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Fábio Lopes é o presidente do Villa Athletic Club, fundado em junho deste ano
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Fábio Lopes é o presidente do Villa Athletic Club, fundado em junho deste ano

Fábio Lopes é o presidente do Villa Athletic Club, fundado em junho deste ano

Um mega complexo desportivo no Alentejo, patrocínios de peso e a promoção relâmpago à I liga. O "sonho impossível" do Villa Athletic

Os donos do clube prometeram muito. Por exemplo, construir um mega empreendimento desportivo no Alentejo. Mas a realidade do Villa Athletic foi bem diferente e impôs-se em poucas semanas.

O projeto para o Villa Athletic Club era promissor. Os donos do clube queriam erguer um mega empreendimento na região do Alentejo que contemplava um estádio “com todos os requisitos exigidos pela FIFA”, restaurante, ginásio e até um hotel, uma equipa de futebol a saltar do campeonato distrital para a primeira liga do campeonato nacional em sete anos, com várias marcas de peso a patrocinar um “sonho impossível”.

Foi assim que Fábio Lopes se referiu ao seu projeto quando o clube foi fundado, a 14 de junho deste ano. As palavras foram premonitórias. Jogadores e dirigentes acabaram arrastados para uma realidade de salários em atrasos, contas por pagar e um presidente — Fábio Lopes, radialista, YouTuber, mais conhecido por Conguito — que se fechou num silêncio quase absoluto ainda antes de as dificuldades no seu clube terem sido relevadas, no início desta semana.

“Ainda parece tudo um sonho, há pouco mais de um ano, eu e o Luís estávamos a ter uma conversa de café a falar de como seria, se tivéssemos o nosso clube. E a verdade é que depois dessa conversa passou um ano, juntaram-se amigos, parceiros e aconteceu”, escreveu Fábio Lopes na sua conta de Instagram, no dia 5 de agosto, praticamente um mês e meio depois da constituição legal do Villa. Das palavras do jovem de 27 anos, que se estreou na televisão como apresentador do programa ‘Curto Circuito’, transparecia a ideia de que tudo tinha acontecido em pouco tempo, que um projeto para criar um clube de futebol podia, afinal, não ser assim tão complicado. Mas era — e os problemas, da falta de dinheiro a uma revolta no balneário da equipa principal, não tardariam muito a aparecer.

No dia 5 de agosto, Fábio Lopes contava nas redes sociais como é que teria começado o projeto do Villa Athletic Club

Apesar dos seus 27 anos, esta não é a primeira vez que um projeto de Fábio Lopes termina sem justificação. Já em 2019, decidiu criar a jamm, just another music magazine. A última de quatro edições foi lançada no mês em que foi decretado confinamento obrigatório, em março de 2020, e já nessa altura existiam críticas sobre o facto de o trabalho dos jornalistas e colaboradores não ser pago, ficando a revista, mesmo assim, com os direitos sobre os textos.

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Dois anos depois, tinha chegado o momento de avançar com um novo projeto. E Ponte de Sor, cidade do distrito de Portalegre, foi o local escolhido pelos donos do Villa para sediar o clube. A razão é simples, mas revela bem a ambição que estava na origem do projeto: com poucos clubes a disputar aquela divisão, e a um passo dos principais escalões competitivos, a subida aos grandes palcos do futebol nacional estaria assegurada e não tardaria mais de sete anos a concretizar-se, acreditavam.

Mas o processo de criação do Villa não foi simples e terá demorado bem mais do que um ano, ao contrário do que Fábio Lopes parecia indicar na publicação que partilhou no início de agosto. Ainda antes do início da pandemia – em 2019, portanto – Fábio apresentou à Câmara Municipal de Ponte de Sor a ideia de criar um projeto desportivo na região. Ele próprio fez a aproximação à autarquia e pediu uma reunião. Nessa altura, o projeto ainda não estava bem definido e, segundo recordou ao Observador fonte do município, “ninguém deu muita importância, porque não estava nada estruturado”. Só dois anos depois, em fevereiro de 2022, Fábio Lopes voltou a surgir no radar da autarquia alentejana. E foi então que apresentou o seu mega projeto para dinamizar o Alto Alentejo através do futebol.

