É um convite para conhecer o melhor de Lisboa, e ainda para manter a feliz tendência de descentralização. Seja numa subida ao Porto, no interior do Alentejo, ou rumo ao Algarve, com direito a duas paragens, há cinco novas mesas estreladas em Portugal: sobe assim para 33 o número de restaurantes no país com esta distinção (incluindo sete espaços com duas estrelas). Com o carimbo do Guia Michelin Espanha & Portugal, que foi apresentado esta terça-feira no Palau de les Arts Reina Sofía de València, em Espanha, há ainda duas estrelas verdes a descobrir, uma estreia em solo nacional: uma para o restaurante Esporão, que acumula esta distinção com o principal dos astros, e outra para o madeirense Il Gallo d’Oro, o duas estrelas Michelin instalado no The Cliff Bay Hotel.
Guia Michelin. Há cinco novos restaurantes com estrela em Portugal
Com a seleção de 2022 a englobar 1.362 espaços, seguimos uma viagem exclusiva dentro de portas ao sabor das novas entradas. E para conhecer algumas das histórias mais deliciosas de um roteiro à portuguesa, reserve este especial para a sobremesa.
Al Sud
Campo de Golfe de Palmares, Odiáxere, Lagos. Menu especial de degustação com oito momentos (69€), com 10 pratos (90€) ou com 12 momentos (110€). Reservas: restaurantealsud@palmaresresort.com
Os sabores da ria começaram a ser apreciados logo no começo do ano no novo Clubhouse, quando o chef Louis Anjos assumiu os comandos dos restaurantes do resort cinco estrelas Palmares Ocean Living & Golf, em Lagos. Para trás ficava o Bon Bon, o não menos estrelado destino no Carvoeiro, em Lagoa. A escassa distância desse janeiro de 2021, ali pela primavera, abriu portas o projeto de fine dining que complementa a experiência a sul, ou Al Sud, o nome que resume este encontro entre a qualidade dos ingredientes e a cozinha de autor — e que dificilmente poderia ignorar a vista da baía de Lagos e o estuário do Alvor, portanto pode ir ensaiando a fotografia, além do estômago. Anjos começou a trabalhar no desenho da carta do Clubhouse em outubro de 2020, inspirada na gastronomia Mediterrânica e com vários apontamentos locais e internacionais. “A cozinha do Al Sud vive do receituário típico da região do Algarve e dos produtos locais, trazendo para a mesa uma rica variedade de peixe e marisco da costa, carne dos nossos pastos e legumes da serra”, lê-se no site que apresenta o espaço concebido pelo atelier RCR Arquitectes, e no qual Louis Anjos conta com o sous-chef Ricardo Luz.
Natural de Minde, Alcanena, o chef formou-se na Escola de Hotelaria de Fátima, no ano 2000, e estreou-se como cozinheiro de 1.ª em vários restaurantes da região de Leiria. Em 2008, apontou agulhas para as unidades hoteleiras do sul do país, começando por ingressar no resort Vila Vita Parc, como Chefe de Partida. Em setembro de 2009, agarrou um novo desafio mais a norte, no Hotel Villa Batalha, tornando-se Chefe de Cozinha da equipa de abertura daquela unidade hoteleira. Em junho de 2010, nova descida aos algarves, agora no seio da equipa do Villa Lara Resort.
Entre abril de 2011 e meados de 2015, assumiu o cargo de chefe executivo no empreendimento hoteleiro Suites Alba Resort, de Luís Figo, como Chefe Executivo. Vencedor da 23.ª edição do Concurso Chefe Cozinheiro do Ano, em 2012, Anjos estagiou no restaurante “Viajante” (uma Estrela Michelin), em Londres, e no “Martin Berasategui” (três estrelas Michelin), em San Sebastián, no norte de Espanha. Entre 2016 e 2018, chefiou ainda a cozinha do hotel Macdonald Monchique Resort & Spa. Para um tributo à tradição culinária local, agora no Al Sud, Louis Anjos propõe um trajeto em 8, 10, ou 12 momentos de degustação.
Desejoso de reservar a sua mesa a sul? Atenção que o restaurante encontra-se encerrado. Abrirá portas de forma excecional para celebrar a passagem de ano (na noite de 31 de dezembro de 2021, com uma capacidade até 24 pessoas) e reabrirá em pleno em fevereiro de 2020.
A Ver Tavira
Calçada da Galeria, Largo Abu-Otmane 13, Tavira. Terça a sábado, das 12h00 às 15h00 e das 18h30 às 22h00. Menu degustação Vegetariano (60 euros), Reflexão (70 euros) e A Viagem do Sabor (125 euros). Menu de almoço a partir de 45 euros. Reservas: restauranteavertavira@gmail.com.
