É mesmo para voltar a fechar. António Costa já o tinha dito esta quinta-feira e hoje confirmou aos partidos com quem reuniu durante toda a tarde. O número de contágios pelo novo coronavírus disparou de 4 mil para 10 mil em apenas dois dias e é preciso travar a fundo ou o SNS não aguenta. “Não há mesmo margem”, ouviu o Observador de uma fonte partidária presente nas reuniões: é para fechar. O confinamento será geral, “tipo março”, estando o Governo apenas na dúvida sobre se “poupa” alguns setores de pequeno comércio de rua ou não. E o Governo não quer esperar mais: é para fechar já na próxima quarta-feira, dia 13, depois da reunião com peritos na sede do Infarmed, prevista para o dia anterior. Só as escolas escapam.

Foi isso que o Governo perguntou aos partidos que ouviu esta tarde em São Bento: se se oporiam a que fossem queimadas algumas etapas de calendário para, em vez de esperar pelo dia 15 de janeiro (dia em que termina o atual estado de emergência), o Governo tivesse luz verde para agir uns dias antes. O PSD não se opôs: “Se as medidas tiverem de entrar mais cedo, se o estado de emergência tiver de ser ajustado mais cedo, apoiamos”, disse Rui Rio à saída.

Por quanto tempo é que vai vigorar o novo confinamento é que não se sabe. Ao Observador, uma fonte partidária afirma que ficou com a perceção, na reunião, que “nunca será menos de um mês”. “É para 15 dias, para já, mas depois é para calibrar”, diz a mesma fonte, afirmando que o Governo deu a entender que está ainda a equacionar deixar algum pequeno comércio aberto, ou começar a abrir (“como aconteceu em maio”) nos 15 dias seguintes, depois de reavaliada a situação.

O PSD, que receia uma nova onda na altura da Páscoa, questionou o Governo sobre qual era a perspetiva do executivo em relação à duração do confinamento, tendo a resposta sido “duas semanas, eventualmente mais”. Certo é que, apesar de a taxa de contágio ser revelada por concelho (e apesar de haver neste momento 25 concelhos com risco mais moderado de contágio), o confinamento será para todo o território continental. Isto significa restaurantes só abertos para entregas ao domicílio ou take away, centros comerciais fechados, comércio fechado, apenas supermercados, farmácias e equivalentes abertos. E as escolas. Por outro lado, também tal como nos meses do primeiro confinamento, a indústria, a construção civil e o retalho alimentar deverão continuar a funcionar.

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PSD com dúvidas sobre opção de manter escolas abertas, quer professores a ser testados semanalmente

Afastado do cenário está, para já, o encerramento das escolas. O PSD foi o único dos partidos ouvidos esta sexta-feira a duvidar dessa opção do executivo, uma vez que para os alunos frequentarem as escolas é necessário haver mobilidade e pais a transportá-los diariamente, com o PCP a reforçar essa decisão notando a necessidade de manter “crianças e jovens nas escolas”.

Segundo fontes presentes nas reuniões contactadas pelo Observador, o Governo alega que os dados que tem apontam para uma reduzida taxa de “contágio e de letalidade” no contexto escolar, baseando-se nisso para defender a manutenção das escolas abertas, assim como no efeito “devastador” para a aprendizagem dos alunos que teria um novo fecho das aulas presenciais. E para a economia. Aos jornalistas, após uma reunião da concertação social, o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, salientou o “significativo” impacto “social e até económico” de um eventual encerramento das escolas.

O PSD duvida da estratégia e desafiou, na audição em São Bento, o Governo a testar semanalmente os professores, mas não obteve resposta. A decisão, contudo, só será tomada na terça-feira, dia 12, depois da reunião com os especialistas na sede do Infarmed. Isto porque o Governo ainda tem “uma pequena esperança” de que este salto enorme nos contágios possa ser efeito pontual do facto de os portugueses terem adiado a realização de testes por causa da quadra festiva e estarem a fazer os testes agora. “Mas nem o Governo acredita muito nisso”, desabafa uma fonte partidária.

Serão os números de novos infetados dos próximos quatro dias a determinar a dureza das medidas e o prazo para serem implementadas — porque são os próximos dias que vão determinar se o crescimento dos contágios é fruto de um episódio pontual ou se é mesmo o novo padrão. Se assim for, para a semana o número de novo contágios pode chegar aos 15 mil casos diários, acredita o Governo.

No que diz respeito ao impacto na economia, Rui Rio não deixou de lado os impactos que um novo confinamento terão nas empresas e na malha empresarial. Preocupação partilhada pelos partidos que foram esta sexta-feira a Belém. Ainda na direita, o CDS criticou o Governo por continuar “a correr atrás do prejuízo” e por ter mantido uma “convivência socialística com o vírus” desde o início da pandemia do país. Já o PCP concorda com a manutenção das escolas em regime presencial. No final da reunião com António Costa, o secretário-geral do PCP Jerónimo de Sousa disse que se deve evitar “a proibição pela proibição” e defendeu que é importante que “as crianças e jovens tenham as escolas a funcionar”.

