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Era a última hipótese para aceitar o convite, mas Donald J. Trump declinou-o. O procurador especial Jack Smith enviou uma carta ao antigo Presidente dos Estados Unidos, um pró-forma judicial, habitualmente enviado a quem está prestes a ser acusado de algum crime. A carta servia para convidar Trump, que conta ser o candidato republicano às Presidenciais de 2024, a apresentar-se perante um grande júri para prestar depoimento sobre o seu envolvimento (ou não) na invasão do Capitólio de 6 de janeiro de 2021.
Acontece que o convite é isso mesmo: um convite, em nada obrigatório, e, por isso mesmo, era pouco provável que o empresário norte-americano comparecesse até à data limite, que terminou nesta quinta-feira. Na carta, segundo a imprensa dos Estados Unidos, podia ler-se: “Fica advertido de que é alvo na investigação do grande júri. Pode recusar-se a responder a quaisquer perguntas, se entender que responder com a verdade poderá incriminá-lo.”
Se Trump decidiu não aparecer, um antigo assessor da Casa Branca tomou a decisão oposta. William Russell, que passou a maior parte do dia da invasão no Capitólio com o então Presidente e que agora trabalha na sua campanha presidencial, foi ouvido pelo grande júri. Não foi a primeira vez. O testemunho de Russell já tinha sido recolhido anteriormente.
Vídeos publicados nas redes sociais mostram como Donald Trump passou a quinta-feira: no seu novo campo de golfe em New Jersey. Além disso, o próprio publicou um vídeo para angariação de fundos na Truth Social, a rede social que criou, onde fala brevemente sobre o processo: “uma caça às bruxas” que pretende destruí-lo.
O que acontece a seguir? Em breve, pode ser uma questão de dias (mais provavelmente de semanas), Jack Smith deverá acusar formalmente Trump. Acusado ou não, condenado ou não, Trump já disse que não desiste da corrida presidencial. E nada na lei americana proíbe uma pessoa detida de se candidatar à Casa Branca.
“Nunca vou sair”: Trump promete continuar na corrida à Casa Branca mesmo se for condenado
Do que se sabe, a linha de investigação de Jack Smith segue um caminho: houve uma série de reuniões, entre novembro e dezembro de 2020, depois das Presidenciais que deram vitória a Joe Biden, em que Donald Trump, em conjunto com a sua equipa, terá planeado pressionar Mike Pence, na altura vice-presidente dos EUA, a não certificar a eleição de Biden.
Essa cerimónia, agendada para 6 de janeiro de 2021, ficou marcada pela invasão do Capitólio por apoiantes de Trump, que contestavam a vitória do candidato democrata, alegando ter havido fraude eleitoral. Pelo caminho, deixaram um rasto de destruição.
Além disso, Jack Smith está também a dar especial atenção à assinatura de certificados falsos que davam a vitória a Trump, enviados ao Congresso pelos apoiantes do antigo Presidente.
Esta não é a única complicação jurídica em que Donald J. Trump se vê envolvido, ele que se tornou o primeiro antigo Presidente dos Estados Unidos a ser acusado criminalmente no caso que envolve Stormy Daniels, uma atriz de filmes pornográficos.
O caso dos documentos secretos
37 crimes, entre eles violação da Lei de Espionagem e de obstrução da Justiça. Formalmente acusado. Ainda sem data para o julgamento.
20 de janeiro de 2023. Ao meio-dia em ponto, Donald J. Trump deixou de ser Presidente dos Estados Unidos da América. O problema? Quando saiu da Casa Branca terá levado consigo o que não devia, nem podia. “Trump mandou que várias caixas, muitas delas contendo documentos classificados, fossem transportadas para o clube Mar-a-Lago, em Palm Beach, na Flórida, onde mantinha a sua residência”, lê-se na acusação de 49 páginas. O antigo Presidente “não estava autorizado a possuir ou a reter aqueles documentos classificados”.
Além disso, recusou-se sempre a entregá-los. Foram necessárias buscas à sua residência para recuperar os documentos.
Foi assim que chegámos a 9 de junho deste ano, dia em que as autoridades federais norte-americanas revelaram a acusação formal que inclui 37 crimes, entre eles de violação da Lei de Espionagem.
Dias depois, a 13 de junho, Donald J. Trump é presente a tribunal, onde já tinha estado em março, altura em que foi acusado de 34 crimes relacionados com o pagamento feito a uma atriz de filmes pornográficos. A postura foi a mesma: considerou-se inocente de todas as acusações que recaem sobre si.
Donald Trump acusado de 37 crimes no caso dos documentos confidenciais levados da Casa Branca
O caso está nas mãos do procurador especial Jack Smith — que, segundo Trump, o “odeia”. Violações à Lei da Espionagem são 31, o mesmo número de documentos que reteve em sua casa, “de forma intencional e obstinada”, e que continham informações vitais para a segurança do país. Durante as buscas à sua mansão, foram encontrados documentos sobre capacidades militares dos EUA, incluindo sobre armas nucleares, entre muitos outros.