Já merecera recomendações no Guia Michelin, e outras tantas distinções entre críticas e elogios nos blogues da especialidade, faltava apenas o astro maior para coroar o trabalho desenvolvido no espaço inaugurado em 2006, que chega agora depois de umas retemperadoras férias. Não há como evitar spoilers com um nome como A Ver Tavira: a homenagem à cidade algarvia revela-se neste ponto instalado na zona histórica, que reabre portas esta quinta-feira, dia 16 de dezembro. Os menus centram-se numa gastronomia contemporânea portuguesa que se afirma pela voz das suas raízes e que não deixa de viajar pelo mundo, encantada com gostos e sabores de outras paragens. E claro que esta paragem entre a igreja e o Castelo de Tavira brinda quem visita a casa com uma vista da cidade para registar ao mesmo nível da experiência gastronómica.
Ao leme da cozinha está Luís Brito, o chef natural de Santa Clara-A-Nova (Almodôvar) que iniciou o seu percurso na cozinha em 1989, ao ingressar na Escola de Hotelaria de Faro. Formado em cozinha e pastelaria, circulou por vários restaurantes e hotéis na região do Algarve, onde assumiu o papel de sous-chef Executivo do Hotel Alfamar. Do Petchey ao Starwood, passando pelo CS Madeira Atlantic, acumulou passagens por diferentes grupos, mas também pela Escola superior de Hotelaria e Turismo do Brasil em São Paulo, pela Escola de Hotelaria e Turismo de Faro e por Angola, enquanto Chefe Executivo do Hotel Nempanzu.
Agostinho Gomes é o sous-chef de serviço numa equipa que serve carta renovada e três menus de degustação ao jantar. O Reflexão (70 euros), por exemplo (pensado para jantares), propõe cavala fumada, alho negro, limão preto e caviar; pão, azeite, manteiga e flor de sal; peixe de linha, arroz de alcácer, molho assado e kaffir; sabores de um cozido português, amêndoa, amendoim, queijo de cabra, e mel. Quanto ao almoço, o mote é O Mar e a Terra, um menu composto por tártato de atum, soja, gengibre e wasabi; camarão, caril, e óleo de abóbora; atum corado, batata, manga e abacate; lombinho de robalo, arroz de limão e coentros; entrecôte de galega, cogumelos, cogolho e batata; bochechas de porco, puré de batata e cebola frita; alfarroba, pudim, gelado e telha; fruta da época macerada, sorvet e espuma. Pode ficar-se por três momentos (45 euros) ou chegar aos oito (85 euros).
Cura
R. Rodrigo da Fonseca, 88, Lisboa. Todos os dias das 19h00 às 23h00. Menu Raízes (85 euros), menu Meia Cura (95 euros), menu Origens (130 euros)
Podia ser um menu em quatro momentos, mas é uma frase em quatro palavras essenciais: “Foi uma oportunidade irrecusável”. Era assim que há pouco mais de um ano, em outubro de 2020, Pedro Pena Bastos resumia a este jornal a sua chegada ao Cura, então o mais recente hóspede do Ritz. O restaurante inaugurou cerca de um ano depois de o chef ter firmado contrato com o luxuoso hotel, e após previsível adiamento imposto pela pandemia. Do restaurante Ceia, no Campo de Santa Clara, onde até então dera cartas, Pedro importou as mãos hábeis do seu braço direito na cozinha, Marco Carmo, e o sommelier/chefe de sala Mário Marques (entretanto a cargo do management), que se juntaram à escanção Gabriela Marques e ao chef pasteleiro Diogo Lopes.
A regra número um a cumprir pela equipa é a junção de dois mundos: clássico com contemporâneo, formal com descontraído. Um encontro de esferas que se manifesta num projeto com assinatura de Miguel Câncio Martins, que revolucionou o espaço que até então funcionara como sala de reuniões, e que entretanto ganhou também porta para a rua.
Aos 31 anos, no percurso de Pedro Pena Bastos contam-se passagens pelo Cafeína, no Porto, Grémio Literário, em Lisboa, Ledbury, em Londres, e Geranium, em Copenhaga. Mas foi no restaurante da Herdade do Esporão, que chefiou até outubro de 2017, que soaram as primeiras campainhas sobre a possibilidade da estrela. O caminho haveria no entanto de apontar no sentido da capital, com a atual oferta a dividir-se em três menus de degustação: o “Meia Cura”, de sete momentos, o “Origens”, com 13, e o “Raízes”, totalmente vegetariano — em todos eles há criações inéditas, claro, e alguns pratos que ganharam cara nova.
Cura: o restaurante de Pedro Pena Bastos é o novo hóspede do Ritz
Entre as novidades, o destaque vai para a combinação de lula, avelã, bergamota, manteiga torrada de algas e caviar ou a “mariscada” que tem na sua base uma espécie de pudim japonês (chawanmushi) feito à base de rama de alho verde e tremoço (prontíssimos para acolher o marisco mais fresco do dia) e o devido toque final de flor de alho ou ovas de truta.