A sede, as camadas jovens e os advogados

Estava tudo condensado num documento de 29 páginas que Fábio apresentou no início deste ano ao vice-presidente da Câmara Municipal de Ponte de Sor, e a que o Observador teve acesso. Ao contrário da impressão de um projeto mais amador, que tinha provocado em 2019, agora estava tudo estruturado ao pormenor. A começar na promessa de construção do Villa Park, “um empreendimento isolado”, com estádio com campo de relva natural, com capacidade para oito mil pessoas — os mesmos lugares que tem, por exemplo, o estádio do Estoril Praia – e com iluminação noturna. Estrutura de alto nível, como exige a FIFA.

Capa do projeto que Fábio Lopes apresentou à Câmara de Ponte de Sor, em fevereiro deste ano

No mesmo complexo, o Villa queria construir um hotel, um restaurante, um centro administrativo e “um conjunto específico e diversificado de equipamentos desportivos”. Tudo para “otimização do rendimento desportivo e formação de jogadores de futebol da região do Alentejo”. E mais: queriam ser um clube amigo do ambiente, com redução da emissão dos gases com efeito de estufa. “Para atingirmos este objetivo, devemos consumir apenas energia renovável e otimizar o seu consumo de energia, implementar boas práticas para potenciar a redução das nossas deslocações e utilizar veículos mais ‘verdes’“, lê-se no documento.

O projeto apresentado para o Villa Athletic Club prometia construir o Villa Park, “um empreendimento isolado”, com estádio com campo de relva natural, com capacidade para oito mil pessoas – os mesmos lugares que tem, por exemplo, o estádio do Estoril Praia – e com iluminação noturna. E prometia ainda um hotel, um restaurante e um centro administrativo. 

Fábio Lopes apresentou o seu projeto de “sonho”. Mas tinha mais trunfos para lançar para cima da mesa: da lista de jogadores que levava consigo constavam nomes como os de Edinho, que chegou a vestir a camisola da seleção portuguesa, André Carvalhas, jogador que fez a sua formação no Benfica, e Meyong como treinador. Juntando todas estas ambições, a Câmara Municipal de Ponte de Sor concordou em ceder o seu estádio municipal para que o Villa pudesse realizar os seus jogos em casa. O novo clube passaria, então, a partilhar o relvado com o Elétrico, o clube de Ponte de Sor.

Ter um local para jogar era um dos três requisitos impostos pela Associação de Futebol de Portalegre para inscrição da equipa no campeonato distrital. Além do campo de futebol, era necessário ter uma associação criada, com os respetivos órgãos sociais, e uma morada fiscal em Ponte de Sor.

  • André Carvalhas, 33 anos, fez formação no Benfica e chegou a ser chamado às camadas jovens da seleção. É jogador do Villa.
  • Vitoria Setubal v CF Os Belenenses - Primeira Liga
    Edinho, 40 anos, disputou seis partidas com a camisola da seleção nacional e marcou três golos. Integrava o plantel do Villa.
    Getty Images
  • Meyong, 42 anos, internacional camaronês, passou pelo Belenenses, pelo Braga e pelo Vitória FC. É o treinador do clube
    ANTONIO COTRIM/LUSA

O Villa conseguiu tudo isto, mas não por muito tempo. É que nenhum dos elementos deste clube é natural de Ponte de Sor e, por isso, a solução passou por arrendar um espaço na rua Alexandre Herculano, no centro da cidade, que permanece neste momento como estava antes do arrendamento – vazio. Como o Observador conseguiu apurar, nunca foi assinado um contrato de arrendamento. Foi apenas feito um acordo entre as duas partes e o clube pagaria as respetivas rendas até ser formalizado o contrato. As primeiras mensalidades foram pagas, mas o dinheiro deixou de chegar. Fábio Lopes, dizem, deixou de atender o telemóvel e não deu mais explicações.

Conguito apresentou novo clube em agosto. Dois meses depois, há denúncias de falta de pagamentos e despejos de futebolistas

Apesar de não existir contrato, foi possível utilizar a morada daquele espaço para constituir o clube como associação. No tal documento de apresentação do projeto, o Villa dizia estar a trabalhar com um escritório de advogados bem conhecido, que pertence ao antigo bastonário da Ordem dos Advogados, Rogério Alves. “O Departamento Jurídico do clube trabalhará em sintonia com a Sociedade de Advogados Rogério Alves & Associados”, lê-se. No entanto, contactado pelo Observador, o advogado Rogério Alves garantiu que o seu escritório apenas ajudou na parte legal da criação da associação. “Nós, através do advogado Marco Moreira, ajudámos na constituição da associação e não temos mais nenhuma ligação à associação”, explicou Rogério Alves.

