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Entrevista ao jornalista norte-americano, Joshua Yaffa correspondente do The New Yorker em Moscovo. 20 de Outubro de 2022 FLAD (Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento), Lisboa TOMÁS SILVA/OBSERVADOR
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Há 10 anos, estabeleceu-se em Moscovo, como correspondente. Nos últimos meses, percorreu a Ucrânia e escreveu longamente sobre a guerra.

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Há 10 anos, estabeleceu-se em Moscovo, como correspondente. Nos últimos meses, percorreu a Ucrânia e escreveu longamente sobre a guerra.

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Joshua Yaffa. "Com a guerra, Putin criou o seu Frankenstein: uma identidade ucraniana coerente, definida pela oposição à Rússia"

O correspondente da New Yorker em Moscovo diz que "poucos russos celebram a morte de ucranianos". O tema é "desconfortável" na Rússia, onde só há duas opções: "Sair do país ou ficar e ser silenciado."

O “homem astuto”. Foi este o termo que o sociólogo Yuri Levada criou para definir o comportamento do cidadão russo durante os últimos anos do período soviético e nos anos que lhe seguiram: uma figura que se adapta ao sistema à sua volta, prestando-lhe fidelidade em público e criticando em privado, contornando as regras a seu favor, gerindo a sua bússola moral num cenário confuso.

Joshua Yaffa ficou fascinado pelo conceito desde que ouviu falar dele pela primeira vez. O norte-americano já contactara com a Rússia em jovem. Uma primeira viagem a São Petersburgo, quando era estudante de russo, deixou-o fascinado. Em adulto, mergulhou de vez no país, ao tornar-se correspondente de vários meios de comunicação como a The Economist e a Bloomberg, em 2012, a partir de Moscovo. Mais recentemente,  tornou-se o correspondente oficial da revista The New Yorker no país, e nos últimos meses viajou por toda a Ucrânia, escrevendo longas peças de reportagem sobre uma guerra incontornável.

Entrevista ao jornalista norte-americano, Joshua Yaffa correspondente do The New Yorker em Moscovo. 20 de Outubro de 2022 FLAD (Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento), Lisboa TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

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Mas é a Rússia que conhece bem. E foi com base no conceito do “homem astuto” que publicou em 2020 o seu livro Entre Dois Fogos — Verdade, Ambição e Compromisso na Rússia de Putin (ed. Relógio D’Água), cujas personagens principais são russos reais que vivem naquilo que Yaffa apelida de “zonas cinzentas”. “O que me interessava pessoalmente não eram as figuras heróicas ou as figuras brutais, os Estalines ou os Soljenítsines. Era encontrar estas zonas cinzentas, que muitas vezes não transparecem no jornalismo feito a partir da Rússia, incluindo no meu”, ilustrou Yaffa à audiência que participou num dos encontros Meet the Author, organizados pela Fundação Luso-Americana, que teve lugar em Lisboa na passada quinta-feira.

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Uma tentativa de aproximar o Ocidente da Rússia real, dos russos comuns e de um sistema onde os cidadãos enfrentam dilemas como o de cooperar ou não com um Estado que não apoiam para realizar as suas ambições pessoais. Mas a guerra na Ucrânia veio “mudar as regras do jogo”, como o próprio Yaffa explicou ao Observador numa entrevista horas antes da conferência. Viver na Rússia de hoje é um jogo de espelhos onde poucos confessam as suas verdadeiras opiniões em relação à guerra e a maioria opta pela apatia. “Eles escolhem, ou escolheram, não prestar atenção à guerra na Ucrânia. Veem-na como algo que está fora da sua responsabilidade e, portanto, do seu interesse, e tentam fugir deste tópico desconfortável e focar-se na sua vida privada”, resume o autor. Para os que se opõem abertamente, só restam duas opções: calar ou fugir.

O futuro do país que o jornalista admira é agora uma incógnita. Tudo depende do rumo que a guerra tomar no campo de batalha, deixando-nos “reféns” do resultado militar, diz. Mas Yaffa — que reflete sobre a importância da Ucrânia na “visão do mundo” de Vladimir Putin — não exclui um cenário em que a repressão se venha a agudizar na Rússia de Putin. “A Rússia pode tornar-se um lugar ainda mais negro e repressivo”, vaticina. Como é que o “homem astuto” aprenderá a viver nesse meio é uma questão para a qual ainda não tem resposta.

