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O antigo piloto é presença assídua em todas as corridas do Mundial de Fórmula 1
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O antigo piloto é presença assídua em todas as corridas do Mundial de Fórmula 1

SOPA Images/LightRocket via Gett

O antigo piloto é presença assídua em todas as corridas do Mundial de Fórmula 1

SOPA Images/LightRocket via Gett

"Fui a mais funerais do que qualquer outro". As memórias de Jackie Stewart, entre a dor de perder amigos e a amizade com Grace Kelly

Foi amigo de Grace Kelly, era próximo de George Harrison, conduzia com Paul Newman. Ao Observador, o tricampeão mundial de F1 Jackie Stewart recorda os "altos e baixos" de ser piloto nos anos 60 e 70.

É uma figura que não escapa aos olhares mais atentos às etapas do Campeonato do Mundo de Fórmula 1. De calças a condizer com o padrão da boina, numa clara recordação da Escócia onde nasceu, Jackie Stewart é presença assídua em praticamente todas as corridas, um pouco por todo o mundo, e Portugal não foi exceção. O ano de 2020, porém, obriga a uma alteração na indumentária: além das calças e da boina, agora também a máscara combina com o mesmo padrão xadrez.

Aos 81 anos, Sir Jackie Stewart é o único campeão do mundo nos anos 60 ainda vivo. Venceu o Mundial de Fórmula 1 três vezes — 1969, 1971 e 1973 –, ficou outras duas no segundo lugar e conquistou a alcunha “The Flying Scot”, o Escocês Voador. Foi mecânico antes de ser piloto, competiu pela BRM, pela Matra, pela March e pela Tyrrell e nunca deixou a modalidade depois de terminar a carreira: esteve ligado à Ford durante décadas, fundou a própria equipa, a Stewart Grand Prix (que só durou três anos e não teve muito sucesso), e é ainda parceiro de marcas que são ou foram fulcrais para a Fórmula 1, como a Rolex, a Heineken e a Moët & Chandon.

[Ouça aqui o podcast “Grelha de Partida” da Rádio Observador, sobre o Grande Prémio de Portugal em Fórmula 1:]

Fórmula 1 em Portimão. “Os pilotos vão adorar”

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Conhecido na cultura pop por ter sido o primeiro piloto a atirar champanhe depois de uma vitória — inicialmente, foi um acidente –, Jackie Stewart foi um dos grandes responsáveis pela melhoria das condições de segurança dos pilotos de Fórmula 1. O britânico, que já foi o dono do recorde que Lewis Hamilton pode bater em Portugal este domingo (maior número de vitórias na modalidade), acabou a carreira na véspera de cumprir o centésimo Grande Prémio porque François Cevert, seu protegido, morreu em pista nesse fim de semana. Jackie não se arrepende, diz que foi a decisão certa e lembra que deve ter ido a mais funerais do que qualquer outra pessoa.

Mas recorda os anos 60 e 70 com nostalgia, um “tempo de mudança”, em que a Fórmula 1 se fundia com a música, o cinema e as artes. Recorda os serões com Grace Kelly, a amizade com George Harrison e as saídas para conduzir com Paul Newman. Em conversa com o Observador, Jackie Stewart, que nunca competiu em Portugal mas garante que vai trabalhar para que Portimão entre no circuito permanente da Fórmula 1, lembra que “ganhar não é suficiente”.

Stewart & Tyrrell At Grand Prix Of France

O piloto britânico foi campeão três vezes em nove anos e ficou em segundo noutras duas ocasiões

Getty Images

Foi piloto de Fórmula 1 nos anos 60 e 70. É o mais próximo que alguém pode estar de ter sido um Beatle?
Sim! E eu até era muito próximo dos Beatles, conhecia o George Harrison, era um dos meus melhores amigos. Acho que foi uma era muito colorida, muito entusiasmante, para a geração que era jovem naquela altura. Foi um período muito entusiasmante no mundo inteiro. O cinema, a moda, as artes, a música. Ainda tínhamos o Sinatra, apareceram os Beatles… Foi um período maravilhoso. Foi um tempo entusiasmante e glamoroso, os cabelos compridos… Era um mundo novo, uma geração nova.

