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Talkdesk. “Se parássemos as vendas e só retivéssemos clientes, ainda assim, crescíamos mais de 30% ao ano”

É vice-presidente de desenvolvimento de um unicórnio que vale 3 mil milhões. Ao Observador Marco Costa não revela números, mas explica porque ter lucros ainda não é objetivo: "Crescer custa dinheiro".

“Se parássemos as vendas e só retivéssemos clientes, ainda assim, crescíamos mais de 30% ao ano.” Quem o diz é Marco Costa, vice-presidente de desenvolvimento corporativo global da Talkdesk, o unicórnio (empresa avaliada em mais de mil milhões de dólares), que em plena pandemia viu o seu valor triplicar depois de fechar uma ronda de investimento internacional de 143 milhões de dólares. Em entrevista ao Observador, o executivo explica porque é que, apesar desta recente operação de financiamento, atingir o break-even [ser uma empresa rentável, sem prejuízos] não está sequer no horizonte da empresa: “Crescer à velocidade a que estamos a crescer custa dinheiro. Não há nada a fazer”, disse, sem revelar os resultados da empresa.

Unicórnio Talkdesk avaliado em 3 mil milhões de dólares após nova ronda de financiamento

A empregar cerca de 1.300 pessoas, maioritariamente em Portugal, os planos da Talkdesk passam por atingir cerca de 2.000 ou 2.500 de colaboradores no próximo ano. Ainda que o ritmo de recrutamento tenha sofrido um abrandamento por causa da pandemia, a empresa tem agora 350 vagas só para a equipa de produto, que junta cerca de 800 pessoas e deverá atingir as 1.000 em fevereiro do próximo ano. Sobre a gestão da equipa nos últimos meses, confessa: “Estamos a aprender. Se lhe disser que foi tudo fantástico, não é verdade. Há desafios”.

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Recentemente, a Talkdesk foi nomeada Líder no Quadrante Mágico da Gartner, na área de Contact Center as a Service (CCaaS), que pela primeira vez distinguiu vencedores da Europa e América do Norte em conjunto. Atualmente, a Talkdesk tem mais de 1800 clientes em mais de 75 países. Foi fundada em 2011 por Tiago Paiva, atual presidente da empresa, e Cristina Fonseca, que se mantém como acionista. Com sede em São Francisco, no EUA, a empresa tem também cinco escritórios em Portugal.

“Se parássemos as vendas e só retivéssemos clientes, ainda assim, crescíamos mais de 30% ao ano”

Li que, nos últimos meses, a Talkdesk teve “um crescimento acentuado”. Mas que crescimento foi este? A que dados se referem?
Só consigo dar dados relativos. Nós estamos a crescer mais de 100% de trimestre em trimestre. Quando comparamos o trimestre homólogo do ano passado, estamos a crescer bem mais de 100%.

Mas crescem em vendas?
Sim. A Talkdesk segue o modelo de software as a service, ou seja, é um modelo de subscrição. Quando um cliente vem ter connosco e diz que tem mil pessoas num contact center, subscreve a possibilidade de ter mil pessoas a usar a Talkdesk em simultâneo. Esse cliente vai continuar a ser nosso cliente todos os meses. E todos os meses, na verdade, ele tem de pagar aquela subscrição. Durante o tempo do contracto — três, cinco anos –, esse cliente continua a usar o Talkdesk. Não é numa ótica de fazermos um projeto e depois há uma manutenção. Isso não existe. Há uma subscrição e aquela receita acontece durante todo o tempo de vida do projeto. Temos duas métricas muito importantes. Uma é a capacidade de reter aqueles clientes que já capturámos, porque essa é a receita que queremos que continue lá para sempre. E temos uma equipa que só faz isso. Depois temos uma equipa que traz negócio novo.