Entrevista ao jornalista norte-americano, Joshua Yaffa correspondente do The New Yorker em Moscovo. 20 de Outubro de 2022 FLAD (Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento), Lisboa TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

“Esta ideia de uma Ucrânia dividida já era falsa e acho que a guerra ainda a tornou mais obsoleta”

Viveu na Rússia vários anos, quase até ao começo da invasão, e depois partiu para fazer reportagem na Ucrânia. Voltou entretanto ao país? E se não, tenciona regressa?
Não, não voltei entretanto, mas é claro que planeio regressar.

Acha que vai encontrar um país muito diferente daquele que existia antes de 24 de fevereiro?
Oh, sim, sim. É claro que depende daquilo que estamos a falar… Mas sem dúvida que, no que diz respeito à estrutura política ou à relação entre o Estado e a sociedade, sim. Acho que começou uma era muito diferente.

E relativamente aos meses que passou na Ucrânia. Esteve por todo o país, tanto no leste como no ocidente. Sentiu diferenças sobre como a guerra é vivida de um lado e do outro?
Menos do que seria de supor, ou pelo menos do que costumamos pensar aqui no Ocidente. É claro que há diferenças, culturais, arquiteturais, económicas. Mas a invasão conseguiu um feito impressionante: criar — ou melhor, não criar, mas solidificar — uma ideia nacional de Ucrânia unificada, que encontramos tanto em Lviv, como no Donbass, como no sul, em todo o lado. E, portanto, essas diferenças regionais são menos importantes politicamente do que achávamos, ou do que já foram no passado. Quer dizer, se olharmos para a eleição de [Volodymyr] Zelensky em 2019, creio que ele venceu em todas as regiões, exceto numa. Ganhou com 73% dos votos, já na altura. Esta ideia de um país dividido já era falsa e acho que a guerra ainda a tornou mais obsoleta.

"É como a história do Frankenstein. Putin acabou por criar aquilo que mais temia, que era uma identidade ucraniana coerente, em muito definida pela sua oposição à Rússia. Esse era o cenário de pesadelo que ele estava a tentar evitar e foi precisamente aquilo que acabou por criar."

A invasão foi contraproducente para a Rússia? No sentido de que acabou por criar uma resistência maior por parte dos ucranianos?
Bem, é como a história do Frankenstein. Putin acabou por criar aquilo que mais temia, que era uma identidade ucraniana coerente, em muito definida pela sua oposição à Rússia. Esse era o cenário de pesadelo que ele estava a tentar evitar e foi precisamente aquilo que acabou por criar.

“Um país está a tentar provar que tem o poder de determinar as políticas dos outros países. É uma história muito a preto e branco”

Acha que há muitos mal-entendidos no Ocidente em relação à Ucrânia e à Rússia? Por exemplo, fala-se muito na brutalidade do exército russo. Mas quem acompanha a História recente do país lembra-se das guerras na Chechénia e esta guerra não é muito diferente dessas em termos de brutalidade…
Não é, mas é diferente em termos de escala. Tem razão quando diz que o exército russo continua a lutar de forma muito semelhante à que aplicou na Chechénia ou até mais recentemente na Síria. Mas, bem ou mal, esses conflitos não estiveram tão presentes no radar do Ocidente como a invasão da Ucrânia está. Não sei qual é a melhor forma de responder a esta questão… Diria que, no início, muitos acreditavam nesta ideia de um exército russo moderno, com equipamento moderno e talvez táticas mais modernas, e isso acabou por não ser verdade. O exército russo combate na Ucrânia da mesma forma que o faz noutros sítios. Só que agora isto aconteceu no centro da Europa e numa era das redes sociais. Há muitas razões pelas quais este conflito é mais acompanhado do que, por exemplo, a primeira guerra na Chechénia. E, além disso, havia alguma confusão. A brutalidade da guerra russa na Chechénia não é questionável, mas tecnicamente aquilo passava-se dentro da Rússia, contra separatistas. Era uma narrativa mais confusa. Esta narrativa é muito a preto e branco. Posso estar a soar defensivo por ser um membro dos media, mas… Não estamos perante um cenário em que os media pintam uma situação a preto e branco quando ela na verdade é mais cinzenta. Aqui a realidade é, de facto, mais a preto e branco.

