O olhar fatalista de Michael Milshtein é tão transparente como as suas palavras: “Posso imaginar cinco cenários diferentes para o futuro de Gaza, mas nenhum deles é bom”, concretiza este especialista em assuntos palestinianos do Centro Moshe Dayan da Universidade de Telavive.
Esses cinco cenários estão agora projectados no ecrã da sala onde falamos, mas tal como Michael Milshtein fez connosco não queremos começar pelo fim, necessitamos de regressar ao dia em que um tempo novo parece ter-se iniciado para israelitas e palestinianos: o dia 7 de outubro de 2023. O dia em que o Hamas apanhou de surpresa tudo e todos em Israel e lançou os seus ataques terroristas contra todas as comunidades que viviam perto da Faixa de Gaza.
O balanço é conhecido: nesse dia morreram perto de 1200 israelitas, a esmagadora maioria civis que viviam em pequenas aldeias (sobretudo kibutz) ou jovens que participavam num festival de música alternativa. Registou-se ainda a tomada de cerca de 250 reféns que foram levados para o outro lado da fronteira, onde ainda permanecem 101, incluindo bebés, incluindo idosos com mais de 80 anos.
As consequências diretas também são conhecidas: uma operação militar israelita destinada a destruir o Hamas e a libertar os reféns, operação que, um ano depois, ainda prossegue e da qual já resultaram dezenas de milhar de vítimas (talvez mais de 40 mil).
“O Caminho para a Paz”, quebrado
É por isso que alguns lugares não são hoje e provavelmente nunca voltarão a ser como era desse dia. Netiv HaAsara é um desses locais. Situada a apenas uma centena de metros da linha que nos mapas aparece definida como “linha do armistício de 1950”, no fundo a linha de fronteira que resultou da guerra de independência de Israel, desta aldeia avistam-se as casas das povoações mais a norte de Gaza e em tempos chegou a ser possível ver campos de treino do Hamas.
Mesmo assim, nesta povoação – uma comunidade agrícola conhecida como moshav, com um modelo de vida semelhante ao coletivismo dos kibutz – uma artista local tinha criado uma instalação que atraía sobretudo gente que sonhava com a paz entre israelitas e palestinianos.
Chamava-se – chama-se – “O Caminho para a Paz” e era uma enorme instalação a que cada um podia acrescentar um pequeno azulejo ou emblema colorido com uma frase alusiva à paz. Hoje já ali não chegam visitantes, apenas militares e jornalistas como nós. E hoje, junto ao enorme muro de cimento que protegia a aldeia dos tiros disparados do outro lado da fronteira, há agora um jardim de oliveiras – oliveiras velhas, retorcidas, com décadas ou mesmo séculos de vida
Não estavam ali antes, mas estão ali agora porque junto a cada uma delas uma pequena placa com um nome e duas datas – a do nascimento e a da morte – recordam as mais de duas dezenas de habitantes de Netiv HaAsara que morreram nesse 7 de outubro. E há também laços e bandeiras amarelas, como há por todo o lado em Israel, para que ninguém se esqueça que ainda há reféns em Gaza. E há ainda o ruído de explosões ao fundo, pois Gaza é mesmo ali e a guerra prossegue.
Há quem olhe para aqueles muros e para aquelas torres de vigia – estão sempre a dizer-nos para não nos aproximarmos mais –, como a consequência inevitável de um erro cometido há 20 anos, a decisão de um governo de Ariel Sharon de levar Israel a abandonar por completo a sua presença na Faixa de Gaza, entregando-a por completo à gestão da Autoridade Palestiniana.
“Nunca devia ter acontecido”, diz-nos Amir Aviv, brigadeiro general na reserva, fundador de um think tank dedicado à defesa e segurança e claramente um “falcão” que fala connosco não longe desse mural dedicado à paz. “Eu na altura era ajudante de campo do chefe de estado maior e estive nalgumas reuniões em que isso foi decidido. Nós éramos contra. O Shin Beth (o serviço de informações interno) também era contra. Mas Sharon, que admiro como génio militar, entendeu que tínhamos mesmo de sair de Gaza. Ele também era um político e tinha outras considerações”.
