À quinta foi de vez. E, mesmo assim, não foi com todos os sindicatos das forças policiais. O Governo conseguiu levar o seu acordo avante e, esta terça-feira, quatro sindicatos aceitaram a proposta apresentada no mês passado por Margarida Blasco, ministra da Administração Interna, depois de quase oito horas de negociações. Ainda que nem todas as estruturas sindicais tenham dado luz verde, todos os agentes da PSP e militares da GNR vão ter o seu recibo de vencimento alterado: mais 200 euros na componente fixa do suplemento já este ano e mais dois aumentos de 50 euros nos próximos dois anos. Ou seja, no total, o aumento é de 300 euros e a este valor é sempre acrescentada a componente variável, que corresponde a 20% do salário de cada um dos trabalhadores.
Mas a negociação não foi fácil e este é um momento de afastamento entre sindicatos. Se durante as últimas quatro reuniões que aconteceram no Ministério da Administração Interna todos os sindicatos se fizeram representar através da Plataforma da PSP e GNR — criada para estas negociações –, agora foi cada um por si. E a tutela agendou para o dia inteiro reuniões individuais com cada um dos sindicatos para discutir a mesma proposta que já tinha sido apresentada anteriormente. Aliás, nas últimas semanas, o Governo fez questão de dizer várias vezes que a proposta se mantinha e Luís Montenegro deu uma ajuda, avisando que não ia acrescentar “nem mais um cêntimo” ao que já tinha sido apresentado.
Suplementos da PSP e GNR. À quinta reunião, Governo consegue chegar a acordo com alguns sindicatos
Com reuniões separadas, os entendimentos não foram os mesmos. Uns decidiram aceitar, mesmo dizendo que o que foi proposto não é o cenário ideal, outros mantiveram o que têm defendido e abandonaram o edifício da tutela sem acordo e alguns já nem entraram no MAI. No fim, chegaram as críticas a quem aceitou o acordo, com um dos sindicatos a admitir que esta decisão “hipoteca quaisquer reivindicações futuras”.
Quase oito horas de negociações e um entre e sai de sindicatos
A primeira reunião estava marcada para as 10h30, com o Sindicato Nacional de Oficiais de Polícia (SNOP), e, de facto, começou a horas. A partir daí é que os planos de agenda do ministério tutelado por Margarida Balsco começaram a falhar — estava previsto que cada encontro durasse meia hora, mas a intenção não foi de todo cumprida.
Logo na primeira reunião, apurou o Observador, Margarida Blasco avançou com a mesma proposta que tinha apresentado no último encontro com a plataforma dos polícias. Mas tinha mais uma promessa: rever a estrutura salarial da PSP e da GNR já a partir do próximo ano. Este ponto agradou ao SNOP, que aproveitou para lançar outras reivindicações, como a revisão do suplemento de turno, de fardamento e patrulha e ainda a revisão da portaria que regula o sistema de avaliação da PSP.
Com todas estas promessas em cima da mesa, estava aberto o caminho para chegar a um consenso. Faltava, no entanto, falar com os restantes sindicatos que aguardavam no exterior do edifício. Assim que estas propostas foram comunicadas, Bruno Pereira, presidente do SNOP, quis reunir com alguns dos grupos sindicais — aqueles que acabaram por assinar o acordo — para transmitir o que tinha sido dito e para discutir possibilidades.
Seguiu-se a Associação Sindical dos Profissionais de Polícia (ASPP), o maior sindicato desta força de segurança, por volta do meio dia, já com a informação de que o SNOP tinha vontade de aceitar o acordo. Um hora depois, Margarida Blasco recebeu o Sindicato Nacional da Carreira de Chefes da PSP e, por volta das 16h, foi a vez de duas estruturas da GNR — a Associação dos Profissionais da Guarda e a Associação Nacional de Oficiais da GNR. Estas reuniões foram as que demoraram mais tempo, tendo em conta a vontade de cada uma delas em assinar um acordo ao final do dia.