Porque estamos a falar de um país que invadiu outro?
Sim. É um país a invadir outro, com a intenção de determinar a trajetória social e política dele, não é? Um país está a tentar provar que tem o poder de determinar as políticas dos outros países. É uma história muito a preto e branco.

E acha que é mais motivada por razões internas para o Kremlin do que por uma visão do mundo ou mais por uma visão do mundo que tem?
Não acho que isto seja Putin a tentar a resolver uma questão doméstica, de tentar manter-se no poder ou distrair a população.

A segunda guerra da Chechénia ajudou muito a popularizar Putin dentro de portas. Não acha que pode ser algo semelhante, portanto?
Não, não. Creio que ele tem uma obsessão real com a Ucrânia e foi isso que o levou a invadir. Isto é sobre as suas próprias obsessões, teorias da conspiração e versões da História que ele tem sobre a Ucrânia e as relações que a Rússia tem com a Ucrânia. Ele acredita no que diz quando fala da guerra.

"Putin vê a Ucrânia na sua forma contemporânea como uma espécie de projeto. Não como uma nação com História, mas como uma espécie de projeto que tem o objetivo de minar o direito histórico da Rússia sobre ela."

E por que razão acha que a Ucrânia é esta obsessão para ele? Quando lemos o livro do Joshua, foi publicado em 2020 e na altura já tinha incluído dois capítulos sobre a Ucrânia. Esta não é uma questão nova. Porque é que a Ucrânia é este espinho encravado para Putin?
A Ucrânia é essencial para que exista um império russo. Sempre esteve na órbita dele e, sem Ucrânia, não há império. O império russo, em qualquer uma das suas versões — antes da Revolução, o soviético, qualquer um —, não era um império credível se tivesse apenas a Bielorrússia e o Cazaquistão, por exemplo, com todo o respeito para com esses países. Sem a Ucrânia não há império porque é o país mais próximo da Rússia em termos históricos e culturais, mas também pela dimensão e influência que tem. É o prémio que determina se a Rússia é ou não um império. É importante percebermos que aqui estamos a habitar a sua visão do mundo, mas, na cabeça de Putin, a Ucrânia é uma espécie de acidente histórico, que é uma invenção moderna.

E ele culpa os líderes soviéticos por essa “invenção”.
Sim, diz que não há legitimidade histórica para este país. E daí esta ideia de que há um “não-país” que, por um lado, foi tomado por fascistas e, por outro, manipulado pelo Ocidente, tudo com o objetivo de minar a Rússia. Ele vê a Ucrânia na sua forma contemporânea como uma espécie de projeto. Não como uma nação com História, mas como uma espécie de projeto que tem o objetivo de minar o direito histórico da Rússia sobre ela. Portanto, é claro que para quem quer corrigir esta espécie de injustiça histórica contra o império russo tem de lidar com o problema ucraniano, entre aspas.

E como é que isso encaixa nos argumentos que o Kremlin tem invocado? Como disse, ora é um país cheio de nazis, ora é controlado pela CIA…
[Interrompe] Para eles são a mesma coisa.

Mas noutras alturas o problema já é a NATO.
Faz tudo parte da mesma ideia, se tivermos em conta que um argumento descabido nem sempre consegue ser coerente. Ele é coerente quando se foca na ideia de que um “não-país” acidental, que não tem legitimidade histórica, foi tomado por várias forças malvadas. Por um lado, temos os nacionalistas ucranianos. E este é o grande mal-entendido de Putin: ele acha que a maioria dos ucranianos são bons — bons no sentido em que reconhecem a relação com a Rússia e veem o país como uma espécie de irmão mais velho —, mas que foram enganados por estes líderes nacionalistas e, por outro lado, pelo Ocidente, que usou esta situação para avançar com a sua agenda. E creio que Putin acha que estas forças estão a atuar em conjunto.

“Durante muitos anos, os líderes europeus acharam que Putin podia ser isolado: ‘Ele é louco, mas deixem-no ser louco ali ao canto'”

Mas durante vários anos, muitos no Ocidente não acreditavam que Putin pensava realmente assim. Havia uma ideia dele como um estratega brilhante…
[Interrompe] Não sei se achavam que ele não pensava assim ou se achavam apenas que ele não iria agir em conformidade com as suas ideias. Durante muitos anos, os líderes europeus acharam que Putin podia ser isolado: “Ele é louco, mas deixem-no ser louco ali ao canto.” Tentaram prestar menos atenção ao que o homem louco andava a dizer. Não acho que eles tivessem dúvidas sobre a visão histórica que Putin tinha da Ucrânia, acho é que pensaram que era irrelevante, porque ele não iria agir em conformidade e, portanto, não importava. Quem quer saber do maluco que anda a falar sozinho no parque, se isso não afetar a geopolítica real?

