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epa09164664 A woman receives the second dose of the Sinovac COVID-19 vaccine at a school in Bangkok, Thailand, 28 April 2021. A group of workers considered to be high risk, linked to a cluster around entertainment venues received the second dose of the Sinovac COVID-19 as authorities continue their efforts to contain the third wave of COVID-19 infections.  EPA/DIEGO AZUBEL
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Para quem esteve infetado, uma vacina é suficiente para reforçar a imunidade

DIEGO AZUBEL/EPA

Para quem esteve infetado, uma vacina é suficiente para reforçar a imunidade

DIEGO AZUBEL/EPA

Teremos imunidade duradoura ou precisamos de reforçar as vacinas? O que se sabe até ao momento

Quando a quantidade de anticorpos contra o coronavírus diminui no sangue isso não quer dizer que se perdeu a proteção: há células que continuam a produzi-los e outras células prontas a atacar o vírus.

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O coronavírus SARS-CoV-2 parece ser um vírus típico no que diz respeito à resposta imunitária que desencadeia no organismo. Acredite ou não, isso é bom. Depois da infeção, os doentes produzem anticorpos, atacam o vírus com quantas ferramentas estiverem disponíveis e ainda guardam informação sobre o invasor e sobre qual a melhor forma de o derrotar. O facto desses anticorpos desaparecerem ao fim de algum tempo foi apresentado com preocupação, mas a descoberta de repositórios de informação de longa duração traz uma nova esperança. E não podemos esquecer que também temos células exterminadoras.

Quando o vírus (ou apenas partes do vírus, como acontece nas vacinas) despertam o sistema imunitário, é ativado um exército de ‘soldados’ de diferentes especialidades com o objetivo de combater o invasor e proteger o organismo. Uma vez derrotado o agente estranho, a quantidade de ‘soldados’ na frente de batalha diminui, mas alguns continuam a patrulhar o organismo e outros ficam de reserva — ou sejam, não deixam totalmente de trabalhar, guardam energias para quando tiverem de ser chamados em força. Estes últimos são os tais plasmócitos de longa duração, que ficam latentes na medula óssea.

Estes plasmócitos de longa duração são produtores importantes de anticorpos, não só em pequenas quantidades ao longo do tempo, mas em grandes quantidades no caso de uma nova infeção com o mesmo vírus. A presença de anticorpos, ainda que em pequenas quantidades, ao fim de 11 meses em pessoas que tiveram doença ligeira após o contágio pelo novo coronavírus e a deteção destes plasmócitos na medula óssea destes doentes são uma novidade que aumenta o otimismo dos especialistas. A equipa da Faculdade de Medicina da Universidade de Washington (Estados Unidos) acredita que a infeção com SARS-CoV-2 induz uma resposta imunitária robusta de longa duração, baseada em anticorpos, contra um antigénio específico (nomeadamente a proteína spike usada nas vacinas). Mas falta saber o que isto nos diz exatamente sobre a imunidade contra o vírus a longo prazo.

“Um plasmócito é a nossa história de vida em termos dos patogénios a que estivémos expostos.”
Ali Ellebedy, imunologista na Universidade de Washington

Como o sistema imunitário usa ‘soldados’ de diferentes especialidades e variadas técnicas de combate, abre a possibilidade de se apanharem variantes do coronavírus recorrendo às células T, sobretudo quando o vírus escapa à resposta imunitária humoral (baseada nos anticorpos e nas células que os produzem). Foi isso que verificou uma equipa holandesa de investigadores: “Algumas variantes podem escapar parcialmente à imunidade humoral induzida pela infeção por SARS-CoV-2 ou pela vacinação com BNT162b2 [vacina da Pfizer/BioNTech], mas a ativação de células T CD4+ específicas para a proteína spike não é afetada pelas mutações nas variantes B.1.1.7 [Alfa/Reino Unido] e B.1.351 [Beta/África do Sul]”, escreveram os autores num artigo publicado na Science Immunology.

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Como reage o sistema imunitário na presença do coronavírus, a potencial necessidade de reforço com uma terceira dose ou mais e a existência ou não de imunidade contra variantes, são algumas das perguntas que ocupam a cabeça dos cientistas, das autoridades de saúde e das pessoas que procuram a melhor forma de se protegerem da doença. Ainda não existem certezas, mas a informação acumulada ao longo do tempo permite dar respostas cada vez mais ajustadas. O Observador compilou alguns dos pontos essenciais sobre a imunidade contra o SARS-CoV-2, com base no conhecimento disponível neste momento.