Entre estes encontros, foram entrando e saindo outros sindicatos que não quiseram um acordo com o Governo. Ou, pelo menos, nestes termos. Enquanto isso acontecia, os representantes das estruturas que já tinham sido recebidos por Margarida Blasco permaneciam dentro do edifício, onde ficaram praticamente o dia todo. Faltava pouco para as 19h, quando finalmente os cinco sindicatos — três da PSP e dois da GNR — se sentaram à mesa com a ministra da Administração Interna para assinar o tão aguardado acordo.
Ainda assim, e apesar de existir um acordo, os representantes quiseram deixar claro que não consideravam o acordado a solução ideal. Ao Observador, Bruno Pereira adiantou que a portaria que regula o sistema de avaliação da PSP é o único ponto do acordo que será cumprido já este ano, além do aumento do suplemento. “É um meio acordo. Achámos que era razoável aceitar neste momento. Achámos que perpetuar isto poderia corromper a possibilidade de ter alguma coisa a curto-prazo”, acrescentou.
Vários sindicatos prometem continuar a reivindicar um suplemento igual ao da PJ
Durante a tarde desta terça-feira, ainda os sindicatos que chegaram a acordo estavam a negociar as respetivas condições, já outras estruturas tinham anunciado que não iriam assinar nada. Foram quatro: o Sindicato Independente dos Agentes de Polícia, Sindicado Nacional da Polícia, Associação Sindical Autónoma de Polícia e o Sindicato dos Profissionais da Polícia.
No entanto, nem todos os que não quiseram assinar o acordo chegaram a sentar-se à mesa com Margarida Blasco. Exemplo disso é o Sindicato Nacional da Polícia (SINAPOL), que tinha reunião marcada para as 11h30, mas acabou por abandonar as instalações do Ministério da Administração Interna por volta da hora de almoço — e os seus representantes já não voltaram. Só regressariam se a discussão com a tutela incluísse um valor diferente daquele que foi apresentado e aprovado por outros sindicatos. Como não existiu essa hipótese, o SINAPOL decidiu dar por terminada a sua participação no dia negocial.
Agora, ainda que as negociações diretas com o Ministério da Administração Interna possam ficar fragilizadas, prometem continuar a luta por outras vias, como reuniões com os grupos parlamentares, apostando todas as fichas no próximo Orçamento do Estado. Ao Observador, Armando Ferreira, presidente do SINAPOL, considerou que este acordo “hipoteca quaisquer reivindicações futuras sobre o assunto”, evidenciando o distanciamento em relação aos sindicatos que acabaram por concordar com o documento.
“Está aqui em causa uma questão de direito de igualdade a um valor nas forças policias portuguesas. Este acordo continua a privilegiar quem ganha mais, continua a compensar com valores inferiores aqueles que estão mais expostos ao risco”, referiu Armando Ferreira, defendendo que ter uma componente fixa de 20% do salário de cada trabalhador vai sempre compensar quem tem salários mais elevados.
Aos jornalistas, após o dia de negociações, o presidente da Associação Nacional de Sargentos da Guarda (ANSG), Ricardo Rodrigues, anunciou que vai recorrer “o mais rápido possível” ao Tribunal Constitucional, considerando que o aumento de 300 euros não contempla “o principio da legalidade e igualdade”. “Não nos resta outra via que não seja a do Tribunal Constitucional e a dos protestos”, anunciou, reforçando que a ANSG considera que “está haver um tratamento absolutamente discriminatório”.
Carlos Torres, do Sindicato Independente dos Agentes de Polícia (SIAP), defendeu, também em declarações aos jornalistas, que “não é digno para um agente da PSP porque fica a ganhar abaixo de um segurança da PJ” e que a estrutura não chegou a acordo porque “manteve a mesma posição”: “Abaixo dos 400 euros nem um cêntimo”.
O Sindicato dos Profissionais de Polícia (SPP) promete “continuar a lutar pela atribuição de um suplemento de risco no futuro”. O presidente, Paulo Macedo, assumiu: não consegue “encontrar justificação válida para que a vida de uma polícia e o risco de um polícia seja inferior aquele que é atribuído na PJ”.