O que lhe estou a dizer é que, ao nível do negócio novo, estamos a capturar clientes e estamos a fazer isso a um ritmo que duplica todos os trimestres. Em termos de retenção [de clientes], temos métricas que são das melhores do mercado. Se parássemos as vendas e não fizéssemos mais nada, só retivéssemos clientes, ainda assim crescíamos mais de 30% ao ano. Porque os clientes que temos continuam a crescer também. Em cima desse crescimento, estamos a capturar mais do dobro dos clientes que estávamos a capturar no trimestre anterior. São novos negócios com receitas correntes — todos os meses aqueles clientes vão ficar connosco. Estamos a duplicar as vendas e os novos clientes em termos de volume, mais do que duplicar em relação ao trimestre homólogo.

E de que valores estamos a falar atualmente?
Somos uma empresa privada e, nesta fase, não divulgamos esses valores a ninguém. É algo que só divulgamos ao nosso conselho de administração.

A pandemia veio acelerar este crescimento? Porque muitas empresas tiveram de diversificar as ferramentas com que trabalham. Isto para Talkdesk pode ter sido uma oportunidade para chegar a mais empresas?
Sim, pode. A Talkdesk trabalha na área da experiência do cliente, ou seja, ajudamos os nossos clientes a falarem com os seus clientes. Quando pensamos que, no passado, todos íamos à rua fazer compras e agora quase não saímos de casa, o que é que está a acontecer? Continuamos a consumir, a questão é que consumimos de forma diferente. Esse é o primeiro fator. E consumimos online. Temos estudos e dados que apontam para que cerca de 90% dos clientes compram em marcas nas quais confiam. Como é que se mede a confiança? Mede-se muito na relação. Quando temos de falar, interagir, temos ou não uma boa experiência? E se nós compramos uma coisa e no pós-venda não conseguimos falar com a empresa, estamos imenso tempo à espera… Mas e se ligarmos e tivermos alguém do outro lado que diz “Olá, Marco, bom dia. Comprou este produto, está com algum problema?”, então a experiência é muito diferente.

A interação passa a ser o canal privilegiado de relação com os clientes. E os nossos clientes já perceberam isso, que ter a tecnologia que lhes permite ter a ligação, esse engagement com os clientes é uma questão de sobrevivência. Posso-lhe dizer também que um terço dos consumidores que não tiverem uma boa experiência [com uma marca/serviço] não voltam a comprar naquele sítio. Portanto, quem tratar bem a experiência do cliente tem uma vantagem enorme sobre a concorrência. O mercado está a perceber isso. Quando juntamos isto à mudança na forma como trabalhamos — agora trabalhamos em casa e os contact centers também — estamos a juntar a necessidade de ter uma melhor experiência com a de ter equipas de suporte distribuídas. E é preciso tecnologia para isso. Na Talkdesk temos a sorte de ter a tecnologia que está focada nestas duas coisas.

"O Talkdesk o que faz? Primeiro, é uma solução inteiramente na cloud [nuvem]. Quando o cliente liga para o contact center, a Talkdesk liga-se a todas as bases de dados que tem e vai perceber se conhece a pessoa que está a ligar ou não"

E como é essa tecnologia? O produto da Talkdesk já mudou desde que a empresa surgiu, tem vindo a adaptar-se. Em 2020, o que é o produto da Talkdesk?
Nós trabalhamos três personas diferentes: o agente do contact center, o supervisor (que é a pessoa que está a gerir a operação) e depois o administrador, que é a pessoa que tem de garantir que tudo funciona. Isto para servir os clientes. O que é que o Talkdesk faz? Quando a Ana liga — e vamos assumir voz como exemplo, mas isto é válido para qualquer canal digital, chat, WhatsApp –, a experiência normal de um contact center é: primeiro, está à espera, carrega em botões, não sabe muito bem onde encaixar a sua questão, nem sempre é claro. Depois, vai para uma fila de espera e começa a falar com uma pessoa que não faz ideia de quem é a Ana, mesmo que a Ana seja cliente. E depois vai pedir-lhe dados, número de cliente e corre o risco de aquela não ser a pessoa certa para resolver o seu problema e ainda vão ter de passar a questão para outra pessoa. E, provavelmente, vai ter de contar tudo de novo. E com isto passou muito tempo.