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O que fez os investigadores pensarem que a resposta era duradoura?

A equipa liderada por Ali Ellebedy, imunologista na Universidade de Washington, recolheu amostras de sangue de 77 pessoas que tinham estado infetadas com SARS-CoV-2 (ao fim de um mês após o início dos sintomas e depois de três em três meses, mais ou menos) e comparou-as com as amostras de sangue de 11 pessoas que não tinham estado infetadas. Como esperado, os primeiros tinham anticorpos contra o coronavírus, nomeadamente contra a proteína spike, e os segundos não. Mais interessante foi que os investigadores verificaram que a quantidade de anticorpos diminuiu rapidamente depois do primeiro e até ao quarto mês, mas mais lentamente depois disso.

“O declínio precoce relativamente rápido [de anticorpos contra a proteína spike] seguido por um decaimento mais lento é consistente com uma transição da produção de anticorpos por plasmablastos [que darão origem a plasmócitos] de curta duração, para uma população menor, mas mais persistente, de plasmócitos de longa duração gerados posteriormente na resposta imune”, escreveu a equipa no artigo publicado na revista científica Nature.

Para o demonstrar, os investigadores procuraram a presença de plasmócitos contra a proteína spike na medula óssea de 19 pessoas passados sete meses da infeção e em 11 voluntários que não tinham estado doentes — onde, naturalmente, não encontraram os ditos plasmócitos. Como nenhuma das pessoas convalescentes tinha células produtoras de anticorpos no sangue naquela altura, os investigadores concluíram que estariam a ser produzidas pelos plasmócitos na medula óssea. Quatro meses depois, a análise à medula foi repetida em cinco convalescentes e os níveis de plasmócitos específicos do SARS-CoV-2 mantinha-se estável.

“De forma geral, os nossos dados fornecem fortes evidências de que a infecção com SARS-CoV-2 em humanos estabelece de forma robusta os dois braços da memória imunitária humoral: plasmócitos de longa duração e células B de memória.”
Jackson S. Turner et al. (2021) Nature

A equipa verificou ainda que, desde o primeiro mês e, pelo menos, até ao sétimo, conseguiam detetar no sangue dos convalescentes células B de memória capazes de se ligar à proteína spike. Estas células formam uma segunda linha de defesa e patrulham o organismo à procura de um invasor conhecido. Quando o encontram, multiplicam-se rapidamente e transformam-se em plasmoblastos capazes de produzir anticorpos. “De forma geral, os nossos dados fornecem fortes evidências de que a infeção com SARS-CoV-2 em humanos estabelece de forma robusta os dois braços da memória imunitária humoral: plasmócitos de longa duração e células B de memória”, concluem os autores, que acreditam ter assim “uma base para avaliar a durabilidade das respostas imunitárias humorais primárias induzidas após infeções virais em humanos”.

Com menos anticorpos ainda estou protegido do coronavírus?

Nem a presença de anticorpos é garantia de que a pessoa está protegida contra o vírus, nem a diminuição dos mesmos prova que a proteção caiu. Depois de uma infeção é normal que a quantidade de anticorpos no sangue aumente muito, mas uma vez cumprida a função o organismo não precisa de continuar a investir energia neste tipo de defesa — a informação está guardada e as células prontas a atuarem se for preciso. E foi isso mesmo que demonstrou a equipa de Rory D. de Vries e Corine H. GeurtsvanKessel, investigadores no Centro Médico da Universidade Erasmus (Holanda), no artigo publicado na Science Immunology.

As pessoas que tinham estado infetadas com SARS-CoV-2 tiveram um rápido aumento do número de anticorpos em circulação após receberem a primeira dose da vacina contra a Covid-19 (neste caso, a vacina da Pfizer/BioNTech). O que demonstra que a primeira dose funciona como uma vacina de reforço para quem já esteve infetado. A segunda dose também serviu de reforço a quem nunca tinha estado infetado, mas tinha recebido a primeira dose. Por outro lado, dar uma segunda dose a quem já tinha estado infetado não trouxe qualquer benefício.