Era quase como ser uma rockstar?
Era como isso, sim, um bocadinho. Os rapazes competiam para ver quem tinha as maiores suíças. Não sei se chegava à rockstar mas era glamoroso, sim. Foi uma geração que quebrou com o establishment que existia. Os pilotos mais antigos perguntavam-se: ‘O que é que eles estão a fazer com aqueles cabelos compridos?’. Era um tempo de mudança, um tempo de alterações, um tempo de glamour. A Playboy apareceu! A revista apareceu. Era um tempo entusiasmante.

Depois da morte de John Surtees, em 2017, é o único campeão dos anos 60 que ainda está vivo. Sente-se um símbolo dessa geração?
Eu não tinha e não tenho grande consciência de estar nessa posição. Eu estava só a fazer o que tinha de fazer. Tinha uma família maravilhosa, uma mulher maravilhosa, um dono de equipa maravilhoso, os melhores mecânicos. A minha vida, naquela altura, era incrível. Estava a viver uma vida incrível. Foi excitante. Viajar estava a tornar-se mais dinâmico, o [Boeing] 747 apareceu, os autocarros de dois andares também. Se viajássemos em primeira classe num avião, tínhamos direito a um quarto.

"Acho que foi uma era muito colorida, muito entusiasmante, para a geração que era jovem naquela altura. Foi um período muito entusiasmante no mundo inteiro. O cinema, a moda, as artes, a música. Ainda tínhamos o Sinatra, apareceram os Beatles... Foi um período maravilhoso".

Lembrava-se de que era um emprego? Ou nem sequer parecia trabalho?
Não parecia nada um emprego! Era quase como um tapete mágico. Ia a imensos sítios diferentes, estava a conhecer monarcas, algumas das pessoas mais poderosas do mundo, presidentes dos Estados Unidos, primeiros-ministros. E superstars. Quer fosse da música ou dos filmes. A Grace Kelly! Umas das mulheres mais bonitas do mundo e eu conheci-a muito bem. Eu e a minha mulher íamos visitá-los, a ela e ao Príncipe Rainier. Isso já não acontece! Vivi num tempo em que o glamour e a cor eram desejados. As pessoas tinham vivido num mundo aborrecido e, de repente, os Beatles apareceram. E eram incríveis. E depois os [Rolling] Stones! Foi um período maravilhoso de transformação.

Foi um dos grandes impulsionadores do aumento da segurança no automobilismo. Atualmente, muitos puristas da modalidade dizem que a Fórmula 1 perdeu dinâmica e interesse por ser muito aborrecida, por não existir risco suficiente. Como é que olha para essas opiniões?
Continua a existir muito risco. Continua a ser um desporto extremamente perigoso. Mas agora os carros são mais seguros. Os bombeiros estão melhor preparados, os pilotos também. Não vemos a morte da forma que eu vi. Eu vi quase todos os meus amigos morrerem em pista. Foi um período negro nesse aspeto. Provavelmente, fui a mais funerais do que qualquer outra pessoa que conheço. Porque eram todos meus amigos. E morreram todos na pista. Foi uma fase que teve altos e baixos. Tal como a minha vida, que também teve altos e baixos. Mas como era tricampeão mundial, eu estava a ter privilégios que mais ninguém tinha.

Jackie Stewart (R), triple Formula One c

Com Grace Kelly e o Príncipe Reinier do Mónaco, de quem era amigo próximo. Helen, a mulher de Jackie Stewart, está à esquerda na fotografia

AFP via Getty Images

Sentia-se invencível?
Não, nunca. Existia sempre alguém a tentar bater-me. Havia sempre alguém que eu achava que era melhor do que eu. Ganhar não é suficiente.