O Talkdesk o que faz? Primeiro, é uma solução inteiramente na cloud [nuvem]. Quando o cliente liga para o contact center, a Talkdesk liga-se a todas as bases de dados que tem e vai perceber se conhece a pessoa que está a ligar ou não. “Sei que é a Ana, conheço o número, vamos perceber que a Ana tem este histórico de relação connosco, comprou estes produtos. É uma cliente VIP. E, já agora, comprou um produto que está a ter problemas com outros clientes. Se calhar é isso.” Pegamos nessa informação e se calhar nem lhe perguntamos: “O que é que quer, Ana?” O que podemos dizer automaticamente é: “Olá, Ana, bom dia. Sei que a Ana tem este problema. É sobre isso que quer falar connosco?” Se for sobre isso, provavelmente podemos seguir.

Em casos mais extremos, temos alguns clientes que tentam perceber qual é o problema e nem sequer passam para o agente [pessoa]. E temos agentes virtuais, que dizem o que é possível, mas que, se ainda assim, quiserem falar com um agente, então passamos. Usamos a informação que existe. E há muita informação da pessoa, informação histórica da empresa, e a do contact center. E fazemos isto muitas vezes, sem sequer chegar a um agente, com um agente self-service, que ainda é mais rápido. Ou, quando a Ana quer mesmo falar com um agente, [o sistema] vai perceber que tipo de agente é o mais adequado para falar com a Ana.

Tudo isto assente em tecnologia de inteligência artificial e machine learning.
Com muita, muita, muita inteligência artificial. Isto é a parte em que tentamos ajudar, antes da interação. Depois da interação, quando o agente está a falar com o cliente, também temos inteligência artificial, que o que está a fazer é: ouve a conversa e percebe o que é que o cliente está a perguntar. Se a Ana começa a falar de uma viagem para Nova Iorque, mas não sabe se é preciso visto, por exemplo, o sistema automaticamente percebe “Nova Iorque, visto, chamada de Portugal”, vai à base de dados de conhecimento, traz informação e mostra ao agente: “Olha, o visto para Nova Iorque é isto. Interessa-te? É o que tens de dizer agora ao cliente?” Automaticamente, o sistema pode mostrar ao agente que opções tem e o agente escusa de andar à procura. O sistema ajuda-o, está a transformá-lo num super agente, para que tenha toda a informação que precisa a aparecer à sua frente. Depois, é ele que decide. Não é só uma oportunidade de servir melhor os clientes, em menos tempo, como potenciamos o upseller e a venda cruzada, ou seja, mais receitas.

"Estamos neste momento com perto de 1.300 pessoas. E no próximo ano vamos claramente ultrapassar as 2 mil, 2.500. Com o crescimento de R&D e o outro crescimento, que tem a ver com a área comercial, crescimento e expansão internacional, provavelmente ultrapassaremos as 2 mil pessoas no próximo ano"

Têm dados sobre quanto tempo poupam as pessoas, por exemplo? Como conseguem medir se o produto é eficiente?
Esse é um dos critérios. Temos dados estatísticos: estamos a falar de aumento da satisfação dos clientes em cerca de 19% depois de a Talkdesk entrar, em média; 23% de redução de tempos de espera. Isto são métricas reais, vale dinheiro. E nós sabemos isso. Se for uma operação com 50 agentes isto vale um determinado dinheiro. Numa operação com mil agentes, 23% da redução de tempo de espera vale muito dinheiro. E não estamos a falar de redução só de custo, não estamos a dizer: “Vamos despedir agentes”. Quer dizer, o nosso cliente pode libertar agentes, mas o que estamos a dizer é que: “Não, vamos mas é ocupá-los a fazer coisas que tragam mais valor para a empresa.” Todo aquele tempo em que estive a tentar resolver problemas que podem ser resolvidos automaticamente pode ser usado para ajudar os clientes e fazer upsell. E temos dados concretos sobre isso também. Há tipicamente estas duas partes. Porque é que o agente está a fazer um trabalho que pode ser feito por uma máquina e se calhar mais eficiente e sem o tempo de espera para o cliente? Não faz sentido. É isso que nós fazemos.