O antigo Presidente foi também acusado de crimes de sonegação de informação, obstrução da justiça e falsas declarações.
Numa conferência de imprensa, Jack Smith convidou todos a lerem a acusação na íntegra, para perceberem “a abrangência e a gravidade dos crimes”, frisando que as leis norte-americanas “aplicam-se a toda a gente”.
Esta semana, a 18 de julho, a juíza distrital Aileen Cannon, a quem foi entregue o processo, convocou uma primeira audiência, à qual Donald Trump não compareceu. No imediato, a juíza não agendou data para o julgamento.
Advogados de Trump pedem adiamento do julgamento em caso dos documentos confidenciais
A acusação pedia que fosse marcado para dezembro, enquanto a defesa pedia um adiamento indefinido por considerar que responder em tribunal pode prejudicar a campanha presidencial de Trump, o candidato mais bem colocado para receber a nomeação do Partido Republicano para as eleições de 2024.
O suborno da atriz porno, da modelo da Playboy e do porteiro
34 crimes, a maioria de falsificação de documentos. Formalmente acusado. Julgamento em março de 2024
O ano é 2006. Stormy Daniels e Donald Trump mantêm um caso extraconjugal, segundo a atriz de filmes pornográficos. Dez anos mais tarde, quando decorrem as Presidenciais de 2016, o advogado do então candidato, Michael Cohen, paga 130 mil dólares à mulher em troca do seu silêncio. O caso tornou-se público depois de uma reportagem do Wall Street Journal de 12 de janeiro de 2018.
A 4 de abril deste ano, Donald Trump foi formalmente acusado de 34 crimes. Segundo o procurador distrital de Manhattan, Alvin Bragg, o antigo Presidente dos Estados Unidos terá criado um esquema para branquear informações que pudessem pôr em causa a sua eleição em 2016.
Stormy Daniels diz que Trump não deve ir para a prisão por a ter subornado
O caso de Stormy Daniels é apenas a ponta do icebergue e há indícios de outros subornos para evitar que detalhes da vida privada de Trump viessem a público numa altura em que procurava chegar à Casa Branca. Outro caso é o de Karen McDougal, modelo da Playboy, que teria intenção de vender a história do seu romance com o empresário. E há ainda um antigo porteiro da Trump Tower que saberia da existência de um filho do patrão, nascido fora do casamento.
Tudo junto, Alvin Bragg acusa Trump de 34 crimes, a maioria deles de falsificação de documentos. Ao longo de 13 páginas, o procurador defende que o objetivo do empresário era “influenciar a eleição presidencial de 2016, identificando e comprando informações negativas para suprimir a sua publicação e beneficiar as perspetivas eleitorais do réu”.
O pagamento ao porteiro, à alegada amante e a Stormy Daniels: as acusações que Trump enfrenta
No dia em que compareceu em tribunal, Donald J. Trump declarou-se inocente de todas as acusações criminais. Nessa data fez-se história nos Estados Unidos: foi a primeira vez que um antigo Presidente foi formalmente acusado de um crime.
Dias mais tarde, durante o mês de maio, os advogados de Trump tentaram afastar o juiz Juan Merchan do caso, alegando que era próximo do Partido Democrata, o que poderia prejudicar o republicano. Além disso, a equipa jurídica do antigo Presidente tentou mudar o caso de mãos, passando de um tribunal distrital para um federal.
Esta semana, a 19 de julho, Trump recebeu notícias, mas não as que esperava. O processo criminal de Manhattan não será transferido para um tribunal federal.
Os argumentos da Defesa são de que as acusações estão relacionadas com o tempo em que Trump ocupou o cargo de Presidente dos Estados Unidos. O juiz que deliberou teve um entendimento diferente: “As evidências sugerem, de forma esmagadora, que o assunto foi puramente uma questão pessoal do Presidente — um encobrimento de um evento embaraçoso. O dinheiro pago a uma estrela de cinema para adultos não está relacionado com atos oficiais de um Presidente”, argumentou Alvin Hellerstein num documento de 25 páginas.
“Falsificar registos comerciais para ocultar tal reembolso e transformá-lo em despesa comercial para Trump e receita para Cohen também não se relaciona com deveres presidenciais”, acrescentou.
O caso deve ir a julgamento em março de 2024.
A agressão sexual num provador de roupa
Crimes de agressão sexual e de difamação. Condenado a pagar indemnização de 5 milhões a E. Jean Carroll.
