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A CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, presta declarações à imprensa esta tarde na sede da TAP, em Lisboa, 22 de junho de 2022. INÁCIO ROSA/LUSA
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Inácio Rosa/LUSA

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Demissões no Governo colocam presidente da TAP sob alta pressão

Com a demissão de Pedro Nuno Santos, o seu maior aliado, a presidente executiva da TAP fica mais fragilizada. O seu futuro depende da auditoria da IGF ao processo de saída e compensação a ex-gestora.

A bomba ao retardador que revelou ser a indemnização paga pela TAP a uma ex-administradora (Alexandra Reis) demorou 10 meses a detonar, mas fez grandes estragos no Governo com três demissões, incluindo a do poderoso ministro  — Pedro Nuno Santos — que parecia resistir a tudo. E se Fernando Medina parece para já escapar — apesar de ter sido o ministro das Finanças a fazer rebentar a bomba com a escolha da secretária de Estado do Tesouro, o facto de não estar no Governo à data do acordo de rescisão de Alexandra Reis dá-lhe mais conforto. A grande dúvida é o que vai acontecer à administração da TAP e, em particular, à sua presidente executiva, que até agora nada disse, para além dos esclarecimentos da transportadora enviados aos ministérios das Infraestruturas e Finanças sobre o acordo de saída e que foram tornados públicos.

Todos os olhos estão agora voltados para a gestora francesa que entrou na TAP há um ano e meio e que, apesar da assinalável recuperação financeira e operacional da empresa neste último trimestre, não deixou de estar debaixo dos holofotes pelos motivos menos desejados. Desde a renovação da frota automóvel para altos quadros, passando pela contratação de uma amiga para um cargo bem remunerado.

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A continuidade de Christine Ourmières-Widener à frente da administração da companhia parece difícil no atual contexto, ainda que esta possa argumentar que fechou o acordo que resultou no pagamento de meio milhão de euros a Alexandra Reis com o conhecimento e consentimento da tutela (pelo menos metade da tutela). Pedro Nuno Santos afirmou desconhecer os contornos do acordo, mas dá a entender que os mesmos foram comunicados ao seu secretário de Estado — Hugo Mendes — que “não viu incompatibilidades entre o mandato inicial dado ao conselho de administração da TAP [para negociar uma rescisão contratual com a administradora] e a solução encontrada”. Há outros fatores em jogo que podem tornar mais difícil e mais cara a substituição da presidente executiva da TAP.

CEO tem contrato com o Estado

Christine Ourmières-Widener tem um contrato assinado com o Estado. Será mesmo a única dos atuais gestores executivos da TAP a tê-lo. O seu conteúdo não é conhecido para além do valor do vencimento que consta dos documentos de prestação de contas da empresa — 504 mil euros anuais considerando já o corte de 30% aplicado à administração. Os salários dos gestores executivos da TAP foram todos validados pela comissão de vencimentos e é numa ata deste órgão que estão fixadas remunerações, bem como os objetivos de gestão e a eventual remuneração variável a que tenham direito, mas não as condições de rescisão e eventuais direitos a compensação. O atual mandato da administração executiva da TAP termina em 2024.

A não ser que a gestora se demita, como voltaram a pedir os sindicatos que contestam a sua gestão, o Governo poderá ter de aguardar pelos resultados da avaliação pedida à Inspeção-Geral de Finanças sobre a legalidade e cumprimento de todas as regras no processo que resultou no pagamento de meio milhão de euros a uma administradora em relação à qual Christine Ourmières alegou ter “uma manifesta incompatibilização, irreconciliável”.

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LUSA

Não se sabe se chegou a explicar em concreto os motivos dessa incompatibilidade com Alexandra Reis, que, no comunicado de Pedro Nuno Santos, surge como tendo sido indicada pelo acionista privado (Humberto Pedrosa, que saiu da TAP no final de 2021). Na TAP, e pela informação recolhida pelo Observador, ninguém parece saber apontar um conflito entre as duas, invocando a expressão “choque de personalidades para explicar os problemas. Mas era conhecida a divergência sobre a mudança de sede da TAP para fora do aeroporto e havia quem afirmasse na empresa que a nova secretária de Estado não permitiria essa transferência.

Alexandra Reis ganhou um grande espaço de manobra e poder na comissão executiva quando, ao lado de Ramiro Sequeira, teve de assumir várias funções numa altura crucial da reestruturação, incluindo a pasta dos recursos humanos. Essa situação, que aconteceu por apenas alguns meses (antes da nomeação da administração liderada por Christine), terá tornado mais difícil a coabitação numa administração alargada e com poderes mais divididos e com uma nova presidente a querer conquistar autoridade.

Nos esclarecimentos remetidos pela TAP ficou confirmado que o acordo assinado entre a empresa e a ex-administradora ficou com o selo de confidencial e que, mesmo na tutela, só o secretário de Estado das Infraestruturas (Hugo Mendes) o conheceria. O que deixa no ar a dúvida sobre quem pôs cá fora a informação dos 500 mil euros e porque só foi conhecido semanas depois de Alexandra Reis ser nomeada secretária de Estado do Tesouro, função que implicaria, em tese, ficar com a tutela financeira da TAP (ainda que a privatização ficasse com o secretário de Estado das Finanças, João Nuno Mendes).