Governo prepara reforço dos apoios sociais e às empresas

Com as novas (e mais apertadas) restrições à vista, o ministro da Economia já assegurou que os apoios aos trabalhadores independentes e aos sócios-gerentes, assim como às empresas que tenham de fechar por lei, serão reforçados. “Se vamos ter um período de 15 dias com mais restrições é preciso reforçar obviamente os apoios nestas matérias”, disse, após a reunião da concertação social, onde o Governo debateu com os parceiros sociais as novas medidas restritivas. Esse reforço será essencialmente feito em três frentes.

Segundo o ministro, as empresas obrigadas a encerrar poderão aceder ao regime do layoff simplificado, como aconteceu nos meses de confinamento e se mantém, por exemplo, para as discotecas. Já os trabalhadores têm os salários garantidos a 100%, sem que isso implique mais encargos para o empregador. As empresas que estão no apoio à retoma progressiva podem manter-se nesse regime.

Além disso, haverá um reforço do programa Apoiar (um apoio a fundo perdido às empresas com quebras de faturação) destinado às atividades “que possam ser objeto de restrição”. O valor de reforço ainda não está estabelecido, mas “durante a próxima semana aprovaremos e publicaremos a portaria de alteração do programa Apoiar para contemplar estas alterações”, disse Siza Vieira. A ideia é que o novo montante do apoio esteja já refletida na segunda tranche do Apoiar pago às empresas que já estão abrangidas ou nas novas candidaturas.

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Também serão majorados os apoios a trabalhadores independentes, sócios-gerentes e trabalhadores do serviço doméstico, retomando “o mecanismo de apoio que tivemos em abril ou em maio” (entre 219 euros e 665 euros), precisou, por sua vez, a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho. Estes apoios excecionais vão vigorar enquanto durarem as medidas mais restritivas que estão a ser preparadas e vão conviver com o novo apoio social ao rendimento dos trabalhadores, que já tinha sido aprovado no Orçamento do Estado para 2021.

Nova estirpe “não está relacionada” com aumento abrupto dos contágios

Aos partidos, António Costa e Marta Temido deram a entender que não estão a trabalhar no cenário em que é a nova variante do vírus que está a provocar o aumento abrupto dos contágios. Embora haja casos da nova estirpe em Portugal: “Disseram-nos que não era isso que estaria a dar origem ao aumento”, afirmou uma fonte partidária ouvida pelo Observador.

A ideia é que a nova variante do vírus está a chegar a Portugal vinda do Reino Unido, e tem uma taxa de transmissibilidade mais elevada, mas os casos presentes no país “são quase todos importados do Reino Unido”, para já. Essa foi uma questão também levantada pelos partidos dentro de portas, uma vez que na África do Sul provou-se que a nova variante atinge sobretudo os mais jovens e, assim sendo, a medida de manutenção das escolas abertas poderia tornar-se mais perigosa.

Para já, contudo, não é nesse cenário que o Governo está a trabalhar, embora tenha pedido aos peritos do Infarmed para dedicarem uma parte da reunião a fazer o ponto da situação específico sobre a evolução da nova variante em território nacional.

Eleições presidenciais não serão adiadas (só PSD o defende)

Com boa vontade, “consenso e bom senso” Rui Rio achou que podia chegar-se a algum acordo para adiar as eleições presidenciais do próximo dia 24. Mas os partidos que se seguiram deixaram os sociais-democratas sozinhos nessa intenção. Uns argumentaram com a Constituição, outros com as ferramentas de que o Governo já dispõe e que permitiram, por exemplo, as eleições na Região Autónoma dos Açores.

Ao início da tarde Rui Rio colocou dois cenários em cima da mesa. Caso o país fique confinado totalmente nas próximas duas semanas, não haveria campanha eleitoral, mas a eleição já seria realizada fora desse confinamento ou, caso o confinamento seja alargado a “duas ou três semanas” poderia afetar ainda a data marcada para as eleições.

Do PSD e “caso algum candidato levante essa questão”, anunciava Rio, havia abertura para chegar a um adiamento das soluções, confiando o “consenso e bom senso” de todos os candidatos envolvidos na corrida presidencial de não ter um país confinado e depois “pessoas aos montes em ações de campanha”.

Mas a tentativa de “consenso” foi curta com o PCP, que apoia o candidato João Ferreira, a recordar que durante o estado de emergência não pode haver alterações à Constituição. Questionado sobre a hipótese levantada por Rio, Jerónimo de Sousa disse “estranhar” a disponibilidade demonstrada pelo líder do PSD.

“É sabido que em relação à questão do adiamento das presidenciais colide com o principio consagrado no estado de emergência em que não pode haver alterações à Constituição da República Portuguesa”, afirmou Jerónimo de Sousa colocando o PCP de fora de um acordo para alterar a Constituição. Sobre um eventual adiamento, Jerónimo questionou: “para quando?”

Já o CDS respondeu com a capacidade do Executivo: “Acreditamos que o Governo tem à sua disposição todos os elementos para garantir a segurança do ato eleitoral e manter a normalidade constitucional, assim queira fazê-lo para bem de todos os portugueses”.