895kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

Getty Images

Getty Images

Reino Unido. Sair ou não sair da UE? Eis a questão

Todos os partidos britânicos admitem a realização de um referendo sobre a permanência do país na UE, mas há os que o propõem, os que o defendem, os que o aceitam e os que o querem travar.

A realização do referendo no Reino Unido sobre a manutenção do país na União Europeia já não parece ser uma questão de se, mas sim uma questão de quando. A palavra referendo consta em todos os programas eleitorais dos principais partidos e até os trabalhistas e liberais-democratas, tradicionalmente mais pró-Europa, admitem a sua realização, caso Bruxelas prossiga na intenção de acumular mais poderes dos Estados-membros. Os conservadores querem em 2017, o UKIP, partido eurocético, diz que será uma das suas primeiras medidas. No entanto, se o referendo decorresse agora, o sim venceria, com 45% dos britânicos a dizerem que querem continuar a fazer parte das instituições europeias – o número mais alto desde setembro de 2010.

“Está na altura de resolver a questão europeia na política britânica. Eu digo aos britânicos: esta é a vossa decisão”, disse Cameron em 2013.

“Eu não vou liderar um Governo que não faça um referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia”, reiterou David Cameron este fim de semana, declarando definitivamente que esta é uma das linhas vermelhas do Partido Conservador. O atual primeiro-ministro fez a promessa de um referendo em janeiro de 2013, altura em que o próprio justificou a sua decisão com o descrédito com que a União era vista pela população, mas também com claras motivações eleitorais. Por um lado, o UKIP parecia estar a cavalgar o eleitorado tradicionalmente conservador, por outro, uma fação dentro do Partido Conservador, exigia uma linha mais dura na Europa – o deputado conservador Douglas Carswell deixou os conservadores pelo UKIP no final de 2014, dizendo que o seu antigo partido “não está preocupado com uma mudança verdadeira”.

Agora, com um possível empate técnico entre Partido Trabalhista e Partido Conservador, Cameron afirma a sua determinação quando já é certo que precisará de outras forças políticas para obter uma maioria no parlamento britânico. Esta terá sido uma mensagem para o Partido Liberal-Democrata com quem mantém uma coligação desde 2010 e que não se pronuncia definitivamente sobre este tema, apesar de no seu manifesto afirmar que o referendo está em cima da mesa caso haja um novo tratado da UE que leve à transferência de mais poderes para Bruxelas.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Cameron,primeiro-ministro britânico e líder dos conservadores, Clegg (ao fundo), líder dos liberais, e Miliband, líder dos trabalhistas, juntos em funções oficiais

Dan Kitwood

Nick Clegg, líder dos liberais, afirma que a União Europeia devia aprender a fazer as coisas de forma “menos complicada e menos espalhafatosa”, mas defende que nunca poderia fazer parte de um Governo que apoiasse a saída da União Europeia. Consciente da sua importância no processo pós-eleitoral – os liberais deverão perder quase metade dos seus deputados nas próximas eleições, mas com o número de deputados muito próximo entre trabalhistas e conservadores, os liberais podem juntar-se a qualquer um dos dois grandes partidos – Clegg deixou também um recado a Cameron e uma piscadela de olhos a Ed Miliband, líder dos trabalhistas “É impressionante que David Cameron e Nigel Farage [líder do UKIP] sejam comparáveis. Eles dizem aos britânicos que mais importante do que financiar o Sistema Nacional de Saúde [NHS], mais importante do que cortes fiscais, mais importante do que equilibrar as contas de forma justa, é o facto de o Reino Unido pertencer à União Europeia”, afirmou.

“Eu quero um acordo com o Reino Unido, mas o Reino Unido não está numa posição de impor a sua agenda a todos os outros Estados-membros”, afirmou Jean-Claude Juncker.

Se, no Reino Unido, o tópico é visto como um problema de segunda linha pela opinião pública britânica, no coração da União Europeia, os restantes Estados-membros e figuras da União estão expectantes em relação aos resultados destas eleições. “Eu não quero que o Reino Unido saia da União Europeia, mas não quero que a União Europeia tenha uma liderança exclusivamente britânica”, disse Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia na segunda-feira, acrescentando ainda que a saída da Grécia seria apenas uma desculpa para o mundo anglo-saxão destruir o projeto europeu.

"Durante demasiado tempo, a sua voz foi ignorada na Europa. Nós vamos dar-lhe voz para saber se ficamos ou não na União Europeia, com um referendo no final de 2017"
Programa do Partido Conservador, 2015

Referendo? Sim, para quase todos os partidos

As referências ao referendo abundam nos programas eleitorais dos principais partidos políticos e as posições oscilam entre primeira medida política caso se chegue ao Governo, no caso do UKIP, até à resistência do SNP, partido escocês que se bateu pela independência da região em 2014, em levar a cabo esta iniciativa. O SNP é aliás o único destes principais partidos que promete travar o referendo e caso não o consiga fazer, promete encontrar uma forma de dificultar a saída da UE ao sugerir que todas as regiões que compõem o Reino Unido – ou seja, Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte – estejam de acordo nessa decisão, fazendo com que o referendo seja duplamente validado.

