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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Em Portugal, a diplomacia da Catalunha faz-se num escritório de co-working — sob o olhar atento de Espanha

A Catalunha reabriu a sua "embaixada" em Lisboa, agora num co-working. Quer explicar a "realidade" e que há "presos políticos" na região. A Embaixada de Espanha vai seguir "tudo o que acontecer".

Há um cheiro a comida requentada no ar. Um grupo de três jovens trabalhadores, vestidos ao estilo smart casual, depenica dos seus tupperwares de comida. As atenções dividem-se entre uma conversa morna em inglês não-nativo e o scroll que fazem nos seus telemóveis. Ao fundo, o micro-ondas emite um zumbido que faz adivinhar que mais um colega se lhes vai juntar. É hora de almoço nos escritórios do Unicorn Workspaces, um espaço de co-working no centro de Lisboa que alberga freelancers, startups, pequenas empresas e… a delegação do governo regional da Catalunha, a Generalitat, em Portugal.

É numa pequena sala, metida a um canto, que se encontra o centro onde o governo independentista de Quim Torra coordena a sua ação para Portugal. Há apenas duas secretárias: a de Rui Reis, o delegado e responsável máximo por esta operação, e a da secretária da delegação, Marta Garcia. Sobram ainda dois blocos de gavetas e uma planta, tudo rodeado de paredes brancas. Se fosse um quarto numa qualquer casa, não caberia aqui muito mais do que uma cama e um roupeiro.

Este não é um poiso definitivo. Quem o garante é Rui Reis, o homem escolhido para representar a Generalitat em Portugal, que recebe o Observador com um fato e gravata que condizem pouco com a descontração deste espaço de co-working e ainda menos com o calor que se faz sentir. Desde que foi nomeado para o cargo, em abril, e se instalou em Lisboa mais tarde, em maio, Rui Reis procura um sítio para instalar a “embaixada” da Generalitat em Portugal — mas a procura não está fácil, com razões que não espantarão ninguém minimamente atento ao que se passa na cidade. “Sofremos com as rendas altas”, suspira Rui Reis. “Vamos demorar muito mais tempo a encontrar um sítio em Lisboa, porque o critério financeiro é muito importante.”

“Nós não queremos nenhuma casa, nem nenhum palácio, queremos só um andar normal”, diz, sublinhando que a contenção de despesas que existe agora é para continuar: “Eu venho de metro todos os dias para a delegação. Não temos carros, não temos chauffeurs, não temos nada disso nem queremos”.

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A delegação da Generalitat em Portugal está temporariamente instalada num espaço de co-working em Lisboa. Procuram um piso para alugar, mas as rendas altas não facilitam (João Porfírio/Observador)

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Esta não é a primeira vez que a Generalitat tem uma delegação em Portugal. Antes, o governo regional da Catalunha já tinha aberto uma delegação em Lisboa, no ano de 2016. Como todas as delegações congéneres espalhadas pelo mundo, a lisboeta viria a ser encerrada no final de outubro de 2017, após a aplicação do Artigo 155 da Constituição — a resposta do Governo de Mariano Rajoy à declaração unilateral da independência pelo parlamento catalão. Apenas as delegações da Generalitat em Madrid e em Bruxelas ficaram abertas. Naquela altura, Rui Reis era o número dois da delegação em Portugal, chefiada então pelo ex-correspondente em Lisboa da RTVE Ramon Font.

Agora, à segunda tentativa, Rui Reis está confiante que será de vez. “Esperamos que esta delegação continue e funcione, não temos uma atitude pessimista e não achamos que vá acontecer o mesmo”, diz, referindo-se ao desfecho de 2017.

De Moçambique para Portugal, com escala na Catalunha

Rui Reis, 55 anos, tem um percurso imprevisível. Nascido em Maputo, seguiu para a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, em Vila Real, para estudar Engenharia Zootécnica. Regressou a Moçambique em 2002, onde trabalhou em iniciativas de cooperação internacional para a criação de escolas de formação profissional. Em 2006, abriu uma vaga para coordenar o programa da Agência Catalã de Cooperação e Desenvolvimento (ACCD) em Moçambique. Concorreu e foi selecionado — não sem antes ter aprendido catalão, de forma autodidata.

