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Patrícia Gaspar completa 44 anos de idade no próximo dia 9 de setembro. Tem dois filhos adolescentes
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Patrícia Gaspar completa 44 anos de idade no próximo dia 9 de setembro. Tem dois filhos adolescentes

Patrícia Gaspar completa 44 anos de idade no próximo dia 9 de setembro. Tem dois filhos adolescentes

Patrícia Gaspar, de "espia" da Marinha a voz da Proteção Civil

Dura, inteligente, desenrascada, com perfil militar, Patrícia Gaspar é a voz da Proteção Civil desde a "lei da rolha" nos fogos. Uma missão que lhe tem valido críticas - e muitas noites longe de casa.

Este artigo foi publicado originalmente a 11 de agosto de 2017 e é agora republicado numa altura em que Patrícia Gaspar tem o comando operacional do incêndio de Monchique.

A noite de quarta-feira, 9 de agosto, foi de combate intenso às chamas que aceleravam rumo a Mação. “O incêndio continua completamente descontrolado”, alertava António Louro, vice-presidente da câmara, antevendo que as horas seguintes seriam “dramáticas”. Esperava-se de novo “um dia extremamente negro no concelho, com toda a certeza.” Mas, o que na vila se anunciava como um inferno, em Carnaxide era apresentado como um cenário bem diferente. Na sede da Proteção Civil, a adjunta de operações nacional, fazia o ponto de situação dos fogos. E o que Patrícia Gaspar descrevia era uma situação “um bocadinho melhor, mais tranquila, estabilizada” em relação aos incêndios — entre os quais aquele, o de Mação — que continuavam a somar hectares negros no centro do país. O contraste entre as duas versões aumentou as suspeitas de que a Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC) estaria a suavizar a verdadeira dimensão da tragédia dos incêndios — uma missão que estava agora a cargo da recém-nomeada porta-voz. Só que a profecia mais dramática do autarca de Mação acabaria por cumprir-se. E a versão suavizada de Patrícia Gaspar, bem como as suas previsões de acalmia nos fogos, acabou exposta e derrotada pela própria realidade.

Patrícia Gaspar, que completa 44 anos no próximo dia 9 de setembro, tornou-se a voz e o rosto da Proteção Civil que a escolheu para conduzir os briefings diários sobre os incêndios — isto quando já havia 64 mortes em Pedrógão Grande e o país passava por uma das maiores tragédias de sempre. Mas todos a viram prontamente como a voz que, a partir de Carnaxide, silenciava a dos homens no terreno, a “rolha”. De rosto fechado, tom assertivo e de resposta pronta à vaga de perguntas nos encontros com a comunicação social, a adjunta de operações nacional da ANPC assumiu a “missão” com a mesma prontidão que demonstrou em 2013, quando foi colocada em Setúbal como Comandante Operacional Distrital do Comando Distrital de Operações de Socorro. A formação militar salta à vista quando veste a farda.

Os dias de intensos fogos têm obrigado Patrícia Gaspar a pernoitar na sede da Proteção Civil, em Carnaxide. Os curtos intervalos em que sai da sala de operações do comando nacional servem para beber um café, fumar um cigarro e voltar a sentar-se em frente aos ecrãs onde as informações sobre os fogos chegam ao segundo

Dedicada, profissional, responsável, focada, bem preparada: estes são alguns dos adjetivos destacados por várias pessoas que se cruzaram com a atual porta-voz da Proteção Civil nas últimas décadas, conforme contaram ao Observador. Uma dedicação que a tem levado até a pernoitar na sede da Proteção Civil nos períodos de fogos mais intensos. E todos são unânimes: quando lhe entregam uma missão, Patrícia Gaspar cumpre-a, concorde ou não com aquilo que lhe é apresentado. Vem à tona o tal perfil militar, o modelo de oficial exemplar com que o pai, o contra-almirante Carlos Gaspar, foi confrontado na Escola Naval na segunda metade da década de 1960 e que Patrícia Gaspar cresceu a admirar.

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Outro exemplo desse traço: estava na Proteção Civil há 13 anos, era adjunta do comando nacional há seis quando foi escolhida para o lugar de Comandante Operacional Distrital do Comando Distrital de Operações de Socorro de Setúbal. Mas aquilo que poderia ser encarado como uma despromoção — deixar a cúpula da organização para ir para o terreno, por onde nunca tinha passado — foi encarado apenas como mais uma tarefa a executar, recorda quem a conhece há décadas.

“É uma mulher de missão: foi para o distrito de Setúbal com uma missão e regressou ao comando nacional, vestindo a camisola da Proteção Civil”, garante Eduardo Correia. Conhece Patrícia Gaspar desde os tempos de escola, ainda miúdos, no Barreiro. “Se lhe pedirem para ser porteira da Proteção Civil, ela aceita”, garante.

