Três semanas depois, acabou. Portugal perdeu com França nas grandes penalidades, foi eliminado nos quartos de final e está fora do Euro 2024 — o que significa que, muito provavelmente, Cristiano Ronaldo e Pepe perderam esta sexta-feira a última oportunidade de repetir a alegria que juntos conquistaram em 2016.
Logo depois do penálti de Theo Hernández que Diogo Costa não conseguiu travar e que ditou o apuramento francês e a eliminação portuguesa, Pepe não conteve as lágrimas e chorou no ombro de Cristiano Ronaldo menos de uma semana de, contra a Eslovénia, Cristiano Ronaldo não ter contido as lágrimas e ter chorado no ombro de Pepe.
De um lado, o avançado não assinou qualquer golo e não conseguiu quebrar o recorde que perseguia, de se tornar o mais velho de sempre a marcar num Campeonato da Europa. Do outro, o central tornou-se o mais velho de sempre a jogar num Campeonato da Europa, mas terá feito o último jogo pela Seleção Nacional com muita desilusão pelo meio. Certo é que, para a história e depois de 17 anos a dividirem balneário, deixam para a história a fotografia de um abraço que é o fim de uma era.
Do lado de Cristiano Ronaldo, aquele penálti, as lágrimas e o recorde que ficou por bater
Era um dos momentos mais aguardados do Euro 2024. Depois de se tornar o primeiro jogador de sempre a participar em seis Campeonatos da Europa, recorde que alcançaria com o simples ato de cumprir um minuto em qualquer jogo, Cristiano Ronaldo precisava de um golo para se tornar o mais velho de sempre a marcar num Campeonato da Europa. Tentou, entre livres, penáltis, cabeceamentos e remates — mas não conseguiu.
Aos 39 anos, deixou por quebrar um dos recordes que mais perseguia e perdeu-o para Luka Modric, que não passou da fase de grupos com a Croácia, mas marcou um golo a Itália. Aos 39 anos, pela primeira vez na carreira, terminou uma fase final de uma competição sem qualquer golo marcado. Aos 39 anos, leva agora nove jogos consecutivos sem marcar qualquer golo em Europeus ou Mundiais, sendo que os últimos três que marcou foram de grande penalidade.
Tal como o próprio reconheceu, logo depois do jogo contra a Eslovénia na passada segunda-feira, este terá sido o último Campeonato da Europa de Cristiano Ronaldo. 20 anos depois do primeiro, em 2004, e oito depois do que conquistou, em 2016, despediu-se dos palcos europeus precisamente depois da primeira temporada completa que cumpriu longe da Europa. E viveu uma odisseia de três semanas onde podiam caber três romances.
Sem que a titularidade alguma vez estivesse ameaçada — já que Roberto Martínez sempre deixou bem claro que “o capitão”, como tantas vezes se referiu a Cristiano Ronaldo, precisava de estar no onze inicial –, começou por ser elogiado pelas exibições contra a República Checa e a Turquia. No seguimento da prestação no último encontro de preparação, contra a Irlanda, mostrava-se mais entrosado com a equipa, mais solidário e colaborativo, contribuindo para a movimentação ofensiva.
Sem ser exuberante, foi importante na complexa primeira jornada, contra a República Checa, e voltou a sê-lo na vitória clara contra a Turquia, onde até foi elogiado pela assistência para o golo de Bruno Fernandes num lance em que poderia ter rematado à baliza. Contra a Geórgia, e no meio da derrocada portuguesa com um onze onde só ele, Diogo Costa e João Palhinha sobraram, tudo se complicou. Até que a hecatombe, desportiva e emocional, apareceu contra a Eslovénia.
Num jogo onde muito cedo se percebeu que não estava a conseguir equilibrar-se emocionalmente, já que não segurou as lágrimas logo no momento do hino nacional, foi alimentando a frustração do golo que não aparecia. Somou oportunidades, remates mais ou menos enquadrados, livres mais ou menos adequados e desabafos para os céus, gritos desmedidos e braços perdidos ao vento. Já no prolongamento, permitiu a defesa de Jan Oblak quando cobrou uma grande penalidade que poderia ter impedido mais penáltis. E desabou.
As lágrimas de Cristiano Ronaldo depois de falhar o penálti, que poderão ter sido porque viu as da mãe na bancada, porque equacionou que Portugal iria ser eliminado ainda nos oitavos de final ou simplesmente porque sentiu que a sorte não estava do seu lado, correram o mundo. Houve quem dissesse que era inadmissível, quem elogiasse a demonstração pública de fragilidade, quem recordasse que também chorou de tristeza no Euro 2004 e de alegria no Euro 2016. Ele próprio, porém, não escondeu que foram simplesmente pelo óbvio: a responsabilidade que carrega nos ombros.
