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O Banco Central Europeu, com sede em Frankfurt, passa a ter mais atenção à dimensão "verde" da economia

picture alliance via Getty Image

O Banco Central Europeu, com sede em Frankfurt, passa a ter mais atenção à dimensão "verde" da economia

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O BCE está mais "verde". Empresas poluentes e banca podem ter de fazer contas à vida

As alterações climáticas ganham peso na agenda do BCE. Os bancos, que enfrentam novas exigências, podem vir a cobrar mais nos créditos a empresas poluentes.

O ajustamento da meta de inflação de médio prazo para os 2% (com margem para ser mais ou menos) gera, porventura, mais frenesim nos mercados, mas os aspetos mais inovadores da revisão estratégica que o BCE apresentou esta quinta-feira estão pintados a verde. São várias as medidas (sem precedentes na Zona Euro) que o banco central europeu quer aplicar, num futuro mais ou menos próximo: testes de stress a bancos face a possíveis choques climáticos; o condicionamento da compra de ativos empresariais ao cumprimento de objetivos de natureza ambiental; ou levar em conta os riscos ligados ao clima para a avaliação de garantias a empréstimos.

Christine Lagarde quer que entidade que dirige acompanhe a evolução dos tempos e estas “armas” vão permitir ao BCE pôr em sentido as empresas poluentes e os bancos que lhes emprestam dinheiro.

O Conselho do BCE reconheceu, desde logo, que as alterações climáticas “têm implicações profundas para a estabilidade de preços”, tendo decidido, por isso, apresentar “um plano de ação abrangente, com um roteiro ambicioso”.

“As alterações climáticas e a transição para uma economia mais sustentável afetam as perspetivas para a estabilidade de preços através do impacto sobre os indicadores macroeconómicos, como inflação, produção, emprego, taxas de juros, investimento e produtividade; estabilidade financeira; e a transmissão da política monetária”, esclarece o BCE. E os impactos não ficam por aqui, porque as alterações climáticas também “afetam o valor e o perfil de risco dos ativos detidos no balanço do Euro-sistema, podendo conduzir a uma acumulação indesejável de riscos financeiros relacionados com o clima”.

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“Estas mudanças são importantíssimas, porque, pela primeira vez, o sistema financeiro está a ser chamado para ficar alinhado com objetivos climáticos”, o que “nunca tinha acontecido". "O setor financeiro não está habituado a qualquer tipo de orientações além da maximização do lucro" e agora "o BCE vem reconhecer que a banca tem de mudar".
Sofia Santos, economista especialista em finanças sustentáveis

Para quem acompanha estes temas, como Sofia Santos, economista do ISEG e consultora em finanças sustentáveis, as medidas propostas não são uma absoluta novidade, porque “todas elas já têm sido faladas”, com o BCE a “lançar no ano passado um guia de orientações em que já exprimia o que esperava que o sistema financeiro pudesse fazer”. Uma espécie de aviso à navegação.

Daí a incorporar essas regras vai, no entanto, uma longa distância. E Sofia Santos considera que “estas mudanças são importantíssimas, porque, pela primeira vez, o sistema financeiro está a ser chamado para ficar alinhado com objetivos climáticos”, o que “nunca tinha acontecido”.

O setor financeiro não está habituado a qualquer tipo de orientações além da maximização do lucro” e agora o BCE vem “reconhecer que a banca tem de mudar”, porque “as alterações climáticas são um risco financeiro”.

Também Paul Diggle, vice-economista-chefe da Aberdeen Standard Investments, não tem dúvidas em afirmar que é nestas mudanças de natureza ambiental que a revisão estratégica do BCE se torna “revolucionária”. Numa nota de research, o economista destaca a vontade do supervisor europeu de ter, a curto prazo, mais conhecimento sobre os riscos associados ao clima e, a médio prazo, várias medidas inovadoras. “Outros bancos centrais vão ler isto e pensar seriamente sobre como podem eles mostrar um compromisso semelhante para tornar a política monetária mais ecológica”.