Quantas pessoas têm a trabalhar só neste sistema de inteligência artificial?
Neste momento, em termos de produto, R&D, temos cerca de 750 a 800. Voltámos agora, outra vez, a crescer a partir de junho. Tínhamos abrandado um bocadinho o recrutamento e agora voltámos a acelerar. Temos cerca de 800 pessoas na equipa que faz produto. Na equipa de machine learning, de inteligência atificial, provavelmente teremos perto de 200 pessoas só dedicadas à inteligência artificial. O centro que criámos em Coimbra é essencialmente inteligência artificial.

E estas 800 pessoas estão em Portugal?
Dir-lhe-ia que 95% estão em Portugal. Temos alguns perfis que fomos contratando especificamente, pessoas que precisávamos noutras localizações. Temos um contingente de colegas no Brasil que estavam para vir para Portugal, mas depois com esta mudança, estamos todos a trabalhar em casa. Alguns vieram, outros não. Temos algumas equipas espalhadas, mas a maioria está cá em Portugal.

Com a pandemia houve um abrandamento no recrutamento?
Vamos definir abrandamento. Abrandamento quer dizer que este ano, até outubro, recrutámos quase 200 pessoas. Portanto, foi esse o abrandamento.

Os vossos objetivos no início do ano deviam ser outros.
Nós queríamos chegar ao final do ano com 1.000 engenheiros. Esse era o plano que já tínhamos apresentado há três anos. E estávamos em linha para atingir esse plano. Com este pequeno abrandamento que tivemos,  diria que vamos atingir esses 1.000 engenheiros talvez em fevereiro do próximo ano. Estamos outra vez com esse objetivo, abrimos agora 350 vagas, mas não vamos provavelmente conseguir chegar lá até dezembro. Acreditamos que em janeiro e fevereiro é que estaremos a tocar nas 1.000 pessoas em R&D.

Ao todo, quantas pessoas empregam?
Ao todo, estamos neste momento com perto de 1.300 pessoas. E no próximo ano vamos claramente ultrapassar as 2 mil, 2.500. Com o crescimento de R&D e o outro crescimento, que tem a ver com a área comercial, crescimento e expansão internacional, provavelmente ultrapassaremos as 2 mil pessoas no próximo ano.

“Crescer à velocidade a que estamos a crescer custa dinheiro. Não há nada a fazer”

Regressando às contas, já está nos vossos planos atingir o break-even [rentabilidade]?
Há aqui uma questão, que tem a ver com: qual é a importância de atingir o break-even neste momento? E o que é que isso iria comprometer em termos da nossa capacidade de crescer? Porque levantámos dinheiro, tivemos os nossos investidores em julho a confiar em nós mais 143 milhões de dólares, porque acreditamos todos. E o plano que temos é que a decisão correta para a empresa é continuar a crescer. Continuar a crescer é contratar mais engenheiros, fazer mais produto, melhorar o nosso produto, contratar mais equipas comerciais, ter mais marketing, que há-de dar resultados daqui a um ano. As equipas comerciais esperamos que passado uns seis meses já comecem a trazer receitas, mas há aquele custo todo, temos de lhes pagar os salários no momento em que chegam e não quando começam a vender. E ainda mais longe do lado da engenharia.

Quando começamos a fazer um produto, até que o produto chegue ao mercado e comece a dar receitas, estamos a falar de um ciclo que em alguns casos pode demorar 18 meses a 24 meses. Termos como objetivo fazer o break-even implicaria parar de crescer e de investir ou investir menos. E acreditamos — e os nossos investidores também — que a decisão certa para a empresa, neste momento, é continuar a crescer. Ou seja, medimos o crescimento, medimos naturalmente a margem que cada cliente nos dá, o que não queremos é castrar a capacidade de crescer com esse objetivo. Temos a sorte de ter investidores que acreditam em nós, no que estamos a fazer e estão dispostos a investir na empresa para que o crescimento seja o grande drive. Não é a linha de fundo, não é o resultado final do ano, neste momento. É o potencial, os novos clientes, toda essa história. Crescer à velocidade a que estamos a crescer custa dinheiro. Não há nada a fazer.