20 anos de autonomia total – e de guerra permanente
E era de facto um político. Herói em várias guerras, comandante audacioso que se destacara principalmente na guerra do Yom Kippur, quando a sua coluna de tanques foi mandada parar quando já ameaçava o Cairo, depois várias vezes primeiro-ministro, fizera uma viagem política da direita para o centro (começou por pertencer ao Likud, o partido que ainda hoje é o de Netanyahu, fundaria depois um partido centrista com um histórico dos trabalhistas, Shimon Peres, e em 2004 surpreendeu o mundo ao decidir uma retirada unilateral da Faixa de Gaza.
Na verdade a retirada começara mais cedo, em 1994, depois dos acordos de paz de Oslo, altura a partir da qual o governo das cidades foi entregue aos palestinianos. O próprio Yasser Arafat começou por se instalar em Gaza quando regressou à Palestina, mas desde o início que a Autoridade Palestiniana teve dificuldades em controlar um território onde a presença do Hamas já era muito forte. Tão forte que pouco depois da retirada total de Israel aquele movimento fundamentalista acabaria por assumir o controlo total, num golpe de Estado durante o qual foram sumariamente executados muitos dos apoiantes laicos da Fatah, o partido de Arafat.
A família que aqui viveu conseguiu sobreviver, mesmo depois de incendiarem a casa
Quando soaram os alarmes e, depois, quando se começaram a ouvir tiros de armas automáticas, a família que vivia nesta casa fugiu para o abrigo e trancou-se lá dentro com os filhos, um deles bebé. Não tardou que chegassem os terroristas e tentassem arrombar a porta do abrigo, houve ameaças, ouviram-se mesmo vozes de mulheres, foram disparados tiros contra a porta blindada mas só um passou e acabou por matar o cão da família. Deitaram então fogo à casa (a imagem é de como ficou a casa de banho, enegrecida e congelada no tempo) e quando a família sentiu que podia morrer sufocada conseguiu fugiu pela janela para outro abrigo. Muitos não tiveram o mesmo destino e morreram nesses quartos onde julgavam estar em segurança.
(Relato de Irit Lahav, uma das sobreviventes do kibutz de Nir Oz, sobre o destino dos seus vizinhos)
A partir dessa altura iniciou-se uma espécie de guerra de baixa intensidade em que o Hamas (e também a Jihad Islâmica, outro grupo fundamentalista com alguma implantação em Gaza) foram escalando a pouco e pouco os bombardeamentos que faziam e dirigiam contra as populações israelitas situadas mais próximas do território.
Apesar de existir um forte controlo nas fronteiras, incluindo na fronteira com o Egipto, a verdade é que depois dos rockets quase artesanais usados nos primeiros ataques, foram aparecendo mísseis cada vez mais sofisticados. Enquanto isso alargava-se a rede de túneis usados quer para permitir a entrada de armamento (via Egipto), quer para proteger as estruturas militares do Hamas, quer ainda para, ocasionalmente, conseguir cruzar a fronteira para o lado de Israel e raptar soldados ou civis que eram depois usados como moeda de troca.
Em mais do que uma ocasião Israel respondeu com incursões armadas (a maior em 2014) ou com bombardeamentos dirigidos, mas a verdade é que, a pouco e pouco, o país se foi habituando a viver com estas constantes agressões. Por um lado, a tecnologia permitiu-lhe desenvolveu o “Iron Drome”, o escudo que protege sobretudo contra o tipo de ataques realizados pelo Hamas.
Por outro lado, nos kibutz e moshav localizados mais próximos da fronteira, as populações acostumaram-se aos alarmes e às corridas para os abrigos ou para os quartos de segurança que existiam em todas as casas. Havia mesmo famílias que transformavam esses abrigos caseiros no quarto dos filhos, pois assim os pais só tinham de correr para lá quando soavam as sirenes e se sabia que se havia menos de meio minuto para encontrar proteção.
A vida tranquila, o espírito comunitário e a eterna esperança que um dia se viveria em paz com os palestinianos levavam a que mesmo nestas condições fossem muitos os que optavam por viver nestes locais onde, de alguma forma, permanecia viva a utopia quase comunista de muitos dos primeiros judeus que migraram para Israel.
