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A tensão está instalada entre professores e Ministério da Educação. A ronda negocial, que começou em setembro, parecia correr bem e o novo ministro, João Costa, prometia melhorar a vida dos professores, com mudanças nos concursos de contratação, acabando com o que chamou de “casa às costas”.
À medida que as propostas do Governo foram ficando mais claras, principalmente nas áreas em que as competências da Educação passam para as autarquias, a contestação subiu de tom. Os sindicatos são há muito contra a municipalização, e a ideia de parte do corpo docente poder ser contratado diretamente pelas escolas também não agradou — confiam mais na habitual tabela de graduação que ordena os professores, indicando quem deve ser contratado em primeiro lugar.
Com as greves a mutiplicar-se — uma delas convocada por tempo indeterminado —, a tutela pôs em causa a legalidade dos protestos, pediu pareceres jurídicos, para os quais o Presidente da República sugeriu celeridade. Já a principal confederação de pais quer serviços mínimos nas escolas (pedido de legalidade duvidosa para alguns juristas) de forma a garantir que as crianças podem ser deixadas nos estabelecimentos de ensino em segurança.
A última gota de água caiu enquanto os professores acampam à porta do ministério: João Costa quer investigar o fundo de maneio que alguns professores estarão a tentar criar, à margem dos sindicatos, para garantir que os assistentes operacionais fazem greve. É que quando estes faltam, as escolas têm mesmo de encerrar, o que nem sempre acontece quando a greve é só dos professores.
Quando é que vai haver greve de professores?
Há várias greves convocadas por diferentes sindicatos. Na segunda-feira arranca a greve distrital, organizada por oito estruturas, entre elas a Fenprof, o sindicato mais representativo de professores em Portugal. A FNE, a segunda maior federação de sindicatos, não se juntou à convocatória.
Assim, além de outras paralisações já convocadas, a greve nacional de professores e educadores vai decorrer de 16 de janeiro a 8 de fevereiro. A cada dia, a greve de 24 horas centra-se apenas num dos 18 distritos do continente. Começa em Lisboa (16 janeiro) e termina no Porto (8 fevereiro), e segue os restantes distritos por ordem alfabética
Moro em Viseu. Quando é que a greve chega às escolas do meu distrito?
Começando por V, Viseu está mesmo no fim do calendário de greves, sendo a última paralisação no continente, antes do Porto. A ordem é a seguinte:
Janeiro:
- 16 — Lisboa;
- 17 — Aveiro;
- 18 — Beja;
- 19 — Braga;
- 20 — Bragança;
- 23 — Castelo Branco;
- 24 — Coimbra;
- 25 — Évora;
- 26 — Faro;
- 27 — Guarda;
- 30 — Leiria;
- 31 — Portalegre.
Fevereiro:
1 — Santarém;
2 — Setúbal;
3 — Viana do Castelo;
6 — Vila Real;
7 — Viseu;
8 — Porto.
Mas já havia outras greves agendadas? A professora da minha filha tem faltado à primeira hora do dia…
Desde que arrancou o segundo período, a 3 de janeiro, várias escolas têm fechado por causa de greves. Há diferentes protestos a decorrer. O STOP — Sindicato de Todos os Professores convocou uma greve por tempo indeterminado, que arrancou no ano passado, a 9 de dezembro. Além dos professores, estes pré-avisos incluem também trabalhadores não docentes.
Segundo período letivo arranca esta terça-feira com greves de professores
Outra greve — apenas parcial — foi convocada pelo SIPE — Sindicato Independente dos Professores e Educadores. Neste caso, os professores que aderirem à greve faltam apenas ao primeiro tempo letivo do dia. Dependendo do horário dos professores, a sua hora de greve cairá em diferentes momentos do dia.
Há ainda uma greve da Fenprof que já atravessou vários anos letivos: a paralisação ao sobretrabalho e às horas extraordinárias, que permite aos professores recusarem trabalho fora do seu horário normal. Este ano letivo, começou logo a 24 de outubro.
Tenho ideia de que me disseram que estas greves vão durar para sempre. É verdade?
Para sempre não será a forma mais correta de colocar a questão, mas, de facto, a greve do STOP foi assumidamente convocada por tempo indeterminado. As negociações com o Ministério da Educação poderão mudar isso.
Quem é que as convoca?
Sindicatos diferentes têm greves diferentes. A que arranca segunda-feira — e que se prevê que venha a ter maior adesão — é convocada por ASPL, Fenprof, Pró-Ordem, SEPLEU, SINAPE, SINDEP, SIPE e SPLIU.