"[A ronda de investimento] não estava nos planos. Foi uma questão de nos ter aparecido a oportunidade. Pareceu-nos uma boa oportunidade para aumentar a capacidade de investimento com os parceiros certos e avançámos. Se percebêssemos que não eram os parceiros certos, não o tínhamos feito"

Foi uma ronda de 143 milhões, que surgiu dois anos depois daquela que vos avaliou em mil milhões de dólares e fez da Talkdesk um unicórnio. Esta ronda já estava a ser negociada há mais tempo ou foi em plena pandemia? Como foi esse processo?
Na verdade, foram 18 meses entre uma ronda e a outra, o que é de facto fantástico perceber como o mercado conseguiu reconhecer o crescimento que a empresa está a ter, quase três vezes o valor da empresa. Crescemos três vezes o valor da empresa, o que foi fabuloso. E quando a empresa passa a unicórnio e tem o crescimento que está a ter, naturalmente estamos sempre em contacto com investidores. Há sempre conversas com investidores que vêm ter connosco, há uma rede de suporte que é preciso manter, para garantir que a empresa tem os recursos necessários para continuar a crescer ao ritmo que falámos antes. Naturalmente, quando percebemos que entrámos numa situação de pandemia… Ninguém sabia, e na verdade ainda ninguém sabe muito bem, qual é o impacto negativo.

No mercado há uma tendência de dar mais importância à experiência do utilizador, como falámos há pouco. E os clientes estão nesse sentido, mas têm de ter capacidade de investir. E alguns clientes perderam capacidade de investir, na área de viagens, hotelaria, etc. Estão numa posição muito difícil e não conseguem investir. Tivemos de ter algum cuidado com a nossa capacidade de investimento e de perceber o que vai acontecer. Há muita incerteza neste espaço. E, portanto, surgiram oportunidades muito interessantes, com investidores muito fortes, muito credíveis e decidimos aproveitar essa oportunidade para garantir que mantínhamos, independentemente do momento de incerteza que estamos todos a viver, capacidade de investimento. E aumentávamos aquilo que nas startups e nestas empresas de crescimento rápido se chama runaway, que é quanto tempo é que temos de dinheiro para continuar a crescer ao ritmo a que queremos crescer? Foi um bocadinho esse o objetivo. Não foi “Agora vamos ter de levantar dinheiro, porque estamos a ficar sem dinheiro”, não foi nada disso. Foi “Ok, temos parceiros que reconhecem o crescimento da empresa, estão a falar connosco e a avaliação faz sentido, é fantástica, três vezes de crescimento em 18 meses, vamos concretizar”.  Foi um bocadinho assim.

Mas esta ronda já estava nos planos?
Não, não estava nos planos. Foi uma questão de nos ter aparecido a oportunidade. Pareceu-nos uma boa oportunidade para aumentar a capacidade de investimento com os parceiros certos e avançámos. Se percebêssemos que não eram os parceiros certos, não o tínhamos feito.