Depois da constituição dos órgãos sociais, acrescentou o advogado Marco Moreira, “todos os contactos que existiram ocorriam num contexto informal, para saber se estava a correr bem. A nível legal, não foi preciso mais nada”. No mesmo documento, foram avançados também nomes como o da consultora Concept Fusion, responsável pelo projeto do centro de treinos e do estádio do Amora Futebol Clube. Mas a empresa garante ao Observador que “não está, nem esteve, a fazer nenhum trabalho” para o Villa, acrescentando que existiu apenas um contacto para que fossem apresentados os projetos.

Foi arrendada um loja em Ponte de Sor para o clube poder ter morada naquela cidade, já que nenhum elemento do clube pertencia a Ponte de Sor. No entanto, as rendas deixaram de ser pagas e nunca chegou a ser assinado contrato. O Villa indicava que estava a trabalhar com o escritório de advogados de Rogério Alves, mas o único contacto que existiu foi para constituir a associação. 

Os esclarecimentos de todos estes alegados ‘parceiros’ do Villa foram recolhidos pelo Observador ao longo da última semana. Mas, no primeira metade do ano, os donos do clube foram conseguindo cumprir os passos formais para transformar as 29 páginas do documento de apresentação num projeto real. Com todos os pré-requisitos preenchidos, a Associação de Futebol de Portalegre aceitou a inscrição do Villa na competição distrital — mas com desconfiança. Dentro da associação existia, aliás, a perceção de que o objetivo do Villa era encontrar uma associação como a de Portalegre, onde só existe uma divisão do campeonato distrital e há apenas sete equipas a competir. Com nomes fortes do futebol no plantel, e numa divisão em que alguns clubes optam por não subir, mesmo ganhando o campeonato — muitas vezes por razões financeiras —, seria assim mais fácil alcançar o campeonato de Portugal, a liga 3, a liga 2 e, finalmente, a primeira liga.

Prova de que a subida era o principal objetivo do clube foi a inscrição de camadas jovens na competição local – um requisito obrigatório para que as equipas possam passar a competir no campeonato nacional. No papel, tudo batia certo. O problema era passar do papel à prática. No início, o Villa inscreveu uma equipa de benjamins, uma equipa de juvenis e outra de juniores, mas acabou por cancelar a inscrição do escalão mais baixo. Neste momento, segundo informações da Associação de Futebol de Portalegre, estão inscritas as equipas de juvenis e de juniores, mas sem qualquer jogador efetivamente inscrito. O campeonato de juniores começa na próxima semana e a associação ainda não conseguiu entrar em contacto com Fábio Lopes. Se a inscrição não for cancelada e não existir ninguém a representar o Villa Athletic Club, o clube será alvo de uma multa.

Da Cidade Universitária para Samora Correia

Quando os jogadores começaram a treinar, o tal complexo desportivo que o Villa queria construir no Alentejo era a parte do “sonho” de Fábio Lopes ainda por realizar – na verdade, nunca passou disso mesmo. Reconhecendo esta lacuna logo à partida, e sabendo que os timings não coincidiam, no documento de apresentação foi dada uma explicação: “Enquanto não temos as nossas infraestruturas prontas, o Villa Park, utilizaremos os campos de jogos do Estádio Universitário de Lisboa, como espaço de treino, todos os dias.”

Foi essa a narrativa partilhada com os jogadores e com a restante equipa técnica, mas em nenhum momento o Villa Athletic Club pisou os relvados da Cidade Universitária. Os treinos acabaram por acontecer no Grupo Desportivo de Samora Correia, a cerca de 50 quilómetros do local indicado inicialmente.

Sérgio Conceição, Francisco Geraldes e Costinha oferecem ajuda aos jogadores do Villa Athletic

Uma pessoa que conhecia elementos do Samora Correia e que conhecia também Fábio Lopes fez a ligação entre as duas partes e foi nas instalações deste grupo desportivo — neste momento, a disputar a primeira distrital de Santarém — que os jogadores do Villa começaram a treinar e chegaram ainda a realizar um jogo particular.