Ninguém soube pensar como o Hamas pensa
Estes habitantes – como Tsameret Zamir, a responsável pelo projeto do mural da Paz, ou ainda como Irit Lahav, umas das sobreviventes do kibutz Nir Oz que antes do 7 de outubro ia buscar doentes a Gaza para serem tratados em Israel – nunca quiseram sair destas zonas de perigo por lhes estarem ligadas e também por acreditarem que um dia a normalidade regressaria.
Espantosamente foi por também pensar o mesmo, ou algo parecido, que o governo, o exército, os serviços de informação falharam de forma tão inesperada – e tão catastrófica – a 7 de outubro, permitindo o regresso do pesadelo dos progroms e do Holocausto.
E falharam, explica-nos Michael Milshtein, “porque não entenderam a forma de pensar da liderança do Hamas, porque não perceberam que eles pensam diferente de nós e têm referências que não são as nossas. Falhámos no 7 de outubro porque não fomos capazes de pensar como os outros, como eles”.
Ou seja, o governo de Israel cometeu um erro fatal quando interpretou a aparente tranquilidade de Yahya Sinwar, o líder do Hamas em Gaza e o homem que planeou os ataques de há um ano, como sinal de que algum progresso económico, como o que estava a acontecer no território – proporcionado pela “Hudna”, ou seja, pela longa trégua que parecia vigorar –, poderia tê-lo encaminhado para o pragmatismo típico dos governantes democráticos, mais preocupados com a economia do que com fazer a guerra.
No Festival Nova, um festival de música, foram mortas 340 pessoas, quase todas muito jovens
“O Estado de Israel, estabelecido para garantir a segurança dos seus cidadãos – de forma a que os pogroms e o Holocausto que marcaram a história dos judeus nunca mais voltassem a acontecer – falhou no seu dever básico de proteger os nossos filhos que queriam simplesmente divertir-se de forma descomprometida numa festa permitida pelas autoridades. O terreno onde agora estamos, os terrenos em redor, estão empapados com o sangue de jovens que foram assassinados com incompreensível crueldade neste lugar de massacre. Por favor honrem este lugar e aqueles que foram assassinados, mantenham-no limpo e tranquilo, e mostrem respeito”.
(Cartaz afixado por familiares das vítimas no local do massacre)
Mas não. O Hamas, recorda este especialista, tem as suas raízes na Irmandade Muçulmana, um movimento fundado no Egipto há quase 100 anos e que prega o regresso ao que diz serem os fundamentos do Islão, rejeitando qualquer influência Ocidental. É por isso que para o Hamas a reconquista completa da Palestina, “do rio até ao mar”, não é meramente uma bandeira política, é antes vista como uma vontade de Deus (de Alá, se preferirem), portanto uma vontade inquestionável e imutável.
“Há uma grande diferença entre a Autoridade Palestiniana, a OLP ou a Fatah e organizações como o Hamas”, prossegue. “Movimentos que se organizam em torno de um princípio religioso não podem aceitar o reconhecimento mútuo, o viver lado a lado, organizações como o Hamas não procuram um acordo de paz, lutam e lutarão os anos, as décadas, os séculos que forem necessários pelo que vêm como sendo a vitória final, o desígnio de deus”.
“Não lhes basta matarem, têm de se cobrir com o sangue dos judeus”
É muito com base nesta análise, que parte daquilo que são os fundamentos religiosos e os objetivos políticos confessos do Hamas, que para Michael Milshtein é mais fácil entender alguns dos comportamentos mais chocantes do 7 de outubro, nomeadamente algumas das mais brutais agressões de que foram vítimas as mulheres.
Ayelet Ben-Or, dirigente de uma organização de defesa dos direitos das mulheres, tem procurado recolher testemunhos e provas dessa violência, muitas de carácter sexual, e fala-nos com enorme paixão, mas também enorme dureza: “Muitos não compreendem porque é que nas imagens do 7 de outubro vemos muitas vezes que os terroristas têm uma arma automática nas mãos, mas quase sempre trazem também uma grande faca presa no cinto”.
“Não foi por acaso, houve inúmeras situações em que os corpos foram mutilados depois dos assassinatos, houve casos em que para além de violações, depois cortavam os seios, houve casos em que era o órgão sexual dos homens a ser cortado. Custa dizê-lo, mas para estes terroristas não basta matar judeus, têm de se cobrir com o sangue dos judeus”, diz.
