Os autarcas das Caldas da Rainha, Óbidos e Rio Maior estão contra o parecer do estudo da Universidade Nova de Lisboa que sugere o concelho do Bombarral como a localização adequada para o novo Centro Hospitalar de Oeste. E querem que a nova infra-estrutura seja construída num terreno localizado entre os concelhos de Óbidos e Caldas da Rainha.

Em declarações ao Observador, Vítor Marques (independente), Filipe Daniel (PSD) e Filipe Santana Dias (PSD) levantam críticas aos critérios utilizados na análise adjudicada pela Comunidade Intermunicipal do Oeste, sentem-se vítimas do centralismo a favor de Lisboa e temem um favorecimento partidário na tomada da decisão final.

“Não nos cabe na cabeça”, desabafou Vítor Marques, o autarca das Caldas da Rainha, que lidera a resistência dos três municípios às conclusões do estudo, em entrevista ao Observador: “No Oeste Norte vai faltar uma unidade hospitalar”, alertou.

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O documento “é pouco para se concluir de uma forma credível e séria a localização do hospital” — e é isso que o presidente da Câmara, ao lado dos homólogos de Óbidos e Rio Maior, vai transmitir numa conferência de imprensa na segunda-feira. Depois de já ter exposto a situação na Assembleia da República, promete também comunicá-la ao Governo, aos responsáveis pelo estudo e à Direção Executiva do SNS.

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A criação de um novo Centro Hospitalar de Oeste foi anunciada pelo ex-ministro da Saúde António Correia de Campos (PS) em 2008. Mas o estudo sobre o “Futuro da Política Pública da Saúde do Oeste”, que sondava o terreno mais apropriado para o construir, só foi encomendado pela Comunidade Intermunicipal do Oeste em 2021; e entregue ao Ministério da Saúde em novembro de 2022.

Manuel Pizarro, novo ministro da Saúde, já prometeu que a localização do novo Centro Hospitalar do Oeste vai ser anunciada até ao último dia do primeiro trimestre deste ano, 15 anos depois de a criação do hospital ter sido anunciada.

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Mas a rede política por detrás desta tomada de decisão é uma das preocupações dos autarcas. É que Adalberto Campos Fernandes, ex-ministro da Saúde socialista, foi o principal consultor na constituição deste estudo.

E Ana Jorge, também ela ex-ministra da Saúde de um Governo do Partido Socialista — e de quem Manuel Pizarro foi secretário de Estado — vai coordenar o grupo de trabalho criado pelo atual Governo para decidir definitivamente a localização e o perfil assistencial do futuro hospital do Oeste.

O Observador tentou contactar Campos Fernandes e Ana Jorge, mas ainda não obteve qualquer reação. A Câmara Municipal do Bombarral, concelho sugerido no estudo, também é socialista. 

Questionado sobre se acredita num envolvimento partidário na tomada de decisão, o autarca das Caldas da Rainha responde: “Não quero acreditar, mas temo que sim”. Vítor Marques ressalva que não quer colocar em causa a credibilidade e confiança profissional dos envolvidos no estudo, nem quer acreditar que as motivações políticas ditem a localização de uma infraestrutura. Mas “de facto, temo que outro tipo de questões se levantem, nomeadamente as ideológicas e as partidárias”: “Se assim for, é lamentável”.

Filipe Daniel, de Óbidos, acredita que os socialistas envolvidos “podem ter isenção nas tarefas que desempenham nestas consultorias”, mas alerta que “a transparência envolta nestas situações fica de alguma forma ferida” — sobretudo numa altura em que o Governo está a braços com casos de incompatibilidade, apontou. “O cidadão comum pode questionar pelos exemplos que vamos lendo na comunicação social. Esta não é uma acusação à imparcialidade destas pessoas, mas preocupa-me a perceção”, assumiu em entrevista ao Observador.

Filipe Santana Dias, autarca de Rio Maior, não quer “equacionar que seja essa a motivação de deslocalizar este hospital”, disse ao Observador: “Acho que é um assunto sério demais para que a política partidária se possa embrenhar na sua escolha. Desejo que isso não seja realidade”.