No início, o projeto foi apresentado no mesmo modelo, sempre de crescimento, de mãos dadas com a ecologia e com a vontade de dinamizar o interior do país e, acima de tudo, com rostos conhecidos do público e empresas com peso no mercado. A ideia de que o Villa tinha uma equipa forte de marketing e comunicação deu ainda mais força para o Samora Correia avançar com um protocolo de cooperação. “Tudo parecia ter viabilidade”, explicou fonte deste clube ao Observador. No entanto, o acordo nunca chegou a ser assinado e as seis semanas – entre agosto e setembro – em que o espaço do Samora foi utilizado nunca foram pagas na totalidade. “Havia sempre alguma coisa que impedia a assinatura. O pagamento e a formalização eram sempre adiados. Por exemplo, uma das coisas que diziam é que os advogados estavam a ver a questão do IVA. Havia sempre um argumento”, acrescentou a mesma fonte.

Os jogadores e equipa técnica continuavam a utilizar os espaços do Samora Correia, mas o dinheiro não entrava nas contas deste clube, que diz ter sido obrigado a fazer “alguns ultimatos”. Foram então dadas duas opções ao Villa: ou pagava ou deixava de treinar ali. Acabaram por “liquidar uma pequena parte da utilização do complexo do Samora Correia”. “E não foi o Villa. Foi o Fábio Lopes. Foi o presidente, do bolso dele.”

O facto de ter sido paga uma parte da dívida deu ao clube mais algum tempo para continuar a treinar ali, mas certo é que os jogadores deixaram de utilizar aquelas instalações há três semanas e os contactos com o presidente do Villa, que trabalha neste momento na rádio Megahits, não passaram de tentativas frustradas, contam.

Treinos, pequeno-almoço e dinheiro adiantado para exames médicos

As instalações do Samora Correia foram o principal palco de atividade do Villa Athletic Club, já que foi ali que os jogadores e equipa técnica passaram a maior parte do tempo juntos. E, no início, tudo corria como planeado e iam sendo seguidos os passos daquela narrativa inicial, em que o objetivo era ser maior do que a divisão onde estavam, a distrital.

Os jogadores treinavam todos os dias no campo do Samora Correia, tomavam o pequeno-almoço, que lhes era disponibilizado por aparentes funcionários do Villa, e tinham consigo um encarregado, responsável por toda a logística dos treinos – desde a organização do balneário até aos equipamentos e à lavandaria. Durante algumas semanas, aquela experiência fortaleceu a ideia de que o projeto estava a ganhar forma. Todo o apoio logístico, as refeições preparadas pelo clube, os treinos, a organização das agendas da equipa — alguns jogadores da equipa tinham experiência em competição de alto nível e, mesmo para esses, tudo aquilo correspondia ao que poderiam esperar de um clube profissional. Estavam a fazer parte da fundação de um clube novo, podiam ser a equipa sensação dentro de poucos anos.

Mas esta organização durou apenas cerca de um mês e meio e a origem do problema foi, precisamente, a falta de pagamento ao elemento do clube que estava todos os dias com os jogadores nos treinos. Nesta altura, ainda nem sequer tinham começado os jogos do campeonato de Portalegre e todas as despesas de deslocação eram garantidas pelos próprios jogadores — muitos deles a viver em Lisboa, outros instalados numa casa alugada em Vila Franca de Xira para os atletas deslocados. Essas despesas nunca chegaram a ser reembolsadas. Da mesma forma, as despesas com os exames médicos exigidos para que pudessem competir eram suportadas pelos jogadores. Que pagassem, que apresentassem a fatura e, depois, seriam ressarcidos desses valores, diziam-lhes. Em muitos casos, nunca chegaram a ser recompensados pelos gastos que foram assumindo em nome do Villa.

Os jogadores treinavam todos os dias no campo do Samora Correia, tomavam o pequeno-almoço, que era dado pelo Villa, e tinham consigo um encarregado, responsável por toda a logística dos treinos – desde a organização do balneário até aos equipamentos e à lavandaria. Mas esta organização durou apenas cerca de um mês e meio, porque o encarregado não foi pago.

