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Cerca de 20 trabalhadores da Platforme foram despedidos no início do mês de setembro
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Cerca de 20 trabalhadores da Platforme foram despedidos no início do mês de setembro

RODRIGO MENDES/OBSERVADOR

Cerca de 20 trabalhadores da Platforme foram despedidos no início do mês de setembro

RODRIGO MENDES/OBSERVADOR

Platforme. Empresa do universo de José Neves (que tem o grupo Amorim no capital) avança com despedimento coletivo e corta metade da equipa

Desafios enfrentados pelo setor da moda e resultados negativos levaram a Platforme a fazer um despedimento coletivo. José Neves, que viu falir a Farfetch, é um dos fundadores.

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Segunda-feira, 9 de setembro. Aparentava ser mais um dia de trabalho normal na Platforme, tecnológica que tem José Neves, ex-CEO da Farfetch, como um dos fundadores. Como era habitual, alguns trabalhadores ficaram em teletrabalho, enquanto outros se deslocaram até ao escritório, no Porto. “Toda a gente foi trabalhar, como sempre”, recorda um funcionário. A rotina alterou-se ainda durante a parte da manhã, quando foi anunciado o despedimento de praticamente metade da equipa, composta por cerca de 40 pessoas.

Para anunciar o ‘corte’, a empresa dividiu os funcionários por duas reuniões, ambas conduzidas pelo CEO, Gonçalo Cruz, acompanhado — pelo menos na segunda — pelo diretor de recursos humanos. Na primeira reunião, que ocorreu por volta das 10 horas, estavam os escolhidos para continuar na Platforme. Na outra, realizada cerca de 30 minutos depois, aqueles que seriam alvo de um despedimento coletivo. Aos trabalhadores que se encontravam em casa e não conseguiam chegar a tempo ao escritório não foi dada a oportunidade de assistir à comunicação em formato online.

“Ninguém estava à espera” dos despedimentos, afirma um dos trabalhadores afetados, que falou com o Observador sob condição de anonimato. Outro dos funcionários dispensados também diz ter sido apanhado de surpresa. Em retrospetiva, porém, lembra que alguns colegas chegaram a comentar, nos dias que antecederam o anúncio, que as chefias estavam “mais atarefadas”, a “participar em mais reuniões do que o habitual”. Foram várias as pessoas — que estão “fora do círculo de decisão” — a reparar que “havia alguma agitação” e que “poderia haver causa para alarme”, ainda que estivessem longe de imaginar que metade da equipa seria dispensada.

José Neves, ex-CEO da Farfetch, é um dos fundadores da Platforme

Octavio Passos/Observador

A história da tecnológica tem início em 2015, quando José Neves disse a Gonçalo Cruz que “a Farfetch estava a explodir, que conhecia muitos investidores e que tinha uma marca de sapatos [a Swear] à qual seria interessante dar um twist“. Desta forma, a Platforme não começa como uma empresa, mas como uma tecnologia para personalizar os sapatos vendidos pela Swear.

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Um ano mais tarde, em 2016, os dois portugueses juntaram-se ao empresário Ben Demiri e criaram a Ripe Productions, uma empresa com uma tecnologia para que marcas de moda de luxo possam personalizar os seus produtos digitalmente, hoje conhecida como Platforme. Em declarações ao Observador, no início de 2017, Gonçalo Cruz explicou o que tinha levado à mudança de nome: “Um dos investidores disse-nos que Ripe era um nome terrível e que as pessoas podiam reconhecê-lo como RIP (Rest in Peace). E nós mudámos para Platforme”, um trocadilho “entre platform + me”.

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Um despedimento “aleatório” e um CEO que procura “substituto à altura”

Os rumores de um despedimento coletivo na Platforme começaram, num primeiro momento, a circular em plataformas como o Teamlyzer, onde os relatos, feitos de forma anónima, apontavam não só para a surpresa dos trabalhadores como para o facto de o Gonçalo Cruz ter, alegadamente, utilizado “desculpas sem fundamento” para a decisão. O CEO foi ainda acusado de não ter tido “uma conversa honesta e transparente” com a equipa.

