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Oito anos depois de ter deixado a política, Maria Luís Albuquerque está menos otimista do que no passado, assume as culpas de uma “geração” que permitiu que os jovens sejam obrigados a emigrar e de um país que precisa de aumentar significativamente o nível de riqueza para resolver problemas. Focada na ideia de que é fundamental “promover a mudança” e de que, para isso, é necessário que as pessoas “não se calem ou não se conformem”, a ex-ministra de Pedro Passos Coelho (o ex-líder do PSD que arrancou um aplauso quando um dos oradores referiu o facto) considera que não é possível alcançar uma real mudança de políticas se PS e PSD continuarem a “desfazer” o trabalho de governos anteriores cada vez que há uma mudança de cor política.
Depois de 2015, alertou, “os consensos entre PS e PSD acabaram” e os dois maiores partidos nacionais “perderam a capacidade de se entender” — “A política extremou-se, temos a esquerda e a direita.” Aos olhos de Maria Luís Albuquerque, este é um problema de princípio que não permite avanços na sociedade, particularmente pela falta de capacidade coletiva de fazer abanar a sociedade: “Lamento que tenhamos passado o ponto de não-retorno e não antevejo um sobressalto que nos obrigue a reagir. É preciso esse sobressalto e o que tenho visto não me dá esperança de que surja.”
Perante um auditório com mais de 150 jovens no âmbito do Campus Liberdade ’23, do Instituto +Liberdade — onde se destacam dois deputados da Iniciativa Liberal na plateia, Carla Castro e Carlos Guimarães Pinto —, Maria Luís Albuquerque sublinha que “não há mudança sem dor e que não há reformas que não deixem alguém pior do que estava”. E “já nem [quero] discutir se os impostos são altos ou baixos, mas que sejam estáveis”, insiste, nomeadamente para que os cidadãos possam saber com o que contar no futuro, no momento de fazer escolhas ou de abrir um negócio, exemplificou. “O cenário de estabilidade começa a ser cada vez mais difícil de manter”, reitera, argumentando que a falta de indignação da sociedade só dá sustento a essa inação dos partidos.
Maria Luís Albuquerque debruçou-se sobre temas como a demografia (uma “restrição brutal” para o país) — desde logo, o facto de cada jovem no mercado de trabalho ter dois pensionistas a seu cargo, mas também os problemas da natalidade. Mais do que isso, deixa o alerta para o facto de uma sociedade envelhecida ter repercussões: “Os políticos são predominantemente mais velhos porque são espelho da sociedade e são tão bons quanto a sociedade de onde sabem”, frisou, realçando também que “pessoas mais velhas e mais pobres não aceitam disrupções e não têm espaço para o risco que significa fazer mudanças”.
Após uma pergunta do público sobre a necessidade de convencer os “avós” de que um aumento de 10 euros na reforma não anula os impostos a que os jovens estão sujeitos e que os “obrigam a emigrar”, a ex-governante resume: “A parte mais difícil é convencer avós sobre o porquê de ser mais importante uma política que ajude a que os netos cá fiquem ou a ver crescer cá os netos, mas mais uma vez é preciso criar mais riqueza para que os 10€ não façam a diferença na pensão porque esta é miserável.”
As críticas ao Governo e ao PS foram-se notando nas linhas e entrelinhas do discurso de Maria Luís Albuquerque, desde logo à escolha do “melhor amigo” de António Costa para dossiês importantes da governação (“o instinto foi escolher uma pessoa em quem confia”), mas também no que toca aos incidentes no Ministério das Infraestruturas (“nem vou falar da pancadaria, mas como é possível que um documento esteja só no computador de um adjunto?”). “Este problema de fraca governance é absolutamente transversal”, afirma, mostrando não entender como é que “todas as crises neste país nos apanham de surpresa” e como há uma “incapacidade de planeamento” que até é vista como positiva: “Dizemos que os portugueses são fantásticos a improvisar, tenho para mim que isso é um embaraço, quem improvisa é quem não planeou.”
Moedas: habitação sem “partidarite” e impacto da JMJ
Ainda no Campus da Liberdade ’23, o protagonista da conferência “As cidades como centros de inovação”, Carlos Moedas, descreve-se como “pessoa política” que assenta em três pilares: impacto, intimidade (diferente da proximidade), inspiração. O importante no caso de um líder, seja qual for a área, é, segundo o presidente da Câmara Municipal de Lisboa a capacidade de impactar o outro e usou um dos temas do momento para o explicar:
“O político antigo quer resolver o problema da habitação através da partidarite, da discussão do partido, e problema resolve-se com muitas soluções concretas: quando cheguei à câmara de Lisboa pensei que não ia conseguir construir casa de um dia para o outro, mas há casas vazias que podem ser imediatamente recuperadas e há a capacidade de ajudar a pagar a renda a quem está a pagar muito”, explica, frisando que neste momento a autarquia tem 800 famílias nesta situação e chegará às mil em breve.
Trata-se do “concreto”, da capacidade de “tomar medidas concretas para mudar a vida das pessoas” e, num país como Portugal, com hierarquias fortes, Moedas realça que é preciso combater a ideia da “questão do político que se posicionava acima dos outros”, já que um “político não é um super-homem ou uma super-mulher”.
Questionado sobre a Jornada Mundial da Juventude e o impacto na economia, Moedas justifica que em causa estão indicadores diários do BdP, que “não têm qualquer capacidade” para explicar “o que é que foi o impacto económico até porque uma semana depois saiu notícia a dizer que cartões de crédito aumentaram em 15% o consumo nessa semana”. Para o presidente da autarquia, “são tendências diárias que não significam exatamente nada”.
E quer esperar para ver: “Se tiver acontecido isso Lisboa [impacto negativo na economia] terá sido a única cidade do mundo em que uma JMJ teve impacto negativo na economia, o que me parece uma coisa impossível.” Carlos Moedas usou ainda o argumento de quanto custaria “uma campanha publicitária em que Lisboa chega a 500 milhões de lares no mundo com imagens todos os dias durante seis dias” como aconteceu na jornada.