Artigo em atualização ao longo do dia
O grupo parecia tudo menos um conjunto de apoiantes do PAN, tradicionalmente identificado com a população mais jovem e urbana. Mas todos aguardavam André Silva e a atenção mediática que o porta-voz do Pessoas-Animais-Natureza trazia com ele devido à campanha eleitoral. Na freguesia da Bajouca, concelho de Leiria, cerca de duas dezenas de pessoas — a maioria já idosas — empunhavam esta tarde cartazes de protesto contra a exploração de gás natural que está equacionada para aquela localidade, e que pode afetar os lençóis friáticos que abastecem de água aquelas populações.
Fátima Fernandes, da Associação Bajouquense para o Desenvolvimento (ABAD), recebeu André Silva e explicou-lhe o que está ali em causa: a “possibilidade de fazerem um furo junto das casas com risco que pode existir para as populações”. Perto de uma zona protegida, o furo será feito com recurso ao fracking, ou fraturação hidráulica, um processo que utiliza químicos tóxicos e que, em caso de derrame, pode contaminar praticamente toda a água que existe no subsolo e que abastece uma série de localidades. Além disso, acrescentou Fátima Fernandes, apelando às ideias do PAN, “não estamos em tempo de fazer novos furos de hidrocarbonetos, estamos num tempo de mudança”.
Preocupados com o que pode acontecer naquela pequena freguesia do centro litoral, os habitantes da Bajouca, liderados pela ABAD, decidiram agir. Já enviaram cartas a Marcelo Rebelo de Sousa e a Ferro Rodrigues, foram ouvidos na comissão parlamentar de economia e enviaram documentação para as instâncias europeias. Além disso, organizaram sessões de esclarecimento na freguesia, incluindo com a Australis Oil & Gas, a empresa que ficou com a concessão do furo, que lhes apresentou um projeto seguro — mas descartou responsabilidades sobre o abastecimento de água caso haja algum acidente.
André Silva, do PAN, cumprimenta cada um dos habitantes da Bajouca (Leiria) que hoje se manifestaram contra a prospecção de gás natural, concessionada à Australis Oil & Gas, feita com recurso ao fracking, que poderá contaminar os lençóis de água que abastecem a região. pic.twitter.com/CMDe09syze
— Observador (Eleições) (@OBSEleicoes) October 1, 2019
“Nós estamos com o que os senhores têm estado a fazer aqui, com o que a população do Algarve e Peniche tem feito ao longo destes últimos dois, três anos, com sucesso. Falta este. Acho que vamos conseguir, e há todo um movimento, cada vez mais crescente, a nível nacional, para fazer cair este contrato de concessão, de exploração de hidrocarbonetos”, disse André Silva ao grupo de manifestantes, que o acolheram esta tarde na zona de mato onde o furo deverá ocorrer.
Mesmo que os habitantes da localidade não percam a esperança, a verdade é que o contrato de concessão está assinado — foi firmado há quatro anos, ainda pelo Governo PSD/CDS — e o terreno já foi comprado pela empresa concessionária.
“Desde que entrámos no Parlamento, a luta pelo fim das concessões de prospeção de hidrocarbonetos no nosso país tem sido uma das nossas bandeiras. Conseguimos, juntamente com o movimento ambientalista, fazer cair todos os contratos que existiam até ao momento. Tavira, Aljezur, Peniche. Este é um dos últimos e estamos muito compenetrados e muito convictos de que conseguiremos também fazê-lo cessar. Não faz qualquer sentido que estejamos a querer descarbonizar a economia, a caminho de uma economia de carbono zero, e queiramos explorar hidrocarbonetos no nosso país”, afirmou André Silva aos jornalistas, no local.
“O movimento tem de ser fechar todos os poços de petróleo no mundo, e em Portugal não abrir nenhum destes furos, nomeadamente com a possibilidade de se fazer exploração de gás por método da fratura hidráulica, ou também conhecido por fracking, cujos impactos ambientais podem ser enormes, são descontrolados ao nível dos lençóis friáticos numa região tão fustigada já por situações ambientais negativas como foi o caso dos fogos recentes no pinhal de Leiria”, acrescentou.
Críticas a Costa. “Não quer debater problema polémico em altura de eleições”
A partir do exemplo da Bajouca, André Silva defendeu outra medida do programa do PAN: a criação de referendos locais às populações, ” que os governantes conheçam o sentimento geral das populações, não só locais, ao nível das freguesias, concelhias, mas também das próprias regiões”. “Estas consultas públicas que se fazem são uma farsa, porque são muito reduzidas, são feitas nos meses de agosto sem qualquer tipo, muitas vezes, de informação científica adequada para que as pessoas possam estudar, sustentar-se, pedir ajuda a outros técnicos e terem o tempo da devida resposta”, considerou André Silva.
