Discurso de Luís Montenegro

no encerramento do 40º Congresso do PSD

São muitos e a todos endereço uma palavra de respeito e agradecimento pela honra que nos dão com a vossa presença. Às representantes de sua excelência o senhor Presidente da República, por intermédio de quem envio uma mensagem de disponibilidade total da nova direção do PSD para prosseguir com sentido de lealdade e colaboração institucional, na relação de proximidade e cooperação que a democracia e os portugueses exigem e merecem.”

Ainda na fase dos cumprimentos, Luís Montenegro não se limitou a sinalizar a presença das representantes do Presidente da República e fez questão de dizer que estava disponível para ter uma relação de “lealdade e colaboração institucional” com Marcelo Rebelo de Sousa. As relações entre o PSD de Rui Rio e Belém já não eram as melhores e pioraram quando o chefe de Estado recebeu Paulo Rangel em Belém perto da campanha das eleições diretas de novembro de 2021. Mesmo que de forma indireta, ter um aliado em Belém (que nunca vai assumir sê-lo) é sempre uma vantagem para Montenegro. Marcelo, a partir do Brasil, felicitou-o minutos depois.

Agradeço ao senhor presidente da câmara municipal do Porto, Rui Moreira, que saúdo com amizade, e em quem agradeço o excecional acolhimento que esta mui nobre, sempre leal e invicta cidade do Porto ofereceu a este marcante 40º Congresso Nacional do PSD.”

Ora aí está mais uma diferença para Rui Rio. Com o anterior líder, mesmo que o Congresso fosse no Porto, como foi, jamais Rui Moreira estaria presente. Durante a campanha das internas o presidente da câmara do Porto recebeu Luís Montenegro duas vezes e, nos bastidores do partido, é mesmo apontado como uma das hipóteses para cabeça de lista às eleições europeias pelo PSD (como independente). No Porto, com base nesta boa relação entre ambos, Rui Moreira já beneficiou desta aliança com Montenegro, com figuras próximas do novo presidente do PSD a viabilizarem a decisão do autarca de sair da Associação Nacional de Municípios Portugueses. É um facto que se dão bem.

Os representantes dos partidos políticos PS, Chega, IL, PCP, PAN, Livre, CDS, PEV; MPT, PPM e Aliança, que cumprimento com fair play democrático. Em especial, dirijo uma palavra de estima e estímulo à delegação do CDS e ao seu Presidente Nuno Melo. Partilhamos vários momentos de responsabilidade na governação nacional e conduzimos em conjunto um número significativo de autarquias locais. Não é a conjuntura atual do CDS que nos inibe de fazer esta referência especial. Pelo contrário, faço-o com o desejo sincero que a vossa nova liderança preencha o futuro com conquistas e sucessos.”

Luís Montenegro enumerou todos os partidos por igual, do PS ao PAN, numa tentativa de não ter leituras especiais sobre partidos como o Chega. Mas fez questão de destacar um: o CDS. Fê-lo por duas razões: para mostrar que o CDS é o parceiro preferencial do PSD (em comparação com IL ou Chega) e para lembrar os tempos em que o PSD governava. O próprio Montenegro era líder parlamentar durante a maioria PSD-CDS e teve de trabalhar em estreita ligação com a bancada do CDS liderada por Nuno Magalhães. É ao lado do CDS que Luís Montenegro se sente bem e são os centristas que lhe lembram os melhores tempos: os do PSD no poder.

Obrigado também aos profissionais da comunicação social que cumpriram o serviço público de levar até muitos portugueses aquilo que aqui se passou nos últimos dias.”

Rui Rio teve sempre uma relação conflituosa com a comunicação social, que chegou a comparar a uma fábrica de sapatos. Mas Luís Montenegro quis marcar a diferença. Embora não estivesse no discurso escrito, o novo líder do PSD fez questão de fazer uma referência elogiosa ao trabalho dos jornalistas — uma prática que é habitual entre vários líderes políticos em Congressos, mas que Rio dispensava.

