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© Hugo Amaral/Observador

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Os caça-russos portugueses em ação

Portugal tem seis F16 a policiar os céus do Báltico. Em dois meses, já fizeram 15 interceções de aviões russos, que estão em intensa atividade. O Observador acompanhou o dia a dia na base da Lituânia.

A ordem vem sempre de Uedem, na Alemanha. Quando o Centro de Operações Conjuntas deteta alguma aeronave não identificada a sobrevoar a zona dos Bálticos, aparece, em segundos, no ecrã do computador, em Siauliai, na Lituânia, a ordem. A “task” – a língua universal é sempre o inglês – determina com precisão o que é para fazer. O militar sentado ao computador dá o alerta. A sirene dispara. No pequeno edifício verde e bege da base, os dois pilotos de F16 que estão de serviço, sempre equipados com o macacão de voo, têm 15 minutos para pôr os aviões no ar. Nunca precisam de tanto tempo. Os cerca de 500 metros até ao hangar são percorridos de jipe, que tem sempre a chave na ignição. Os quatro hangares têm um caça F16 cada um. São todos portugueses, desde os aviões ao oficial de dia, ao piloto, ao mecânico.

O som do F16 a descolar é ensurdecedor. Parece que até a terra treme. Em segundos a parelha desaparece no ar. Saem sempre dois de cada vez. Quando chegam perto avião suspeito, colocam-se cada um de um lado do aparelho. Tão perto (30 metros) que dá para ver até a cara do piloto. A dos pilotos dos F16 é sempre mais difícil de ver por causa do capacete que tapa toda a cabeça.

“Estamos preparados para isto mas existe sempre alguma emoção”, descreve um dos seis pilotos portugueses dos caças. É pedido que não seja identificado pelo nome. Não é um novato. Fez parte do primeiro contingente da Força Aérea que esteve na Lituânia, em 2007. Mas agora as coisas são diferentes. “Não estávamos à espera de tanta atividade, mas estamos treinados para isso”, explica, sublinhando que também as condições da base melhoraram muito.

A base aérea de Zokniai, a norte da capital, Vilnius, era uma das principais bases das forças soviéticas na região do Báltico durante a Guerra Fria mas foi abandonada em 1993, após o fim da União Soviética.

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Em Portugal, muitos treinos foram feitos ao largo da Figueira da Foz. Os F16 estão estacionados na base de Monte Real, em Leiria, e para simular um teatro real de operações os F16 portugueses fazem de bons e de maus. Um faz de Mig – o mítico avião russo rival do caça de fabrico norte-americano – enquanto os outros treinam uma interseção. É esse cenário que agora se repete na Lituânia com russos a sério – já os aviões são, na sua maioria, Tupolev.

Os portugueses chegaram no dia 1 de setembro e vão ficar até ao fim de dezembro – um empenhamento que custa cerca de 6,2 milhões de euros – em alerta de reação rápida 24 horas por dia. Em dois meses, fizeram várias missões e 15 interceções de aviões russos, idênticas às que os caça portugueses fizeram na semana passada junto a Portugal. Os aviões estavam a voar sem plano de voo e com os equipamentos de identificação desligados. Nestes casos, a identificação tem que ser visual e as aeronaves são acompanhadas até sairem de espaço lituano. Ao todo, os F16 portugueses fizeram 30 saídas e 43 horas de voo.

"Estamos preparados para isto mas existe sempre alguma emoção. (...) Não estávamos à espera de tanta atividade", descreve um dos seis pilotos portugueses dos caça F16.

“Na realidade, há mais missões reais do que esperávamos”, admite o comandante do destacamento, tenente-coronel Carlos Lourenço, explicando que já houve interseções de aviões de transporte mas também de “aviões mais bélicos e armados”. “Mas nunca tivemos uma reação estranha ou de desobediência. Nunca tivemos que intervir com mais força”, explica.

Os F16 fazem 20 anos de serviço em Portugal precisamente este ano. Foram fabricados nos EUA nos anos 70 e comprados em segunda mão àquele país pelo ex-primeiro-ministro Aníbal Cavaco Silva. Embora por fora possam ser antigos, por dentro os equipamentos foram renovados com um Mid Life Update e são o principal orgulho da Força Aérea.

Os militares portugueses na Lituânia não vão contrariados. “Toda a gente quer participar”, confirma um dos pilotos. Em Siauliai, a 3.057 quilómetros de Lisboa, está um contingente de 70 militares – o número que é preciso para pôr no ar os F16 que fazem vigilância do espaço aéreo da Lituânia. Este país, que aderiu à União Europeia e NATO em 2004, tem uma Força Aérea débil – são os parceiros europeus que se revezam para “emprestar” meios aos lituanos. Nesta altura, os aviões no ar são os F16 de Portugal (quatro na base lituana e dois em Portugal, de prevenção) e os F18 do Canadá. Portugal é a força liderante, embora em número os canadianos sejam mais, 135. Distinguem-se facilmente pelo camuflado pixelizado.