Com a saída do elemento que estava encarregue do apoio logístico do clube, três membros da equipa técnica e da direção do clube assumiram todas as tarefas que até ali tinham sido feitas pelo ex-funcionário – Pedro Campos Ribeiro, diretor desportivo, Alexandre Costa, team manager, e João Maria, membro da direção. Como explicou ao Observador fonte do plantel, estes três elementos passaram então a ir às compras para o pequeno-almoço, a lavar louça, a tratar da lavagem da roupa dos treinos e a limpar e arrumar os balneários. “Nunca lhes foram dadas estas tarefas, porque o trabalho deles era tudo menos lavar roupa, mas o trabalho deles foi incansável. Sem eles, tínhamos deixado de treinar há mais tempo.”

Um mês e meio depois de a equipa ter começado a treinar, os indícios de que talvez o sonho fosse mesmo impossível começaram a multiplicar-se e os jogadores não foram os únicos a perceber isso. Do lado do Samora Correia, além de um contrato cuja formalização era sucessivamente adiada, existiam outros sinais bem claros: “Percebemos que algumas coisas começavam a falhar. O pagamento já é um indicador bastante grande, mas no início contratavam árbitros para os jogos amigáveis, depois começaram a ser os treinadores a fazer isso. Depois não havia coletes para treinar, nem bolas e nunca compraram material de treino. E os jogadores começaram a dizer que nunca receberam.

A esse respeito — o material de treino —, terá sido vendida a ideia de que seria assinado algum tipo de contrato com a loja desportiva Decathlon, mas esse acordo nunca chegou a acontecer. Aliás, ao Observador, fonte oficial da Decathlon garante não ter “conhecimento de ter sido contactada pelo clube”. “Oficialmente, não chegou nada à sede”, acrescentou.

Com promessas por cumprir e cada vez mais falhas, o Grupo Desportivo do Samora Correia pensou em cancelar o acordo, ainda que apenas falado, que tinha feito com o Villa, mas nunca chegou a dar esse passo definitivo. “Por nós, já tínhamos fechado a porta há muito tempo, mas foi por respeito aos jogadores, que nos pediram mais tempo.”

O despedimento por zoom e os contratos com marcas que nunca existiram

A ideia de ter várias marcas associadas ao projeto dava-lhe credibilidade. E dimensão. Esse foi, aliás, um dos fatores que deu confiança aos jogadores no momento em que trocaram os clubes onde estavam inscritos pelo Villa, que sabiam estar a começar do zero — além das caras conhecidas, quer das redes sociais quer do mundo do futebol, claro. Arriscaram e perderam. Todos os jogadores do plantel têm, neste momento, salários em atraso. E, segundo, informações recolhidas pelo Observador, os salários variam entre os 200 e os 2.000 euros.

“Havia casos realmente mais necessitados e algumas pessoas conseguiram receber inicialmente, porque à medida que iam arranjando algum dinheiro, iam pagando. Mas há salários em atraso para todos – uns mais do que outros. Há casos não tão graves, porque à medida que iam recebendo algum dinheiro, iam pagando. Mas depois o dinheiro acabou”, contou um dos membros do clube. 

O dinheiro passou a ser tema quando, no momento em que devia começar a chegar às contas dos jogadores, simplesmente não apareceu. Isso aconteceu logo no mês em que deveria ser pago o primeiro ordenado. Em setembro, começaram as reuniões para discutir os pagamentos e para perceber o que estava a acontecer. À direção do clube e a alguns jogadores presentes nestas reuniões, Fábio Lopes terá dito sempre que os patrocinadores – as tais marcas que iriam financiar grande parte do projeto – estavam atrasadas nos respetivos pagamentos e que essa seria a razão para não haver disponibilidade financeira imediata. Era uma questão de tempo, assegurava Conguito aos jogadores.

“A justificação era única e exclusivamente por atrasos das marcas. E nós aí ficámos sempre mais descansados”, confessou um desses jogadores. Compreendiam que os atrasos dos patrocinadores poderiam acontecer, mas queriam garantir que quem estava numa situação mais complicada teria prioridade no pagamento. “Havia casos realmente mais necessitados e algumas pessoas conseguiram receber inicialmente, porque à medida que iam arranjando algum dinheiro, iam pagando. Outros não eram tão graves. Mas há salários em atraso para todos – uns mais do que outros. Mas depois o dinheiro acabou“, acrescentou.

