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José de Bouza Serrano recebeu o Observador em sua casa, onde a arte, a monarquia e a memória convivem numa decoração que conta as histórias de uma vida
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José de Bouza Serrano recebeu o Observador em sua casa, onde a arte, a monarquia e a memória convivem numa decoração que conta as histórias de uma vida

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

José de Bouza Serrano recebeu o Observador em sua casa, onde a arte, a monarquia e a memória convivem numa decoração que conta as histórias de uma vida

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Casamento real. Os convidados, a organização e o protocolo explicados por "um monárquico ao serviço da República"

O Presidente Marcelo está confirmado e membros da realeza e da aristocracia europeias estão de viagem marcada para Portugal. Bouza Serrano explica a organização de um casamento real e o seu protocolo.

Mais habituado a ir a batizados reais do que a casamentos, José de Bouza Serrano conta que a única boda da realeza em que esteve presente foi precisamente a dos duques de Bragança, a 13 de maio de 1995, em Lisboa. Na altura estava a trabalhar em Bruxelas, no cargo de assessor do representante permanente de Portugal junto da União Europeia, e veio de propósito, chegando no próprio dia, mesmo a tempo da cerimónia por causa de uma greve de controladores aéreos. Já reformado das suas funções de embaixador e chefe de protocolo do Estado, mantém-se ligado à monarquia e o segundo casamento do seu extenso currículo de eventos da realeza será precisamente o da filha dos duques de Bragança.

No próximo dia 7 de outubro Bouza Serrano será convidado do enlace entre a infanta Maria Francisca e Duarte de Sousa Araújo Martins, mas também um orgulhoso membro da equipa que está a organizar o evento. Semanas antes do grande dia recebeu o Observador na sua casa para falar sobre os preparativos da próxima boda real nacional e falar sobre o protocolo e organização a que estas ocasiões obrigam.

“Um monárquico com serviços à República”

Bouza Serrano mostra o seu convite para o casamento. Recebeu-o a 28 de julho. Num dos cantos consta uma das informações essenciais: o dress code. Para os homens “uniforme, fraque ou fato escuro” e, para as senhoras, vestido curto e chapéu. A cerimónia será na Real Basílica de Mafra, e está marcada para as 15h00, o mesmo horário do casamento dos duques de Bragança. “Foi a 13 de maio e o casamento teve de ser às três da tarde porque havia gente que voltava de Fátima”, explica o ex-embaixador. Registada esta semelhança, quais as diferenças entre o casamento dos pais e o da filha? “O casamento dos pais foram quatro dias de festa. Foi muito mais completo.” Houve uma exibição com cavalos da escola equestre em Queluz que, segundo Bouza Serrano, “os estrangeiros adoraram”, houve um cocktail nos claustros dos Jerónimos e também um jantar em Sintra.

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Como ficou a saber do casamento da infanta Maria Francisca com Duarte de Sousa Araújo Martins?
Fiquei a saber pelo Facebook, porque a Sra. Dona Isabel mandou-me uma fotografia dos noivos em Díli, em Timor, na altura em que o noivo pediu a mão da noiva e lhe deu o anel. Eu enviei [uma mensagem de] muitas felicidades. E que notícia tão bonita que nos enche de alegria. E é verdade, nós como monárquicos ficamos sempre tocados por estas coisas. Foi mais uma surpresa. Eu sempre pensei que a Sra. Dona Maria Francisca casasse no estrangeiro, porque ela tem tantos primos e tantas pessoas fora, mas olhe, foi um português que foi o felizardo.

O que lhe foi pedido ou proposto?
Depois a Sra. Dona Isabel, muito simpática, disse: “Eu conto consigo”. Mas contava comigo para ir ao casamento e também para trabalhar. Eu sirvo o duque de Bragança e agora os duques de Bragança, há muitos anos. No fundo eu sou um monárquico com serviços à República. Não deixei nunca de servir o meu país, mas sempre com esta perspetiva, e às vezes não é muito fácil compaginar as duas coisas, mas tem sido até agora e como hoje em dia estou reformado, estou perfeitamente solto para ter qualquer opção desse género.