Hoje, governar não pode continuar a ser um festival incessante de anúncios de medidas avulsas e precipitadas, que foram pensadas apenas para o telejornal desse mesmo dia mas que são destituídas de efetividade e nada têm a ver com a vida das pessoas até porque já se desvaneceram no dia seguinte. Hoje, governar, mais do que nunca, é ter a coragem de transformar e reformar.”

Luís Montenegro quer mais uma vez convencer os portugueses — como Passos Coelho tentou fazer em 2015 — que o PS só governa para o imediato e a curto-prazo por oposição a um PSD com uma ímpeto reformista. Na última vez que o PSD esteve no Governo, os dois partidos fizeram várias reformas, algumas forçadas pelo acordo com a troika, algo que para a nova direção do PSD é motivo de orgulho. A esquerda considera essas reformas retrocessos.

No PSD não temos problemas existenciais, não temos cismas ideológicos, não nos interessam discussões estéreis de esquerdas e direitas, de linhas verdes ou vermelhas”

Se Rui Rio tinha uma obsessão por provar que o PSD é um partido ao centro e desmultiplicava essa ideia em slogans e cartazes a dizê-lo, Luís Montenegro diz que não está disponível para fazer essa discussão. E, se não quer dizer se o PSD está ao centro, é porque está confortável com a forma como se definia o partido: centro-direita. Aliás, durante  o período de governação Passos Coelho, Luís Montenegro era um dos líderes parlamentares da maioria de direita e não se importava com a definição.

Não somos nem comunistas nem socialistas, porque a história nacional e internacional já provou, mesmo recentemente, que Estado a mais traz sempre ilusões efémeras e pobreza estrutural. A maior ironia das ideologias políticas é a confirmação absoluta de que os projetos comunistas e socialistas, que almejam o igualitarismo e o progressismo, desembocam sempre em crises sociais e económicas e muitas vezes em regimes autoritaristas e oligárquicos. Não nos confundam. Nós não somos, nem seremos, socialistas moderados.

Luís Montenegro quer marcar uma diferença mais clara para o PS para se afastar do posicionamento do anterior líder, que os seus apoiantes chegaram a acusar de querer transformar o partido num PS-B. Luís Montenegro chega mesmo a dizer que o PSD não é, nem será, um partido de socialistas moderados. O novo líder do PSD já demonstrou que não se importa de polarizar para mostrar que o PSD é uma alternativa bem diferente do PS. Assume também que quer o PSD como a grande casa do espaço não-socialista.

E é por sermos moderados que também não somos nem populistas nem ultraliberais. E muito menos nos associaremos algum dia a qualquer política xenófoba ou racista. Acreditem, se algum dia for confrontado com a violação dos nossos princípios e valores para formar ou suportar um Governo, o partido pode decidir o que quiser mas não serei eu o líder de um Governo desses.”

Durante a campanha eleitoral, Luís Montenegro foi criticado por não estabelecer um cordão sanitário à volta do Chega. Durante o Congresso, no púlpito, Jorge Moreira da Silva voltou a pressionar ao dizer que não tinha uma “obsessão com o Chega”, mas com a “dependência de extremismos”. Montenegro deu a garantia que não entra num Governo que vá contra os princípios do PSD nem com políticas xenófobas e racistas, mas isso não muda o que sempre disse sobre o assunto. Estas declarações não invalidam que forme um Governo com o apoio do Chega nos moldes em que o PSD o fez nos Açores (com uma cláusula em que são salvaguardados os direitos humanos). Mais um detalhe: quando atira aos “ultraliberais”, Montenegro está, naturalmente, a atacar a Iniciativa Liberal.

Quando é que nós nos associámos a partidos anti-NATO, ou anti-UE, ou anti-euro, ou anti IPSS, ou anti misericórdias, ou anti setor privado da saúde, ou mais flagrante ainda, partidos pró-russos no contexto da guerra da Ucrânia? Nós nunca fizemos isso nem vamos fazer. Quem fez tudo isso foi o PS português. Quem fez tudo isso tem rosto e tem nome: António Costa, Pedro Nuno Santos, Fernando Medina, Mariana Vieira da Silva, Ana Catarina Mendes, e por aí fora.”