O que dizem os professores sobre os protestos sobrepostos?
Um grupo de professores, cerca de meia centena, lançou um abaixo-assinado na terça-feira, 10 de janeiro, apelando à unidade sindical. “Nós, professores e educadores, sindicalizados ou não, estamos convictos de que tudo nos une e pouco nos separa. Acreditamos que é hora de todas as organizações sindicais convergirem e se unirem nas lutas, pois juntos seremos sempre muito mais fortes.” Na sexta-feira de manhã tinha passado as 1.700 assinaturas. Há cerca de 132 mil professores em Portugal.
Além da greve, os professores vão fazer mais algum protesto?
Até esta sexta-feira, um grupo de professores, liderados por Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, esteve acampado em frente ao Ministério da Educação, em Lisboa. As oito estruturas que apoiam a greve que arranca segunda-feira, 16 de janeiro, têm também agendada uma manifestação nacional de professores e educadores para 11 de fevereiro.
Este sábado, convocada pelo STOP, há uma manifestação de professores em Lisboa, a segunda vez em menos de um mês.
E o resto do pessoal que trabalha nas escolas?
O pessoal não docente, que inclui, entre outros, os assistentes operacionais, está abrangido pela greve do STOP, aquela que não tem data para terminar.
Pelo contrário, a greve da Fenprof (e de mais sete sindicatos) apenas abrange os professores na possibilidade de não se apresentarem nas escolas. O pessoal não docente não está incluído na greve de 24 horas.
O que dizem as associações de pais sobre as paralisações?
Num comunicado disponível no site da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), e embora frisando que “não questiona o direito à reivindicação dos professores e demais agentes educativos”, os encarregados de educação pedem a intervenção do ministro João Costa.
“A Confap entende que, perante os pré-avisos de greve que se encontram publicados pelos diversos sindicatos e pela duração que as mesmas apresentam, o governo deve, com urgência, decretar serviços mínimos e adequados a que os alunos possam permanecer no interior da escola em condições de segurança e com o direito à refeição.”
Associações de pais preocupadas com as escolas devido às greves querem serviços mínimos
Foram tomadas outras posições pelos encarregados de educação?
Há uma petição a correr, que sexta-feira de manhã tinha mais de 11 mil assinaturas, entre os grupos informais de pais, grupos de WhatsApp e nas redes sociais, onde se escreve que a luta dos professores não é nem contra os pais nem contra os seus filhos. “Estas pessoas, que também trabalham para sustentar as suas famílias, lutam por uma vida melhor”, lê-se na petição.
No entanto, é impossível saber se as assinaturas são de encarregados de educação ou, por exemplo, dos próprios professores. A petição termina com um apelo: “Ajudemos os nossos professores para que eles possam ajudar os nossos filhos a serem as melhores pessoas que podem ser.”
A ideia de serviços mínimos nas escolas é possível?
Dificilmente. Os serviços mínimos têm de ser definidos até três dias após a entrega do pré-aviso de greve e as situações em que podem ser requeridos está legislada. Já o direito à greve está consagrado na Constituição da República Portuguesa. Apesar disso, o Ministério da Educação têm dúvidas e pediu um parecer técnico sobre a legalidade dos protestos.
Os juristas Rita Garcia Pereira e Fausto Leite consideram que o Governo deveria ter antecipado a situação e organizado serviços mínimos. Mas “serviços mínimos não são serviços máximos”, ou seja, não servem para garantir que todos os alunos têm todas as aulas, defendeu a jurista.
Juristas criticam tutela por não ter pedido serviços minimos nas escolas
Já António Garcia Pereira acredita que a atual greve dos professores é legal e não permite a definição de serviços mínimos.
Isso quer dizer que a legalidade da greve está em causa?
Quer dizer que o Ministério da Educação tem dúvidas. Assim, a 11 de janeiro, a equipa do ministro João Costa pediu pareceres jurídicos à Procuradoria-Geral da República e ao Centro de Competências Jurídicas do Estado sobre a legalidade da forma de execução das greves. Em causa estão as greves do STOP e do SIPE.
O Presidente Marcelo não disse que as escolas deviam estar a funcionar?
Não foi exatamente isso. Questionado pelos jornalistas, o que o Presidente da República disse foi que estamos “num período crucial em termos de ano letivo” e que “é fundamental que haja condições para que as escolas possam funcionar”. Assim, a 12 de janeiro, Marcelo Rebelo de Sousa dizia esperar uma clarificação legal rápida sobre a greve. No entanto, considerou que esse pedido devia ter sido feito com antecedência.
