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Ricardo Salgado tem 79 anos, vários diagnósticos de doença de Alzheimer e, para já, uma pena de prisão de 8 anos pendente
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Ricardo Salgado tem 79 anos, vários diagnósticos de doença de Alzheimer e, para já, uma pena de prisão de 8 anos pendente

Ricardo Salgado tem 79 anos, vários diagnósticos de doença de Alzheimer e, para já, uma pena de prisão de 8 anos pendente

Ricardo Salgado está a exagerar a doença de Alzheimer?

Nova perícia médica confirma diagnóstico de Alzheimer, diz que ex-banqueiro pode ser interrogado em tribunal e levanta "suspeita de que possa existir simulação" para exagerar efeitos da doença.

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Depois de um primeiro relatório de peritos independentes da delegação de Lisboa do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF) ter atestado que Ricardo Salgado estava no terceiro de quatro estágios da doença de Alzheimer, uma segunda perícia, com médicos diferentes, confirma o diagnóstico, mas acrescenta pontos de vista clínicos que levantam dúvidas sobre a existência de “exagero” ou “simulação” por parte do ex-presidente executivo do Banco Espírito Santo.

Os médicos da delegação centro do INMLCF realizaram novos exames, examinaram Salgado e concluíram igualmente que, apesar de “apresentar défices de memória”, o ex-banqueiro está em condições de ser interrogado em tribunal. E levantam a suspeita que possa” ter existido “simulação” de Ricardo Salgado com o “exagero de um possível défice intelectual ao falhar em questões simples de conhecimento gerais” que não se coadunam com as respostas que deu ao longo de diversos testes de avaliação neuropsicológica.

Vários peritos forenses contactados pelo Observador, garantem que tal alegada “simulação” não coloca em causa o diagnóstico de Alzheimer, mas pode indiciar que Ricardo Salgado está claramente consciente de que está a ser julgado e de que já foi condenado — uma questão de consciência que é determinante para saber se Salgado será algum dia preso. Refira-se que a condenação a uma pena de prisão de 8 anos por se ter apropriado de cerca de 10 de milhões de euros do Grupo Espírito Santo ainda não transitou em julgado.

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“Sem dúvida que Ricardo Salgado terá cadastro”

O Observador explica o que diz a segunda perícia, cruza com as conclusões do primeiro relatório e tenta perceber o que pode acontecer nos diversos processos que têm Ricardo Salgado como réu.

Quantas perícias já foram realizadas a Ricardo Salgado?

Foram realizadas duas perícias. O relatório da primeira foi produzido a 27 de novembro de 2023 e foi assinado por um colégio de peritos composto por Fernando Vieira, psiquiatra forense e um dos grande especialistas nacionais na área, Camila Nóbrega (neurologista) e Henrique Saraiva Barreto (neuropsicólogo). O tribunal que requereu o exame foi o Tribunal Cível de Cascais na sequência de um processo que tem Ricardo Salgado e a sua mulher como réus.

Já a segunda perícia é mais recente — o relatório tem a data de 21 de dezembro de 2023 — e foi feito por especialistas do INMLCF de Coimbra, sendo o colégio de peritos liderado por Joaquim Cerejeira e Isabel Santana. Neste caso, o requerente foi o tribunal da comarca de Lisboa que está a julgar o caso Manuel Pinho, no qual Ricardo Salgado é acusado de ter corrompido o ex-ministro de José Sócrates.

As duas perícias têm o mesmo objetivo?

Sim. Os juízes que ordenaram as perícias querem saber se Ricardo Salgado tem a doença de Alzheimer, como argumenta a sua defesa desde há vários anos, e se está em condições de testemunhar em tribunal.

A segunda perícia, feita pelos peritos de Coimbra, é mais explícita quanto às capacidades do ex-presidente executivo do Banco Espírito Santo poder depor em tribunal: “O arguido [Ricardo Salgado] mantém uma boa capacidade de interação pessoal, compreensão e expressão verbal, raciocínio e um estado emocional que, no nosso entender, não impedem que seja submetido a um interrogatório judicial na qualidade de arguido”, lê-se no relatório a que o Observador teve acesso.

A segunda perícia, feita pelos peritos de Coimbra, é mais explícita quanto às capacidades do ex-presidente executivo do Banco Espírito Santo poder depor em tribunal: "O arguido [Ricardo Salgado] mantém uma boa capacidade de interação pessoal, compreensão e expressão verbal, raciocínio e um estado emocional que, no nosso entender, não impedem que seja submetido a um interrogatório judicial na qualidade de arguido", lê-se no relatório a que o Observador teve acesso.

Contudo, os peritos de Coimbra avisam o tribunal de que Salgado pode “apresentar défices de memória”, não sendo por isso “possível garantir o rigor” das respostas que dará.