Os relatos publicados online coincidem com os que foram feitos por funcionários afetados pelo despedimento ao Observador, que falam num processo conduzido de uma “forma muito questionável” e sem critérios. Os trabalhadores alegam que foram dispensados profissionais essenciais para o funcionamento da empresa, como “metade da equipa de engenharia”, incluindo todos os engenheiros mais antigos. “Estamos a falar de pessoas que criaram aquele que neste momento é o produto core da empresa. Não sei como é que os trabalhadores que ficam vão conseguir gerir isso nos próximos tempos, sinceramente”, afirmam.

Os trabalhadores dizem que foram dispensados profissionais essenciais para o funcionamento da empresa, como “metade da equipa de engenharia”.

Quanto às razões que foram apresentadas para o momento que a empresa atravessa, as fontes falam, desde logo, em razões do foro privado relacionadas com a saúde de Gonçalo Cruz. Durante as reuniões, o CEO disse que essas questões eram “um dos fatores” que conduziram a esta decisão e, a dada altura, segundo uma das pessoas afetadas, “chegou a dizer que não queria estar ali e que só estava porque não encontrou ainda um substituto à altura”.

Outros dos profissionais dispensados, que foram ouvidas pelo Observador, também destacam que a administração está “à procura de um substituto para o CEO há algum tempo” e defendem que as expectativas do board podem estar “um bocado defraudadas em relação à empresa”, uma vez que este ano ainda só foi possível “assinar [contrato com] um cliente, o que não é suficiente”.

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Gonçalo Cruz é o CEO da Platforme

“Foi-nos dito que tínhamos mais dinheiro”, acusam trabalhadores

Na carta formal enviada aos trabalhadores, a que o Observador teve acesso, a administração da Platforme justifica a decisão do despedimento coletivo com os desafios enfrentados pelo setor da moda, a diminuição das receitas, o aumento dos custos e a dificuldade em captar investimento. E assegura que a medida, que “foi discutida e ponderada longamente”, é tomada para “salvaguardar o futuro da empresa e assegurar a sua continuidade no mercado”.

Os trabalhadores admitem que tinham “alguma noção” de que o negócio poderia estar “melhor”, mas dizem que a empresa assegurou, durante reuniões semestrais, que “havia dinheiro suficiente no banco” para manter as operações a decorrer com normalidade. Por isso, e face à decisão de reduzir a equipa, acusam a entidade empregadora de falta de transparência na apresentação de contas: “Este nunca foi o cenário que nos venderam.” 

A decisão de iniciar um despedimento coletivo foi tomada para "salvaguardar o futuro da empresa e assegurar a sua continuidade no mercado".
Administração da Platforme

“Descontentes”, as pessoas afetadas pela decisão vão ainda mais longe e dizem que as contas que constam no documento com a decisão do despedimento são “menos animadoras” do que as que tinham sido apresentadas até então. “Foi-nos dito que tínhamos mais dinheiro do que realmente temos”, alegam, acrescentando que o CEO transmitiu “uma imagem de que a empresa estava melhor do que realmente estava e que havia mais segurança do que realmente havia”.

Após ouvir os relatos dos funcionários, que não avançaram com números para sustentar os argumentos, o Observador contactou Gonçalo Cruz, que disse apenas que a Platforme não tem uma posição formal a apresentar e não confirma nem desmente os rumores.

Os últimos resultados financeiros apresentados pela Platforme, que são referentes ao ano passado e que foram aprovados por unanimidade em assembleia geral em maio, mostram que a empresa não tinha prejuízo. Nessa altura, apresentava lucros de 699 euros (quase o dobro dos 354 euros de 2022) e contava com uma equipa de 40 trabalhadores, 21 homens e 19 mulheres. Os gastos com o pessoal aumentaram de 1,9 milhões de euros para 2,3 milhões de euros e as vendas têm vindo a subir gradualmente todos os anos desde 2019, como é possível aferir através da tabela abaixo apresentada.

