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Fora do governo, cresce a contestação nas ruas, principalmente após este fim de semana as Forças de Defesa de Israel terem encontrado seis corpos de reféns num túnel em Rafah, no sul de Gaza, sequestrados a 7 de outubro

Anadolu via Getty Images

Fora do governo, cresce a contestação nas ruas, principalmente após este fim de semana as Forças de Defesa de Israel terem encontrado seis corpos de reféns num túnel em Rafah, no sul de Gaza, sequestrados a 7 de outubro

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Greves, protestos e Biden impaciente. De olhos postos no "corredor de Filadélfia", Netanyahu resiste a acordo de cessar-fogo

Governo israelita rejeita cessar-fogo se não mantiver o controlo do Corredor de Filadélfia, a faixa de 14 quilómetros entre Egito e Gaza. Mas greves e protestos podem aumentar pressão sobre Netanyahu.

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Aeroportos congestionados. Estradas bloqueadas. Hospitais em serviços mínimos. Alguns bancos e até centros comerciais encerrados. A greve geral convocada pelo maior sindicato em Israel afetou o quotidiano dos israelitas até ao início da tarde desta segunda-feira. Ao mesmo tempo, milhares de pessoas saíram às ruas para protestarem e pedirem um acordo ao governo de Benjamin Netanyahu que chegue ao cessar-fogo e que permita a libertação dos reféns que ainda se mantêm na Faixa de Gaza. No entanto, o executivo não parece ceder num ponto que também aparenta ser inegociável para o Hamas: a libertação do contestado Corredor de Filadélfia, uma zona tampão na fronteira entre Gaza e o Egito.

Dentro do governo israelita, existe quase um consenso de que Telavive não pode abandonar aquele corredor de 14 quilómetros. Essa unanimidade é apenas contestada pelo ministro da Defesa, Yoav Gallant, que criticou duramente a decisão do primeiro-ministro: “O facto de que nós priorizamos o Corredor de Filadélfia ao custo da vida de reféns é uma desgraça moral”. Porém, este governante está sozinho num executivo que integra alguns membros de partidos de extrema-direita — estes que prometem impedir quaisquer negociações com o Hamas e insistem na continuidade da guerra na Faixa de Gaza.

Fora do governo, cresce a contestação nas ruas, principalmente após este fim de semana as Forças de Defesa de Israel (IDF, sigla em inglês) terem encontrado seis corpos de reféns num túnel em Rafah, no sul de Gaza, sequestrados a 7 de outubro. De acordo com o Times of Israel, os militantes do Hamas terão morto os seis à queima-roupa entre quarta e sexta-feira. “Foram brutalmente assassinados pelos terroristas do Hamas antes de os encontrarmos”, adiantou o porta-voz das IDF, Daniel Hagari.

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Os efeitos da greve em Israel esta segunda-feira em estação de comboios, aeroportos e as estradas

Anadolu via Getty Images

Isto aumentou a indignação de muitos críticos da guerra em Gaza, principalmente entre as associações ligadas aos familiares dos reféns. Ao longo das últimas semanas, têm sido vários os avanços e recuos no que diz respeito a um acordo para cessar-fogo — e a sensação que fica entre muitos é que estas seis mortes poderiam ter sido evitadas. O Fórum de Famílias de Reféns e Pessoas Desaparecidas emitiu um comunicado em que acusava Benjamin Netanyahu de ter “abandonado os reféns”. Por isto, esta organização considerava que “o país devia tremer” — para enviar um forte sinal ao primeiro-ministro.

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Ao apelo das organizações das famílias dos reféns, que ao longo dos últimos meses insistem num acordo que acabe a guerra e liberte os reféns, juntou-se o mais influente sindicato em Israel, o Histadrut, que convocou uma greve geral nesta segunda-feira. “Estamos a receber sacos com corpos em vez de um acordo. Cheguei à conclusão de que a nossa intervenção pode influenciar aqueles que necessitam de ser influenciados. Apelo à população de Israel para sair às ruas e fazer parte da greve”, pediu o líder sindical, Arnon Bar-David.

Se nas questões internas a manutenção da guerra está a tornar-se mais difícil, também externamente Benjamin Netanyahu está a ser pressionado, nomeadamente pelos Estados Unidos da América (EUA). O Presidente norte-americano, Joe Biden, realçou esta segunda-feira que o primeiro-ministro israelita “não” está a fazer o suficiente para se alcançar um cessar-fogo em Gaza.

"Estamos a receber sacos com corpos em vez de um acordo. Cheguei à conclusão de que a nossa intervenção possa influenciar aqueles que necessitam de ser influenciados. Apelo à população de Israel para sair às ruas e fazer parte da greve."
Apelo do líder sindical Arnon Bar-David

Pressão interna e externa: há mais vozes que pedem ao fim da guerra

Esta segunda-feira, a greve geral teve um impacto negativo em vários pontos de Israel — e foi a primeira ação desta dimensão a ocorrer desde o dia 7 de outubro. O governo de Benjamin Netanyahu insistiu que esta ação era ilegal, sendo que o Tribunal do Trabalho de Telavive veio dar razão ao executivo. O órgão jurídico argumentou que a natureza da paralisação era “política” e que não existia “qualquer conexão entre a morte dos reféns e a economia”. Assim sendo, determinou a interrupção da greve, decisão que o Histadrut acatou por “respeito à lei”.