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Importa lembrar que os Bragança não são uma família reinante e que a infanta Maria Francisca é a filha do meio, havendo ainda o herdeiro e príncipe da Beira, e o infante Dom Dinis. Quando Dom Duarte se casou já era chefe da casa de Bragança. Os convites ficaram a cargo do secretariado de Dom Duarte e, garante Bouza Serrano, “as pessoas gostam de ser convidadas”, mesmo que por algum motivo depois não tenham possibilidade de comparecer.

A cerimónia na basílica de Mafra terá entre mil e mil e cem convidados, mas os seus nomes não são revelados e a lista final, além de estar em constante transformação, está também envolta em grande secretismo. Acredita-se que venham, sobretudo, pessoas da geração dos noivos e não tanto chefes de casa nem herdeiros, mas virão certamente muitos membros de casas europeias e, claro, muita família do Brasil.

Esperam-se convidados da casa do Liechtenstein, da família Saxe-Coburg Gotha, Orléans e Bragança (do Brasil), da família dos condes de Paris e parentes chegados de França, o Grão-Mestre de Malta e aristocracia da Europa, parentes e amigos que se dão regularmente com a noiva e os seus irmãos, segundo apurou o Observador. Do Reino Unido e de Espanha não virão convidados reais, porque, como aponta o embaixador, também não há membros destas famílias da mesma geração da noiva, a infanta Maria Francisca. Assim como também não se esperam membros das casas reais do norte da Europa, como Suécia, Noruega e Dinamarca. Também são esperados, claro, membros da aristocracia nacional. O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa já confirmou a sua presença e António Costa, que também foi convidado, mas ainda não se sabe se estará presente. Neste caso não há representações, os convites são pessoais.

É na criação do mapa de lugares de todas estas figuras que o conhecimento de Bouza Serrano é precioso. Além de chefe de protocolo teve uma carreira diplomática que o colocou em embaixadas em Madrid, Bruxelas, Santa Sé, Ordem Soberana e Militar de Malta, Copenhaga e Haia. Ao longo de muitos anos conheceu e lidou com inúmeros membros da realeza de diferentes gerações e nacionalidades, sabendo de cor como se organiza a sua hierarquia. “Se [as famílias reais que] são reinantes têm precedência, são as primeiras. Depois, os filhos segundos das famílias reinantes também estão acima das não reinantes. Tudo isto tem uma graduação. Há o Almanaque de Gotha, que tem as precedências. Depois também há a nobreza portuguesa que estará representada.”

Terá sido pensado um banquete real na noite do casamento em que os convidados usariam casaca e vestido comprido, bem como as suas joias e condecorações, no entanto acabou por se optar por uma celebração com smoking e vestido curto. “Depois seria muito complicado. As pessoas hoje gostam de viajar mais leves.” Quererá isto dizer que os membros da realeza viajam em low cost? “A rainha Sofia de Espanha vai muitas vezes a Londres de Easy Jet e as pessoas veem-na entrar para o seu lugar com uma mala pequenina e [acompanhada pela] sua irmã”, conta o ex-embaixador.

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Há casas reais com quem os Bragança tenham especial relação?
O Sr. Dom Miguel de Bragança [1802-1866], mesmo no exílio, tinha imensas filhas e há muitas cortes europeias que são Bragança. No Luxemburgo, na Bélgica, os Orléans, que não são reinantes mas são descendentes dos reis de França, as alianças são múltiplas. Os príncipes de Bourbon-Parma têm avós e mães Bragança. Os Thurn und Taxis, o Liechtenstein.

Há algum protocolo de segurança para os membros das casas reais?
O que o protocolo de estado pediu foi uma lista final. Há pessoas que têm necessidades de segurança específicas.

Neste caso é o Estado que intervém para garantir a segurança?
Claro, tem de ser. Não será com a intensidade que foi com o Sr. Dom Duarte e a Sra. Dona Isabel.

É preciso que haja uma predisposição do Estado para ajudar?
Ajuda muito.

Em que é que ajuda muito? Na segurança?
Quanto à segurança, nós como país recetor, e vai acontecer um ato privado com uma dimensão internacional, não podemos correr o risco que aconteça nada desagradável.