“Tudo o que possa ser uma clarificação rápida do que é legal ou não é legal [na greve dos professores] e se é possível ou não haver serviços mínimos é fundamental”, concluiu.
Enquanto não há parecer, o Ministério deu ordem às escolas de como agir?
Sim. Foi enviada na quarta-feira uma comunicação aos diretores de escolas pela DGEstE — Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares. Em resumo, diz aos diretores que devem “garantir, em todos os momentos, a abertura dos estabelecimentos escolares, acolher os alunos assegurando a sua segurança e bem-estar no interior das instalações das escolas, afetando, para tal, os necessários meios humanos disponíveis nos respetivos agrupamentos e escolas não agrupadas”.
Em declarações ao Público, o diretor geral, João Miguel Gonçalves, argumentou ter recebido diversos pedidos de orientação das escolas. No documento, a DGEstE lembra que os grevistas não podem ser substituídos e que as escolas devem assegurar “as condições necessárias para a prestação de trabalho por parte dos elementos do pessoal docente e do pessoal não docente que não adiram à greve.”
Os diretores de escolas aceitaram as indicações?
O presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE) considerou o documento “inócuo” por se limitar a repetir aquilo que as escolas já fazem, mas, ao mesmo tempo, disse ser uma pressão sobre as escolas. “Em nenhuma circunstância deixaremos de cumprir a lei. Em nenhuma circunstância boicotaremos quem está em greve, são direitos inalienáveis. Em nenhuma circunstância iremos deixar alunos abandonados na rua”, afirmou Manuel Pereira, citado pelo Público.
O que se passa com os fundos de greve?
As denúncias chegaram ao Ministério da Educação e o gabinete de João Costa decidiu investigá-las. Em causa está uma espécie de fundo de greve — mecanismo previsto na lei, com regras próprias — para angariar dinheiro de forma a que os assistentes operacionais possam fazer greve. A notícia é avançada pelo Público, que cita fonte oficial do ministério.
Quando se faz greve, esse dia é descontado do ordenado, o que pode impedir alguns trabalhadores de participar nas paralisações, por questões económicas. Para possibilitar a adesão à greve de um maior número de profissionais que pudessem não aderir à paralisação precisamente por questões económicas, em algumas escolas os professores estarão a criar um fundo de maneio para pagar o dia aos assistentes operacionais. “Caso se verifique a ilegalidade da recolha e aceitação de dinheiro neste contexto”, o Ministério da Educação afirmou que serão extraídas “as devidas consequências legais”, atuando-se “em conformidade”.
Fundos de greve nas escolas investigados pelo Ministério da Educação
Os sindicatos e o Ministério da Educação não têm tido reuniões?
Há vários meses que as reuniões decorrem entre professores e tutela, estando ainda em fase negocial, ou seja, nem as negociações encerraram nem se chegou a nenhum acordo. No entanto, há propostas dos dois lados em cima da mesa e os sindicatos não têm recebido com entusiasmo as propostas do Ministério da Educação. Em relação a algumas questões abordadas nesse processo negocial, foi lançado um ultimato, dando ao ministro João Costa até 10 de janeiro para responder.
Esse encontro não aconteceu e a resposta da tutela não foi apresentada, mas os sindicatos foram chamados para uma terceira ronda negocial entre 18 e 20 de janeiro. Na ótica dos sindicatos, e como referiu Mário Nogueira, agendar uma reunião não é suficiente para travar os protestos em curso.
O que é que os professores contestam?
A mudança na forma de contratar professores é o que tem gerado mais contestação — apesar de haver outras matérias que geram desconforto. No que diz respeito à contratação, está em causa a ideia de que parte dos docentes poderão ser contratados diretamente pelas escolas. Desta forma, os diretores poderão procurar professores com um determinado perfil, em vez de seguir a tradicional lista de graduação, que coloca os professores por ordem de uma nota (que leva em conta anos de serviços, avaliações, entre outros).
Governo vai apresentar propostas “mais além” do que os professores pedem
Entretanto, o ministro João Costa garantiu que nas próximas reuniões vai ter propostas para a revisão do regime de recrutamento e mobilidade que oferecem mais do que àquilo que os professores pedem. “Vamos apresentar uma proposta bastante mais além do que aquilo que os sindicatos nos responderam, de reduzir significativamente as zonas pedagógicas para evitar deslocações muito grandes dos professores dentro do território”, disse o ministro.