Sabemos hoje que existe uma conexão incrível entre sistema digestivo e o cérebro. E o próprio intestino (um dos órgãos do sistema digestivo), é metaforicamente chamado de “segundo cérebro” porque alberga um sistema nervoso independente do cérebro – o sistema nervoso entérico (SNE) – com milhões de neurónios, responsável por controlar diretamente o sistema digestivo e comunicar com o Sistema Nervoso Central (SNC) através dos sistemas simpático e parassimpático.

A nutricionista Maria Inês Antunes, da Sociedade Portuguesa para a Inovação em Microbioma e Probióticos (SPIMP), sintetiza  que “o intestino consegue comunicar com o cérebro, da mesma forma que o sistema nervoso central consegue comunicar com o intestino”.

Desta forma, alterações do sistema nervoso podem interferir na movimentação de todo o sistema digestivo e interferir na secreção de enzimas digestivas ou até nas sensibilidades intestinais a alguns alimentos. Por outro lado, as alterações da microbiota intestinal podem ter impacto  na parte neurológica. Para além do eixo intestino-cérebro, existem inclusive outras relações do intestino com muitos outros órgãos, como o sistema cardiovascular, o sistema endocrino (influenciando a tiróide, a fertilidade, por exemplo), doenças reumáticas e até resistência à insulina, refere a nutricionista Maria Inês Antunes, o que evidencia de facto a importância deste segundo cérebro que é afinal o intestino.

Microbioma e Microbiota – Temas a reter pela saúde digestiva

Quando falamos do eixo intestino cérebro, surgem na conversa outros termos que se mostram bastante importantes para percebermos esta relação entre o cérebro e o intestino.

São eles o Microbioma, que à semelhança do genoma humano, é o património genético dos micro-organismos que vivem com o ser humano, e a microbiota, a comunidade de micro-organismos residentes em diversos sistemas do corpo, incluindo pele, aparelho geniturinário, trato respiratório e trato gastrointestinal.

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Maria Inês Antunes explica que a microbiota intestinal (antes designada de flora intestinal) diz respeito à comunidade de micro-organismos residentes no intestino e varia de indivíduo para indivíduo. O intestino é o grande responsável pela seleção do que absorvemos a partir de tudo o que comemos. Por um lado, é uma barreira que nos protege de bactérias patogénicas, e por outro contém também as suas próprias bactérias naturais e essenciais- a microbiota) responsáveis pelo funcionamento do metabolismo, equilíbrio do sistema imunitário e resistência a doenças. São milhares de espécies de bactérias que habitam no nosso intestino, formando uma flora simbiótica que separa e seleciona o que vem de fora daquilo que efetivamente absorvemos. São estas bactérias que gerem o sistema imunitário, através do controlo de determinadas células imunitárias e das vias inflamatórias responsáveis por quase todos os tipos de doenças crónicas; desempenham um papel direto na síntese de vitamina B e K, bem como na absorção de cálcio e ferro; e produzem substâncias qualificadas para degradar o que consumimos em pequenas partículas capazes de nos nutrir.

O equilíbrio da microbiota intestinal é impactado grandemente pelos alimentos que escolhemos, multiplicando, reproduzindo ou reduzindo o número de bactérias consoante as estimulamos com o que comemos. Elas utilizam algumas partículas que o nosso organismo não digere nem absorve, fermentando-as para produzir substâncias mediadoras de funções importantes para o nosso organismo, os ácidos gordos de cadeia curta. É cada vez mais evidente que estas substâncias contribuem para a estabilidade da microbiota intestinal, diminuição da inflamação, estabilização do metabolismo e até a perda de peso. Para além disto a nossa predisposição para determinadas doenças, alergias e intolerâncias alimentares é também parte razão de uma microbiota desequilibrada.

Teremos o poder de alterar o nosso microbioma?

Apesar das primeiras bactérias boas dos intestinos se formarem durante o nascimento e a amamentação, somos nós os responsáveis por modelá-la ao longo da vida, através das escolhas alimentares que fazemos. A resposta para muitos dos problemas de saúde está no intestino e a chave para os resolver está naquilo que comemos. Por isso, a alimentação é fulcral para tornar este órgão num aliado para a vida.

No dia 7 de maio falámos sobre a relação entre o nosso cérebro e intestino. A talk “O cérebro que não sabia a importância do intestino”, contou com Eduardo Sá, Psicólogo Clínico e Psicanalista, e Miguel Raimundo, Presidente da SPIMP, Sociedade Portuguesa para a Inovação em Microbioma e Probióticos, numa conversa moderada pela host Ana Filipa Rosa. Assista aqui.

Este artigo faz parte do projeto “O cérebro que não sabia a importância do intestino