Devido à duração, os impactos foram, por conseguinte, limitados (a greve começou de madrugada e durou algumas horas), mas não deixa de mostrar que o governo pode estar a perder o apoio da população no que diz respeito à gestão do conflito na Faixa de Gaza. Esse amparo da opinião pública que o primeiro-ministro contava foi quase uma garantia ao longo de onze meses de guerra — poucas foram as vozes críticas — mas a frustração com a situação dá sinais de estar a aumentar.

Sublinhe-se que o sindicato Histadrut, que convocou a greve geral, é um dos mais influentes em Israel. Foi, aliás, fundado nos anos 20 do século passado, mesmo antes da criação do Estado israelita. Na altura, foi criado para garantir os direitos laborais dos judeus que imigravam para o outrora mandato britânico da Palestina, como recorda o New York Times. Em 1948, quando Israel é reconhecido como um Estado judeu pela maioria da comunidade internacional, teve um papel fundamental para criar as bases da economia de um novo país.

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Protestos contra Benjamin Netanyahu em Telavive na noite de domingo

Anadolu via Getty Images

Atualmente, o Histadrut representa 800 mil trabalhadores em Israel, um país de cerca de 9,5 milhões de habitantes. E já mostrou a sua influência o ano passado, quando se juntou aos protestos contra a polémica reforma judicial que Benjamin Netanyahu queria levar a cabo.

As associações dos familiares dos reféns também têm aumentado o tom das críticas à atuação do primeiro-ministro, perdendo a paciência com a falta de um acordo e com os sucessivos impasses nas negociações. Einav Zangauker, a mãe de um refém que ainda se acredita estar na Faixa de Gaza, considera que as ações do governo de Benjamin Netanyahu são um “crime contra a população, contra o Estado de Israel e contra o sionismo”. “Netanyahu não é o Senhor Segurança, é o Senhor Morte. Ele está a minar o acordo.”

Sem saberem dos familiares há quase um ano (muitos nem tendo noção se estarão vivos), as famílias dos reféns desesperam por notícias e por um cessar-fogo que permita a libertação dos reféns. Jonathan Dekel-Chen, o pai de um refém que ainda estará na Faixa de Gaza, assinalou que, se o governo não chegar ao acordo para o fim da guerra, os “reféns vão morrer no cativeiro do Hamas”. “Não há explicação razoável [para a rejeição do acordo] além de considerações políticas domésticas e de retenção do poder.”

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Familiares exigem acordo que crie as condições para um cessar-fogo e libertação de reféns

Getty Images

Fora das fronteiras de Israel, o maior aliado israelita, os Estados Unidos também desejam que se alcance um cessar-fogo. Segundo apurou o Washington Post, a Casa Branca, juntamente com os mediadores Egito e Qatar, ponderam apresentar um derradeiro acordo a Israel e ao Hamas nas próximas semanas. Se nenhuma das partes aceitar, será o fim destes esforços de mediação.

Aliás, esta segunda-feira, Joe Biden e a candidata presidencial democrata Kamala Harris debateram com alguns mediadores os “esforços para chegar a um acordo que assegure a libertação dos restantes reféns” e um possível cessar-fogo.

Netanyahu não cede e não quer abandonar o Corredor de Filadélfia

Após ter recebido a notícia da morte dos seis reféns, o primeiro-ministro israelita parecia afastar qualquer possibilidade de cessar-fogo, culpabilizando o grupo islâmico pelo falhanço em chegar a acordo. “Recentemente, enquanto Israel continua a encetar negociações intensivas com os mediadores num esforço para alcançar um acordo, o Hamas continua a recusar todas as propostas. Pior, ao mesmo tempo, mata seis dos nossos reféns. Quem assassina reféns não quer um acordo”, defendeu Benjamin Netanyahu.

"Recentemente, enquanto Israel continua a encetar negociações intensivas com os mediadores num esforço para alcançar um acordo, o Hamas continua a recusar todas as propostas. Pior, ao mesmo tempo, mata seis dos nossos reféns. Quem assassina reféns — não quer um acordo."
Primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu

Ainda assim, numa reunião do Conselho de Ministros na quinta-feira passada, Benjamin Netanyahu considerava mais importante manter o controlo do Corredor de Filadélfia — algo em que o Hamas pretende que Israel ceda — do que um acordo que permita a libertação de reféns. Segundo uma transição a que o Canal 12 teve acesso, Yoav Gallant insurgiu-se contra esta decisão e questionou diretamente: “Se Sinwar [o líder do Hamas] lhe apresentar um dilema: deixa Filadélfia ou recupera os reféns, o que faz?”. “Eu fico em Filadélfia. Apenas negociações resolutas vão forçar [Sinwar] a ceder”, respondeu o chefe do executivo.