"Qualquer empresa que tem o nível de crescimento que estamos a ter e o tipo de investidores e de rondas, naturalmente que um IPO é um caminho com alguma normalidade. Agora, não há aqui uma obsessão de termos de fazer um IPO para o ano ou daqui a dois anos. Isso não existe. O que existe é uma ambição mito grande de continuarmos a ser uma empresa que trata bem os clientes, tem cada vez mais e maiores clientes, mais produto e melhor produto. Essa é a visão"

Como é falar e negociar rondas de investimento numa altura como esta? Os investidores continuam muito ansiosos e com vontade de investir ou estão mais reticentes e mais defensivos?
Não posso falar especificamente sobre isso, porque o processo foi conduzido pelo Tiago Paiva [CEO da Talkdesk], naturalmente. Mas quando olhamos para aquilo que são os números de investimento globais, percebemos que houve aqui uma redução naturalmente de investimento. Há expectativa sobre o que vai acontecer e o mercado retraíu-se e foi para áreas mais seguras. Houve grandes empresas cotadas de software as a service que tiveram um crescimento enorme, porque o mercado percebeu que era uma aposta segura para proteger os seus capitais. Mas o mercado de investimentos de facto retraiu-se. Fazer esta ronda foi um reconhecimento ainda maior de que o mercado acredita no que estamos a fazer.

O Tiago Paiva já tinha falado nisto anteriormente e, na altura da ronda, disse à Bloomberg que fazer um IPO [admissão em bolsa] era algo que podia estar para breve. Esses planos mantêm-se? É uma coisa que continua a estar para breve? Muito para breve?
Acho que o Tiago disse tudo. Vamos ser claros: qualquer empresa que tem o nível de crescimento que estamos a ter e o tipo de investidores e de rondas, naturalmente que um IPO é um caminho com alguma normalidade. Agora, não há aqui uma obsessão de termos de fazer um IPO para o ano ou daqui a dois anos. Isso não existe. O que existe é uma ambição mito grande de continuarmos a ser uma empresa que trata bem os clientes, tem cada vez mais e maiores clientes, mais produto e melhor produto. Essa é a visão. Agora, garanto-lhe: se fizermos isso bem feito estaremos em condições para fazer um IPO assim que for um bom momento para o fazer. Mas não é uma obsessão. Acho que vai acontecer com naturalidade quando chegar o momento, mas não é o foco. O nosso foco, acredite, é mesmo manter as equipas de engenharias focadas e a fazer um grande produto, em ter o melhor produto no nosso espaço. E também, com a minha nova função, garantir que estamos perto dos clientes, o mais perto possível em termos globais. Isso é o mais importante para nós.

Para algumas empresas esta pandemia foi uma oportunidade, mas para outras representou uma grande crise. A Talkdesk perdeu clientes de peso que não estava à espera de perder?
Nós passámos por uma experiência um bocadinho diferente, que foram os clientes que tinham connosco uma determinada capacidade instalada, um número de agentes, e que perceberam que tinham de reduzir um bocadinho. Note que há uma coisa interessante: mesmo algumas empresas que diminuíram a atividade aumentaram o número de chamadas do contact center.

Temos exemplos de empresas que aumentaram 600% o número de chamadas, porque o facto de, dando o exemplo das operadoras aéreas, o facto de não haver voos, não quer dizer que não haja pessoas a ligar, porque havia voos marcados e é preciso tratar de toda essa logística. “O que é que fazemos agora?” As pessoas têm muito mais dúvidas. Houve, em muitas áreas, um redirecionar do tipo de interação, de investimentos, de canais ou sítios presenciais para canais digitais. O facto de alguns clientes terem baixado a sua atividade não quer necessariamente dizer que baixaram a sua atividade connosco. Às vezes é o contrário.

Houve clientes que, sim, tiveram de reduzir o número de agentes. E pediram-nos ajuda. E a nossa equipa de customer success, que são os gestores de conta, tiveram instruídos para garantir que trabalhamos com os nossos clientes para perceber qual é a melhor solução para eles e para nós. Quer dizer… Naturalmente, não queremos estar a perder aquilo que é a nossa receita, mas também não queremos estar a forçar clientes a usar soluções que não podem usar. Encontrámos entendimento de várias formas criativas para garantir que eles continuam a ser clientes Talkdesk e que há uma relação de proximidade. E tivemos muito bons resultados aí. Muitos clientes que, nesta fase mais difícil, na verdade, se aproximaram mais de nós do que o contrário — a nossa equipa foi capaz de ouvir e de perceber as necessidades de cada um dos clientes e ter alguma flexibilidade nessa relação. Houve alguma redução, mas foi um caso de sucesso em termos da forma como nos entendemos.