Após a apresentação das contas, que terão ficado “abaixo das expectativas”, a tecnológica cancelou os processos de recrutamento que estavam a decorrer e instaurou, segundo os trabalhadores, um “hiring freeze [congelou contrações] para controlar a situação financeira”. Nessa altura, pensavam que se tratava de uma “medida proativa”, de quem estava a “tentar virar o barco”, mas agora olham para a decisão como um prenúncio dos despedimentos que estavam para vir.

Os valores mencionados constam nas contas apresentadas no verão e são referentes à Platforme MTO, Unipessoal, LDA, empresa portuguesa, com sede no Porto, que é a detentora dos contratos laborais e com os fornecedores. Já os números que aparecem na carta com a decisão do despedimento coletivo são, na sua maioria, mais amplos porque englobam o “grupo”, uma vez que a tecnológica é detida por um sócio único com sede no Reino Unido, a Platforme International Limited.

Afinal, que contas são apresentadas na carta de despedimento?

Uma “tendência de decrescimento”, principalmente no comércio eletrónico, e os “fortes desafios” enfrentados pelo setor da moda de luxo são mencionados pela Platforme como fatores que afetam “diretamente os resultados do grupo”, que atualmente tem três tipos de modelo de negócio. Num deles recebe comissão sobre as vendas dos clientes que utilizam a sua tecnologia de personalização; noutro estabelece mensalidades fixas por “intervalos de vendas” dos clientes e no último cobra pela criação de “gémeos dos produtos físicos” para possibilitar as “vendas no ambiente digital”.

Na correspondência que foi enviada aos trabalhadores na segunda semana de setembro, a tecnológica informa que “as receitas do grupo seguem uma tendência negativa ou de declínio, sem indicação de reversão para um cenário mais positivo”, e revela que, nos últimos anos, alguns clientes “cessaram contratos com o grupo (caso da Gucci ou PVH) e/ou forçaram a renegociação dos contratos para obter poupanças consideráveis”. Mantêm-se no leque de clientes nomes como Dior, Hèrmes, Fendi e Salsa, mas as receitas associadas a cada uma destas marcas têm vindo a diminuir. No caso da primeira empresa, por exemplo, os números foram descendo ao longo dos anos, passando de 1,3 milhões de euros em 2022 para 938 mil euros em 2023 e 491 mil euros na primeira metade de 2024.

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A Dior faz parte do leque de clientes da Platforme

NurPhoto via Getty Images

Como a maioria dos contratos comerciais está ‘alocada’ à empresa-mãe, a única fonte de receita atual da empresa portuguesa é a Swear, marca de sapatos de José Neves que é detida pelo grupo. Mesmo assim, indica a Platforme, as vendas também têm registado “quedas substanciais ao longo dos anos”.

Ano após ano, devido a “resultados negativos”, o grupo Platforme foi tendo cada vez menos dinheiro no banco. Em 2019, quando fechou uma ronda de investimento de 10,5 milhões de euros que foi liderada pela norte-americana Nordstrom e que contou com a participação do grupo Amorim e de José Neves, tinha “o maior saldo bancário registado até hoje”: 10,4 milhões de euros. No final de 2023, o valor tinha descido para 164 mil euros. A possibilidade de captar um novo financiamento no futuro próximo é descartada face a um ambiente económico “desfavorável” quer “pelas elevadas taxas de juro oferecidas por bancos centrais e mercados financeiros”, quer “pela desconfiança dos fundos de investimento relativamente a empresas no setor da moda”.