Temos estado a falar muito sobre Putin, mas no seu livro quis focar-se para lá do alcance do líder político e tentar perceber como é que os russos lidam com o sistema — como contribuem para o próprio sistema, mas também se sentem encurralados por ele, o que é uma dicotomia muito interessante. Acha que é possível essas regras do jogo virem a mudar num sistema destes?
Não sei, porque o próprio Putin mudou totalmente as regras do jogo. Ele criou uma situação nova em que as antigas regras já não se aplicam. E aumentou a parada de tal forma, escalou de tal forma, que não tem outra hipótese a não ser vencer na Ucrânia. E se não conseguir — e, sinceramente, a situação militar não é boa para ele, objetivamente — não sei o que acontece depois disso. Foi um problema que ele próprio criou. Se o exército russo perder de forma clara, de uma forma que nem sequer pode ser mascarada…

Mascarada como uma vitória?
Exato. Se isso acontecer, é uma realidade política totalmente diferente e é difícil prever o que acontecerá.

"[Os russos] são responsáveis pela sua apatia e passividade, mas isso não é o mesmo que ativismo. Pode-se apoiar a guerra de forma passiva, sem dúvida. Mas isso não é um apoio ativo."

Escreveu um artigo muito interessante na New Yorker sobre esta ideia de que os russos apoiam claramente a guerra. Pode explicar um pouco o que ali defende, como não é assim tão simples?
Bem, a tese principal do artigo é que na verdade não sabemos o que os russos pensam sobre a guerra. Já antes da guerra era difícil fazer sondagens na Rússia, porque num sistema autoritário repressivo não há acesso a informação livre e, portanto, os resultados quando perguntamos a pessoas o que pensam sobre política são questionáveis. Mas agora, com as leis de censura sobre a guerra, a ideia de que teremos uma resposta honesta ou rigorosa, quando um estranho pergunta o que pensa sobre a guerra, é risível. Quer dizer, nestes estudos, 90% a 95% das pessoas recusam participar, só analisamos as respostas dos 5% que aceitam responder. Por definição, é quase certo que os que se opõem à guerra recusam responder e ficamos apenas com os que concordam. A estatística mais interessante do Centro Levada, o único centro independente que ainda existe na Rússia, é que, no final do verão, mais de 50% dos participantes diziam estar a prestar pouca atenção ou nenhuma à Ucrânia. E essa é a estatística mais reveladora, que vai ao encontro da definição de “homem astuto” que uso no livro para os russos. Eles escolhem, ou escolheram, não prestar atenção à guerra na Ucrânia. Veem-na como algo que está fora da sua responsabilidade e, portanto, do seu interesse, e tentam fugir deste tópico desconfortável e focar-se na sua vida privada. Essa é uma forma de apoio, não quero sugerir que isto faz com que não sejam responsáveis. São responsáveis pela sua apatia e passividade, mas isso não é o mesmo que ativismo. Pode-se apoiar a guerra de forma passiva, sem dúvida. Mas isso não é um apoio ativo.

E é diferente da situação em 2014, com a Crimeia, onde o apoio era muito mais notório.
Sem dúvida, mas a Crimeia não custou nada a ninguém. Foi apenas um momento de patriotismo leve, sem custos. Acho que para muitos russos é desconfortável ver russos a matar ucranianos. Não lhes agrada. No caso da Crimeia, houve alguma violência e algumas pessoas morreram, mas foram poucas. No caso da Crimeia, para muitos russos isso aconteceu não só sem mortes de soldados russos, mas sem mortes de ucranianos. E por isso não havia por que não celebrar. Agora não só há soldados russos a morrer, como há ucranianos a morrer. E, uma vez mais, não quero desresponsabilizar os russos, mas poucos celebram a morte de ucranianos. E, por isso, este é um tópico muito desconfortável.