“Fico emocionado quando penso na minha família, porque são momentos únicos. Não consigo expressar em palavras. É o meu último Europeu, claro que sim. Mas não é por isso que fico emocionado. Fico emocionado por tudo o que implica o futebol, pelo entusiasmo que tenho pelo jogo, pelo entusiasmo que vejo nos adeptos, por ter a minha família aqui, pela paixão das pessoas, pelo carinho que têm por mim, os próprios companheiros… Não é por deixar o futebol. Nada se vai resumir por mais um ponto ou menos um ponto, o mais importante desta caminhada que tenho feito é o entusiasmo que ainda tenho para estar aqui. 20 anos de Seleção e jogar, alegrar as pessoas, a família, os filhos, é o que mais me motiva”, disse o avançado, ainda na zona de entrevistas rápidas, num dos momentos em que conseguiu falar sem voltar a emocionar-se.
Curiosamente, esta sexta-feira e na sequência da eliminação contra França, Cristiano Ronaldo não chorou. Festejou os penáltis convertidos, sorriu para cumprimentar Griezmann, foi saudado por Didier Deschamps e Roberto Martínez e ainda teve tempo para consolar Pepe, que o abraçou em lágrimas. Se é quase certo que o capitão da Seleção Nacional ainda irá ao Mundial 2026, também é quase certo que os Campeonatos da Europa já se despediram do capitão da Seleção Nacional — e o recorde, aquele de que todos falavam, ficou por bater.
Do lado de Pepe, a exibição contra a Turquia, aquele sprint e um abraço
Se Pepe consolou Cristiano Ronaldo na segunda-feira, contra a Eslovénia, Cristiano Ronaldo consolou Pepe na sexta-feira, contra França. Nos quartos de final, foi o central do FC Porto que não conteve a emoção de quem sabe que, muito provavelmente, não irá voltar a disputar uma grande competição com a Seleção Nacional — e as lágrimas que não travou, logo depois de Theo Hernández bater Diogo Costa na grande penalidade decisiva, foram a imagem disso mesmo.
Aos 41 anos, Pepe tornou-se o jogador mais velho de sempre a participar num Campeonato da Europa. Mais do que isso, assinou exibições notáveis contra a Turquia, na segunda jornada da fase de grupos, e contra França — com o sprint atrás de Marcus Thuram, praticamente à beira do minuto 90, a ficar na memória de todos os que chegaram a dizer que já nem sequer tinha condições para ser convocado por Roberto Martínez, quanto mais para ser titular.
Aprendeu a correr menos para correr melhor: Pepe e uma masterclass de quem tem sempre de contar
No início de julho, já fora do Euro 2024, o futuro do central está em aberto em todas as frentes. Por um lado, já sabe que não vai continuar no FC Porto e é um jogador livre, pelo que as próximas semanas poderão trazer novidades sobre o clube que vai representar na temporada que se segue. Por outro lado, é já fácil imaginar um cenário em que decide deixar a Seleção Nacional de imediato e terminar um percurso que começou em 2007.
“Dói perder assim. Terei tempo de falar sobre o meu futuro, temos de passar por esta dor muito grande. Tínhamos capacidade para vencer a prova e agora temos de levantar a cabeça. Se é o meu último jogo? O importante não é isso, vou ter tempo para falar do meu futuro. O mais importante é dar os parabéns aos meus companheiros pela entrega que tiveram no jogo. Vou ter tempo para poder falar nisso. Hoje não é o momento de falar do futuro do Pepe”, explicou, antes de abordar com maior detalhe o abraço emocionado que partilhou com Cristiano Ronaldo em pleno relvado.
“O abraço significa muito. É muito doloroso. Não vou dizer publicamente o que ele me disse, mas nós sentimos muito isto. Ao contrário do que muita gente pensa, nós sentimos muito isto. Sentimos a frustração de não ganhar um jogo, de sair eliminado numa competição tão grande como o Europeu, sabendo que tínhamos muita qualidade para poder seguir em frente. É a dor que nós sentimos. Mas tenho de agradecer aos portugueses. Desde o primeiro dia, quando me naturalizei, que disse que ia dar o máximo de mim e retribuir tudo aquilo que Portugal me deu. E a melhor forma de poder retribuir é dentro de campo, a fazer aquilo que eu mais amo. E senti essa alegria com a ovação que me deram no Europeu”, terminou, recordando os aplausos das bancadas depois do jogo contra a Turquia.