Paula Amorim e a ronda de investimento de 2019

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O grupo Amorim investiu pela primeira vez na Platforme em 2016, ano em que a Amorim Holding II liderou uma ronda de financiamento de seis milhões de euros. Três anos depois, a empresa recebeu mais dinheiro (10,5 milhões de euros) e a Amorim voltou a constar da lista de investidores.

O financiamento angariado em 2019 foi liderado pela retalhista norte-americana Nordstrom e em Portugal foi captado pelas subsidiárias da Platforme e acompanhada pelo fundo de coinvestimento 200M, criado pelo Estado para cofinanciar projetos nacionais com investidores privados. José Neves, através da Flatwoods, também voltou a investir na empresa.

Empresária Paula Amorim e José Neves, da Farfetch, investem em plataforma tecnológica dedicada à moda de luxo

O Observador contactou a Amorim Holding II para obter uma reação ao atual momento da Platforme. Na resposta, a empresa afirma que detém “cerca de 10% do capital da Platforme” e nota que na altura do primeiro investimento Paula Amorim foi nomeada como a sua “representante no conselho de administração da sociedade”. Outras questões são remetidas para “a direção executiva” da tecnológica.

Quanto à empresa portuguesa em particular, a administração indica na carta que enfrenta “uma insuficiência de capital social para cobrir as despesas correntes” e que é “evidente a forte dependência” à proprietária. Ao longo dos anos, os custos do grupo foram “progressivamente transferidos na sua maioria” para essa subsidiária: “Em 2023, 81% dos custos do grupo eram tidos via Platforme e é expectável que a tendência continue, uma vez que as principais rubricas, nomeadamente as relacionadas com a equipa e operação, estão praticamente todas em Portugal.”

No ano passado, a empresa portuguesa registou lucros de 699 euros, sendo que muito deste valor é gerado por atividades dentro do grupo. Isto porque, no mesmo período, o resultado financeiro da subsidiária sem faturas intragrupo era negativo em 3,5 milhões de euros. Desta forma, apesar dos “pequenos lucros”, com os “descontos de faturas intragrupo, os resultados são consistentemente negativos”.

Em 2023, o grupo Platforme apresentou prejuízos de cerca de dois milhões de euros. As despesas foram de 4,8 milhões de euros (que atingem os 8,3 milhões de euros com custos intragrupo) e as receitas totalizaram os 2,8 milhões de euros (6,3 milhões de euros com as operações intragrupo).

Face à “consistência de resultados negativos”, a Platforme defende que a redução do número de trabalhadores é uma “medida fulcral para alinhar os custos operacionais com a realidade financeira da empresa, procurando a sustentabilidade e viabilidade” a médio longo prazo.

A proposta de despedimento coletivo

O processo de despedimento coletivo iniciou-se, segundo a carta enviada aos trabalhadores, a 2 de setembro. Mas todas as pessoas afetadas que foram ouvidas pelo Observador garantem só ter sido informadas no dia 9. Após as reuniões com o CEO e com a proposta de despedimento em sua posse decidiram consultar advogados, que lhes terão dito que “há várias ilicitudes no despedimento” como, por exemplo, não ficarem explícitos quais foram os critérios para escolher aqueles que seriam dispensados ou o facto de ter sido, alegadamente, comunicada uma decisão antes de uma intenção. Ainda assim, após ponderação, dizem que não pretendem avançar com uma ação judicial contra a empresa.

Um despedimento coletivo inicia-se com uma “comunicação em que o empregador deve expor detalhadamente todos os motivos” que conduzem a esse processo, começa por explicar Madalena Caldeira, coordenadora do departamento de direito do trabalho do escritório de Lisboa da Goméz-Acebo & Pombo, em declarações ao Observador (que presta em termos genéricos sem comentar qualquer caso em concreto). Se a empresa não tiver uma comissão de trabalhadores, os funcionários podem, ainda que não seja obrigatório, no prazo de cinco dias úteis constituir uma que os “vai representar nas fases seguintes do despedimento”.