“Não foi fácil, mas isso que se diz por aí, que os burros velhos não aprendem línguas, é mentira”, diz, entre risos. “Fui praticamente autodidata. Li muita literatura catalã, vi muita TV3 [televisão pública catalã] e ouvi muito as rádios em catalão, como a RAC1 e a Catalunya Ràdio. Tive um processo de imersão de um ano.”

Em 2009, já com o catalão dominado — que Rui Reis fala com desenvoltura, mesmo que com um sotaque português indisfarçável —, tornou-se delegado da ACCD para a África Oriental. Em 2017, depois de uma passagem de dois anos por Barcelona, voltou a Portugal, onde se tornou número dois da então recém-criada delegação da Generalitat, ficando responsável pelas pastas da cultura e economia. Foi uma passagem curta, já que o encerramento da delegação em outubro desse ano ditou o fim das suas funções.

Voltou para Moçambique, mas não tardaria a regressar a Portugal. No final de 2018, venceu o concurso público aberto para ser delegado da delegação do governo catalão em Portugal, tornando-se responsável pela sua reabertura.

“Somos dois países com trajetórias comuns, o que levou a que sempre houvesse cumplicidade entre Catalunha e Portugal. Ao longo dos séculos, embora com trajetórias diferentes, tivemos a presença forte da Espanha castelhana.”
Alfred Bosch, conselheiro do governo regional da Catalunha para a Ação Exterior

“Construir ou reconstruir é sempre mais difícil do que destruir. Foi muito fácil para o Governo espanhol fechar as delegações, o que para nós significou começar quase de novo”, diz ao Observador, numa entrevista por telefone, o conselheiro do governo regional da Catalunha para a Ação Exterior, Alfred Bosch. “O Rui já tinha trabalhado como número dois e, agora, recuperou com mais experiência e com muita bagagem. Para nós, é uma sorte. É uma pessoa capaz.”

Alfred Bosch refere ainda que a mensagem da Generalitat pode vir a ser recebida pela população portuguesa, sustentando-se para isso na História de Portugal e da Catalunha e do que entende serem pontos em comum. “Somos dois países com trajetórias comuns, o que levou a que sempre houvesse cumplicidade entre Catalunha e Portugal”, diz. “Ao longo dos séculos, embora com trajetórias diferentes, tivemos a presença forte da Espanha castelhana.”

De acordo com o conselheiro, por causa dos 60 anos de ocupação espanhola em Portugal — entre 1580 e 1640, isto é, terminado há quase quatro séculos —, existe entre os portugueses “uma compreensão muito ampla” da situação na Catalunha. Como exemplo disso, refere um manifesto assinado por mais de 60 personalidades portuguesas — entre eles deputados maioritária mas não exclusivamente à esquerda, além de académicos e intelectuais.

Ao Observador, o conselheiro Alfred Bosch recusa que haja "limitações políticas" para a diplomacia da Catalunha: "Isso seria franquismo" (David Zorrakino/Europa Press via Getty Images)

David Zorrakino/Europa Press via Getty Images

Para já, a delegação da Generalitat não consta na lista disponível no site do Departamento de Ação Exterior do governo regional catalão. Ali, a lista inclui apenas as delegações de representação na União Europeia, França, Reino Unido e Irlanda, Alemanha, Estados Unidos da América, Itália, Suíça e Balcãs. A esta lista poderão ainda juntar-se outras que, tal como a de Portugal, foram anunciadas no final de 2018: países nórdicos (com sede em Estocolmo), países bálticos (com sede em Tallin), mediterrâneo (com sede em Beirute) e Europa Central (com sede em Viena).

Enquanto o governo regional da Catalunha tenta abrir mais, o governo espanhol tenta fechá-las. Em julho, o governo de Pedro Sánchez pediu ao Tribunal Superior de Justiça da Catalunha que encerrasse, como medida cautelar, as delegações do Reino Unido e Irlanda, Alemanha e Suíça, alegando que estas atuavam de forma “lesiva para os interesses do Estado”, que levavam a cabo atividades “com singular intensidade” e que serviam “um projeto secessionista inconstitucional”. O tribunal acabou por rejeitar este pedido, referindo que a queixa era “extemporânea”.

Um elefante na sala chamado “processo independentista”

Rui Reis tem uma pasta aberta, com vários papéis espalhados, quando lhe perguntamos, afinal, o que quer o governo regional da Catalunha de Portugal. O delegado da Generalitat, que começa por falar recorrendo ocasionalmente aos papéis que tem à frente, começa por referir “os interesses da Catalunha”, que coloca em três vertentes: cultural, económica e, por fim, política e institucional.