"Estamos a aprender. Se lhe disser que foi tudo fantástico, não é verdade. Há desafios, há pessoas que se adaptam mais rápido do que outras, há pessoas que têm melhores condições em casa do que outras, há pessoas que têm questões familiares que têm de se ajustadas e nós temos de ser sensíveis a isso. E fomos"

Pandemia: “Estamos a aprender. Se lhe disser que foi tudo fantástico, não é verdade”

O Marco Costa agora é vice-presidente global de desenvolvimento corporativo e tem, por isso, uma posição de liderança de topo. Como tem sido liderar e gerir equipas de uma empresa com o ADN da Talkdesk, de rápido crescimento e pressão, nesta altura?
Não tem sido muito diferente daquilo que tem sido nos últimos quatro anos. Quando entrei para a Talkdesk, entrei para liderar a região da EMEA [Europa, Médio Oriente, que era o internacional na altura. Esta nova posição surge com alguma naturalidade de manter supervisão da equipa em Portugal e fazer no resto das regiões aquilo que estamos a fazer na Europa, que era liderar a ida para o mercado e a expansão internacional. Na verdade, é um bocadinho mais trabalho, mas é uma continuação do que já estava a fazer. Claro que é muito interessante poder olhar para as regiões que até conheço razoavelmente bem, como Singapura, Austrália, América Latina. Todas essas áreas estão com as mesmas tendências, a mesma necessidade de apoiar bem os seus clientes, com crescimentos muito rápidos nestas áreas digitais.

É muito interessante olhar para isso e perceber como vamos replicar o modelo, ainda mais rápido do que o que fizemos na Europa, e garantir que levamos a Taldesk para todos os sítios em que há clientes que precisam de nós. Estarmos lá perto deles. Hoje, a Europa representa já cerca de 25% da nossa capacidade instalada, dos nossos clientes em termos globais. EUA é sempre o maior mercado e vale cerca de 70%, 25% Europa e 5% está um bocadinho espalhado pelo resto do mundo. O que queremos é ser relevantes em todas as outras regiões em que faz sentido estarmos e é esse o plano em que estamos ativamente a trabalhar.

Quais têm sido os maiores desafios na área do recrutamento?
Também mudou, agora é tudo remoto. Muitas das pessoas que entraram este ano não tiveram sequer uma entrevista física, foi uma entrevista remota, onboarding remoto, trabalho com as equipas remoto… Se assim não fosse seria o contrário do que defendemos, que é proteger a segurança e a saúde dos nossos colaboradores. Há aí uma questão de cultura: como conseguimos manter a cultura da empresa sem que haja a proximidade que tanto gostamos, enquanto portugueses e latinos, de ir um bocadinho além do contacto de trabalho. Estamos a aprender todos a fazer isso. Estamos a criar momentos para fazer isso.

Mas isso também deve ter sido um desafio: manter a cultura da Talkdesk com toda a gente em trabalho remoto, numa pandemia. Como deram a volta a isso? Foi uma preocupação?
Claro que foi. E quando juntamos a isso a necessidade de continuar a crescer e a de sermos cautelosos das decisões que tomamos, porque havia uma grande incerteza. Não lhe vou dizer que foi um ano fácil nesse sentido. Agora, em termos tecnológicos, a equipa estava preparada. Estávamos todos equipados para trabalhar remoto, não é um problema. Não é uma questão da produtividade das pessoas, isso não existe. As pessoas trabalham em qualquer lugar. Tivemos foi de adaptar duas coisas: a dinâmica do trabalho, as cerimónias, os momentos, um bocadinho mais de comunicação e, se calhar, reuniões mais curtas, que as pessoas cansam-se de estar duas horas num Zoom. Aí, sim, perde a produtividade. E tentar criar mais momentos de comunicação, para que as equipas percebam. Foi um bocadinho tentar, testar e ajustar.