Uma missão para a “espia” da Marinha

Patrícia Alexandra Costa Gaspar esteve dois anos nas Secretas, quatro na Marinha. Escolheu a Proteção Civil quando podia ter optado por uma carreira atrás de uma secretária. É agora a adjunta de operações que os responsáveis da autoridade nacional chamaram para controlar a comunicação sobre os incêndios – e, desta “lei da rolha” imposta aos bombeiros, emergiu um rosto novo. Agora os portugueses vêem-na, pelo menos duas vezes por dia, como a mensageira das (muitas vezes más) notícias. E com um estilo muito próprio: a voz sempre autoritária, nunca demasiado pessimista, quase sempre a driblar as críticas e as perguntas insistentes.

Licenciada em Relações Internacionais, a atual adjunta do Comandante Nacional Operacional, Rui Esteves, passou diretamente da Marinha para a ANPC, em 2000, quando a autoridade ainda era Serviço Nacional de Proteção Civil. Esteve quatro anos (1996-2000) ligada à Divisão de Informações do Estado-Maior da Armada – Secção de Protocolo e Secção de Informação Estratégica. Pelo meio, foi destacada para os Serviços de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), o braço externo das Secretas portuguesas onde se recolhe e analisa informações sobre eventuais ameaças à soberania nacional e se acompanha a segurança das comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo.

Quando lhe entregam uma missão, Patrícia Gaspar cumpre-a, concorde ou não com aquilo que lhe é apresentado. Vem à tona o tal perfil militar, o modelo de oficial exemplar com que o pai, o contra-almirante Carlos Gaspar, foi confrontado na Escola Naval na segunda metade da década de 1960 e que Patrícia Gaspar cresceu a admirar.

Foi nesse papel, ainda nas Secretas, que acompanhou o pós-referendo pela independência de Timor, numa fase particularmente sensível da vida do país, quer do ponto de político como social e de segurança. A experiência deixou marcas, mas só há pouco tempo conseguiu viajar até Díli para receber uma condecoração pelo trabalho feito mais de uma década antes. A experiência, confidenciou aos mais próximos, foi como um fechar de um ciclo.

Louvores

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Patrícia Gaspar recebeu louvores e medalhas do líder das Secretas, das chefias da Marinha, de dois presidentes da Proteção Civil e de um ministro da Administração Interna.

A passagem pelo SIED valeu-lhe um louvor do então secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), Domingos Jerónimo. Não foi o primeiro. Nem o último. À imagem do pai, somou distinções dos cargos por que passou — distinções entregues por chefes militares, por diferentes dirigentes da ANPC, por secretários de Estado e por ministros.

Uma “opção de vida”

Os dias de intensos fogos têm obrigado Patrícia Gaspar a pernoitar na sede da Proteção Civil, em Carnaxide. Os curtos intervalos em que sai da sala de operações do comando nacional servem para beber um café, fumar um cigarro e voltar a sentar-se em frente aos ecrãs onde as informações sobre os fogos chegam ao segundo. É dali, e do contacto permanente com os comandantes distritais no terreno, que obtém a informação que lhe serve de base para os briefings que tem conduzido, pelo menos, em dois momentos do dia – ao final da manhã, pelas 12h, e ao final da tarde, por volta das 18h – na última semana e meia. “Não é surpresa nenhuma isto que lhe está a acontecer”, diz Octávio Machado, presidente da associação de Bombeiros Voluntários de Palmela, que durante pouco mais de quatro anos partilhou as instalações com a então comandante distrital. “O que me admira é que só tenha acontecido agora.”

O empenho que coloca nas missões só choca, por vezes, com a agenda familiar. Os dois filhos adolescentes, um rapaz e uma rapariga, já perceberam que a profissão da comandante da ANPC é desempenhada em modo permanente. Mesmo assim, de tempos a tempos, Patrícia Gaspar consegue acompanhar o filho aos jogos de basquetebol, com o grupo de pais que compõem a claque improvisada do clube desportivo. Nesses momentos em que despe a farda, a “contadora de histórias e de anedotas” permite-se a alguns momentos de “total descontração”. Puxa pela equipa, mas também lança considerandos aos árbitros quando as decisões não lhe agradam.

Mãe de dois adolescentes, Patrícia Gaspar consegue acompanhar o filho aos jogos de basquetebol, com o grupo de pais que compõem a claque improvisada do clube. Nesses momentos em que despe a farda, a "contadora de histórias e de anedotas" descontrai, puxa pela equipa e até lança considerandos aos árbitros quando as decisões não lhe agradam

Nos quase 20 anos que tem na Proteção Civil, Patrícia Gaspar nunca revelou ambições de comando. Recebe as missões que lhe são atribuídas e executa-as. Ponto. Mas há quem diga, ainda que discretamente, que, um dia, a adjunta de operações chegará ao topo da hierarquia. “É capaz de lá chegar”, admite Eduardo Correia. “Ela tem os pés assentes no chão, sem ambições desmedidas, mas se as oportunidades surgirem, surgiram”, acrescenta o dirigente dos bombeiros.