Os factos remontam a 1996. Nesse ano, a jornalista E. Jean Carroll diz ter sido agredida sexualmente por Trump nos provadores de uma loja em Manhattan. Carroll entrou com dois processos contra o empresário: um por difamação — já que Trump negou a agressão sexual e acusou-a de mentir (novembro de 2019) —; e o segundo, o mais mediático, deu entrada em novembro de 2022.
O primeiro está parado nos tribunais até hoje.
O segundo já foi julgado e o tribunal foi palco de depoimentos extremamente gráficos. Ao abrigo de um diploma promulgado nesse mesmo ano, a Lei dos Adultos Sobreviventes de 2022, Carroll pode levar Trump a julgamento, já que a nova legislação prevê que as vítimas possam pedir indemnizações pelos danos, mesmo quando os casos de agressão sexual prescreveram.
O julgamento decorreu este ano, entre abril e maio.
Quatro momentos-chave do processo que responsabilizou Trump por abuso sexual contra E. Jean Carroll
O júri condenou Trump e ordenou que pagasse uma indemnização milionária a Carroll, de cinco milhões de dólares no total: dois milhões por agressão sexual (não ficou provado o crime de violação) e três milhões por difamação. Nas 59 páginas da decisão judicial pode ler-se que Trump “deliberada e forçadamente penetrou a vagina de Carroll com os seus dedos, causando-lhe dor imediata e danos psicológicos e emocionais de longa duração”.
No entanto, por ser um processo cível e não judicial, e por se tratar de um crime que prescreveu, o antigo Presidente não foi considerado formalmente culpado, nem tampouco poderia cumprir pena de prisão.
Nos últimos dias, houve novos desenvolvimentos. Donald Trump, que tinha recorrido da decisão judicial e entrado com um processo contra Carroll, recebeu más notícias. Um juiz federal de Nova Iorque rejeitou o seu pedido para a realização de um novo julgamento.
Um dos pontos contestados pelos advogados do milionário norte-americano era o valor da indemnização, já que a acusação de violação não ficou provada. Assim, defendiam que “uma indemnização de dois milhões de dólares” por um comportamento como “apalpar os seios por cima da roupa” que “não causou qualquer dano mental diagnosticado” é “excessiva”.
Juiz rejeita pedido de Trump para novo julgamento contra jornalista E. Jean Carroll
A história dos 11.780 votos falsos
Sob investigação. Eventuais acusações de extorsão e de conspiração para cometer fraude eleitoral.
Presidenciais de 2020. Donald J. Trump está prestes a ter de assumir a derrota na corrida contra Joe Biden. As alegações de fraude põem em causa os resultados de 3 de novembro e, no estado da Geórgia, é feita uma auditoria aos votos contados. Nas semanas seguintes, a 23 de dezembro e a 2 de janeiro, o republicano fala ao telefone com Brad Raffensperger, secretário do estado da Geórgia, responsável pela auditoria. O segundo telefonema é gravado e divulgado pela imprensa. Trump diz a Raffensperger para “encontrar 11.780 votos”, o número necessário para ultrapassar Biden.
Em fevereiro de 2021, os procuradores da Geórgia, liderados por Fani T. Willis, começaram a investigar o sucedido. Tudo indica que estarão a tentar construir um caso onde haverá acusações de extorsão e de conspiração para cometer fraude eleitoral. Um grande júri, reunido para deliberar sobre o caso, considerou que deviam ser acusadas várias pessoas, embora não se saiba quem. O documento é sigiloso até hoje.
Há dois meses, em maio, Fani T. Willis deu os primeiros sinais de qual será o cronograma do processo. Pediu à sua equipa que se mantivesse disponível durante as primeiras três semanas de agosto e pediu a juízes de um tribunal de Atlanta que não marcassem julgamentos para esse período do verão.
Embora não seja certo que Trump vá ser acusado, esse é o cenário mais provável. Numa entrevista ao New York Times, a presidente do júri, Emily Kohrs, questionada sobre a acusação do antigo Presidente respondeu indiretamente: “Não vão ficar chocados. Não é ciência aeroespacial.”
Os milhões que se transformaram em triliões
Crime de fraude fiscal e bancária. Formalmente acusado. Julgamento marcado para outubro.
Neste caso não há uma data, há várias. Num despacho de 220 páginas, Donald Trump e os filhos são acusados de fraude fiscal. A procuradora-geral de Nova Iorque, Letitia James, aponta para mais de 200 avaliações falsas de ativos em 11 demonstrações anuais de rendimentos. No final, a família Trump terá enganado credores e seguradoras ao sobreavaliar os seus ativos.
Letitia James só tem autoridade para avançar com um processo cível e foi isso que fez, mesmo não podendo apresentar acusações criminais. O seu objetivo é impedir o empresário e a sua família de conduzirem negócios no estado de Nova Iorque.
O julgamento está marcado para outubro.