Luís Montenegro tentou inverter as críticas e demonstrar que o PS é que se une a extremistas, rótulo que cola a Bloco de Esquerda e ao PCP, que ainda classifica de partido pró-russo “no contexto da guerra da Ucrânia”. Mas o mais curioso nas críticas é a forma como Luís Montenegro marca o duelo com esse PS para 2026 — como fez questão de colocar no ecrã gigante. “Montenegro 2026”, lia-se. E, nessa batalha, Luís Montenegro sabe que é mais provável enfrentar um dos sucessores de António Costa do que o atual primeiro-ministro. E por isso faz questão de nomeá-los a todos: “Pedro Nuno Santos, Fernando Medina, Mariana Vieira da Silva, Ana Catarina Mendes”.

Portugal precisa e chama pelo PSD porque, apesar de estar em funções há apenas 3 meses, este Governo tresanda a velho. Apresenta-se gasto, desorganizado, desnorteado. António Costa é primeiro-ministro há sete anos. que um Governo viveu a mais trágica e vergonhosa incapacidade de estar ao lado de quem precisa quando não foi capaz de salvaguardar mais de uma centena de vidas humanas nos incêndios florestais de 2017. Porque não esqueço e não quero que nunca mais alguma coisa parecida se possa viver em Portugal, estarei amanhã de manhã em Pedrógão, para falar com os autarcas, os bombeiros e as vítimas dessa inconcebível tragédia.”

Luís Montenegro alinha na tese defendida pelo ex-líder do PSD, Luís Marques Mendes, de que o Governo — apesar de ter tomado posse há três meses — “tresanda a velho”. O novo líder do PSD quer colar ao Executivo de António Costa uma imagem de desgaste e, por isso, revisita as falhas dos últimos sete anos, como é exemplo as mortes nos incêndios de Pedrógão Grande. De forma simbólica, é mesmo a essa zona que irá nas primeiras 24 horas de mandato, já esta segunda-feira.

Nós no PSD, sabemos bem que as pessoas esperam de nós que sejamos uma oposição firme e exigente, mas também esperam que não limitemos a dizer o que está mal. O PSD tem a responsabilidade de apontar caminhos alternativos, de ter iniciativa política.”

Luís Montenegro não diz de forma aberta, como Rui Rio, que quer negociar reformas com o PS, mas admite nas entrelinhas que se vai sentar à mesa com o Governo. Promete que vai ser assertivo no estilo de oposição (“firme e exigente”), mas também que não se limitará a dizer mal. Mais do que grandes negociações, Montenegro propõe, aliás, que apresentará propostas alternativas — que naturalmente o Governo depois poderá ou não aproveitar.

Aqui chegados, há sete temas que, pela sua especial pertinência e alcance, gostaria de transmitir hoje ao país como orientadoras da nossa ação.”

O novo líder do PSD quis lançar logo um rol de prioridades para mostrar que tinha um caminho. E fê-lo apesar de ainda faltar quatro anos para as eleições. Na verdade, as propostas que Luís Montenegro apresenta têm um problema de base: precisam do acordo do PS para serem aplicadas, já que o partido tem maioria absoluta.

Quanto ao eventual referendo sobre a regionalização que o Governo prometeu para 2024, considero que também aqui temos de dizer a verdade saem tibiezas: não é adequado. (…) Se o Governo compreender o bom senso desta posição, tanto melhor. Mas se o Governo pensar de modo diferente, tem todo o direito de avançar. Só que, nesse caso, avançará sozinho para a iniciativa de convocar um referendo em 2024. Tem uma maioria absoluta que lhe permite fazê-lo. O que não terá é o aval ou a cobertura do PSD.”

Luís Montenegro marcou posição relativamente à regionalização — um dos sete temas que escolheu — tentando capitalizar todo o espaço contra esta alteração administrativa. Se Rui Rio estava disponível a avançar com o processo (mediante condições), o novo líder social-democrata está já a condicionar o primeiro-ministro — que pretende ter um referendo em 2024 — ao dizer que o PSD não apoiará essa ideia. Diz mesmo que, se Costa quiser avançar, terá de assumir esse ónus sozinho.