Perante os restantes ministros, Yoav Gallant ficou completamente isolado — e ninguém o defendeu. Para Benjamin Netanyahu, a permanência de tropas israelitas em 14 quilómetros entre a fronteira com Gaza e o Egito é uma linha vermelha. Ainda esta segunda-feira, o primeiro-ministro assegurou que Israel “não deixará Filadélfia — nem em 42 dias, nem em 42 anos”. 

No entender do primeiro-ministro israelita, se Telavive cedesse neste momento e aceitasse um cessar-fogo (perdendo o controlo do Corredor de Filadélfia), seria enviado um sinal de fraqueza de Israel para a liderança do Hamas, especialmente após a morte dos seis reféns. “Mesmo depois da morte dos nossos reféns, nós não vamos chegar a compromisso na rota de Filadélfia. A decisão que tomámos na última reunião de ministros foi certa. Cancelá-la agora? Após a morte dos nossos reféns?”, questionou Benjamin Netanyahu, acrescentando: “Esse passo seria uma recompensa para o terrorismo e mandaria uma mensagem perigosa ao Hamas de que matar os nossos reféns compensa.”

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O Corredor de Filadélfia, na Faixa de Gaza

AFP via Getty Images

Mas por é que Israel tem tanto interesse no Corredor de Filadélfia? Esta faixa de terra desmilitarizada com cerca de 14 quilómetros de extensão que corre ao longo da fronteira é do domínio do Hamas desde 2007; antes disso, foi supervisionada pela Autoridade Palestiniana. Foi originalmente estabelecido após Israel ter deixado a Península do Sinai (pertencente ao Egito) em 1979 e Telavive manteve tropas na região até 2005. Agora, deseja voltar a controlá-lo.

Nas longas negociações entre Israel e o Hamas, a gestão do Corredor de Filadélfia foi um dos pontos que mais afastou as duas partes. O grupo islâmico exige que Telavive o abandone, ao passo que as autoridades israelitas recusam esta possibilidade. Em meados de agosto, Israel voltou a insistir no assunto e prometeu que ficaria naquela faixa de terra, mas reduziria o número de tropas e de postos militares — algo com que os Estados Unidos terão concordado.

epa11494582 Prime Minister of Israel Benjamin Netanyahu delivers an address to a joint meeting of Congress in the chamber of the US House of Representatives on Capitol Hill in Washington, DC, USA, 24 July 2024. Netanyahu's address to a joint meeting of the US Congress comes amid a close 2024 US presidential election cycle. Thousands of pro-Palestinian protesters were expected to gather near the US Capitol when Netanyahu becomes the first leader to address the US Congress four times.  EPA/WILL OLIVER
"Todas as coisas que vieram para Gaza através do Corredor tornaram Gaza um perigo para a segurança de Israel."
Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel

Na visão do primeiro-ministro israelita, o corredor de Filadélfia é o “tubo de oxigénio” para a sobrevivência do Hamas. “Temos de ficar lá. É essencial para a segurança de Israel. Se nós o deixarmos, será difícil regressarmos. Este é um tempo crítico da guerra para manter o corredor, sem o qual não conseguiremos atingir os objetivos da guerra”, afirmou Benjamin Netanyahu.

O governo israelita e as Forças de Defesa de Israel acreditam que é através do Corredor de Filadélfia que o Hamas transfere armas e outros equipamentos de guerra para a Faixa de Gaza, existindo túneis subterrâneos na faixa de terra para o efeito. Para além disso, um dos receios de Benjamin Netanyahu é que o grupo islâmico consiga levar reféns para fora de Gaza — mais concretamente para o Irão —através deste corredor.

Munido com um mapa, Benjamin Netanyahu clarificou, numa conferência de imprensa esta segunda-feira, a “importância” deste Corredor. “Quando saímos do Corredor de Filadélfia, a fronteira entre Egito e Gaza, não existiu nenhum obstáculo ao influxo de armas, equipamentos para construir armas, máquinas para fazer túneis. Tudo com o patrocínio do Irão e o dinheiro do Irão”, denunciou. “Todas as coisas que vieram para Gaza através do Corredor tornaram Gaza um perigo para a segurança de Israel.”

Netanyahu a explicar com um mapa a importância do Corredor de Filadélfia numa conferência de imprensa

Na lógica do objetivo de guerra de destruir o Hamas, é portanto “essencial” para Telavive controlar aquela faixa de 14 quilómetros. Em contrapartida, no entender do ministro da Defesa, é mais importante “recuperar os reféns detidos pelo Hamas” — e por isso, fazer cedências. “A decisão que tomámos na quinta-feira [de manter o controlo do corredor] foi sob a máxima de que há tempo, mas se queremos os reféns vivos, não há tempo”, insistiu Yoav Gallant esta terça-feira.

O governo de Israel não está disposto a ceder no controlo de Corredor de Filadélfia. O assunto é interpretado com uma linha vermelha quer para Benjamin Netanyahu, quer para o Hamas. As duas partes mantêm-se inflexíveis, mas o primeiro-ministro terá de lidar com a questão dos reféns — que a cada dia que passa correm perigo de vida.

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