Está selado mais um top job europeu: Roberta Metsola foi reeleita presidente do Parlamento Europeu com uma votação histórica. Foram 80,4% dos votos à primeira volta (e 90,2% dos votos expressos), o que é o melhor resultado de um presidente do hemiciclo europeu. A votação foi um autêntico passeio para a maltesa que contou com os votos da extrema-direita e dos eurocéticos que agora lhe pedem em troca o fim da cerca sanitária.
Metsola conseguiu 565 votos em em 699 votantes, contra apenas 61 da candidata indicada pela esquerda, Irene Montero. No discurso da vitória, Roberta Metsola prometeu, de facto, uma “Europa para todos“, mas deixou avisos a algumas forças políticas: “Temos de ultrapassar o pensamento antigo que excluiu as pessoas, que fomenta ódio e raiva em vez de construir esperança e confiança no político. Esta casa quer construir em vez de destruir”.
Os resultados para o Parlamento Europeu nos últimos 15 anos
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Roberta Metsola teve a melhor votação de sempre de um presidente do Parlamento Europeu desde 2009 com 562 votos, num total de 623 votos expressos.
- Roberta Metsola (PPE) 2024: 562 votos a favor em 699 votantes.
- Roberta Metsola (PPE) em janeiro de 2022: 458 votos a favor em 690 votantes.
- David-Maria Sassoli (S&D) em 2019 – 345 votos a favor (na seegunda volta) em 704 votantes.
- Antonio Tajani (EPP) – 351 votos a favor (na quarta volta) em 713 votantes.
- Martin Schulz (S&D) em julho de 2014: 409 votos em 723 votantes.
- Martin Schulz (S&D) em janeiro de 2012: 387 votos em 715 votantes.
- Jerzy Buzek (PPE) em 2009: 555 votos em 713 votantes.
A Ucrânia continua a ser uma prioridade para o Parlamento Europeu — que vai votar nova resolução de apoio a Kiev na quarta-feira — e Metsola faz questão de o dizer. A Defesa e a Segurança da Europa, para a qual garante que irá contribuir, vai opor-se “aos sonhos expansionistas de ditadores na vizinhança” da Europa, numa referência a Vladimir Putin e Aleksandr Lukashenko.
Metsola disse mesmo que “a guerra de agressão russa contra a soberana Ucrânia continua no topo da agenda” da UE. Lembrou que foi para Kiev em nome do Parlamento Europeu logo “no início da guerra” e que essa visita que deu um novo impulso e uma “nova visibilidade e influência” aos eurodeputados. Metsola diz que a Ucrânia confia no Parlamento Europeu e que será “chamado a fazer mais”.
Relativamente ao Médio Oriente, Metsola defende que o Parlamento Europeu deve “continuar a ser a voz da humanidade que pressiona pelo fim do ciclo intergeracional de violência, por uma solução de dois Estados, uma paz sustentável e o regresso dos reféns” israelita.
Já antes no “pitch” de cinco minutos como candidata, Roberta Metsola tinha defendido que, nos próximos dois anos e meio”, seria necessária “uma liderança forte” para o Parlamento Europeu, tendo em conta o contexto de imprevisibilidade. Irene Montero, a candidata derrotada, tinha aproveitado o mesmo espaço para defender que a “Europa não pode continuar a ser cúmplice do Estado genocida de Israel”. Montero lembrou ainda as eleições em França que, defendeu, dão à Europa “um ensinamento democrático e anti-fascista”. E acrescentou: “A extrema-direita combate-se pela via da esquerda, as políticas neoliberais não só não põem um travão à extrema-direita como lhe dão um tapete vermelho para andar”.
Portugueses entre o voto a Metsola e a mira em Von der Leyen
Sebastião Bugalho destacou o resultado histórico alcançado por Roberta Metsola e “o modo como as famílias políticas europeístas, democráticas e defensoras da União Europeia acabam por estar juntas quando é necessário”. Quanto a Ursula von der Leyen, o eurodeputado eleito pela Aliança Democrática confirma que terá o seu voto — e de todos na delegação portuguesa do PPE — e apesar de não fazer previsões, aponta: “A partir do momento em que as principais famílias políticas deram a sua palavra para reeleger Ursula von der Leyen eu acredito nas palavras deles.”