À conversa com Bouza Serrano as explicações de como funciona o protocolo de um evento como um casamento real são acompanhadas de histórias pessoais e fotografias, livros e cartões que as confirmam

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Como se começa a organizar um casamento real?

Bouza Serrano é um dos membros de uma equipa responsável pelo protocolo deste casamento real. “Somos um grupo alargado de pessoas. Alguns foram repescados do casamento do Sr. Dom Duarte e da Sra. Dona Isabel.” Conta-nos que a ele se juntam o embaixador António Almeida Lima, que é tio do noivo e foi chefe do protocolo de estado a seguir a Bouza Serrano, Isabel Amaral, que é consultora de protocolo e foi presidente da APorEp, a associação de protocolo, e Helena Azevedo Coutinho, que está ligada ao Museu de Arte Antiga.

“Estamos mais focados na parte do protocolo, nos convites e, sobretudo, na cerimónia em Mafra.” Afinal, segundo o ex-embaixador, a infanta Maria Francisca “é a primeira pessoa real que casa em Mafra” e para o grande evento do próximo dia 7 de outubro os cenários serão a basílica, os claustros e umas salas anexas. “Mafra era um grande projeto que [nós portugueses] nunca chegámos a fazer. Muitas vezes somos megalómanos, como com o Palácio da Ajuda, e fica tudo um bocadinho pelo meio. Mafra era para ter uma alameda até à Ericeira, que nunca se fez, mas Mafra abria, como se fosse Versalhes moderno, até ao mar e era extraordinário.” O antigo chefe de protocolo do Estado lembra que quando o Presidente Vladimir Putin veio a Portugal, em 2007, esteve em Mafra. “Ele não ficou esmagado, mas ficou impressionado.”

Como se começa a organizar um casamento real? 
Primeiro [há que definir] o sítio. Penso que a Sra. Dona Isabel gostaria de ter repetido o que foi o casamento dela, que foi muito bonito, [no Mosteiro dos Jerónimos]. Ao não poder ser nos Jerónimos, penso que a alternativa foi Mafra e muito bem escolhido.

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Há uma ligação especial entre a família dos duques e o convento de Mafra?
Foi uma promessa de um Rei que é um antepassado deles. Não tinham descendência e, ao terem, construíram um palácio, que é notável. A riqueza, as coleções, a biblioteca. E aqui ao pé, não é muito longe e é o centro daquela vila.

Não é muito longe de Lisboa? Onde ficarão instalados os convidados?
Há muitos hotéis ali ao pé e também em Sintra. Há muita gente que irá a Sintra a casa de Suas Altezas Reais que recebem na noite do casamento. Está tudo pensado nesse sentido.

Como será feito o transporte de convidados de outras casas reais?
Penso que em automóveis alugados pelos próprios. Estas coisas têm de ser partilhadas.

Decidido o espaço, segue-se a lista dos convidados?
Pois, quem se vai convidar. Quando se decidiu, a Sra. dona Isabel mandou um save the date, dizendo que a resposta [deveria ser dada] até ao dia 1 de setembro.

Com quanta antecedência tem de ser enviado um save the date?
Dois ou três meses. É mais difícil encaixar nas agendas.

Assume-se "um monárquico com serviços à República". Como o retrato dos duques de Bragança, atrás, e uma longa carreira diplomática como representante de Portugal no estrangeiro provam

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Os convidados, os seus lugares e o protocolo

Quando o Observador falou com José de Bouza Serrano, a menos de um mês do casamento, a organização do evento tinha já vários pontos definidos. Haverá uma entrada para cadeira de rodas, pensada para quem tenha limitações de movimentação. E, caso chova, o plano B implica o uso de chapéus de chuva e será necessário ir buscar os convidados junto dos seus carros. “Não há toldos, isso seria um encarecer da cerimónia.”

Contudo, ainda muito estava também por confirmar, nomeadamente, a longa lista de convidados. “As pessoas vão receber o livro de missa, o missal, com um marcador com a cor do sítio onde ficam. Há uma série de voluntários que irão ser formados e levarão as pessoas aos sítios”, explica Bouza Serrano sobre como se vai proceder à receção dos convidados na cerimónia do casamento. “O Presidente será acompanhado especialmente ao seu lugar e mais uma ou duas pessoas.”