“Não podemos excluir nenhum cenário, a não ser o de que a Rússia venha a emergir disto como uma democracia de estilo ocidental”

É por isso que muita da narrativa pública se foca em tentar retratar os ucranianos como nazis?
Claro, há um esforço de desumanização do adversário.

É um esforço que resulta particularmente bem tendo em conta o papel da Rússia na II Guerra Mundial?
Acho que resulta bem em todo o lado. É uma tática universal para conseguir mobilizar uma população em tempos de guerra.

Olhando para a situação política internamente no país, a maioria dos políticos da oposição estão totalmente dominados, Navalny e Kara-Murza estão presos, por exemplo. Imagino que tem falado com alguns russos que estão preocupados com a situação. Quais são as opções deles? É possível algum tipo de mobilização ou já desistiram?
Mobilização neste momento é praticamente impossível e praticamente ninguém o faz. A questão neste momento é sair do país ou ficar e ser silenciado. Viver com o próprio desconforto, com a oposição à guerra, mas não poder fazer nada sobre isso. Ou partir. Essas são as escolhas neste momento.

E a maioria está a optar por qual das hipóteses?
Há uma grande vaga de pessoas a sair, foi assim em março e agora ainda mais em setembro, com o anúncio da mobilização parcial. Mas nem toda a gente tem meios para partir e muitos acabam por regressar. Percebo isso. Não é possível para toda a gente de repente tornar-se um emigrante. E isso é um problema para a Rússia, porque os que acabam por sair são os que têm estudos e posses e o país está a perder muitos dos seus melhores.

Há uma espécie de “fuga de cérebros”?
Sim, está a acontecer. Mas não acho que Putin esteja preocupado com isso neste momento.

Em termos públicos, há um discurso único em relação à guerra, mas temos assistido a algumas bolsas de contestação, sobretudo de ultranacionalistas que admitem que a guerra não está a correr bem. Acha que se vão tornar mais ruidosos?
Claro que sim. Se a Rússia continuar a perder a guerra de uma forma impossível de ignorar, vamos ouvir muito descontentamento dessas vozes ultranacionalistas e bélicas e vai haver uma caça aos culpados.

"A questão neste momento é sair do país ou ficar e ser silenciado. Viver com o próprio desconforto, com a oposição a guerra, mas não poder fazer nada sobre isso. Ou partir."

E os culpados podem ser outros que não Putin?
É claro, pode haver muitos bodes expiatórios. O ministro da Defesa, Shoigu, já é um. Vamos ver como é que a guerra evolui. Pode chegar a um ponto em que já não há bodes expiatórios possíveis, em que há uma humilhação para a Rússia no campo de batalha, e não é possível culpar outra pessoa além de Putin. Depende muito da própria guerra, estamos todos reféns do que vai acontecer no campo de batalha.

Voltamos ao início e à Rússia que vai encontrar quando regressar. Sei que é impossível prever, mas há algum futuro político possível para Putin? Ele consegue sobreviver a isto?
Talvez. Depende de como a guerra acabar. Mas é claro que é possível, ele pode aumentar o aparelho repressivo e fazer purgas no exército. Consigo imaginá-lo a manter-se no poder. A Rússia pode tornar-se um lugar ainda mais negro e repressivo. Porque não? Há muitos exemplos disso, como o de Saddam Hussein no Iraque, depois de perder a guerra com o Irão. Não podemos excluir nenhum cenário, a não ser o de que a Rússia venha a emergir disto como uma democracia de estilo ocidental. Sinceramente, esse parece o cenário menos provável.

O que é muito interessante, porque após o fim da União Soviética era isso que muitos esperavam no Ocidente. E até quando Putin foi eleito pela primeira vez, havia muita gente a depositar essas esperanças nele. Acha que ele mudou ou estas ideias sempre estiveram ali?
Acho que aconteceram ambas as coisas. Não acho que a invasão da Ucrânia era inevitável desde o ano 2000, quando ele assumiu o cargo. Houve muitas encruzilhadas no caminho em que as coisas podiam ter tomado um rumo diferente. Mas a maior parte da responsabilidade é de Putin. Sim, houve momentos em que o Ocidente podia ter tratado a Rússia e Putin de forma diferente, sem dúvida. Mas, no final de contas, a responsabilidade é de Putin e ele teve muitos momentos em que podia ter seguido um caminho diferente.

 
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