Esse é o título da sua autobiografia, “Ganhar não é suficiente”.
Exato, exato. Há tanto para lá disso. A importância de nos relacionarmos com diferentes pessoas, com diferentes nacionalidades, com diferentes pessoas. Diferentes desejos. E eu vivi nessa altura, na altura da mudança, mudança rápida em quase tudo. Não existia aborrecimento. E as pessoas eram entusiasmantes. Como o George Harrison, o rei Hussein da Jordânia era dos meus amigos mais próximos, um homem super dinâmico, fantástico. Como eu era o campeão do mundo, como estava envolvido nesse processo de tornar a Fórmula 1 mais segura, de mudar o desporto, acabava por estar sempre perto de pessoas muito importantes.

Que tipo de pessoas importantes?
O Paul Newman tornou-se um bom amigo! Passei muito tempo com o Paul Newman porque ele era um bom piloto mas queria ser um piloto melhor. Ele aparecia e eu passava dias com ele, só os dois, a conduzir. Sei lá… O Sean Connery, também é um amigo próximo. São pessoas excecionais. É uma coisa natural. Quanto mais sucesso tivermos, mais as pessoas também ficam intrigadas connosco.

"Não parecia nada um emprego! Era quase como um tapete mágico. Ia a imensos sítios diferentes, estava a conhecer monarcas, algumas das pessoas mais poderosas do mundo, presidentes dos Estados Unidos, primeiros-ministros".

Que avanço tecnológico de que os pilotos usufruem hoje em dia é que gostava de ter tido na altura?
A única coisa é mesmo a segurança. Acabamos de ver um incêndio e o piloto saiu de lá ileso [o incidente com Pierre Gasly na segunda sessão de treinos]. No meu tempo, isso não tinha acontecido. A segurança em pista… Os meus amigos morreram todos, mais uma vez. Estes miúdos não sabem o que é o luto. Eu soube o que era o luto. Mas é preciso ultrapassar o luto, lidar com o luto, ir a todos os funerais. É preciso consolar o pai, a mãe, o irmão e a irmã, a mulher. Isso coloca-nos a vida toda em perspetiva. A dada altura, parecia que era como a guerra. Como quando os soldados vão para a guerra e no minuto seguinte o melhor amigo morre à frente deles, por causa de uma bomba ou algo assim. Eram altos e baixos, lá está. Num minuto, estávamos no céu; no outro, estávamos no inferno.

Se pudesse estalar os dedos e viajar no tempo, voltava àquela época?
Eu gosto de onde estou hoje. Tive um tempo maravilhoso, acho que não poderia ter tido uma janela temporal melhor. E repito: teve tudo altos e baixos. Hoje é tudo mais plano. Mas não posso dizer que não seja entusiasmante. Hoje estou aqui e estou entusiasmado, viajei para Portugal e estava entusiasmado. Isso ainda continua.

François Cevert, Jackie Stewart, Grand Prix Of Sweden

Com François Cevert (esquerda), o piloto francês que morreu em pista na antecâmara daquele que seria o 100.º GP da carreira de Stewart

Getty Images

Terminou a carreira na véspera daquele que seria o seu 100.º Grande Prémio devido à morte de François Cevert, em 1973, de quem era colega de equipa. Alguma vez se arrependeu dessa decisão?
Não. Era um dos meus melhores amigos. Era um homem maravilhoso, um tipo ótimo, o meu protegido. Foi um fim frio e cruel. Senti que Deus me tinha dado uma pancada. Aprendi aí a não tomar nada como garantido. Ele morreu à minha frente. E eu podia ter feito o meu centésimo Grande Prémio mas achei que, por respeito a ele, não devia correr. E foi a decisão certa. Nunca me arrependi. Sei que fiz a coisa certa.

O que é que ainda lhe falta fazer?
Faltam-me muitos anos! Tenho nove netos, tenho dois cachorros, sou casado há 58 anos. Tenho muitos anos pela frente.

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