O porta-voz do PAN criticou ainda “os principais partidos do nosso sistema democrático” de continuaram “com a lenga-lenga do ‘temos que conhecer o que é que temos debaixo do nosso subsolo, temos de conhecer os nossos recursos geológicos'” — e não perdoa ao PS adiar a discussão sobre o tema.
“O Governo socialista, o que disse foi, relativamente aos projetos que ainda estão em vigor, que é este e na Batalha, e a outras novas concessões que eventualmente poderão ocorrer, porque a lei de exploração de hidrocarbonetos está em vigor, disse que só se iria pronunciar depois de outubro de 2019. O mesmo é dizer, há um ano atrás. O mesmo é dizer que não quer debater este problema polémico em altura de eleições, antes das eleições, o que do nosso ponto de vista, a interpretação que nós fazemos em relação ao PS e aos outros partidos, é que vão querer fazer esta exploração de recursos fósseis, que do nosso ponto de vista estão completamente obsoletos. E o movimento mundial, europeu, tem de ser outro, o de abolir este tipo de exploração e de rapidamente fazermos uma transição energética na próxima década, para tentarmos não depender dos hidrocarbonetos. Ele não pode passar por explorar hidrocarbonetos no nosso país”, acusou André Silva.
Lítio é “pequena transição entre os fósseis e o hidrogénio”
Questionado, no mesmo local, sobre a aparente contradição entre a apologia dos carros elétricos (com baterias de lítio) e a crítica da exploração deste minério, André Silva esclareceu que o lítio deve ser apenas “uma pequena transição entre os fósseis e o hidrogénio” e que a nova mobilidade não poderá ser feita ” base de lítio, até porque todo o lítio existente no mundo não consegue fazer a substituição dos automóveis que existem”.
“Significa que revendo o regime jurídico o PAN poderá rever a sua posição se a exploração de lítio tiver outros impactos ou estiver absolutamente controlada. Neste momento, a exploração de lítio não é controlada relativamente aos impactos ambientais que tem. E por isso nós propomos a suspensão da exploração tal como ela está a ser feita. Não é aceitável, e portanto a existir, numa transição rápida para a tecnologia do hidrogénio, ela tem de ser feita de outra forma”, afirmou o porta-voz do PAN.
O que deve acontecer em breve, defendeu André Silva, é o encerramento das centrais termoelétricas do Pego e de Sines, “porque os leilões que já ocorreram de fotovoltaica e aqueles que vão ocorrer até 2023 conseguem superar, não apenas igualar, mas superar a produção de energia à base do carvão dessas duas centrais”.
“As centrais de Pego e de Sines estão perfeitamente amortizadas. Aquilo que estamos apenas a fazer a partir de 2023 é a queimar carvão por um lado e a dar mais 700 milhões de euros à EDP, aos chineses, sem qualquer tipo de razão. Não faz sentido nenhum que estejamos a beneficiar uma empresa cujas centrais já foram amortizadas”, considerou.
Com saudades dos tempos de estudante, André Silva almoçou (vegetariano) nas cantinas de Coimbra
A campanha do PAN desta terça-feira havia começado em Coimba. O ponto de encontro eram as escadas monumentais da Universidade de Coimbra, às 10h. O objetivo, mais uma iniciativa “Pergunta-me o que quiseres”, desta vez dirigida especialmente à comunidade estudantil, por aquela hora a caminho das aulas. Mas a chuva que caiu durante a manhã na cidade obrigou a campanha do PAN a mudar de rumo mais cedo e, depois de distribuir alguns folhetos a estudantes que passavam apressados, o porta-voz do partido, André Silva, seguiu para o mercado municipal para a primeira ação da campanha passada entre bancas de frutas e legumes — um clássico em tempos de eleições.
A rota pelo interior do mercado foi feita de modo a passar sobretudo pelas bancas dos vegetais e da fruta, evitando os talhos. Mas não foi possível evitar todos e André Silva não teve problemas em deixar a comerciantes de carne folhetos que apelam a uma redução do consumo de carne. Das vendedoras de fruta e legumes ouviu queixas sobre as reformas baixas. “A minha reforma é de 250 euros”, lamentou-se uma idosa numa das bancas. “Então vem cá para compensar?”, perguntou-lhe André Silva. “Onde é que a minha reforma dava para pagar um lar?”