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Há apenas sete mulheres. A tenente Vitalina Martins, de 43 anos, é uma delas e é responsável pela manutenção dos F16. Tem sob as suas ordens quase 50 militares que tratam da mecânica, sistema de armamento e abastecimento. Faz parte do lote da primeira recruta de mulheres que entrou para as Forças Armadas em 1991 e tem orgulho nesta missão da NATO. “Não é todos os dias que temos oportunidade de mostrar o que sabemos fazer. E sentimo-nos mais perto dos acontecimentos”, explica. A missão dura quatro meses mas os efetivos vão rodando – há militares que ficam apenas um mês para ir dando o lugar a outros.

Desde que a Lituânia aderiu à União Europeia, Portugal esta é a segunda vez que os militares portugueses dão uma ajuda ao país. Os recordistas são a Polónia e a Alemanha que mais vezes fornecem meios para ajudar ao controle aéreo daquela região dos Bálticos.

A Lituânia tem ainda uma particularidade chamada enclave de Kaliningrado. Trata-se de território russo situado entre a Polónia e a Lituânia, sem fronteiras terrestres com a Rússia. "Há um corredor aéreo para Kaliningrado e tem havido muito tráfego".

Para além dos F16, Portugal tem também um P3 de vigilância em Siauliai (a 200 quilómetros da capital, Vilnius). Os militares chamam-lhe uma “fragata voadora” por ser um avião que ajuda a vigiar as movimentações no mar. Pode-se também chamar de avião-espião: os seus equipamentos de radar de longo alcance permitem captar imagens no mar e no solo com uma nitidez e pormenor impressionantes e de tão longe que o avião, por exemplo, pode “fotografar” solo russo sem sequer entrar no espaço aéreo daquele país.

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A Força Aérea da Lituânia (um país com apenas 3,3 milhões de habitantes) tem poucos aviões e os que tem são só para transporte e busca e salvamento. Segundo o ministro da Defesa lituano, Juozas Olekas, o Governo aumentou em 20% o orçamento da defesa – o valor situa-se nos 280 milhões. “Após os acontecimentos na Ucrânia e a agressão russa, a necessidade de ampliar os gastos será mais bem entendida pelo povo lituano, e haverá mais apoio”, disse à Reuters em março o ministro lituano da Defesa, Juozas Olekas.

Esta semana, depois de um encontro com o ministro da Defesa português, José Pedro Aguiar-Branco, recordou esse investimento e agradeceu a presença das Forças Armadas portuguesas. “Agradecemos muito. É muito importante para nós. Nós sabemos que a Rússia faz muitos exercícios nesta região”, explicou.

A Lituânia tem ainda uma particularidade chamada enclave de Kaliningrado. Trata-se de território russo situado entre a Polónia e a Lituânia, sem fronteiras terrestres com a Rússia. “Há um corredor aéreo para Kaliningrado e tem havido muito tráfego”, explica o comandante do destacamento português, tenente-coronel Carlos Lourenço.

Esta semana, o ministro da Defesa português visitou o destacamento no mesmo dia em que ao largo de Faro um navio russo era acompanhado por uma corveta da Marinha, depois de, por duas vezes, bombardeiros russos terem sido detetados no espaço aéreo internacional sob jurisdição portuguesa sem plano de voo.

“Na tropa não se agradece, reconhece-se”, disse Aguiar-Branco, que almoçou com os militares portugueses na base, onde fez uma visita e acompanhou alguns dos procedimentos, envergando um blusão igual aos dos militares da Força Aérea que lhe foi oferecido. Mesmo assim, acabou a agradecer o esforço de todos, tal como o Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, general Pina Monteiro.

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À hora de descanso, a televisão na ampla sala de convívio está ligada na Fox. À entrada do edifício, o vestíbulo tem poucos casacos. Nesta altura do ano, ao contrário do que é habitual não há temperaturas negativas. “Isto é verão”, comenta a rir um dos militares. Quando ali chegou há três semanas, conta, estava muito mais frio. Agora, estarão cerca de 10º C. Alguns andam em mangas de camisa, com camisolas interiores polares. Não é preciso luvas nem gorros.

Os militares portugueses não vivem na base. Estão instalados num hotel no centro de Siauliai, a três quilómetros da base, e, ao contrário dos canadianos, não têm recolher obrigatório.

Os militares portugueses não vivem na base. Os que não estão de serviço à noite – o trabalho é 24 h /7 dias por semana – fazem um horário das 9h as 17h . Depois disso vão para ‘casa’, um hotel no centro de Siauliai, a três quilómetros da base. É a quarta maior cidade do país e, segundo os militares portugueses, um bocado rural. “Vilnius é uma cidade moderna. Aqui nota-se que é mais atrasado. No outro fim de semana queríamos ir passear e não havia um único carro para alugar. Estavam todos esgotados”, conta a sorrir um militar português ao Observador. Em contrapartida, talvez, pela proximidade com a base, há vários bares e mesmo discotecas. Mas aí é raro os portugueses cruzarem-se com os canadianos. Estes têm recolher obrigatório. “Acho que são um bocado arruaceiros e gostam de se meter em confusões”, diz um militar.

Portugal já se comprometeu a voltar à Lituânia em 2016 para uma missão idêntica. Resta saber como nessa altura estará o conflito Ucrânia-Rússia e as movimentações do lado da vizinha Rússia.

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