Avaliação da IGF pode ser determinante

Numa primeira fase, o que está em causa na auditoria da IGF é sobretudo a legalidade da solução jurídica encontrada pelos advogados contratados pelas duas partes — e que contorna o que está previsto no estatuto do gestor público porque, por um lado, Alexandra Reis não assinou qualquer contrato ao abrigo daquele estatuto; mas também, explicou a TAP, porque, por outro lado, este regime não prevê a possibilidade de negociar um acordo de saída, tendo por isso recorrido ao Código das Sociedades Comerciais. Está também em causa na auditoria a adequação do valor atribuído, os tais 500 mil euros.

Das conclusões da IGF, a quem não terá sido dado um prazo para esta avaliação porque isso seria visto como uma condicionante, sobre a legalidade do acordo e do montante dependerá uma eventual exigência de devolução do montante recebido pela ex-administradora. Ainda antes de ser demitida do cargo de secretária de Estado do Tesouro, Alexandra Reis mostrou-se disponível para devolver o valor da compensação, caso esta fosse considerada ilegal. Ainda que, e dado o envolvimento de escritórios de advogados no processo de negociação e de acordo, pareça existir alguma confiança da parte da TAP e da antiga gestora sobre a legalidade da situação.

João Leão não foi informado do acordo quando era ainda ministro das Finanças. Pedro Nuno Santos só agora teve conhecimento

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Só que pode estar igualmente em causa o cumprimento das regras estatutárias — que órgãos na TAP teriam a competência legal para validar esta decisão. Os estatutos da empresa referem apenas que o Conselho Fiscal deve fiscalizar “os negócios da sociedade” sem especificar mais obrigações e, por regra, contratos de rescisão não costumam ser analisados por este órgão social. A IGF deverá verificar se foram respeitas as regras de relacionamento da TAP com o acionista Estado, sobretudo depois de o antigo ministro das Finanças, João Leão, ter vindo a público afirmar que nem ele, nem o secretário de Estado do Tesouro (Miguel Cruz) que tinha a tutela financeira TAP sabiam do acordo de saída de Alexandra Reis. À data, em fevereiro de 2022, o governo estava em processo de substituição após as eleições de janeiro (o novo Governo só tomou posse em março). Mas já se apontava para que Leão não se mantivesse no Ministério das Finanças, ao contrário de Pedro Nuno Santos, que tudo indicava que ficaria com a mesma pasta — a das Infraestruturas.

Mas se foi a administração da TAP a falhar por ter apenas comunicado a uma parte da tutela a situação — e aí a responsabilidade cairia também sobre o muito discreto presidente não executivo Manuel Beja — ou se era o Ministério das Infraestruturas que tinha de informar as Finanças é outra questão em aberto. Ainda que neste último tema já tenham sido assumidas as responsabilidades políticas com as demissões de Pedro Nuno Santos e de Hugo Mendes.

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CMVM deu já ordem à TAP para corrigir comunicado de saída de Alexandra Reis

Outro tema sob escrutínio é o dever de comunicação à CMVM, a quem o Governo remeteu a informação enviada pela TAP. Em fevereiro, a empresa comunicou a saída de Alexandra Reis como uma renúncia, acrescentando que a gestora decidiu encerrar este capítulo da sua vida profissional e abraçar novos desafios. Esta formulação, que fez parte do acordo legal de saída, tem sido amplamente criticada por ser considerada uma informação falsa ao mercado, dado que a gestora não saiu por sua iniciativa.

Apesar de renúncia ser um termo recorrente para anunciar saídas de gestores que foram afastados – Antonoaldo Neves, o CEO dispensado por Pedro Nuno Santos em 2020, recorreu à mesma figura —  por “determinação da CMVM” a TAP teve corrigir na quarta-feira à noite versão da saída de Alexandra Reis para esclarecer que a renúncia “tinha resultado de um processo negocial de iniciativa da TAP, no sentido de ser consensualizada por acordo a cessação de todo os vínculos contratuais existentes entre Alexandra Reis e a TAP”.

A sobrevivência de Christine Ourmières-Widener à frente da TAP não se joga apenas no plano jurídico. E talvez nem seja esse o principal campo do jogo. Há a questão política — a sua saída ajudaria a sanar a crise criada dentro do Governo. E a questão institucional e laboral. A indemnização paga a uma administradora por uma empresa que viu já esta semana renovada a condição de situação económica difícil para poder manter cortes nos salários e suspensão de acordos de empresa representa um enorme rombo reputacional.

A presidente executiva da TAP, a quem um dirigente sindical já comparou à rainha Maria Antonieta, ficará ainda mais fragilizada para negociar com sindicatos novos acordos de empresa e sustentar porque é que a TAP não pode voltar aos custos salariais que tinha antes do plano de reestruturação para garantir a sua sustentabilidade. Os tripulantes já afirmaram esta quinta-feira que vão avançar com os 5 dias de greve anunciados para janeiro depois de terem rejeitado a última proposta de acordo feita pela administração da empresa.

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A gestora perdeu ainda o seu maior apoiante público, Pedro Nuno Santos, que sempre fez questão de defender os resultados da gestão da TAP, destacando a ultrapassagem das metas económicas do plano de reestruturação e apontado até à exaustão o retorno para o país da injeção pública na companhia. A última vez que o Governo tentou contratar um gestor profissional no mercado internacional para a transportadora demorou um ano.

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