A lei obriga a que exista uma fase de informação e negociação nos processos de despedimento coletivo.

Decorrido esse prazo, a lei obriga “a que haja uma fase de informação e negociação“, que “normalmente é entre o empregador e os trabalhadores” e que, se não existir, pode “invalidar o despedimento”. Nas reuniões devem ser explicados os motivos que levaram ao despedimento e “como é que foram selecionados os trabalhadores”.

A seleção dos trabalhadores a incluir no despedimento é uma das situações que dá mais aso a conflito. A lei não estabelece, a propósito de despedimento coletivo, nenhum critério, mas diz que os trabalhadores devem ser selecionados de acordo com critérios objetivos”, diz Madalena Caldeira.

Esta é uma das queixas dos trabalhadores da Platforme, que dizem não terem sido informados dos critérios que levaram à dispensa de uns em detrimento de outros e que falam mesmo num processo “aleatório”. Na carta que receberam, que foi consultada pelo Observador, são apresentadas justificações para o despedimento, mas não para a escolha específica de determinados profissionais.

Por outro lado, os trabalhadores dispensados afirmam que “não houve qualquer comunicação de intenção de despedimento, nem abertura de negociações”, sendo que alegam ter sido apenas informados de uma “decisão”. Na carta, que dizem ter sido a única que receberam, lê-se que está a ser comunicada a “decisão de despedimento coletivo”.

Nos relatos que fizeram, os profissionais alegaram ainda que o despedimento coletivo não tinha sido reportado às entidades competentes. A advogada Madalena Caldeira nota que a falha de qualquer empresa em comunicar um despedimento coletivo consiste numa “irregularidade” que “implica coima, mas não invalidade”. De qualquer forma, em resposta ao Observador, a Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT) confirma “ter sido notificada pela empresa Platforme MTO, Unipessoal, Limitada sobre a promoção de despedimento coletivo” e diz estar “a analisar os esclarecimentos e documentos recentemente apresentados pela referida empresa”.

A Platforme propôs aos trabalhadores o pagamento dos créditos obrigatórios por lei, como uma compensação calculada com base num mês por cada ano de trabalho, subsídio de Natal e Férias (proporcionais), o montante das férias não gozadas e os créditos de formações não recebidas.

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Os trabalhadores acusam a empresa de não ter apresentados os critérios que levaram ao despedimento de terminados profissionais

AFP via Getty Images

O ausente José Neves e a tentativa de distanciamento após a queda da Farfetch

Ao ser colocada nos sites das marcas, a tecnologia desenvolvida pela Platforme permite a personalização digital, como alterações dos materiais ou das cores, de determinadas peças de moda de luxo. A empresa nasce para inverter um cenário em que, segundo José Neves, um dos fundadores, “as marcas e retalhistas tentam adivinhar a procura e acabam invariavelmente por produzir mais do que é necessário”.

Em declarações ao semanário Expresso, em 2019, José Neves assegurou que a relação entre a Farfetch, empresa de que era CEO na altura, e a Platforme era meramente comercial. As contas do outrora unicórnio com ADN português, nomeadamente o relatório financeiro de 2022, mostram que firmou em outubro de 2015 um “acordo para serviços de comércio eletrónico através da FPS [Farfetch Platforme Solutions] para o desenvolvimento do site da Swear”.

Além disso, no segundo trimestre de 2017, celebrámos vários acordos de serviços de comércio eletrónico com a Platforme, nos termos dos quais disponibilizámos para venda no Farfetch Marketplace produtos de cada uma das marcas da Platforme, Swear, MySwear e B Store”, lê-se no documento com as contas anuais da plataforma que agora pertence à sul-coreana Coupang.