Quando aconteceu o casamento dos atuais duques de Bragança, o Presidente Mário Soares também esteve presente, lembra Bouza Serrano. “Era uma pessoa muito aberta e era extraordinário e sabia que a República não estava em perigo por clamar o chefe da casa de Bragança.” Esteve também presente o primeiro-ministro da altura, Aníbal Cavaco Silva.

Haverá representantes da Ordem de Malta, da Ordem do Santo Sepulcro de Jerusalém, ordens com especial dedicação dos duques de Bragança. E há também as ordens dinásticas, como a Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, ordem instituída pela casa de Bragança, a ordem de Santa Isabel e há ainda outras ordens de parentes que têm representação em Portugal. “É natural que essas pessoas sejam convidadas e vão.”

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Dentro da basílica a organização dos convidados é rígida e obedece a regras. O lado esquerdo do altar será mais importante do que o direito, porque é onde se lê o Evangelho e é deste lado que ficará a família da noiva, incluindo os avós do lado da mãe, Jorge e Raquel de Herédia. O Presidente da República ficará entre estes convidados, “num lugar destacado”. Do lado oposto do altar está a epístola e será o lado da família do noivo. “Vai ser um ato litúrgico. O casamento vai ter o celebrante, o anterior cardeal patriarca, Dom Manuel Clemente.” O novo patriarca de Lisboa, Dom Rui Valério, também foi convidado mas ainda não se sabe se vai comparecer. Atrás do celebrante, no espaço que tem o nome de sagrado, estarão vários religiosos “que acompanharam de certa maneira a família”. Depois de casados, os noivos trocam de lado. O embaixador acredita que do Vaticano virão ainda uma bênção e terços para os noivos.

Quem escolhe os convidados? O protocolo obriga a que haja alguns convidados?
São os pais dos noivos [que convidam], depois há os convidados nacionais e os internacionais, em função das relações das pessoas que estão próximas da família. Convidaram o Sr. Presidente da República, que também os convida sempre quando cá vem alguém e eles têm o seu lugar na Ajuda. Se bem que não têm o seu lugar na lista de precedências, que foi uma coisa que me aborreceu muito. Nem eles nem o cardeal patriarca de Lisboa. O obrigatório é sempre em função do desenvolvimento da família.

O que é a lista de precedências?
É a lista de precedências do Estado, quem é quem na estrutura, que foi estabelecida pela Assembleia da República. [É uma lei que define] onde as pessoas se sentam. Omitiram os representantes, e no fundo nós em oito séculos só temos 108 anos de República, os outros séculos são de monarquia. Esta ética republicana não tem essa flexibilidade, quando no fundo os outros países, a França, que é uma república há tantos anos, reconhece os duques de Anjou, os Orléans e os descendentes do Napoleão e quando são convidados são com todo o protocolo e categoria. Não se envergonham da sua história passada. O cardeal patriarca de Lisboa também não tem lugar na lista de precedências, o que é um bocadinho incómodo porque um cardeal pode ser Papa.

Pela lei das precedências, quando se realiza num determinado concelho uma cerimónia, o presidente da câmara tem categoria de ministro e é sentado, pela precedência, depois do último ministro do governo. Nesta cerimónia o presidente da câmara de Mafra terá categoria de ministro, mas à noite no jantar já será o presidente da câmara de Sintra.

Porque há tantos membros do clero nesta cerimónia?
São vários membros do clero que acompanharam tanto a Sra. Dona Maria Francisca como a família real ao longo destes anos. Por exemplo, o Sr. Dom Dinis é duque do Porto e foi batizado no Porto. Tudo isso foi um acumular de cerimónias religiosas que foram celebradas e presididas por membros da Igreja portuguesa, alguns infelizmente já desapareceram, mas que estiveram sempre presentes na vida espiritual da família de Bragança, é natural que numa ocasião destas estejam presentes.

São os pais da noiva que escolhem quem vai presidir à cerimónia?
Convidaram [Dom Manuel Clemente] e ele também quis muito casá-los.

Podemos esperar uma intervenção mais pessoal por parte do cardeal?
Na homilia? Sim, penso que sim.

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