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Os ímanes são colocados um de cada lado do tecido a eliminar com recurso a uma endoscopia
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Os ímanes são colocados um de cada lado do tecido a eliminar com recurso a uma endoscopia

Ricardo Rio-Tinto/FChampalimaud

Os ímanes são colocados um de cada lado do tecido a eliminar com recurso a uma endoscopia

Ricardo Rio-Tinto/FChampalimaud

Subitamente, conseguiu comer outra vez. Dispositivo inovador, com mão portuguesa, ganha prémio europeu

O dispositivo pode ser usado para tratar problemas no esófago ou intestino. É introduzido por endoscopia e a cirurgia acontece depois, quando o doente já está em casa. Numa semana, está resolvido.

“Sempre gostei de cirurgia, mas nunca quis ser cirurgião”, diz Ricardo Rio Tinto. E o sonho tornou-se realidade. Agora, é distinguido com um prémio de inovação por ter contribuído para um dispositivo médico que permite fazer uma cirurgia depois de o doente já ter deixado a clínica ou o hospital e sem precisar de fazer qualquer corte. Confuso? Vamos por partes.

Pode dizer-se que a ideia tem quase 200 anos. Em 1826, Denans sugeriu um “novo processo de cicatrização de feridas no intestino” que consistia, grosso modo, em apertar uma porção do tecido intestinal entre duas placas até provocar a morte do tecido e abrir o orifício pretendido. Os resultados não foram assim tão bons e permaneceram semi-esquecidos ao longo do tempo até que a necessidade fez a equipa de Ricardo Rio Tinto, médico e investigador na Fundação Champalimaud, a repescar. Assim, usaram dois ímanes para apertar um pedaço de tecido, mas desta vez no esófago.

“Foi há quatro ou cinco anos que nos lembrámos de usar os ímanes”, conta Ricardo Rio Tinto sobre os primeiros passos daquilo que viria a ser o dispositivo inovador que agora tem em ensaios clínicos. O médico decidiu arriscar porque tinha doentes com uma condição muito específica e sem um tratamento razoável. Bem, o tratamento existia, mas os riscos associados à intervenção cirúrgica naquele grupo de doentes tornava-a desaconselhável.

“[O prémio] dá-nos motivação para avançarmos para novas aplicações, para passarmos ao passo seguinte: a aplicação em doenças mais frequentes”
Ricardo Rui Tinto, Fundação Champalimaud

“Os primeiros resultados não foram ótimos”, confessa. A solução funcionava, mas por poucos dias. E no primeiro doente em que a testaram, tiveram de a repetir várias vezes. O conhecimento adquirido e a determinação acabaram por levar ao desenvolvimento de um dispositivo que permite completar o processo com uma única endoscopia para introduzir o aparelho e uma radiografia no final para garantir que está tudo bem.

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A ideia é tão fora da caixa que mesmo os colegas de Gastroenterologia confessam que nunca se lembrariam de usar ímanes neste tipo de intervenção. O prémio da Sociedade Europeia de Endoscopia Gastrointestinal, entregue este sábado aos mentores do dispositivo mais inovador/promissor de 2021, sabe a reconhecimento pelos pares, diz o investigador. “Dá-nos motivação para avançarmos para novas aplicações, para passarmos ao passo seguinte: a aplicação em doenças mais frequentes”.

Ricardo Rui Tinto: “Sempre gostei de cirurgia, mas nunca quis ser cirurgião”

Ricardo Rio-Tinto/FChampalimaud

Como um íman no esófago muda a vida de uma pessoa

“Este dispositivo nasce da necessidade de tratar alguns doentes com uma situação muito concreta, que lhes provocava uma péssima qualidade de vida”, conta o gastroenterologista. A situação é o surgimento de divertículos esofágicos, uma espécie de bolsa onde a comida se acumula em vez de fazer a viagem normal da boca até ao estômago. Os doentes têm dificuldade em comer, regurgitam com frequência e podem até aspirar os alimentos que voltam à boca. Estes doentes correm, assim, o risco de sufocar e morrer.