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Muito em breve haverá uma capa ambiental sobre a compra de ativos empresariais, porque o BCE quer ajustar “o enquadramento que orienta a atribuição de compras de obrigações de empresas para incorporar critérios de alterações climáticas”. Isto significa que os emitentes dessas obrigações terão de cumprir a legislação da UE que põe em marcha o acordo de Paris, “através de métricas relacionadas com as alterações climáticas ou compromissos dos emitentes para com esses objetivos”.

A entidade liderada por Christine Lagarde lembra ainda que já começou a ter em conta os “riscos relevantes das alterações climáticas” nos procedimentos de ‘due diligence’ — as inspeções detalhadas que são feitas nas empresas para avaliar riscos do negócio — nas compras de ativos que faz junto das empresas.

Embora não totalmente satisfeito, Jörg Krämer, economista-chefe do banco alemão Commerzbank, aplaude a ideia. O BCE, “atualmente, compra uma quantidade desproporcionada de obrigações de empresas que emitem quantidades de CO2 acima da média”, refere o economista numa nota de research enviada às redações. “Empresas intensivas em CO2 tendem a emitir mais obrigações” e o BCE “quer reduzir essa distorção”.

O economista compreende ainda o alinhamento da entidade monetária com as prioridades das restantes instituições europeias, que estão profundamente empenhadas na chamada transição ambiental. “Em princípio, consideramos correto que o BCE já não pretenda contrariar a política climática dos políticos eleitos e, por isso, promete reduzir o enviesamento do CO2 na sua política de compras e garantias”.

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Só que, para Krämer, por muito louvável que seja a medida, não resolve tudo. “As abordagens de correção são complicadas e resolvem apenas de forma aproximada o problema de distorção de CO2”. Para o economista-chefe do Commerzbank, “o problema poderia ser evitado muito mais facilmente e, acima de tudo, completamente, se o BCE simplesmente parasse de comprar obrigações às empresas e descontinuasse esse programa”. É que Krämer vê nestas compras outras distorções, “como a desvantagem das pequenas e médias empresas”. Ao contrário das grandes empresas, as PME “geralmente não recolhem fundos nos mercados obrigacionistas”.

Problema à vista para empresas que dependem de combustíveis fósseis 

A distorção referida pelo economista do Commerzbank — em que são as empresas intensivas em CO2 que mais emitem obrigações — “também tem reflexos no colateral aceite pelo BCE”, indica Jörg Krämer. E é por isso que a avaliação dessas garantias, nas operações de crédito que envolvam bancos do Euro-sistema, se vai tornar também mais ambiental. O BCE vai passar a ter em conta “riscos climáticos relevantes” nessas avaliações.

Esta é, para Sofia Santos, uma das maiores novidades no pacote apresentado pelo BCE. “É talvez a primeira vez que as garantias estão assim tão explicitamente identificadas”. E como é que a perspetiva sobre a qualidade desses ativos deixados como garantia pode ser alterada, à luz do novo enquadramento ambiental? “Muitas vezes o colateral é um edifício, um terreno, mas esse edifício ou terreno pode estar sujeito a riscos climáticos. Imaginemos que é um terreno que já tem algum tipo de contaminação, ou que é um edifício que já tem um elevado risco físico, porque está numa zona de inundações ou de fogos, uma zona perto do rio”, explica a consultora, que trabalha para o Green Climate Fund das Nações Unidas para África.