José Neves, o homem que sonhava ser astronauta e não conseguiu manter o unicórnio Farfetch a voar

No final de 2022, segundo a Farfetch, já não existiam “obrigações contínuas” ao abrigo “do acordo de serviços de comércio eletrónico através da FPS”. Nas contas seguintes (e as últimas a serem apresentadas antes da queda e posterior resgate da Farfetch), referentes ao primeiro e segundo trimestres de 2023, não é feita qualquer menção à Platforme.

Apesar de ser um dos fundadores e de ter um lugar no conselho de administração, José Neves não terá um papel ativo na empresa. Alguns trabalhadores dizem que era uma figura “mais presente” antes da ronda de investimento fechada em 2019 e que depois disso raramente foi visto no escritório. Gonçalo Cruz falava com “alguma frequência” no ex-líder da Farfetch, principalmente quando “queria dar ‘show-off’ ou quando era conveniente ‘atirar nomes grandes ao ar'” para dar a sensação de “segurança e estabilidade”.

“Após a queda da Farfetch, a Platforme tentou-se distanciar de José Neves", diz um funcionário

“Após a queda da Farfetch, a empresa tentou distanciar-se de José Neves. Antes essa associação era um ponto forte usado tanto em pitches de vendas como quando se tentava publicitar a empresa. Mas desde a queda da Farfetch que é suposto tentar evitar mostrar a relação entre José Neves e a Platforme“, afirma um funcionário, que garante que o distanciamento foi discutido durante uma das reuniões all hands (com toda a empresa). O Observador tentou chegar à fala com José Neves para obter um comentário acerca da atual situação da Platforme, mas não conseguiu.

Custom e Real Time, os dois produtos da Platforme

Neste momento, a Platforme tem dois produtos: o Custom e o Real Time. O primeiro, desenvolvido desde 2015, é descrito pela empresa como uma “solução modular de ponta a ponta que permite às marcas de moda exibir gémeos digitais 3D ou 2D dos seus produtos em vários pontos de venda, permitindo que os clientes finais personalizem esses produtos”. O segundo, que começou a ser desenvolvido em 2022, é uma “solução SaaS (Software as a Service) para que os atores da indústria acelerem o tempo de chegada ao mercado, ligando fabricantes, retalhistas e marcas” e permitindo que tomem “decisões informadas com dados em tempo real” e reduzam “riscos com desperdício ou excesso de stock”.

A tecnológica afirma que foram “alocados recursos muito consideráveis” ao Real Time, mas admite que o produto não tem “sucesso comercial substantivo”. Os trabalhadores dizem que o objetivo do novo produto não ficou “muito claro” desde o início e apontam que as chefias “não sabiam o que queriam” quanto à sua execução: “É um produto que não faz nada de muito útil (daí não vender nada).”

Catalyst AI e Springkode, as duas empresas compradas em 2021

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No início de 2021, a Platforme comprou a Springkode, empresa que permitia a venda de produtos de fábrica diretamente ao consumidor, com o objetivo de avançar para um modelo tecnológico mais sustentável “que reduz a incerteza e aumenta a eficiência e o lucro das operações”.

A empresa considerava que a fusão ia permitir “acelerar a escala do número de marcas, retalhistas e fabricantes com foco no crescimento sustentável, quer em termos financeiros quer em termos de impacto ambiental”.

PlatformE. Startup de José Neves compra Springkode para acelerar a moda sustentável

Em dezembro do mesmo ano, fazia uma segunda aquisição: a Catalyst AI, startup sediada no Reino Unido. Com a compra, a Platforme visava, segundo o seu site, reforçar as “capacidades de inteligência artificial e adicionar à sua plataforma ferramentas de machine learning para otimizar os processos da cadeia de abastecimento da moda”.

Os valores dos dois negócios não foram partilhados.

Ao longo das últimas semanas, o Observador contactou os responsáveis pela Platforme, incluindo o CEO, que não se mostraram disponíveis para prestar quaisquer esclarecimentos acerca do momento atual da empresa, nem para responder aos relatos feitos pelos trabalhadores.

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