Sobre o facto de serem precisos os votos da extrema-direita para conseguir um resultado tão consensual quanto o de Metsola, Bugalho remata: “Tenho a certeza que entre ter os votos da extrema-direita e ser reeleita sem ter 90%, von der Leyen preferia não ter 90% para não contar com esses votos.” E apesar de “não colocar o cenário” de o acordo para os top jobs não ser cumprido, caso isso acontecesse, Bugalho considera que “António Costa enfrentaria um cenário politicamente complexo, não só para ele, como para toda a Europa”.
Já Marta Temido garantiu que os socialistas são “confiáveis” e que “há uma convicção de que os acordos são para cumprir”, mas sublinha que “isso implica passos de parte a parte” e que “não há cheques em branco”, numa alusão à eleição de Von der Leyen na quinta-feira, que está longe de ter o apoio férreo dos eurodeputados do PS. A eurodeputada diz que o PS é confiável “em relação àquilo que assumimos como compromissos e no sentido da nossa votação, naturalmente que os compromissos que assumimos têm por base não posições, mas conteúdos políticos e esses conteúdos políticos têm de ser respeitados”, explica a eurodeputada socialista.
Ainda sobre Metsola, Tânger Corrêa confirma que o Patriotas pela Europa tomou a decisão de “apoiar Roberta Metsola em vez de apresentar um candidato próprio” porque “os mais antigos no Parlamento Europeu afirmaram que Metsola tinha sido cooperante com a antiga formação do ID ou, pelo menos, não se opunha como outros”.
O eurodeputado do Chega revela que esse apoio tem por base a exigência de “algumas contrapartidas”, nomeadamente que “ajude a desbloquear o cordão sanitário” de que a direita radical é alvo. “Houve uma conversa entre o presidente do grupo, Jordan Bardella, e Metsola e foi muito positiva, daí que tivéssemos votado todos”, refere, sublinhando que está à espera de “honestidade” de todas as partes. Mas quanto a Ursula Von der Leyen não há qualquer hipótese: Tânger Corrêa confirmou que está “fora de questão” votar a favor de Ursula von der Leyen.
No lado liberal, há mudanças de opinião favoráveis para a atual presidente da Comissão Europeia. João Cotrim Figueiredo diz que conversações dos últimos dias permitiram que “exista suficiente consenso entre os liberais e os populares” para um voto em Ursula von der Leyen. “Do nosso lado, o acordo está suficientemente equilibrado para poder merecer uma votação favorável”, refere o eurodeputado liberal que chegou a admitir não ter esse sentido de voto.
À esquerda não houve voto para Metsola e muito menos vai existir para Ursula Von der Leyen. João Oliveira considera que a eleição de Metsola “não constitui uma surpresa” considerando-a uma “tradução dos posicionamentos políticos distintos assumidos e que não permitem que se possa encarar a eleição como uma perspetiva de solução para os problemas dos povos da Europa”.
Sobre a votação de Ursula von der Leyen, o eurodeputado pelo PCP reconhece que “não representa uma perspetiva diferente” da de Metsola e “também aí há uma objeção de fundo”. “Não contará com o nosso voto, contará com a nossa oposição”, revela.
A bloquista Catarina Martins mostrou-se preocupada com o “significado político” de um “arco” de votação que foi dos “verdes à extrema-direita”. “Aqui há forças de extrema-direita herdeiras dos nazis e fascistas e acho que Roberta Metsola não devia querer ter votos desses herdeiros”, afirma. Relativamente a Ursula von der Leyen, diz apenas que “não será nenhuma surpresa que o voto vai ser contra”. Pela amostra portuguesa se percebe que a manhã de Von der Leyen quinta-feira vai ser muito mais difícil do que o passeio no parque de Metsola.