No âmbito cultural, refere que este 11 de setembro, Dia Nacional da Catalunha e data que assinala a queda das tropas do reino de Aragão (do qual a Catalunha fez parte) em 1714 para as tropas espanholas, a delegação da Generalitat vai organizar “um ato cultural muito interessante”, garante Rui Reis. No mesmo dia, esperam-se centenas de milhares de manifestantes em Barcelona, para a já habitual manifestação pró-independência que organiza a ONG Assemblea Nacional Catalana. No que toca à economia, Rui Reis garante que há contactos com a agência para a competitividade empresarial catalã, a Acció, para que haja incentivos às empresas catalãs que trabalhem com e em Portugal.

“É uma realidade que há pessoas presas por terem exercido os seus direitos fundamentais políticos. São presos políticos. Isto é uma realidade política e nós não estamos aqui para escamotear as realidades.”
Rui Reis, delegado do governo regional da Catalunha em Portugal

Sobre o âmbito cultural e económico, Rui Reis fala com prontidão e desenvoltura. Porém, o tom mais cauteloso toma conta do seu relato quando se trata de falar do elefante nesta sala de reuniões num co-working com nome de unicórnio: o processo independentista. Sempre que lhe perguntamos se é ou não independentista, Rui Reis insiste em guardar as suas opções políticas para si mesmo — mas sublinha que é “a favor do exercício dos direitos fundamentais e um deles é o referendo”.

Seja qual for a sua opinião quanto à questão independentista, Rui Reis garante que a sua delegação não servirá de porta-estandarte da causa: “Nós não somos uma lança do independentismo no estrangeiro”. Porém, o delegado acrescenta que na execução do seu mandato não vai ignorar a questão política catalã — “não, claro que não” — e diz que compete à delegação da Generalitat explicar aquilo que é a “realidade política e institucional da Catalunha”.

“Quando explicamos a realidade política e institucional, estamos a explicar a realidade dos factos. O meu governo é um governo em que as pessoas legítimas para estarem à sua frente não podem fazê-lo porque estão presas”, diz Rui Reis, em alusão a políticos como Oriol Junqueras (ex-vice-presidente do governo regional) ou Raül Romeva (ex-vice conselheiro de Ação Exterior), entre outros, além de Carles de Puigdemont, auto-exilado na Bélgica.

“É uma realidade que há pessoas presas por terem exercido os seus direitos fundamentais políticos. São presos políticos”, continua. “Isto é uma realidade política e nós não estamos aqui para escamotear as realidades.”

Já antecipando a leitura da sentença do julgamento do referendo catalão de 1 de outubro de 2017, prevista para outubro deste ano, Rui Reis admite que haja uma reação da sua parte e da sua delegação, em concertação com o governo regional da Catalunha. “No momento em que for proferida a sentença e virmos o que sai dela, faremos o que for o nosso mandato, ou seja, aquilo que o nosso governo nos pedir”, diz. “A estratégia será definida pelo nosso governo.”

“A administração pública tem de ser politicamente neutra”

De acordo com a lei espanhola e o estatuto da Catalunha, é totalmente legal aquela região ter delegações que a façam representar em todo o mundo — e no contexto internacional não é uma novidade, já que regiões e cidades levam a cabo a sua própria diplomacia, numa atividade academicamente conhecida como “paradiplomacia”.

Porém, entre o que está estipulado nas leis de ação exterior (a que foi aprovada para a totalidade de Espanha e a que diz respeito à Catalunha), e pesando o que diz o Estatuto de Autonomia da Catalunha e a Constituição de Espanha, as delegações catalãs não podem ser utilizadas para fins políticos.

“A lei de ação exterior do Estado, que executa e permite que haja delegações, é clara ao dizer que a ação exterior das comunidades tem de ser leal ao Estado central e tem de responder à ação política do Estado”, sublinha, numa entrevista ao Observador, o professor de Direito Internacional e especialista na política externa catalã Xavier Pons.

“Para uma parte dos catalães, há presos políticos, mas, para outra parte, há políticos presos. Essa designação responde a orientações políticas e os delegados não podem tomar uma posição de que há presos políticos quando há uma parte considerável dos catalães que discorda fundamentalmente disso."
Xavier Pons, professor catedrático de Direito Internacional da Universidade Barcelona

O académico sublinha: “A administração pública tem de ser politicamente neutra. Da mesma forma que o governo tem de ser político, a administração pública tem sempre de ser neutra. Pode até explicar-se o que se passa na Catalunha, mas não se pode utilizar terminologia que pertence a um dos lados da questão”.