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Em Portugal, as pessoas que recuperaram da doença há mais de seis meses começaram a ser vacinadas em maio. Este intervalo foi definido pela Direção-Geral da Saúde (DGS), “porque nesses seis meses, há evidência científica de que a imunidade é muito boa — será até melhor do que a da própria vacina”, disse, na altura, Graça Freitas. Manuel do Carmo Gomes, membro da Comissão Técnica de Vacinação da DGS, explicou ao Observador que este limite de tempo “está relacionado com a duração dos estudos” (a maior parte entre cinco e sete meses), mas que “é possível que estes seis meses possam vir a ser alargados por mais tempo”.

As orientações da DGS também preveem que as pessoas recuperadas só tomem uma dose da vacina, porque, segundo a diretora-geral, a infeção natural funciona como a primeira dose e a dose da vacina como o reforço. “Independentemente da vacina que for administrada, apenas terão uma primeira dose, porque já têm imunidade natural”, reforçou Graça Freitas. “A resposta à vacinação de pessoas recuperadas de infeção por SARS-CoV-2 tem sido avaliada em diversos estudos que concluem que a resposta a uma dose única de vacina é igual ou superior à obtida com duas doses de vacina“, disse fonte oficial da DGS ao Observador.

"Independentemente da vacina que for administrada, apenas terão uma primeira dose, porque já têm imunidade natural."
Graça Freitas, Direção-Geral da Saúde

Na experiência da equipa holandesa ficou demonstrado que a vacinação (de pessoas que estiveram ou não infetadas) desencadeia a produção de anticorpos neutralizantes, de células T (capazes de eliminar o vírus) e de células que são ativadas pelos anticorpos para atacarem os vírus. A infeção prévia e a vacinação permitiram desenvolver anticorpos neutralizantes que continuavam a ser úteis contra as variantes britânica (Alfa) e sul-africana (Beta), mas com menos poder para as travar. A vantagem da resposta imunitária celular, nomeadamente com as células T CD4+, é que a “ativação destas células foi robusta e parecia indiferente às mutações na proteína spike que as variantes B.1.1.7 e B.1.351 apresentavam”, escrevem os autores.

A recente invasão e domínio da variante indiana (Delta) no Reino Unido é uma boa demonstração da presença de uma resposta imunitária que vai além da produção de anticorpos, diz o imunologista Luís Graça ao Observador. O número de infeções aumentou muito, mas o número de internamento e mortes não acompanhou esse aumento, “o que sugere que há uma componente de imunidade celular que consegue, mesmo assim, evitar as consequências mais graves da infeção”, explica o investigador do Instituto de Medicina Molecular (Lisboa).

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Qual a vantagem das células T contra as novas variantes?

Os anticorpos são proteínas (ou imunoglobulinas) que fazem parte do sistema de defesa do organismo e respondem à invasão do organismo com agentes estranhos — seja um vírus completo, seja uma proteína do vírus (como acontece com as vacinas contra a Covid-19). Se pensarmos na proteína spike, por exemplo, como uma árvore pouco simétrica, o anticorpo que encaixa muito bem num ramo, não será tão bom a encaixar-se noutro. A vantagem é que haverá vários anticorpos de formas diferentes disponíveis, o que não quer dizer que todos sirvam para prevenir que o vírus infete as células. Confuso? Veja outro exemplo.

Imagine que durante uma corrida está a ser bombardeado com bolas pegajosas. É provável que essas bolas fiquem coladas no corpo, lhe dificultem os movimentos, mas não o impeçam de correr e de chegar à meta. Exceto quando as bolas pegajosas lhe colarem os pés um ao outro ou ao chão. Da mesma forma, há anticorpos que se ligam a várias partes da proteína spike do vírus — e até podem funcionar como um letreiro luminoso a dizer: “o vírus está aqui” —, mas não o impedem de cumprir o objetivo de entrar nas nossas células. Os anticorpos neutralizantes, por sua vez, são a bola pegajosa que se cola precisamente na zona da proteína que permite a invasão (e infeção) da célula humana. Como se um bocado de pastilha elástica tivesse ficado preso na chave de casa e não conseguisse abrir a fechadura.