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No estudo a que o Observador teve acesso, apresentado em novembro do ano passado, são avaliadas três localizações no Bombarral, uma no Cadaval, Alcobaça, Caldas da Rainha, Óbidos, Torres Vedras e Mafra com base principalmente em dois critérios: a distância e tempo de deslocação entre as potenciais localizações do hospital e os centros de cada secção regional. Critérios que todos os autarcas classificam com a mesma palavra: “redutores”. Defendem que o estudo não teve em conta a atratividade para os profissionais de saúde em termos de acessibilidade ou os planos para as reformas na Linha do Oeste, por exemplo.

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O concelho do Bombarral — mais especificamente, o projeto num espaço com 50 hectares na Quinta do Falcão junto à A8 e à linha ferroviária — acabou por ser apontado como o mais adequado para receber o novo hospital por reunir as melhores condições em três das ponderações entre o tempo e a distância ao centro de cada região. Mas os três autarcas discordam e acreditam que há uma alternativa melhor: a construção num terreno partilhado pelas Caldas da Rainha e por Óbidos.

Trata-se de um espaço com 60 hectares (25 deles em espaço público, 35 numa área privada) que fica entre a Linha do Oeste e a estrada nacional 114, está na fronteira entre os concelhos de Óbidos e Caldas da Rainha (nas freguesias de Gaeiras e Nossa Senhora do Pópulo) e nas proximidades da A8, do nó de acesso à A15 e da entrada para a A6.

O terreno está, em média, a 30,49 minutos e a 39,71 quilómetros do centros das outras regiões — apenas mais 1,39 minutos e quatro quilómetros que a opção recomendada no Bombarral. Mesmo assim, não consta entre os melhores classificados. À frente dele estão terrenos “divididos pela linha férrea ou autoestrada, linhas de água ou perto de aterros sanitários”, acusa Vítor Marques.

O espaço das Caldas e Óbidos foi eliminado porque, segundo o documento a que o Observador teve acesso, não tinha um bom equilíbrio entre a distância aos restantes concelhos e o tempo que um utente noutros municípios demoraria a alcançá-lo.

Os três presidentes de Câmara temem que se esteja perante mais um exemplo de centralismo, porque “mais uma vez tendemos a empurrar soluções para junto da Grande Lisboa”, acusou Filipe Santana Dias, de Rio Maior: “Parece-me que deixamos descalças as pessoas que efetivamente precisam por não ter outra alternativa. Se vamos retirar o centro hospitalar da zona do Oeste para o puxar para sul, aproximando-se de Lisboa, vamos ter mais uma alternativa a esses habitantes, mas vamos deixar esta orla sem um serviço de saúde próxima”.

E o argumento de que a construção do Centro Hospital do Oeste serviria os concelhos de Arruda dos Vinhos, Sobral de Monte Agraço, Torres Vedras ou Alenquer não convence os autarcas: muitos utentes dessas regiões já são acompanhadas no Hospital de Vila Franca de Xira e no Hospital de Loures. A zona norte da região Oeste, no entanto, fica orfã: “Não estamos a considerar o que se passa mais acima, onde é preciso desafogar o Hospital de Leiria”, considerou Filipe Daniel.

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No estudo não foi considerada nenhuma localização no concelho de Rio Maior, cujo hospital de referência é o de Santarém — apesar de, segundo o presidente da autarquia, grande parte dos serviços de saúde prestados nessa população já decorrerem no atual Centro Hospitalar do Oeste, que fica até mais perto do centro riomaiorense do que o hospital escalabitano. Se esses utentes tiverem de viajar para o Bombarral, em vez de se deslocarem às Caldas da Rainha, isso significaria “aumentar para o dobro a distância entre a sua residência e os cuidados de saúde” e “reduzir em muito a qualidade e a acessibilidade dos serviços”.

Por outro lado, entraram nas contas oito das onze freguesias de Mafra — embora este município, à semelhança de Rio Maior, também não pertença à Comunidade Intermunicipal do Oeste. “Talvez por questões de mais valia no algoritmo para indicar determinada localização”, questiona o obidense Filipe Daniel.

O autarca revelou que está preocupado com o impacto socioeconómico nas Caldas da Rainha se o novo Centro Hospitalar do Oeste for constituído no Bombarral: “Um território que teve sempre esta continuidade em termos de cuidados de saúde deixar de ter uma estrutura destas era matar de alguma forma o seu território. Para além de não estarmos a promover a coesão social e territorial”, considerou.