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King Juan Carlos
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Na nova biografia romanceada, Juan Carlos é descrito como uma criança sem infância e sem afeto

Express/Hulton Archive/Getty Images

Na nova biografia romanceada, Juan Carlos é descrito como uma criança sem infância e sem afeto

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"Juan Carlos morrerá no exílio e com o nome de Corinna nos lábios"

Antes de publicado, "Eu, o rei" passou por uma mão cheia de advogados. A infância sem afeto, as muitas amantes e a sede de dinheiro fazem parte da obra de Pilar Eyre, que demorou 40 anos a nascer.

Os livros da jornalista catalã Pilar Eyre — que já antes escreveu sobre vários membros da família real espanhola — são um cruzamento pensado entre documentação e imaginação. O mais recente, “Eu, o Rei: A escandalosa vida de Juan Carlos I da Espanha”, não é exceção. Se por um lado há criatividade na recriação de diálogos e de cenas em que não esteve presente, por outro, a investigação feita ao longo de 40 anos serve de base à obra editada pela Esfera dos Livros e que chegou ao mercado nacional a meio desta semana.

A infância solitária e sem afeto, a morte trágica do irmão e os muitos romances que marcaram (e marcam) a vida do rei emérito de Espanha têm palco neste livro, que também procura traçar a relação sem amor de D. Juan Carlos I e a rainha Sofia. Já Corinna Larsen, garante a autora, é ainda nome que marca o coração do ex-monarca e também o seu grande amor. Em entrevista ao Observador, Pilar Eyre navega pelos segredos daquele que já foi o homem mais poderoso de Espanha.

O livro está à venda no mercado nacional desde quarta-feira ©Divulgação

Quanto tempo demorou a escrever este livro? Que tipo de investigação o sustenta?
Demorei 40 anos… Foi o tempo que passei a trabalhar e a investigar sobre a família real, como jornalista ou como escritora. Escrevi 12 ou 14 livros sobre diferentes membros da família real. Também há muitos anos que escrevo uma coluna sobre casas reais. Tenho estado a reunir informação durante todos estes anos… muitas coisas que não publiquei até agora. Mas escrever este livro, sentar-me à frente do computador, e começar, foi um ano.

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O livro tem por base o testemunho de que tipo de fontes?
As minhas fontes têm sido muitas ao longo de todos estes anos e foram, sobretudo, amigos e pessoas próximas de D. Juan Carlos I — muitos deles já morreram porque eram amigos de infância ou amigos de há vários anos. Mas também jornalistas, que não podiam publicar nos seus meios o que [agora] conto, e correspondentes que viajaram com o rei durante muitos anos e que, naquela época, não podiam publicar as coisas que viam. Mas também muitos livros, documentos e artigos já esquecidos, além do meu próprio conhecimento da família real, que julgo conhecer melhor do que a minha. Por isso pude escrever este livro e creio que 99% das coisas que conto são verdade.

Ficou muita informação confidencial por publicar?
O livro logicamente teve de passar por advogados. Publiquei um manuscrito que passou por três gabinetes de advogados — uns queriam cortar muito, outros menos, uns queriam eliminar todos os nomes e outros disseram que o livro era impublicável, que era uma bomba-relógio. Eu e a minha editora elegemos a opção que mais respeitava a identidade do livro. Tivemos que suprimir alguns nomes, mas dou muitas pistas [sobre quem são as pessoas] e são facilmente identificáveis. Os rumores não os introduzi no livro porque tudo o que escrevi tem uma prova palpável ou uma fonte fiável. Quis escrever um livro sério, não quis escrever um livro jornalístico, que falasse das últimas informações [sobre o rei], mas sim de história, para que gerações seguintes possam consultar. Tudo o que escrevo é fiável.

"O curioso é que algumas [mulheres] ligaram-me, zangadas, porque não saem no livro. Uma senhora sevilhana... ligou-me o marido a dizer: 'Olhe que a minha mulher foi amante e amiga do rei durante muitos anos e não está no livro!'."

Há muitos nomes de amantes no livro que não são reais?
Todos os nomes são reais e correspondem às senhoras. Mas o curioso é que algumas ligaram-me, zangadas, porque não saem no livro. Uma senhora sevilhana… ligou-me o marido a dizer: “Olhe que a minha mulher foi amante e amiga do rei durante muitos anos e não está no livro!”. Teve muita piada. Também aconteceu com uma senhora que vive em Barcelona que, na rua, disse-me: “Pilar, não o esperava de ti… Não me incluíste no livro”.

