos da Igreja que tenham sido suspensos devido a suspeitas de abuso e até mesmo a agressores sexuais. Todos serão atendidos e a todos será dado o encaminhamento adequado no que toca a respostas de saúde mental.
Isto porque, especificou Rute Agulhas, o trabalho do Grupo VITA vai orientar-se por três eixos de ação fundamentais: a proteção, a prevenção da reincidência e a prevenção de situações abusivas.
O primeiro eixo passa por “acolher suspeitas e relatos de abuso sexual de crianças ou adultos, atuais ou antigos, cometidos por membros da Igreja Católica, sacerdotes ou leigos e encaminhar a respetiva denúncia para as entidades de investigação competentes”. Aqui, garantiu Rute Agulhas, os casos que chegarem serão enviados para o Ministério Público e para a diocese ou instituto religioso em questão — para que seja dado início aos processos legais, quer no âmbito civil, quer no âmbito canónico —, ao mesmo tempo que começa o trabalho da equipa no acompanhamento da vítima, que passará por ajudar a pessoa a encontrar o apoio certo, seja no que toca à saúde mental, seja no que toca a questões jurídicas, ou até no que diz respeito a eventuais apoios sociais de que a pessoa possa necessitar.
Questionada pelos jornalistas, Rute Agulhas rejeitou que a comissão venha a decidir a atribuição ou não de indemnizações compensatórias às vítimas: a esta comissão caberá prestar todo o apoio à pessoa, para que nenhuma vítima fique sem ajuda psicológica, médica, jurídica ou social por falta de recursos; se surgirem vítimas a exigir indemnizações, a comissão encaminhará para a diocese respetiva, explicou Rute Agulhas.
No que toca ao segundo eixo, o Grupo VITA diz estar apostado em “acolher e acompanhar elementos da Igreja que estejam suspensos do exercício do ministério, ou outros referenciados pelas dioceses, e que desejem esse acompanhamento”. A equipa de Rute Agulhas propõe-se “acolher e acompanhar adultos que tenham cometido crimes sexuais e também jovens que se envolveram em comportamentos sexuais abusivos“. Isto porque, explicou a psicóloga, o acompanhamento dos abusadores é uma das formas mais eficazes de proteger futuras vítimas. Também nestes casos, as situações que chegarem ao conhecimento da comissão serão encaminhadas para as autoridades civis e canónicas.
A equipa diz também que pretende “acolher e acompanhar adultos que tenham cometido crimes sexuais e também jovens que se envolveram em comportamentos sexuais abusivos”.
No terceiro eixo de ação, situa-se a ação mais académica do Grupo VITA: a equipa de Rute Agulhas pretende “capacitar pessoas do universo da Igreja que estejam empenhadas na prevenção para dinamizarem ações de sensibilização e formação para os diferentes membros (clérigos e leigos) da Igreja”, mas também elaborar “documentos e materiais de apoio”, incluindo um “manual de prevenção” que possa ser globalmente difundido em todas as instituições da Igreja. Além disso, a equipa pretende desenvolver um “programa de prevenção primária dos abusos sexuais” específico para o contexto da Igreja Católica e espera poder implementá-lo em algumas realidades concretas com a colaboração de eventuais estudantes de mestrado ou doutoramento, para que possa sair do trabalho da comissão conhecimento concreto sobre a aplicabilidade destas ideias.
Bolsa não é organizada pela Igreja, mas por Ordens dos Médicos e Enfermeiros
Uma das ideias que geraram mais debate prende-se com a criação de uma bolsa nacional de psicólogos e psiquiatras com formação específica na intervenção com vítimas de violência sexual e com agressores sexuais, para que possa haver uma referenciação mais rápida dos profissionais que podem apoiar as vítimas.
Numa primeira fase, ainda em fevereiro, a ideia foi explicada ao Observador pela advogada Paula Margarido, secretária da equipa de coordenação nacional das comissões diocesanas, liderada pelo antigo procurador-geral da República José Souto Moura, e passava pela criação de uma bolsa de profissionais, por parte da Igreja Católica, para quem as vítimas pudessem ser encaminhadas caso necessitassem de apoio psicológico e psiquiátrico. A ideia foi duramente criticada por Daniel Sampaio, psiquiatra que pertenceu à comissão independente de Pedro Strecht. À CNN, Daniel Sampaio disse que “a história demonstra que quando os psicólogos e os psiquiatras pertencem às instituições, as pessoas têm muitas dificuldades em falar dos casos dessas instituições”.
Questionada sobre quais os moldes concretos em que esta bolsa vai ser preparada, Rute Agulhas enfatizou que não será a Igreja Católica a organizar a bolsa, mas sim as Ordens dos Médicos e dos Psicólogos — e que, mesmo assim, as pessoas que precisarem de apoio em saúde mental “jamais ficarão limitadas aos profissionais que integrarem essa bolsa”, uma vez que têm “autonomia” e devem ser “ativas no seu processo”.
