Quando o PS se reunir, já neste sábado, no Portimão Arena para mais um congresso, contará com dois dos pivôs das negociações à esquerda bem atentos ao que se vai passar: Jorge Costa, pelo Bloco de Esquerda, e Vasco Cardoso, pelo PCP, são os nomes que os antigos parceiros de geringonça vão enviar ao conclave socialista, e são também os nomes que costumam sentar-se à mesa com o PS para negociar orçamentos. Ainda assim, à esquerda, a esperança de ouvir boas notícias em Portimão é escassa: os partidos vizinhos não têm gostado do que o Governo tem tido para lhes propor e neste congresso deverão ouvir, sobretudo, a linha oficial do PS — sem espaço para grande contraditório.
À esquerda, já há quem lamente o facto de não estar, pelo menos, planeada uma intervenção de Pedro Nuno Santos, que tem vindo a avisar que tenciona ficar calado no congresso. No Bloco de Esquerda, regista-se o facto de a ala mais esquerdista do PS, representada pelo atual ministro das Infraestruturas — o mesmo que no congresso de há três anos apresentava uma moção e garantia que as suas ideias eram “socialistas” e não “radicalistas” — estar a assumir uma posição discreta e de as correntes divergentes no PS parecerem “congeladas”.
Por isso, não é de esperar no congresso deste fim de semana que apareça uma mão amiga para a esquerda, nem para o Bloco em particular — que esta sexta-feira via o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, dar sinais de abertura negocial, em entrevista à Lusa, mas também ouviu as declarações de socialistas de relevo, desejosos ou convictos de que António Costa se candidatará a um terceiro mandato em 2023.
Francisco Assis: “Ninguém duvida de que Costa será candidato em 2023”
A esta distância, pode não ser uma garantia absoluta; mas, acreditam os bloquistas, será uma forma de adiar a questão da sucessão e manter a ala pedronunista, que tinha começado a marcar terreno no partido, afastada do poder no PS tanto tempo quanto possível. Más notícias para a esquerda? Depende da perspetiva: com Pedro Nuno a chegar à liderança, os acordos poderiam ficar mais fáceis… e o eleitorado de esquerda menos inclinado a votar nos partidos que se situam à esquerda do PS.
Se o Congresso de continuidade de Costa e “congelação” da sucessão não entusiasma a esquerda, também não é maior a esperança de que dali saiam boas notícias para as negociações em curso. Os antigos parceiros leram com atenção a entrevista de António Costa ao Expresso, em que o primeiro-ministro colocava em cima da mesa medidas como o desdobramento dos escalões do IRS ou mexidas no abono de família, mas avisava que seria preciso escolher e “compatibilizar o quadro orçamental”.
O aviso já tinha sido feito em privado, nas reuniões de trabalho, que agora seguem setorialmente e sem o primeiro-ministro. E é visto com ceticismo: boa parte dessas medidas, como as relativas ao IRS, já se encontravam previstas no programa de Governo embora pouco concretizadas, pelo que não seriam exatamente matéria de negociação e, na cabeça dos bloquistas, podem ser, colocadas assim, uma forma de pressão sobre os parceiros negociais.
Se no Bloco de Esquerda o sentimento é de pouca crença no sucesso das negociações — até porque o partido avançou este ano com prioridades como a agenda laboral e a exclusividade dos trabalhadores do SNS, que no ano passado levaram à ruptura com o Governo — no PCP, que viabilizou o último Orçamento, a visão não é mais otimista.
“A dimensão dos problemas que o país enfrenta e a resposta exigida para lhes responder, seja no plano do que resultou mais evidenciado com a epidemia, seja dos problemas de fundo que marcam a realidade sócio-económica, exigem uma política alternativa que rompa com opções e critérios que conduziram à actual situação”, insiste o PCP, em resposta ao Observador.
Mais claro: “A entrevista do primeiro-ministro está longe de permitir identificar, quer no domínio do Orçamento do Estado para 2022, quer em outros domínios como os dos salários, direitos e legislação laboral, que essa seja a opção que o Governo do PS admita fazer”.
Embora tanto no BE como no PS se assuma que é mais provável que este Orçamento volte a ser aprovado com o aval do PCP do que que o BE volte a jogo — ou que haja uma crise política –, os comunistas não se mostram confortáveis.
Desde logo, além do Orçamento, um desconforto adicional: depois de o PS ter aprovado, na generalidade, uma proposta laboral dos comunistas que previa, entre outras coisas, o fim do alargamento do período experimental — e ter assim irritado parte da própria bancada parlamentar — o primeiro-ministro veio, na mesma entrevista, esclarecer que afinal a aprovação serviu apenas para “não prejudicar a presença do projeto do PCP no debate” e que o PS “não subscreve todas as medidas que lá estão”.
Os comunistas, que tinham feito questão de não festejar antes de tempo e sublinhar a pouca fé que colocavam no PS em matérias laborais, registaram a resposta; por isso frisam agora que também em questões de “salários, direitos e legislação laboral” estão em dessintonia com o PS. As eleições autárquicas e, logo de seguida, a negociação orçamental pura e dura ajudarão a definir o quadro à esquerda. Mas o congresso do PS não parece reservar boas notícias para os partidos vizinhos.