As células T, por sua vez, “são cegas à estrutura tridimensional das proteínas”, diz Luís Graça. Voltemos a pensar na proteína spike com uma árvore (ou no vírus como uma floresta de proteínas diferentes). Algumas células do sistema imunitário funcionam como as trituradoras de madeira, engolindo indiscriminadamente os agentes estranhos e quebrando-os em pedaços mais pequenos. Estes pequenos pedaços ficam na superfície destas “células-trituradoras” e um batalhão de células T vai reconhecer cada um destes pedaços onde quer que os voltem a encontrar. “Como é fácil de imaginar, é muito mais difícil para o vírus conseguir escapar a este género de deteção”, diz o investigador.

Assim, os anticorpos neutralizantes são importantes para impedir a infeção (ou seja, impedir que o vírus entre nas células humanas) e as células T são importantes para limitar a infeção e evitar a doença grave — incluindo no caso das variantes, reforça Luís Graça. Isto porque, quando o vírus infeta as células humanas e as usa como fábrica das suas proteínas, vão sendo libertados pedaços de proteínas virais (os pedaços da madeira triturada) que vão ser detetadas pelas células T. “E o sistema imunitário evoluiu para conseguir matar as nossas células infetadas”, reforça o investigador.

Logo, mesmo que a proteína spike das variantes seja um pouco diferente, e que os ramos desta árvore tenham uma forma que os anticorpos não conseguem reconhecer totalmente, a “madeira triturada” será semelhante entre as variantes — ou seja, continuará a haver partes do vírus que se mantém iguais.

“É muito provável que tenha de haver um reforço das pessoas que têm uma imunidade mais débil, mas não se sabe quando.”
Luís Graça, investigador no Instituto de Medicina Molecular

Estamos protegidos para o resto da vida?

Ali Ellebedy, da Universidade de Washington, defende que o estudo que conduziu demonstra que “os plasmócitos de longa duração podem durar toda a vida” e, como tal, “podem produzir anticorpos para sempre”. Manel Juan, chefe do Departamento de Imunologia do Hospital Clínico de Barcelona, concorda, conforme disse ao jornal El País: “É razoável que esses tipo de células forneçam imunidade vitalícia”.

Rafi Ahmed, imunologista da Universidade Emory em Atlanta (Estados Unidos), cuja equipa co-descobriu os plasmócitos no final dos anos 1990, é mais cauteloso. Apesar de destacar a importância da observação feita, disse à Nature que ainda “estamos no início do jogo”, o que quer dizer que não sabemos como serão os níveis de anticorpos a longo prazo e se eles oferecem alguma proteção.

A equipa de Ali Ellebedy reconhece as limitações do estudo, a começar pelo facto de não saber que proporção dos plasmócitos de longa duração é capaz de produzir anticorpos neutralizantes (aqueles que impedem mesmo a infeção). Depois, a maioria das pessoas que recuperaram da infeção com SARS-CoV-2 incluídas no estudo tiveram doença Covid-19 ligeira. O que se sabe até agora é que as pessoas que recuperaram rapidamente dos sintomas tiveram uma resposta humoral (com anticorpos) robusta, mas que as pessoas que tiveram doença grave e prolongada tiveram uma resposta humoral desrregulada. Os investigadores não sabem ainda que impacto isso pode ter nos plasmócitos de longa duração.

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Vamos precisar de reforços da vacina?

Pode até ser difícil de acreditar, mas uma nova exposição ao vírus pode funcionar quase como o reforço que nos confere a vacina — pelo menos, em pessoas saudáveis que tenham desenvolvido uma boa resposta imunitária. Já vimos que os anticorpos vão diminuindo com o tempo e é possível que os plasmócitos de longa duração e as células B e T de memória também diminuam. Uma nova vacina ou uma exposição ocasional a um vírus que se torne endémico (que não desapareça completamente) permite que o sistema imunitário volte a ativar toda a resposta que preparou antes e da qual guarda a informação.

Claro que com as pessoas mais vulneráveis e com uma resposta imunitária debilitada, como as pessoas transplantadas, a fazer quimioterapia ou idosos, pode ser “prudente reforçar as defesas imunitárias mais cedo, nomeadamente, através de uma nova dose de vacinação, para que retomem níveis ótimos de proteção”, diz Luís Graça. Neste momento, ainda não sabemos qual a duração da proteção conferida pelas vacinas, nem tão pouco qual a duração dessa proteção nas pessoas mais vulneráveis. “É muito provável que tenha de haver um reforço das pessoas que têm uma imunidade mais débil, mas não se sabe quando”, reforça.

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