A líder do partido e ministra principal escocesa, Nicola Sturgeon, já disse que só uma “mudança material” nas circunstâncias ou na opinião pública é que a levariam a defender o referendo.

Esta é uma das posições mais importantes, já que o SNP, que pode ganhar 50 lugares no parlamento britânico, será uma das chaves para resolver o impasse político que se vai viver após as eleições. O parlamento britânico é composto por 650 deputados e nem conservadores nem trabalhistas têm capacidade para atingir a maioria. Segundo as sondagens mais recentes, os dois partidos ficarão abaixo dos 280 deputados – os trabalhistas um pouco menos – e só através de coligações se vai conseguir resolver a governabilidade do país. A coligação natural dos conservadores será com os liberais e a dos trabalhistas, devido às semelhanças de programa, será com o SNP. No entanto, esta coligação pode não ser suficiente e os liberais poderão juntar-se aos trabalhistas e aos escoceses.

Nicola Stugeon, líder do SNP, e Nigel Farage, líder do UKIP, debatem na televisão britânica

WPA Pool

Apesar da sensação nas eleições locais e nas europeias – foi mesmo o partido que ganhou o escrutínio europeu em 2014 no Reino Unido – e até uma possível votação expressiva, com cerca de 13% no dia 7, o UKIP deverá apenas eleger entre dois ou três deputados. No entanto, o partido até já apresentou a pergunta para o referendo. “Deseja que a Grã-Bretanha seja uma democracia livre, independente e soberana?“. É esta questão que Nigel Farage, líder carismático do UKIP e eurodeputado – até reuniu no Parlamento Europeu o número suficiente de eurodeputados eurocéticos para formar um grupo político, como o Movimento 5 Estrelas de Beppe Grillo – quer que os britânicos respondam o “mais depressa possível” depois das eleições. Do referendo está, aliás, dependente uma das maiores bandeiras do UKIP para além de libertar o Reino Unido de Bruxelas, a imigração.

Já os conservadores e os trabalhistas partilham as mesmas intenções em relação ao primeiro passo a dar nesta nova legislatura: renegociar os termos de permanência do Reino Unido na União Europeia. O programa dos trabalhistas quer uma Europa focada no crescimento e no emprego, quer a conclusão do mercado único assim como maior disciplina fiscal – promete ainda que Reino Unido não vai aderir ao euro. Os conservadores querem “reformar a maneira como a União Europeia funciona que é demasiado mandona e burocrática”. O problema vem depois. Os trabalhistas até admitem um referendo, mas só perante perdas de soberania de Londres para Bruxelas, enquanto os conservadores firmam o compromisso de um referendo no final de 2017.

“A liberdade de circulação na UE nunca foi um direito incondicional e agora precisamos que opere numa base mais sustentável, tendo em conta as experiências dos últimos anos”, disse David Cameron no final de 2014.

“Deixar a Europa seria danificar profundamente as vidas do nosso povo e o futuro do país. Nunca vamos pôr o interesse nacional em risco ao ameaçar a saída da União Europeia”, afirmou Ed Miliband em abril, falando sobre as posições dos trabalhistas na política externa. O próprio David Cameron, que propôs o referendo, disse há dois anos que a decisão teria de ser “refletida” e que sair da União era “um bilhete apenas de ida”. No entanto, as constantes pressões do UKIP em relação à imigração, fizeram com que o primeiro-ministro dissesse no final de 2014 que um dos principais objetivos na renegociação com a Europa seria limitar o número de imigrantes dos restantes 27 Estados-membros, assim como os seus benefícios. Nick Clegg já disse publicamente que apoiaria estas mudanças.

A proposta dos conservadores é a de limitar os subsídios dados aos imigrantes europeus, nomeadamente subsídio de desemprego e os abonos para as crianças, assim como obrigar os nacionais dos 27 a abandonarem o país depois de ficarem mais de seis meses desempregados. Cameron admite que esta exigência pode levar à revisão dos tratados, algo que ele diz estar dispostos a trabalhar juntamente com os outros países. Pouco tempo depois deste anuncio, o Governo polaco veio reiterar publicamente que vetaria qualquer alteração que limitasse a liberdade de circulação dos seus nacionais.