Ouvíamos estas palavras e recordávamos uma imagem famosa do linchamento de dois soldados israelitas em Ramallah, no ano 2000, quando um dos assassinos, Aziz Salha, apareceu a uma janela com as mãos cobertas de sangue e a multidão aplaudiu, em apoteose [Aziz Salha, que esteve preso em Israel mas depois foi libertado, terá morrido esta semana num combate em Gaza]. Algumas das imagens gravadas pelos próprios atacantes durante os ataques do 7 de outubro não deixam dúvidas sobre este tipo de comportamento.
Neste quadro, outros dos erros que Michael Milshtein considera ser muito comum é ter a ideia de que o Hamas é uma minoria de fanáticos como os do ISIS, que apenas governa Gaza pelo terror. “Não é verdade”, sublinha-nos.
“A estratégia do Hamas é dupla: por um lado a Jihad, a guerra santa que todos conhecemos, por outro lado a Da’wah, isto é, o proselitismo, as obras sociais que estão por todo o lado e que tendemos a esquecer. Uma grande parte da população de Gaza não receia o Hamas, antes se identifica com o Hamas. Mesmo os estudos de opinião realizados depois do 7 de outubro e depois de todas as desgraças da guerra não mostram uma erosão do apoio ao Hamas. O apoio ao Hamas em Gaza estava nos 42% em dezembro do ano passado, logo a seguir aos ataques, e em junho só tinha descido para os 38%, uma descida sem significado”.
Cinco cenários, todos maus
Quererá isto dizer que a estratégia de destruir o Hamas – um dos objetivos estabelecidos nesta guerra por Israel – é inalcançável?
Michael Milshtein é mais prudente na resposta, até porque a sua análise coincide, no essencial, com o balanço que ouvíramos de generais de diferentes sensibilidades políticas. Isto é, do ponto de vista militar o Hamas está quase destroçado. O balanço deste especialista é que já terão sido mortos 18 mil combatentes do Hamas, o que representa mais de metade da força de que dispunha antes desta guerra.
Em simultâneo, um quarto dos membros das milícias do Hamas terá desertado, o que significa que o grupo estará reduzido, em número de combatentes, a um quinto do que era. Do seu arsenal de mísseis e rockets, cerca de 80% já terão sido disparados ou então foram inutilizados. 25 dos seus comandantes mais importantes foram eliminados. E as zonas onde o grupo continua entrincheirado já estão bastante circunscritas.
Mesmo assim não desistem e continuam a combater – e este ponto é fundamental para quem quer que deseje desenhar um plano para o futuro de Gaza. E aqui regressamos aos cenários anunciados por Michael Milshtein, todos maus.
Vamos então a eles, um por um:
- Um primeiro cenário seria o regresso à situação que vigorou entre o final da guerra dos Seis Dias (1997) e os Acordos de Oslo (1992), ou seja a ocupação e administração direta por Israel de todo o território da Faixa de Gaza. É um cenário inaceitável mesmo pelos aliados de Israel e que colocaria problemas virtualmente insolúveis a uma qualquer administração civil, até por a população de Gaza ter passado de 300 mil habitantes, em 1970, para 1,2 milhões, em 2002, e estar nos 2,4 milhões no início desta guerra (Gaza tem a 7º maior taxa de crescimento populacional do mundo). Para além disso, dois terços dessa população considera-se refugiada e mais de metade vive abaixo da linha de pobreza.
- Um segundo cenário, porventura ainda mais impensável, seria uma retirada total das forças, sem solução de continuidade, permitindo que se criasse uma situação de caos, um pouco à imagem de Mogadício.
- Um terceiro cenário seria o da devolução da administração à Autoridade Palestiniana (AP), a mesma entidade que o Hamas expulsou violentamente em 2008. Infelizmente a AP não dispõe de meios para retomar o controlo de Gaza e ainda menos de autoridade moral (outra das grandes diferenças entre o Hamas e a AP é que esta última é altamente corrupta, enquanto os dirigentes do Hamas, pelo menos os que permanecem no interior, têm fama de viver como o povo e sofrer como o povo).