Já o colégio de peritos de Lisboa, liderado pelo psiquiatra forense Fernando Vieira, foi mais cauteloso. Afirma também que não existe real “impossibilidade” de Salgado “comparecer” no julgamento, mas admite claramente que, em termos médico-legais, podem estar “comprometidas as suas declarações” devido à doença de Alhzeimer e à “situação que em si sempre será stressante para qualquer cidadão em abstrato, incluindo naturalmente o examinando em concreto”.

As duas perícias confirmaram a doença de Alzheimer?

Sim. Nenhuma deixa dúvidas de que Ricardo Salgado padece daquela doença degenerativa.

A primeira perícia, pedida no âmbito de uma ação cível do Tribunal de Cascais, determinou que o ex-líder do BES apresenta “critérios clínicos para Perturbação Neurocognitiva Major em fase de demência moderada” e “causada por doença de Alzheimer” com “elevada probabilidade”.

Paulo Saragoça da Matta. “Ricardo Salgado não é inimputável” e “sem dúvida que terá cadastro”

O segundo colégio de peritos foi mais moderado nas palavras mas o resultado é o mesmo. O “quadro clínico cumpre os critérios definidos” pela Organização Mundial de Saúde para a “Demência devido à doença de Alzheimer”, lê-se no relatório.

Como surge a questão da alegada “simulação”?

Surge apenas no segundo relatório dos peritos Joaquim Cerejeira e Isabel Santana e devido a exames complementares realizados pela psicóloga Renata Benavente, do INMLCF.

Tais exames, refira-se, costumam ser feitos em muitas avaliações clínicas e também forenses e visam perceber se o doente está a enganar os médicos. Há casos clínicos, como de pessoas idosas que tentam obter carta de condução, em que está em causa a ocultação de sintomas da doença. E há casos de perícias forenses, em que os arguidos tentam exagerar os sintomas de doenças degenerativas ou até simular determinadas doenças degenerativas.

Que testes foram feitos no caso de Ricardo Salgado?

Além da observação e entrevista — que detetou um Ricardo Salgado “colaborante”, “vigil e orientado” com uma “linguagem empobrecida embora verbigerações ou neologismos”, com um “discurso normal e organizado, apesar de lacónico” —, foram realizados 17 testes para avaliar uma panóplia de variáveis como, entre outros, a “memória lógica”, a “informação e orientação”, as “cenas de família”, o “raciocínio aritmético” ou a “informação” do ponto de vista da atualidade e capacidade intelectual.

Na maioria desses testes, que servem para avaliar as capacidades cognitivas de Ricardo Salgado, o ex-banqueiro teve resultados "padronizados" no que é expectável "para a população portuguesa em função da faixa etária". Isto é, Salgado teve resultados semelhantes a pessoas com a sua idade (79 anos) e sem doenças degenerativas.

Na maioria desses testes, que serviram para avaliar as capacidades cognitivas de Ricardo Salgado, o ex-banqueiro teve resultados “padronizados” no que é expectável “para a população portuguesa em função da faixa etária”. Isto é, Salgado teve resultados semelhantes a pessoas com a sua idade (79 anos) e sem doenças degenerativas.

Nos testes em que obteve resultados abaixo da média, destacam-se o teste de rastreio do défice cognitivo ligeiro (MoCA – Montreal Cognitive Assessement) e o teste de avaliação de demência. Neste último, foi detetado que as “funções executivas, fluência verbal e alternativas motoras” estão “significativamente comprometidas”, apesar de “uma das 5 sub escalas se situar no intervalo da normalidade”,  lê-se no relatório.

E qual foi o teste exato levantou a questão da “simulação”?

O teste tem o nome técnico de SIMS – Inventário Estruturado de Simulação de Sintomas e visa detetar a “simulação de sintomas psicopatológicos e neuropsicológicos.” Na prática, é um teste que consiste em 75 “itens” de “resposta dicotómica (verdadeiro ou falso)” que pretende avaliar várias questões como  “transtornos de memória”, “sintomas psicóticos inusitados ou extravagantes” ou “baixa inteligência”.

Neste teste, cuja “pontuação total obtida” por Ricardo Salgado foi “superior à recomendada” para “determinar a existência de simulação”, foi detetada uma contradição nas respostas.

A perita levanta a suspeita "que possa existir simulação" e explica que "o perfil de respostas reflete um padrão focado na apresentação de sintomas neurológicos ilógicos ou muito atípicos" que "são inconsistentes com padrões de comprometimento produzidos por disfunção ou dano cerebral real". Diz que existe a hipótese de Ricardo Salgado ter promovido com as suas respostas ao teste um "exagero de um possível déficite intelectual ao falhar questões simples de conhecimentos gerais".
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Em primeiro lugar, a perita detetou que o “examinando responde frequentemente a itens referentes a sintomas atípicos em pacientes com distúrbios psicopatológicos ou neurocognitivos genuínos, o que levanta a suspeita que possa existir simulação”. 