Como exemplo, refere-se ao uso da expressão “presos políticos” para falar dos ex-governantes catalães presos preventivamente desde novembro de 2017. “Para uma parte dos catalães, há presos políticos, mas, para outra parte, há políticos presos. Essa designação responde a orientações políticas e os delegados não podem tomar uma posição de que há presos políticos quando há uma parte considerável dos catalães que discorda fundamentalmente disso”, diz o académico da Universidade de Barcelona, que é da opinião de que “tem havido uma utilização política das delegações do governo regional da Catalunha”, referindo que muitas vezes estas atuam no que considera serem “zonas cinzentas” entre o que é permitido e proibido àquelas representações diplomáticas.

Alfred Bosch rejeita esta noção, evocando a liberdade de expressão e política. “Seria um erro pensar que há limitações [para a ação exterior da Catalunha]”, diz. “Isso seria franquismo. Na época de Franco, podíamos sair do país para ir fazer jogos de futebol, mas não para fazer política. Isso já acabou, isso é impossível. Eu faço parte de um governo que tem um programa político e tem as suas convicções. Era só o que faltava sair para o estrangeiro e não poder explicar as minhas convicções e o meu programa.”

“Seria um erro pensar que há limitações [para a ação exterior da Catalunha]. Isso seria franquismo. Na época de Franco, podíamos sair do país para ir fazer jogos de futebol, mas não para fazer política. Isso já acabou, isso é impossível. Eu faço parte de um governo que tem um programa político e tem as suas convicções. Era só o que faltava sair para o estrangeiro e não poder explicar as minhas convicções e o meu programa.”
Alfred Bosch, conselheiro do governo regional da Catalunha para a Ação Exterior

O conselheiro da Catalunha para a Ação Exterior — cargo que, no caso de a Catalunha ser um país independente, equivaleria a ser ministro dos Negócios Estrangeiros — garante: “Não estamos obcecados com uma bandeira ou com um programa político”. Seja como for, além da ação cultural e económica, Alfred Bosch sublinha que da parte das delegações da Generalitat pelo mundo “há muito interesse em explicar a quem nos quiser ouvir qual é a nossa posição política”.

“Estranho seria achar que pode haver aqui censura”, sublinha.

Governo espanhol pediu suspensão da diplomacia catalã

Mais do que em sobreaviso, o Governo espanhol já está agir no sentido de impedir aquilo que entende ser a desvirtuação da política de ação exterior legalmente prevista e reconhecida às comunidades autónomas espanholas.

A 23 de agosto, a porta-voz do executivo espanhol, Isabel Celaá, informou que o governo de Pedro Sánchez iria exigir a Quim Torra que suspendesse a aplicação do Plano Estratégico de Ação Exterior e de Relações com a União Europeia 2019-2022 do governo regional da Catalunha. De acordo com o que disse a ministra e porta-voz do governo, aquele plano “não respeita as competência do Estado em matéria de coordenação da ação exterior” porque “não se refere em ponto algum que a Catalunha é uma comunidade autónoma, favorecendo outras expressões de maior ambiguidade”.

O Governo de Pedro Sánchez pediu ao governo regional catalão que suspendesse o seu programa de ação exterior (Ricardo Rubio/Europa Press via Getty Images)

Ricardo Rubio/Europa Press via Getty Images

Tanto na versão original em catalão como no documento traduzido para inglês (ainda não há versão em castelhano), a Catalunha é referida como um “país” — o que, conceptualmente, exigiria que aquela região tivesse um Estado próprio, que não tem. Essa definição, porém, contrasta com a que é utilizada no Estatuto de Autonomia da Catalunha, onde se lê que a Catalunha comporta uma “nacionalidade” — o que aponta para uma comunidade partilhada, não necessariamente com um Estado próprio. Porém, também por ali se lê que a “Catalunha é um país rico em territórios e gentes”.

Se tudo isto parece confuso, o bate-boca entre governo central e o governo regional catalão só ajuda ainda mais à confusão.