O esófago, o tubo que leva a comida ao estômago, trabalha diariamente, contraindo e relaxando os músculos para deixar passar os alimentos. Como já terá experimentado com elásticos, de tanto esticar, alguns acabam por ficar laxos. É o que acontece com o esófago de algumas pessoas idosas. Com o esófago obstruído, vão, gradualmente, tendo mais dificuldade em comer, perdem peso e nem percebem como. O único tratamento eficaz era, até ao momento, a cirurgia que, em pessoas idosas, fracas, muitas vezes desnutridas por causa do próprio problema, apresenta riscos significativos e acaba por ser desaconselhada.

“Escolhi endoscopia na altura certa. Nos últimos 15 anos teve uma evolução brutal.”
Ricardo Rui Tinto, Fundação Champalimaud

O médico sentia a necessidade de tratar os seus doentes de uma forma menos invasiva. Aliás, sempre sentiu. “Dentro da Medicina sempre tive preferência por áreas de intervenção”, mas não a cirurgia. “Sempre imaginei poder fazer coisas sem ter de abrir os doentes.” Acabou por escolher uma área que lhe permite fazer uma intervenção profunda na vida dos doentes, mas sem incisões. “Escolhi endoscopia na altura certa. Nos últimos 15 anos teve uma evolução brutal.”

Agora diz que se vê a “inaugurar uma nova era”, em que “podemos implantar um dispositivo que vai fazer o trabalho por nós”. O MAGUS (MAgnétic Gastrointestinal Universal Septotome) — cujo nome soa a magia, diz o investigador — consiste em dois ímanes ligados por um fio de corte. Os ímanes apertam a base do tecido que está a mais e o fio faz o resto do estrangulamento. O tecido morre e é levado pelo sistema digestivo para fora do corpo — tal como o pequeno dispositivo — que tem 12 a 15 milímetros —, a parte que fica cicatriza e o doente volta a comer sem problemas.

MAGNUS, o dispositivo médico com dois ímanes e um fio de corte

Ricardo Rio-Tinto/FChampalimaud

O processo é tão simples que pode ser feito em ambulatório, continua. O doente entra de manhã e à tarde já pode ir para casa. Só durante o ensaio clínico é que ficavam internados 24 horas para garantir que corria tudo bem. Quanto às queixas, muito poucas, tirando um certo desconforto facilmente resolvido com paracetamol.

Quando o doente vai para casa ainda não sente melhoria nenhuma. Mas ao fim de cinco a oito dias, “a magia acontece”: subitamente os doentes começam a comer normalmente. Neste caso, contamos o “truque”, ao fim de cerca de uma semana, o dispositivo conseguiu cortar completamente o pedaço de tecido a mais e, cumprida a sua função, é eliminado pelo sistema digestivo. Quando a obstrução desaparece, o doente sente-se subitamente melhor. Depois, só precisa de voltar para uma radiografia e endoscopia para garantir que o dispositivo saiu e que o problema está realmente resolvido.

Até ao momento, a equipa de Ricardo Rio Tinto, que inclui médicos e investigadores da Universidade Livre de Bruxelas e do Hospital Erasmus, também em Bruxelas, já tratou 17 doentes, metade deles portugueses, “com resultados clínicos muito bons”, garante o médico. Depois da intervenção, os doentes passaram a conseguir alimentar-se, aumentaram de peso e deixaram de sentir dor quando comiam. A publicação dos resultados deverá ser feita numa revista científica durante o segundo semestre de 2021.

O ensaio clínico foi pequeno porque a doença é, de certa forma, rara. Agora, a equipa de Ricardo Rio Tinto quer testar este tipo de dispositivo e aplicação em doentes com tumores incuráveis que causam obstrução do estômago ou do intestino. A ideia é fazer um bypass sem ser preciso recorrer a cirurgia, que é uma intervenção muito agressiva para estes doentes. Outra possibilidade é verificar se este método traz vantagens em relação ao bypass cirúrgico para tratar a obesidade. “Faz-me impressão sermos tão agressivos com os doentes para tratar algumas destas coisas.”

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