- Um quarto cenário é um dos mais referidos e implicaria a administração direta do território por uma coligação de forças multinacionais, eventualmente com uma forte componente de países árabes moderados. Não há boas recordações de soluções deste tipo (a transição de Timor-Leste será uma das raras exceções) e aquilo que a UNIFIL (não) está a fazer no Líbano indica que uma tal solução nunca teria viabilidade – isto se houvesse vontade de a prosseguir, vontade que também não existe.
- Um quinto cenário é tentar formar uma administração civil palestiniana independente, imune à influência do Hamas e mais competente do que a Autoridade Palestiniana, uma autoridade civil que pudesse ter o apoio do Egipto e, pelo menos, a anuência de Israel. Talvez fosse a melhor opção, mas parece a mais longínqua de todas, até porque é difícil imaginar onde se encontraria essa administração independente.
“Talvez o último dos cenários seja o menos mau”, prossegue Michael Milshtein, “mas que ninguém tenha ilusões sobre algumas teorias que por aí andam – pelo menos circulam aqui em Israel –, de que seria possível devolver poder aos clãs palestinianos, pois apesar de tudo esses clãs ainda não desapareceram totalmente. É uma ilusão. Nos últimos meses houve tentativas de falar com chefes desses clãs, gente de Gaza, e o resultado foi que o Hamas os executou logo de seguida, mal percebeu que havia contactos”.
O 7 de outubro matou a solução dos “dois estados lado a lado e em paz”?
É neste quadro que encontramos cada vez menos defensores da solução dos dois estados – “vivendo lado a lado e em paz” – não apenas na sociedade israelita, como nas suas elites. “Para voltar a acontecer o que aconteceu em Gaza, de onde saímos há 20 anos e o resultado foi o que foi?”, ouvimos repetir a gente com diferentes alinhamentos políticos.
Mais: os únicos consensos que encontrámos, de certa forma contraditórios entre si, foram que:
- por um lado, Israel devia aceitar um cessar-fogo sem mais condições do que a libertação imediata de todos os reféns (ou a devolução dos seus corpos), mesmo que isso implicasse libertar todos os presos palestinianos, a maioria deles terroristas assumidos;
- e que por, outro lado, deveria manter uma forte presença e controlo militar no chamado “corredor de Filadélfia”, uma tira de terreno no sul de Gaza de apenas 100 metros de largura, mas a separar o território da fronteira do Egipto e assim controlar melhor o contrabando de armas. E porventura de ainda uma outra faixa a meio do território, o “corredor de Netzarim”, com a cidade Gaza a norte e as cidades de Khan Yunis e Rafah a sul, por forma a que o exército conseguisse evitar a reconstrução do poder do Hamas.
Ou seja, na verdade não há consenso nenhum e apenas duas certezas: o 7 de outubro mudou a sociedade israelita e ninguém conhece os planos do governo de Benjamin Netanyahu que, mesmo com combates em Gaza ainda a decorrer, abriu uma nova frente no Líbano ou, para ser mais exato, começou a tentar destruir no Líbano as infraestruturas do Hezbollah de onde há um ano partiam ataques contra o norte de Israel.
E mesmo junto a Gaza os sentimentos não coincidem. Em Netiv HaAsara, o moshav de onde se avista a fronteira, no terreiro onde plantaram as oliveiras, à vista do mural pela paz, está hoje um mastro com uma bandeira de Israel que dizem ser o mais alto do país. Já no kibutz de Nir Oz, mais a sul, onde morreram um terço dos habitantes, se Irit Lahav perdeu muitas das suas ilusões pacifistas, o sentimento de abandono e de atraso no socorro que sentiu no 7 de outubro leva-a a confessar que até lhe custa olhar para a bandeira de Israel.
Mas isto é do lado de cá da fronteira – do lado de lá talvez só depois da eliminação de Yahya Sinwar (que estará escondido num túnel, porventura usando reféns como um escudo para evitar um ataque direto como o que eliminou o líder do Hezbollah), como talvez só depois da neutralização das últimas bolsas de resistência do Hamas, se consiga realmente falar do futuro.
Para quem está longe é fácil fazê-lo, imaginar o futuro, quanto mais não seja por retórica, mas para quem está no terreno não parecem existir boas opções. Dos dois lados.
O Observador integrou um grupo de jornalistas europeus que esteve em Israel a convite da EIPA, Associação de Imprensa Europa-Israel