O que significa novos problemas para vários ativos que não tinham, até agora, este filtro. “Se eu, como banco, tenho muita exposição a empresas que emitem grandes quantidades de CO2 e a regulação é toda no sentido de baixar as emissões de CO2, então eu tenho ativos que, se calhar, estão sobreavaliados”, avisa Sofia Santos.

epa08760953 YEARENDER 2020 PERSONALITIESEuropean Central Bank President Christine Lagarde during an EU Eurogroup finance ministers' meeting at the European Council in Brussels, Belgium, 20 January 2020. Lagarde is the first female President of the ECB. EPA/STEPHANIE LECOCQ *** Local Caption *** 55785010

Christine Lagarde, presidente do BCE, reconhece que as alterações climáticas "têm implicações profundas para a estabilidade de preços"

STEPHANIE LECOCQ/EPA

Algumas empresas podem, por isso, ver o valor da avaliação dos ativos baixar na hora de os dar como colateral para um empréstimo, “principalmente, as dos combustíveis fósseis”, porque “a banca pode começar a ter dúvidas se quer emprestar ou não, porque aumenta o risco”. Estão em causa “petrolíferas, centrais a carvão, gás natural”.

Os bancos vão ter de fazer novas contas à vida: “Se eu emprestar dinheiro a estas empresas vou ter uma maior exposição de risco e, como tal, posso vir a ter de reter mais capital. Se eu retenho mais capital, tenho menos dinheiro para emprestar, logo a minha rentabilidade pode baixar”. As instituições financeiras vão ter, então, de perceber se “vão emprestar dinheiro, talvez até a uma taxa de juro superior” a este tipo de empresas, por terem mais risco, “ou se preferem não emprestar porque não querem ter o risco de reter depois mais capital”. Caberá aos bancos decidir, consoante a estratégia de cada um.

Uma questão que terá implicações mais abrangentes, uma vez que o BCE quer fazer em 2022 “testes de stress climáticos ao balanço do Euro-sistema” para avaliar em que medida se encontram os bancos expostos às alterações climáticas. Algo que “Inglaterra já começou a fazer”, de acordo com Sofia Santos, e que os britânicos já discutem há algum tempo.

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“A lógica é a mesma do que outros testes de stress — se se concretizar um risco, o banco tem capital suficiente para conseguir responder? Há riscos como a taxa de desemprego, uma nova crise mundial, e agora vamos incluir um risco climático sistémico — que podem ser tempestades ou um furacão”, por exemplo.

“Podem-me dar uma garantia que vale 5 milhões, mas se eu [como banco] a analisar bem e o valor baixar, eu posso ter uma imparidade”, explica a consultora. E, por isso, passar nos novos testes de stress implicará que os bancos não deixam cair o filtro ambiental na hora de emprestar.

“Vamos ter de desenvolver novo conhecimento académico nesta área, porque não há”

A curto prazo, o BCE quer “desenvolver novos indicadores experimentais, abrangendo instrumentos financeiros verdes relevantes e a pegada de carbono das instituições financeiras, bem como as suas exposições a riscos físicos relacionados com o clima”. E promete “acelerar o desenvolvimento de novos modelos e realizar análises teóricas e empíricas” para acompanhar as implicações das alterações climáticas na economia e no sistema financeiro, e “a transmissão da política monetária, através dos mercados financeiros e do sistema bancário, para famílias e empresas”.

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Abre-se toda uma nova área da economia“, considera Sofia Santos. “Faz a ponte com a engenharia, é uma ótima área de ligação entre economistas e engenheiros de termodinâmica”. Significa ainda que “estão a ser dados os primeiros passos e há muito desconhecimento”, uma vez que “tudo isto para o sistema financeiro é muito novo”.

“Como é que o setor financeiro consegue calcular as emissões de CO2 das suas empresas? Só se as empresas lhes disserem. Sendo que 90 e tal por cento são PME, então as PME vão ter de começar a reportar as suas emissões de CO2”, o que “não é difícil”, porque “é uma folha de excel com cálculos”.

“Se nós conseguimos fazer a contabilidade que fazemos hoje, então também se consegue calcular as emissões de CO2. Há fórmulas”, nota Sofia Santos. “Da mesma forma que hoje temos o IES [Informação Empresarial Simplificada que, é entregue às Finanças], daqui a uns tempos vamos ter um IES ambiental”, acredita.

É, no entanto, terreno por desbravar. “Vamos ter de desenvolver novo conhecimento académico nesta área, porque não há, e depois vamos ter de começar a traduzir isto para conhecimento mais prático através dos indicadores”.

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