Em abril, o Tribunal de Contas espanhol apurou que 74,3% das atividades da diplomacia catalã “tiveram a finalidade de promover, publicitar, justificar, promover ou impulsionar o processo soberanista”.

“No estatuto da Catalunha, no preâmbulo, a Catalunha é defendida como uma nação. País e nação são um sinónimo”, opina Alfred Bosch. Já Rui Reis é perentório ao dizer que “a Catalunha é uma nação e não é um país”, mas ainda assim são algumas as vezes em que se refere àquela comunidade autónoma como “país” ao longo da nossa entrevista. Já o governo espanhol, pela voz de Isabel Celaá, aponta que o plano para ação exterior “oferece uma projeção da Catalunha como Estado e não se refere em ponto algum à Catalunha como comunidade”.

São poucos os passos da diplomacia catalã que escapam aos olhos mais atentos em Madrid. Em abril, o Tribunal de Contas espanhol recomendou ao Governo central que regulasse os gastos da Generalitat em ação exterior, referindo que 74,3% das suas atividades “tiveram a finalidade de promover, publicitar, justificar, promover ou impulsionar o processo soberanista” — entre as quais contemplava viagens de governantes catalães para conferências.

Porém, além dos olhos atentos em Madrid, haverá também outros, em Lisboa, atentos ao que se fizer na delegação da Generalitat em Portugal: os da Embaixada de Espanha.

Sob o olhar atento (e desagradado) da embaixada de Espanha

A 31 de maio de 2016, estava calor de sobra na sala do ISCTE que acolheu a conferência “A Situação Política na Catalunha: Manutenção do Statu Quo, Federalismo ou Independência?”, que contava com a presença de um rol de académicos portugueses e, como convidado-estrela, o então conselheiro da Ação Exterior da Catalunha, Raül Romeva. Lendo uma intervenção escrita em português, o independentista catalão fez uma intervenção inicial onde referiu que o verdadeiro objetivo da Generalitat era então o de “abrir uma nova etapa democrática” através da “constituição de um Estado próprio”.

Raül Romeva, ex-conselheiro do governo regional da Catalunha para a Ação Exterior, é um dos políticos que aguardam a sentença do julgamento do referendo de 1 de outubro de 2017 (STEPHANIE LECOCQ/EPA)

STEPHANIE LECOCQ/EPA

Ao longo da sessão, não faltaram as vezes em que, tanto a partir da mesa como da plateia, aquele responsável político foi descrito como sendo “ministro”. Esse mesmo facto iria aumentar para o dobro a temperatura naquela sala do ISCTE quando, da plateia, um funcionário da embaixada espanhola pediu a palavra. “Você não é ministro, você é conselheiro!”, disse-lhe em voz alta.

Três anos depois, a tensão só tem como estar ainda mais alta. Ao Observador, o conselheiro de comunicação da Embaixada de Espanha em Lisboa, Agustin Galán, promete uma postura vigilante às atividades da delegação catalã. “Vamos informar-nos bem de tudo o que acontecer”, garante. “No caso de haver irregularidades, informaremos as autoridades espanholas e as autoridades de Portugal, que tem um governo amigo e democrático.”

Agustin Galán diz que a delegação da Generalitat tem “o dever de cumprir as leis”, referindo que “isso implica que qualquer pessoa que venha para cá trabalhar a ser paga pelo dinheiro de todos os catalães terá de representar todos os catalães e não apenas aqueles que querem a independência da Catalunha”.

O conselheiro de comunicação queixa-se também de que, até agora, ninguém da delegação catalã se apresentou na Embaixada de Espanha. “Ainda não cumpriram essa obrigação, que, além de ser legal, seria da mais básica cortesia apresentarem-se à embaixadora de Espanha”, diz.

Quanto a esta questão, Rui Reis confirma que ainda não contactou a embaixada espanhola. “Estamos abertos ao diálogo com todos, com toda a gente. Nisso, enquadra-se também a Embaixada de Espanha. Não falámos porque ainda não houve oportunidade”, garantiu. Ainda assim, referiu que “há dias” enviou um convite à embaixadora espanhola, em Portugal, Marta Betanzos Roig, para as festividades que assinalam o Dia Nacional da Catalunha, este 11 de setembro.

Quando lhe perguntámos se acreditava que esse convite teria resposta, Rui Reis riu-se e, evasivo, respondeu: “Pode vir a embaixadora ou qualquer outra pessoa da embaixada. Serão bem recebidos”.

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