Há aqui uma fase em que estamos todos a aprender como é que isto se faz. Porque mesmo as empresas que nasceram remoto e só a fazer trabalho remoto, as pessoas que foram contratadas já sabiam que iam para remoto. Não é o caso da Talkdesk, as pessoas que estavam connosco — os 600 colaboradores vieram para a Talkdesk também pela questão da proximidade com os colegas, da cultura que se criou. Estamos a aprender. Se lhe disser que foi tudo fantástico, não é verdade. Há desafios, há pessoas que se adaptam mais rápido do que outras, há pessoas que têm melhores condições em casa do que outras, há pessoas que têm questões familiares que têm de ser ajustadas e nós temos de ser sensíveis a isso. E fomos.

"Queremos e vamos continuar a investir no crescimento das nossas equipas para produto (R&D), é uma prioridade. E a outra prioridade é a expansão internacional. São essas as duas que queremos fazer"

A Talkdesk foi nomeada Líder no Quadrante Mágico da Gartner, na categoria de Contact Center as a Service. na Europa e América do Norte. O que é que isto significa e em que é que se traduz?
A Gartner é provavelmente o melhor, maior e mais reconhecido sítio independente, onde as grandes empresas vão perceber quem são os líderes em cada um dos setores. A nível mundial, quando as grandes empresas querem comprar uma solução de CRM [de gestão da relação com o cliente], de workforce management [gestão de força de trabalho] ou de contact center [centros de contacto], tipicamente o que fazem é: vão à Gartner, há um quadrante mágico para os setores relevantes e depois vão perceber quem é que está nesse quadrante mágico. O quadrante mágico mede num dos eixos a visão e a capacidade de uma inovar e no outro mede a capacidade de entrega. Quanto mais para cima e para a direita, melhor.

A Talkdesk foi a empresa mais jovem de sempre a ser considerada no quadrante mágico, há dois anos. Na primeira vez, entrámos como visionários, ou seja, [por termos ] uma grande visão. Tínhamos seis, sete anos, éramos claramente os novos entrantes neste espaço. Entretanto, no ano passado, a Gartner já nos colocou como líderes do quadrante mágico nos EUA e como visionários no da Europa, porque começámos um bocadinho mais tarde. Este ano fizeram uma grande alteração — juntaram-se e fizeram um só quadrante mágico. É global. Não há outro. Portanto, quando qualquer empresa no mundo quiser saber quem é o líder no espaço de contact center, é aqui que vão. E para nós é fantástico estar com esta posição. Há apenas três empresas que estão no quadrante mágico dos líderes (que têm a visão e capacidade de entregar) e nós acreditamos que é uma questão de tempo até que a Gartner perceba que os nossos clientes são cada vez maiores e mais globais e continuaremos a subir ainda mais nesse quadrante mágico. Para nós, significa uma prova independente fabulosa dos analistas.

Para 2021, contratar mais, chegar a mais países. E quais são os outros objetivos?
É isso. Queremos e vamos continuar a investir no crescimento das nossas equipas para produto (R&D), é uma prioridade. E a outra prioridade é a expansão internacional. São essas as duas que queremos fazer. Na primeira cabem muitas coisas, que é trazer mais pessoas, garantir que as que cá estão continuem motivadas, crescem cá dentro, são promovidas, têm tudo o que precisam para se manterem cá. E aos que vêm, que se integrem rapidamente e que nos ajudem a crescer. O segundo ponto é tratar bem os nossos clientes e estar perto dos novos clientes. Apesar de estarmos remotos, a verdade é que se estivermos remotos na região de novos clientes eles não vão achar muita piada. Se agora quisermos clientes na Austrália, por exemplo, temos de estar lá. Temos de ter pessoas que conhecem o mercado, que estão lá no fuso horário, que conhecem a região. Não vale a pena assumirmos que isto agora é tudo remoto e fazemos a partir de Portugal. Não funciona. Temos de estar próximos de cada região.

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