De um lado os talhos, do outro as frutas e legumes. Na hora da primeira ação de campanha no mercado, André Silva, do PAN, não tem dúvidas sobre o corredor que escolhe #Legislativas2019 pic.twitter.com/HTiZLMceZL
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Depois de deixar elogios aos agricultores locais que vendem no mercado e de lhes perguntar se sentem a concorrência das grandes superfícies, André Silva desceu a rua Ferreira Borges, bem no coração da cidade, para repetir aquilo que tem feito noutros locais: “Bom dia, posso entregar-lhe um panfleto do PAN? Obrigado”. A meio da rua, interpelado por um homem que lhe perguntou para quando um SNS para os animais, o porta-voz do partido suspirou: “Somos presos por pôr a proposta e por não pôr”. Ergueu os olhos, disse “estou a brincar” e partiu para as explicações que já tem dado sobre a medida, que gerou polémica — não se trata de um SNS, mas de uma rede pública de veterinários para apoiar quem não tem meios e quem se substitui ao Estado no tratamento dos animais.
“Eu tenho um cãozinho e não consigo pagar os tratamentos dele. É caríssimo, não ganho para isso”, lamentou o homem, para André Silva insistir na ideia de que é preciso reduzir o IVA da alimentação e tratamentos dos animais de companhia e deixar novas críticas às touradas: “É inadmissível que os artistas tauromáquicos paguem 6% de IVA e a alimentação dos animais 23%. Precisamos de mais apoios”.
Na cantina da Universidade com elogios ao fim da carne de vaca
Das margens do Mondego, André Silva voltou a pé pelas ruas da cidade que já foi sua (“aquela varanda era a do meu quarto, quando cá estudei”, disse durante a descida da rua Ferreira Borges) para ir almoçar às cantinas universitárias — onde a partir de janeiro do próximo ano deixará de ser servida carne de vaca.
“Eu não vou às cantinas da Universidade de Coimbra simbolicamente, vou porque tenho de almoçar e aproveito e almoço numa cantina em que almocei durante muitos anos enquanto aqui fui estudante, tenho muitas saudades desta cidade, tenho uma ligação bastante emocional. Aproveito para almoçar, junto dos estudantes, um prato evidentemente vegetariano”, disse André Silva aos jornalistas, antes de deixar elogios à decisão do reitor da Universidade de Coimbra.
“O senhor reitor não aboliu a oferta de carne nas cantinas da Universidade. Ele reduziu a carne numa das espécies, que é a carne bovina. No fundo, o que o senhor reitor está a fazer é a adotar as melhores práticas que a comunidade científica tem vindo a dizer. Reduzir o consumo de proteína animal, que pode ser feito de várias formas. Uma delas é de facto reduzindo a espécie de carne que mais impacto tem, que neste caso é a bovina”, afirmou.
Coimbra foi, até agora, o local onde André Silva encontrou mais resistências às suas propostas. À saída do mercado, encontrou mesmo um criador de vacas que o acusou de não ouvir os mais velhos e de prejudicar a agricultura com os apelos ao fim do consumo de carne de vaca. A resistência, porém, não vem dos estudantes — esses em larga medida satisfeitos com a proibição da carne de vaca na universidade.
Aos jornalistas, André Silva desvalorizou as críticas. “Quando qualquer movimento ao longo da história traz novas ideias, novos temas a debate, muitas vezes difíceis, apanha com as primeiras setas, com as primeiras resistências, e é natural que haja pessoas que demonstrem esse desagrado. Estamos habituados a isso desde a nossa fundação, mas o importante é andar na rua, informar as pessoas, esclarecer e responder às questões que têm vindo a ser colocadas sobre esta matéria”, argumentou.
“O PAN, o que defende, é uma redução do consumo de proteína animal e tem sido o porta-voz da comunidade científica, quer em matérias de combate às alterações climáticas, que em matéria de saúde pública. Temos de continuar a dizer e a informar que de facto temos de produzir alimentos de uma forma mais sustentável, mais adaptadas às alterações climáticas, senão qualquer dia não temos agricultura. É importante fazer essa informação e essa pedagogia”, acrescentou.
Otimismo. “Sondagens da rua dão-nos mais de 3%”
Questionado sobre as sondagens, que têm dado ao PAN um resultado confortável em torno dos 3%, André Silva — que habitualmente recusa comentar sondagens — afirmou que, na rua, tem sentido um carinho pelo partido que é maior do que apenas 3% das pessoas. “As sondagens da rua dizem-nos que há mais de 3% das pessoas que nos acarinham, que nos apoiam, e acima de tudo que reconhecem o trabalho do PAN e que querem que nós cresçamos”, assegurou.
André Silva voltou a desvalorizar a relevância das sondagens: “São fotografias do momento e basta, no nosso caso, duas ou três pessoas a mais ou a menos, para ter uma variação de meio ponto percentual. E a história também nos diz que as sondagens — não quer dizer que desta vez não acertem —, geralmente, antes dos atos eleitorais, ficam um pouco distantes do resultado. Mas, independentemente de as sondagens serem boas ou más, isso não é importante. O que é importante é continuar, até à meia-noite de sexta-feira, a informar as pessoas sobre as nossas propostas, sobre aquilo que nós temos para oferecer, e isso é que é determinante para nós, mais do que as sondagens”.