Um ano antes de chegar à Proteção Civil, quando ainda servia na Marinha, Patrícia Gaspar foi confrontada com uma oportunidade profissional que a teria levado por um caminho totalmente oposto: um lugar nos quadros da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), organismo acabado de criar e no qual poderia ter feito carreira. Fontes próximas da dirigente da ANPC explicam que a recusa, depois de ter sido aprovada em concurso, se deveu ao tipo de funções que teria de desempenhar, num serviço típico “de secretária”. A oportunidade na Proteção Civil, no ano seguinte, por outro lado, encaixava-se como uma luva no seu perfil. “Não sendo uma estrutura militar, tem as suas parecenças”, diz um responsável dos bombeiros que lidou com Patrícia Gaspar nos anos de Comando Distrital de Operações de Socorro de Setúbal. “Foi uma opção de vida”, define Eduardo Correia.

Essa experiência no seu distrito de origem valeu-lhe o “respeito” dos homens no terreno. “Foi assim que assumiu algum protagonismo”, lembra Jaime Marta Soares, presidente da Liga dos Bombeiros eleito pela primeira vez em 2011. “É oficial da Marinha, tem conhecimento, disciplina e organização e teve um passado em Setúbal que é de enaltecer”, considera o dirigente. “Além de estar bem preparada, é uma desenrascada, não tem qualquer dificuldade e, se não tiver inventa soluções, inventa-as e bem”, acrescenta.

D.R.

Até esse momento, Patrícia Gaspar nunca passara pelo “terreno”. Os quatro anos em Setúbal levaram-na a percorrer os quartéis do distrito, a falar com dezenas de dirigentes, a conhecer os problemas e, pela imagem que criou, a ganhar a confiança das bases da estrutura. A estabelecer contactos — como já tinha feito em Bruxelas, quando acompanhou o pai nas funções que o contra-almirante desempenhou na sede da NATO. “Teve uma relação com o comando e com os operacionais de bombeiros muito agradável, sem atritos, sem se revelou muito amável e afável”, enaltece Octávio Machado.

Ser mulher num mundo comandado por homens nunca se revelou um obstáculo. “O que é fundamental é que os comandantes se sintam bombeiros, que vivam dia a dia de bombeiros, que saibam interpretar as preocupações, que façam uma gestão rigorosa, profissional e inteligente”, enquadra Octávio Machado. “E ela é inteligente”, considera o presidente da associação de Bombeiros Voluntários de Palmela.

D.R.

Em plena época de incêndios, a revolução que a ANPC fez na sua comunicação pública deu lugar a suspeições e reações internas. Casos como o da última quarta-feira, com as diferentes avaliações do fogo em Mação, só pioraram as críticas. Antes disso, a meio de julho, as atualizações já estavam centralizadas na sede nacional — uma decisão anunciada logo depois do despiste de um helicóptero que participava no combate aos incêndios em Alijó e que um comandante distrital da Proteção Civil classificou como um simples “toque” no chão e aterragem de emergência. O que aconteceu, ficou claro dias depois, foi bem diferente: o aparelho ficou destruído na margem da barragem de Vila Chã.

Este novo modelo de comunicação gerou polémica e levou o então responsável pela comunicação da ANPC a apresentar a demissão em protesto pela forma como o organismo estava a redefinir a sua política de comunicação sobre os incêndios. As horas escolhidas para os briefings diários não são fruto do acaso. É que, no primeiro encontro do dia com os jornalistas, a não ser que haja um incêndio de proporções astronómicas, o mais normal é que a situação esteja mais calma que às últimas horas do dia anterior.

Contradições

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As chamas ameaçavam Mação e a Proteção Civil falava numa manhã “mais tranquila” e “estabilizada”. As críticas à “lei da rolha” ganhavam força, depois de outras contradições anteriores, como a das versões sobre a queda do helicóptero em Alijó.

“Estão a passar a imagem errada ao país”, defende fonte da autoridade que pede para não ser identificada. Ao Observador, elementos da ANPC garantem, no entanto, que o objetivo nunca foi suavizar a real situação dos fogos. “Não passa pela cabeça de ninguém que, numa sociedade globalizada e da informação, se suavizem estas questões”, garante a mesma fonte.

Ser o rosto da Proteção Civil, especialmente quando há extensas zonas do país a ser consumidas pelas chamas com voracidade, é, por isso, “um papel de grande sacrifício”, sublinha Eduardo Correia. “Acredito que algumas coisas que diz não as sinta daquela forma, mas foi a solução que encontrou para gerir a situação e manter a calma”, considera o presidente da Federação dos Bombeiros do distrito de Setúbal, que conhece Patrícia Gaspar há décadas e a defende. A missão mais dura de Patrícia Gaspar, no entanto, ainda está por cumprir: garantir o consenso de todos sobre o seu novo trabalho diário.

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