"O Partido Trabalhista vai: devolver ao Reino Unido o papel de liderança na Europa, de modo a que a União Europeia funcione para o país e vai garantir que não haverá transferência de poderes para Bruxelas sem a realização de um referendo"
Programa do Partido Trabalhista 2015

O impacto da saída para o Reino Unido e para o Mundo

Os meses de campanha e pré-campanha têm sido os melhores meses para o sim à permanência do país na União Europeia. Em março, 46% dos britânicos estavam a favor e em abril 45%, números que quase duplicam os valores de 2012. É também agora que se verifica uma maior diferença entre o sim e o não, sendo que 33% dos britânicos considera que o melhor é sair da União, havendo 16% dos inquiridos indecisos em relação ao tema. O apoio ao sim sobe quando se fala em referendo depois de um renegociação bem-sucedida.

Este súbito reforço de apoio à União pode vir das opiniões de várias figuras britânicas que se têm mostrado contra a saída. “Imaginem o caos produzido pela possibilidade de a Grâ-Bretanha deixar a Europa. Os postos de trabalho dados por adquiridos passariam a ser pouco seguros, decisões sobre investimento seriam congeladas ou canceladas e a imprevisibilidade ia pesar na economia britânica”, avisou o antigo primeiro-ministro trabalhista, Tony Blair, defendendo que Ed Miliband trará “verdadeira liderança à União Europeia”. No dia seguinte ao seu discurso, vários empresários disseram que apoiavam a ideia de Tony Blair e que sair da UE criaria incerteza na economia britânica – entre os empresários que tomaram esta posição estão Chris Gibson-Smith, presidente do conselho de administração da London Stock Exchange, e Philip Hampton, presidente do conselho de administração do Royal Bank of Scotland.

Atualmente, mais de três milhões de postos de trabalho no Reino Unido estão dependentes da relação com a União Europeia e as exportações do país para os Estados-membros valem entre 10 a 15 mil milhões de libras por mês – em agosto de 2014, o valor das exportações foi de 10,8 mil milhões de libras, cerca de 14 mil milhões de libras. Um estudo recente, realizado por dois think-tanks alemães, Ifo e Fundação Bertelsmann, aponta que a saída do Reino Unido iria causar a redução das exportações e ia tornar mais caras as suas importações, diminuindo o investimento e a inovação no país. As perdas do Reino Unido no seu produto interno bruto poderiam chegar a 14% na primeira década, o que representaria a perda de 313 mil milhões de euros.

No entanto, este estudo mostra que uma saída negociada poderia ter um impacto mais subtil, embora afetasse sempre negativamente não só o Reino Unido, mas também a economia europeia e a economia mundial.

Numa situação complicada fica também a Irlanda cujo maior parceiro comercial é o Reino Unido. A Irlanda, ainda a recuperar da crise, poderia vir a perder até 3% do seu PIB.

Um dos países mais afetados seria a Alemanha, o maior parceiro comunitário do Reino Unido quer em exportações como importações. O país liderado por Angela Merkel podia vir a perder até 0,3% do PIB, mas algumas indústrias perderiam muito mais – seria o caso do setor automóvel que poderia perder até 2% com o decréscimo de trocas comerciais com o Reino Unido. O SPD, partido socialista alemão, já veio dizer publicamente que aguarda um vitória dos trabalhistas de modo a que a saída do Reino Unido “morra de vez”. “O Reino Unido fora da UE é impensável. Vou ficar acordado a ver os resultados, a torcer pela vitória dos trabalhistas”, disse Norbert Spinrath, porta-voz dos Assuntos Europeus do partido, à Bloomberg.

Segundo o relatório da Open Europe sobre a saída do Reino Unido, esta ação faria com que o Reino Unido tivesse de abrir a sua economia ao comércio com os Estados Unidos – o seu maior parceiro comercial no momento -, Índia, China e Indonésia, no entanto, esta abertura poderia ter efeitos negativos já que os britânicos se deparariam com novos níveis de concorrência a padrões de trabalho e produção muito diferentes. O relatório aponta ainda que sair da UE implicaria uma politica mais dinâmica de imigração de trabalhadores e não fechar as fronteiras, como o UKIP propõe.

Argumentos que podem ou não pesar já nas eleições de dia 7, mas parecem estar a moldar maneira como os britânicos olham para a União Europeia.

"Pelo menos 330 mil postos de trabalho na Escócia dependem do mercado único. É por isto que estamos contra o referendo sobre a saída da UE. Fazer parte da Europa é bom para os negócios. Caso o referendo avance, vamos tentar aprovar legislação para que nenhuma parte do Reino Unido saia da União contra a sua vontade. Vamos propor ainda uma "dupla maioria", o que significa que a não ser que a Inglaterra, a Escócia, o País de Gales e a Irlanda do Norte votem para sair, o Reino Unido terá de continua na União Europeia"
Programa do Partido Nacional Escocês (SNP) 2015

 

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.