Restaurante Herdade do Esporão
Herdade do Esporão, Reguengos de Monsaraz. Quarta a domingo, das 12h30 às 15h30. Menu Carta Branca (50 euros). Reservas@esporao.com. Aconselhada marcação com mínimo de 72h de antecedência.
Não estranhe se o vir pela zona desembaraçado da jaleca, num dos muitos momentos em que o chef de 29 anos deixa de meter as mãos na massa para passar a enfiá-las na terra. Ou se vir que a beterraba recebe atenção extra. Ou ainda se sugerirem uma aliança entre o seu prato e uma kombucha, qual alternativa ao tradicional copo de vinho. Desde que assumiu o restaurante da Herdade do Esporão, Carlos Teixeira conseguiu fazer com que 80% da sua comida seja criada a poucos metros da mesa onde a pode provar, e os vegetais conquistaram protagonismo evidente. O resultado é um menu sazonal em que as estrelas, tão reluzentes como a que acaba de ganhar, são os produtos saídos deste reduto alentejano, entre outras matérias-primas bem nacionais com direito a confeção e interpretação modernas. Em suma, conte com uma cozinha de ‘terroir’ e confie nas escolhas do chef: em cima da mesa tem um menu de degustação Carta Branca, pautado por cinco ou sete momentos, devidamente acompanhado de wine pairing.
Há seis anos na cozinha do Esporão, curiosamente os dois primeiros dos quais como sous-chef de Pedro Pena Bastos, que venceu também a estrela este ano, à frente do Cura, Teixeira estagiou em Londres e é no interior do Alentejo que aposta na via da sustentabilidade e do desperdício zero, liderando uma cozinha com feições renovadas. Inserido no enoturismo da Herdade do Esporão, em Reguengos de Monsaraz, o restaurante (então já apontado por muitos como uma potencial estrela Michelin) encerrou no final de outubro de 2017 e reabriu no ano seguinte com novo conceito, mais descontraído, focado nos almoços, e que lança o convite para uma escapadinha em família.
Sim, há um detalhe importante para o caso de ponderar deixar os miúdos em casa: o restaurante da Herdade do Esporão é kids-friendly e as opções à la carte são apropriadas para crianças.
Vila Foz
Av. de Montevideu 236, Porto. Terça a sábado, apenas ao jantar (serve entre as 19h30 e 22h30). Acesso reservado a maiores de 12 anos. Rebentação (90 euros), Novo Mundo (75 euros), Maresia (120 euros). Reservas: vilafoz@vilafozhotel.pt
Comer como um rei e sobretudo sentir-se como um, não fosse a envolvente digna de um ocupante de trono dos nossos dias. É num salão nobre de palacete, com a devida dose de exuberância e requinte, que se dispõem as mesas e cadeiras do restaurante do Vila Foz Hotel & Spa, o cinco estrelas a mirar o Atlântico que serve fine dining com a assinatura do chef Arnaldo Azevedo.
Naturalmente, a proximidade do azul que se avista para lá das janelas também contagia os pratos. As propostas de degustação (ora atente nos nomes dos menus ali em cima) refletem essa influência e valem-se de dois príncipes do nosso cardápio: o peixe e os mariscos mais frescos e autênticos da costa portuguesa, bem apanhados numa rede de texturas, contrastes e sabores. O menu Maresia (120 euros), por exemplo, inclui saudações do chef; lavagante, azeitona de Tras-os-Montes, nabo e limão Meyer; Lula, alho assado, daikon e caldo iodado; linguado, couve-flor e mariscos do Atlântico; arouquesa, tutano, girassol batateiro, vinagre Moura Alves e molho Madeira; cordeiro de leite, pistácio, duo de batata e legumes; uva e iogurte; ananás dos Açores, abade priscos e citrinos; café e petit fours. Prefere carne? Não é caso para desanimar, como leu.
Filho de peixe, perdão, de chef (com o mesmo nome e tudo), Arnaldo Azevedo deu os primeiros passos no negócio da família e decidiu frequentar o curso de cozinha da Escola de Hotelaria de Santa Maria da Feira. Depois de outras experiências, chegou ao Vila Foz, para assumir também os destinos do restaurante Flor de Lis, outro pouso gastronómico no hotel.
E se pretende uma experiência alternativa mas não menos exclusiva (pelo contrário), teste a modalidade Kitchen Seat. É num espaço contíguo ao salão principal, sentado ao balcão, bem de frente para a cozinha e em ligação direta com Arnaldo Azevedo, que contará com uma refeição preparada só para si e com a informação sobre cada prato bem mastigadinha, para ficar a par de cada pormenor. Por fim, não se esqueça que as melhores histórias podem e devem ser harmonizadas com os melhores vinhos.