Porque é que acha que o divórcio real nunca aconteceu? Seria algo aceite pelos espanhóis?
No início não seria aceite. A sociedade espanhola era muito conservadora e na altura de Franco era impensável — havia uns serviços secretos destinados a vigiar a conduta de D. Juan Carlos. Naquele momento era impensável que o fizesse. Havia medo porque a sociedade espanhola era conservadora e um rei divorciado não podia acontecer. Estou segura — conto isso no meu livro — que a partir de 2000 o rei quis divorciar-se da rainha, falou com ela e falou com o primeiro-ministro para se divorciar. Juan Carlos chegou reunir-se com os três filhos num restaurante, em Madrid, para dizer-lhes que se ia divorciar para casar com Corinna… Felipe, o atual rei, disse-lhe “Papá, se a queres matar a monarquia…”. Penso que Sofia nunca se quis divorciar, ela adora ser rainha.

Pilar Eyre, autora do livro "Eu, o Rei: A escandalosa vida de Juan Carlos I da Espanha"

©Sergio González Valero

Corinna Larsen foi o grande amor do rei emérito de Espanha?
Sim, sem dúvida. Estou muito segura de que D. Juan Carlos morrerá com o nome de Corinna nos lábios. Em 2019, antes da pandemia, viajou até Londres para falar com ela e pedir que voltasse (começaram a relação em 2004). Havia a desculpa de que foi [ter com ela] para que deixasse de falar com a imprensa, mas podia tê-lo feito por telefone. Para o bem ou para o mal, ainda a tem presente na sua cabeça e no seu coração. Ainda agora, contaram-me, tem saudades dela e fala dela. Fez muitas loucuras por ela e tentou deixar a rainha. Acredito que foi o grande amor da vida de D. Juan Carlos.

Acha que foi recíproco?
Foi Corinna quem acabou a relação. Ela não queria ser amante, também não queria ser a rainha, sabia que isso era impossível, mas queria ter um status especial. Há outras vozes que dizem que, quando o rei deixou de ser rei, deixou de interessar para Corinna. Penso que ela já esteve apaixonada por ele… É muito difícil resistir ao poder e à atração de um rei. Se tens um rei completamente apaixonado por ti, um rei tão poderoso como o rei de Espanha… dando-te tudo… E não foram só um par romântico, eram cúmplices, companheiros, viajavam juntos, faziam negócios juntos, tinham uma visão da vida muito parecida, adoravam a caça, tinham muitas afinidades. Penso que Corinna chegou a estar muito apaixonada pelo rei. Agora, penso que já não. Quando estávamos a escrever o livro, antes de o publicarmos, quem nos dava mais medo eram os advogados de Corinna. Ela tem um grupo de advogados muito importante que está a acompanhar continuamente tudo o que se publica sobre ela em todo o mundo.

Marta Gayá. A história da amante mais duradoura de Juan Carlos

E Marta Gayá?
Durante uma época da sua vida, foi uma mulher muito importante, mas converteu-se na sua segunda mulher, o que é chato. Continuam a ser amigos e continuam a ver-se. É uma amiga, mas a paixão que [Juan Carlos] teve por Corinna… Era a atração sexual… Ele dizia a Corinna: “Tens uma cabeça de homem num corpo de mulher”. É uma mulher muito atraente, ficas a olhar para ela na rua quando a vês.

"Ainda agora, contaram-me, tem saudades de Corinna e fala dela. Fez muitas loucuras por ela e tentou deixar a rainha. Acredito que foi o grande amor da vida de D. Juan Carlos."

Dá um grande destaque à infância de Juan Carlos. Parece ser solitária, marcada pela rivalidade entre irmãos e com pouco afeto, sobretudo da parte do pai. Acha que este período o marcou muito?
Totalmente. Foi por isso que recreei tanto a infância, grande parte da qual é passada em Portugal. Acredito que os seus defeitos e qualidades vieram da infância. Por exemplo, ele teve uma infância que não foi acomodada, não digo que tenha passado por penúrias económicas, mas por algumas dificuldades. Daí o grande amor ao dinheiro que sempre teve — o medo é ficar sem ele. Essa forma de ser, apresentando-se como alguém desamparado… Aqui, na televisão, na Catalunha, fizeram um documentário há umas semanas em que falaram com um político do Cazaquistão que explicava que o presidente deste país dava periodicamente a D. Juan Carlos algumas quantias de dinheiro muito grandes; quando lhe perguntaram o porquê, o político disse que [o rei emérito] lhe dava muita pena, porque olhava com uns olhos de desamparo e o presidente entendia que ele não tinha muito dinheiro. Esta vitimização desde a infância, sem dinheiro e sem afeto (não voltou a viver com a sua família depois dos oito anos)… Foi uma criança sem afeto, sem infância. Tudo isso fez com que D. Juan Carlos tivesse sido tão mulherengo — evidentemente que é genético, tanto o pai como o avô eram promíscuos sexualmente —, mas também deriva de uma necessidade de afeto. Amigos de D. Juan Carlos contaram-me que ele não procura apenas sexo nas mulheres, mas também carinho. Sejam namoros de quatro horas ou de uma noite, ele precisa de uma palavra de amor.