Por outro lado, “o perfil de respostas reflete um padrão focado na apresentação de sintomas neurológicos ilógicos ou muito atípicos e sintomas relacionados com distúrbios de memória que são inconsistentes com padrões de comprometimento produzidos por disfunção ou dano cerebral real”, lê-se na pág. 15 do relatório da perita Renata Benavente produzido a 4 de dezembro de 2023.

A perita diz que existe a hipótese de Ricardo Salgado ter promovido com as suas respostas ao teste um “exagero de um possível déficite intelectual ao falhar questões simples de conhecimentos gerais”.

Refira-se que apesar dos marcadores biológicos indicarem o diagnóstico de Alzheimer, os testes para despistar situações de simulação são sempre feitos, segundo um perito forense consultado pelo Observador.

Qual a consequência da “simulação” e o que a mesma pode indiciar?

A consequência imediata é que colégio de peritos destacou nas suas conclusões gerais essa parte, dando assim relevo aos testes realizados pela perita Renata Benavente — que não faz parte do colégio.

Por outro lado, a suspeita de simulação também coloca em cima da mesa um indício de Ricardo Salgado ter consciência de que está a ser julgado e do que está a acontecer à sua volta, daí poder, alegadamente, ter a tentação de simular determinados sintomas para exagerar as consequências da doença de Alzheimer, segundo peritos forenses contactados pelo Observador.

O que poderá acontecer a Ricardo Salgado? 9 perguntas e respostas sobre a perícia para confirmar a doença de Alzheimer

Enfatize-se que, segundo as mesmas fontes, isso não é incompatível com a doença de Alzheimer, visto que esta doença degenerativa, como outras similares, tem diversos estágios de desenvolvimento.

Contudo, o primeiro relatório pericial indicou que Salgado está já na terceira da quatro fases de desenvolvimento da doença de Alzheimer

O tribunal que está a julgar o caso Manuel Pinho terá agora de avaliar se entende que Ricardo Salgado está em condições de testemunhar ou não.

Há mais processos em que já tenha sido pedida uma perícia médica independente?

Sim. A defesa de Ricardo Salgado está apostada em pedir novas perícias forenses em todos os processos que envolvem o ex-líder do BES. Isso deve acontecer já no julgamento do caso Universo Espírito Santo, prestes a iniciar-se, e no qual Ricardo Salgado é o principal arguido, com uma acusação de mais de 60 crimes.

O mesmo deve repetir-se naquele que é o processo mais avançado do GES: o caso de abuso de confiança, no qual Salgado foi condenado por três crimes de abuso de confiança a uma pena de prisão efetiva de 8 anos por alegadamente se ter apropriado de mais de 10 milhões de euros. Esse processo está no Supremo Tribunal de Justiça e deverá transitar em julgado ainda este ano.

Ricardo Salgado condenado a 8 anos de prisão efetiva

Quais os objetivos da defesa de Ricardo Salgado com tais perícias?

O objetivo primeiro é impedir que ex-banqueiro preste testemunho em todos os processos.

O segundo objetivo, e mais importante, é consolidar o diagnóstico de que o seu cliente padece da doença de Alzheimer, de modo a sustentar mais à frente em cada um dos processos a ideia de que a defesa não consegue conferenciar com o seu cliente.

Na perspetiva da defesa, tal ponto é crucial, visto que poderá estar em causa o princípio da defesa. Porque se Salgado não tem capacidade para conferenciar com os seus advogados, tem os seus direitos de defesa (devidos a todos os arguidos) diminuídos.

O que diz a jurisprudência sobre casos semelhantes?

É claro para os diversos especialistas contactados pelo Observador nos últimos meses que a jurisprudência nacional não leva à leitura de que os autos devem ser arquivados.

Tal só poderia acontecer se estivéssemos perante uma situação de inimputabilidade legal aferida por um conselho de peritos. Isto é, Salgado teria de padecer de uma doença degenerativa no momento da alegada prática dos ilícitos criminais que lhe são imputados.

Ora, tal não aconteceu.

Existe a hipótese de todos os processos que envolvem Salgado serem arquivados?

Não, exatamente porque não está em causa a inimputabilidade de Ricardo Salgado.

Ou seja, nem a defesa de Ricardo Salgado alguma vez solicitou que o tribunal certificasse tal inimputabilidade, nem isso está em cima da mesa. O parecer do colégio dos peritos informa isso mesmo: “Não foi invocada pelo réu a existência de falta de capacidade judiciária [inimputabilidade]”.

Paulo Saragoça da Matta. “Ricardo Salgado não é inimputável” e “sem dúvida que terá cadastro”

Sempre foi claro em todos os processos que a defesa de Ricardo Salgado não contesta que o ex-líder do BES estava perfeitamente são no momento dos factos (sejam criminais, sejam cíveis) que lhe são imputados, logo tal hipótese está fora de questão.

Corrigida às 22h26 a informação da pena de prisão efetiva à qual Ricardo Salgado foi condenado pela alegada prática de três crimes de abuso de confiança.

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