A ideia, explicou Rute Agulhas, é “pedir a colaboração às ordens profissionais“, para que sejam definidos critérios mínimos — por exemplo, a formação numa determinada especialidade — que permitam a integração de profissionais nessa bolsa. Depois, serão as próprias Ordens a fazer saber aos profissionais que existe a possibilidade de integrar uma bolsa para apoiar vítimas de abusos sexuais e agressores sexuais e a perguntar quem deseja integrá-la. A ideia é que a bolsa seja representativa das “várias áreas de Portugal e das ilhas”, embora Rute Agulhas reconheça que poderá ser difícil cobrir todo o território.
Além da mera organização da bolsa, a ideia do Grupo VITA é depois oferecer formação específica em intervenção com vítimas e agressores a esses profissionais, bem como oportunidades de supervisão profissional no decorrer da sua atividade com estas vítimas — uma vez que dentro da bolsa haverá, provavelmente, “assimetrias de conhecimentos”.
Rute Agulhas frisou reiteradamente que a bolsa “não parte da Igreja, mas das respetivas ordens profissionais” — e que o objetivo é “ter alguma resposta de qualidade, com supervisão“, a oferecer às vítimas. Quanto à pergunta vital — quem vai pagar tudo isto? — Rute Agulhas garante: é a Igreja quem vai assegurar todas as despesas no apoio psicológico e médico das pessoas que abordarem o Grupo VITA, seja esse apoio prestado pelo SNS, por um profissional da bolsa ou por outro profissional qualquer. Aliás, lembrou a psicóloga, já é o que está a acontecer com cerca de 30 casos, como anunciou D. José Ornelas na semana passada.
Rute Agulhas revelou também que nos últimos dias os membros do Grupo VITA foram contactados pelo psiquiatra Daniel Sampaio, que lhes falou da possibilidade de estabelecer um protocolo com o Serviço Nacional de Saúde para que seja dada prioridade às vítimas de abusos sexuais na Igreja Católica. Mas a psicóloga considera que “este caminho não é uma verdadeira solução”, uma vez que “todas as pessoas têm direito a ajuda” e “não há vítimas só na Igreja”.
Apesar da tensão com a comissão independente no que toca à questão do apoio psicológico às vítimas, Rute Agulhas garantiu que os elementos do Grupo VITA já leram o relatório do grupo de Pedro Strecht, já refletiram sobre ele e vão tentar agendar uma reunião com os elementos da comissão independente, para poderem trabalhar a partir dos resultados já obtidos pela equipa anterior. A psicóloga também confirmou que o Grupo VITA pretende realizar balanços públicos a cada seis meses, para divulgar dados estatísticos e dar conta do avanço dos seus trabalhos.
Até dezembro deste ano, a equipa de Rute Agulhas espera já ter criado e consolidado um “sistema integrado de acolhimento e encaminhamento das vítimas e agressores, em articulação com as estruturas existentes“, feito a seleção e formação inicial dos profissionais que vão integrar a bolsa nacional, elaborado o site e os documentos de apoio, e começado a desenvolver ações de formação para a capacitação das comissões diocesanas e institutos religiosos.
Equipa aposta na intervenção com agressores
Um dos aspetos fundamentais do trabalho da equipa de Rute Agulhas será o trabalho de acompanhamento dos agressores sexuais, além das vítimas — um trabalho supervisionado pelo psicólogo Ricardo Barroso, especialista na intervenção com agressores sexuais.
Reconhecendo que a prioridade são as vítimas, Ricardo Barroso esclareceu que a prevenção dos abusos passa também pela “reabilitação dos agressores“, que não significa nenhum tipo de desculpabilização dos agressores — nem os isenta de eventuais processos judiciais em curso. O objetivo, salientou, é evitar a reincidência dos abusos e acompanhar clinicamente as pessoas que abusaram sexualmente de alguém, para que possam mudar os seus comportamentos, aceitar as responsabilidades, alterar as distorções e, nos casos em que isso seja possível, regressar até às tarefas que tinham à época dos abusos.
O especialista salientou que, grosso modo, 10% dos agressores sexuais têm um risco elevado de reincidir, 50% têm um risco médio-alto e 40% um risco médio-baixo. Segundo Ricardo Barroso, as intervenções que têm vindo a ser testadas em vários países permitem observar uma alta eficácia de reabilitação nos agressores de risco médio-alto e médio-baixo, ou seja, em 90% dos casos.
“Poderá sempre haver indivíduos em que a intervenção psicoterapêutica não é eficaz e poderá ser necessário recorrer a outro tipo de medidas”, sublinhou.