Há um Juan Carlos antes e depois da morte do irmão, “Alfonsito”?
Totalmente. Tenho um testemunho da morte de Alfonsito, de uma pessoa que não era da família, mas que estava na casa. Foi um testemunho direto que me contou há muitos anos que, numa questão de horas, acabou o brilho, a expressão alegre e juvenil, que [Juan Carlos] tinha nos olhos. Uma expressão que se apagou totalmente e que nunca mais voltou. Este mesmo amigo explicou, muitos anos depois, que encontrou D. Juan Carlos no Palácio da Zarzuela a chorar — estava com uma fotografia de Alfonsito na mão e disse “Nunca amei ninguém como ele”. Foi ele quem disparou contra o irmão. Esta morte marcou a família para sempre.

Juan Carlos foi encarado, desde a nascença, como a esperança da família real. Ele soube lidar com essa pressão?
Ele nunca se sentiu realmente livre. Quando me dizem que deve estar muito triste em Abu Dhabi, digo que não [é verdade]. É a primeira vez na vida que não tem responsabilidades, que pode dizer e fazer o que quiser. Não tem pressão de ninguém a dizer-lhe o que tem de fazer. Tem boa saúde, está num país onde pode fazer o que quiser, pode ter as mulheres que quiser e não está com Sofia, o que o deve alegrar muito…

Spanish Royals Host Gala Dinner in Honour of The President Of Vietnam

A família real espanhola em dezembro de 2009

Fotonoticias/WireImage)

Juan Carlos teve um papel muito importante no processo democrático de Espanha após Franco. Esse é um legado que pode ser ofuscado pelos sucessivos escândalos?
Totalmente. É uma pena, mas é certo que seja mais recordado por isso do que pelo bom que fez à democracia. É triste, mas é assim. Durante muitos anos atuou de forma muito irregular. Na época era inviolável, era o rei e não podia ser julgado. Agora também não podemos tomar medidas. O que mais dói é que não havia nenhuma necessidade. D. Juan Carlos fê-lo a si mesmo e [enganou] todos os espanhóis que o adoravam e acreditaram nele durante tantos anos. Todos pensávamos — eu era a primeira — que era um homem honrado, uma pessoa que lutava por Espanha. Era mulherengo, mas num país tão machista isso era visto como algo engraçado. Mas pensávamos que era um homem absolutamente honesto, sentimo-nos enganados.

Acredita que Juan Carlos morrerá no exílio? Chegou a escrever-se, em 2020, que ele viria viver para Cascais…
No início, Cascais foi apontado como um dos destinos, mas penso que ele deixou claro que vai viver num país autocrático como a Arábia Saudita — um rei só pode ser protegido por outro rei, sobretudo um rei absoluto. Penso que sim, que morrerá no exílio. Na altura [em que deixou Espanha] eu tinha informações muito fiáveis de que o rei tinha ido para sempre.

"No início, Cascais foi apontado como um dos destinos [para o exílio], mas penso que ele deixou claro que vai viver num país autocrático como a Arábia Saudita — um rei só pode ser protegido por outro rei, sobretudo um rei absoluto."

É muito irónico: no início do livro relata a vontade da família real voltar ao país da origem e, depois de tanta provação, Juan Carlos poderá terminar a vida fora de Espanha…
Sim… é verdade. Ele nasceu no exílio e morrerá no exílio. É uma boa reflexão, é um círculo que se fecha, é curioso. Mas esperemos que ainda tenha muitos anos de vida.

Quais considera serem as revelações mais surpreendentes neste novo livro? Que descoberta a chocou mais?
A infância. Penso que é a primeira vez que é explicada com tanto detalhe, mas também as suas relações com as mulheres — penso que não existe nenhum livro que dê tantos detalhes sobre as relações com as namoradas ou com as amantes, como quiserem chamar-lhes. E o que está mais documentado [no livro] é a sua relação com a rainha, como casaram sem amor, como a relação se rompeu definitivamente quando Felipe nasceu e como foi um lento deteriorar.

Quão diferentes são pai e filho, Juan Carlos e Felipe, como reis e como maridos?
Felipe teve uma juventude muito alegre, teve muitas namoradas. Mas também é certo que é um marido muito fiel desde que se casou com Letizia, não se conhece nenhuma irregularidade. Letizia tampouco o iria consentir. Ela não é como Sofia. [Felipe] é um rei austero, moderado. Não está ligado a nenhum caso de corrupção que saibamos, nem a sua mulher. É discreto, não intervém em nada, mantém-se à margem de tudo. Haverá espanhóis que perguntem: porque o temos, para que serve? É um equilíbrio muito difícil: não ser como o pai e, ao mesmo tempo, não ser cinzento.

Para quando um livro sobre a rainha Letizia?
Sei que o vou escrever. Perguntam-me sempre isso nas entrevistas. Tenho muita matéria e é um dos livros que tenho de escrever, mas será dentro de uns anos. Letizia tem de ter mais biografia. É uma personagem muito interessante: é uma rainha divorciada, jornalista, que apanha o metro, que vem de uma família simples… Que se converteu rainha. A evolução psicológica dessa personagem é interessantíssima.

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