Como os casos não eram resolvidos, no dia 6 de outubro, na quinta-feira anterior ao primeiro jogo oficial do Villa, na Taça Remax, membros da equipa, da direção e o presidente do clube voltaram a juntar-se e, desta vez, o discurso foi diferente. Fábio Lopes assumiu que o Villa tinha as contas a zero e sugeriu que os salários fossem revistos. Nesse momento, os jogadores não se contiveram: “Como é que alguém que deve dinheiro, que não cumpriu nenhum valor acordado, é capaz de chegar e vir reformular algo que nunca pagou?”

Fábio Lopes assumiu que o Villa tinha as contas a zero e sugeriu que os salários fossem revistos. Mas, questionaram os jogadores: “Como é que alguém que deve dinheiro, que não cumpriu nenhum valor acordado, é capaz de chegar e vir reformular algo que nunca pagou?”

A conversa evoluiu e chegou, finalmente, ao ponto de rutura. “O Fábio admitiu que não tinha nada assinado com as marcas. Havia apenas conversas. E não coloco em causa que existiram conversas, que ele tentasse e que fizesse tudo pelo clube. O que é certo é que de boca pouca gente paga”, assumiu outro jogador.

Conguito defende-se das acusações de salários em atraso no Villa Athletic Club: “Não se salta de um barco a arder”

Depois desta reunião, ficou uma certeza: não havia condições para continuar, pelo menos naqueles moldes de rutura. O clube dividiu-se em partes desiguais. De um lado, ficaram os jogadores e a equipa técnica; do outro, isolado, Fábio Lopes. O Villa acabou por faltar ao primeiro jogo do campeonato, frente ao Gavionenses, no dia 9 de outubro, e da ausência desse fim de semana resultou uma multa de 750 euros para o clube treinado por Meyong, aplicada pela Associação de Futebol de Portalegre, precisamente por falta de comparência.

Esta divisão trouxe, no entanto, mais uma mancha para a curta história do clube. Depois de faltarem ao primeiro jogo, Pedro Campos Ribeiro, diretor desportivo do Villa e que mais tarde assumiu todas as funções que iam além da sua, acabou por ser despedido numa reunião através do Zoom. Em causa estaria, segundo outra fonte do clube, o facto de Pedro Campos Ribeiro ter “tomado o lado dos jogadores, por não concordar com uma reformulação imediata” – relacionada com a revisão dos salários. Mas aqui colocou-se mais uma questão: o despedimento implica também a liquidação dos valores em falta. Até agora, nenhum pagamento foi feito, até porque, no caso de Pedro Campos Ribeiro, não estão em atraso apenas os ordenados, mas também todo o dinheiro que foi adiantado para os já referidos pequenos-almoços e até para a realização de exames médicos.

Depois de faltarem ao primeiro jogo, Pedro Campos Ribeiro, diretor desportivo do Villa e que mais tarde assumiu todas as funções que iam além da sua, acabou por ser despedido numa reunião feita através do Zoom.

Já em outubro, há nove dias sem treinar e com o presidente do clube já incontactável, a direção do Villa foi informada pela Associação de Futebol de Portalegre de que o segundo jogo marcado no calendário contra o Elvas também não ia acontecer e que o projeto ia acabar ali. Terá sido Fábio Lopes a telefonar para a Associação de Futebol de Portalegre, para dar estas informações. Mas o dono do clube não chegou a formalizar o plano que traçou, nesse contacto com a Associação de Portalegre. E, por isso, a equipa poderia, se quisesse, apresentar-se em campo frente ao Elvas. Nesta fase, aquilo que era um momento de total rutura entre jogadores e Fábio Lopes transformou-se num plano para garantir a sobrevivência do Villa e o afastamento dos atuais dirigentes do clube.

Esse plano começou a ser executado no último domingo, e bastou que os jogadores do Villa tivessem entrado em campo. Com apenas 12 jogadores inscritos, equipa técnica na bancada e equipamentos emprestados pelo Samora Correia, o Villa jogou contra o Elvas e acabou por vencer o jogo por 0-2.

Neste momento, a Câmara Municipal de Ponte de Sor retirou a cedência do estádio municipal ao clube e o Villa deixou de preencher todos os requisitos para se manter na distrital de Portalegre. Sensibilizados pela situação em que os jogadores do Villa se encontram, algumas personalidades do mundo do futebol nacional — como os casos do treinador do Fc Porto, Sérgio Conceição, e dos jogadores Costinha (Santa Clara) e Francisco Geraldes (Estoril Praia) — já se disponibilizaram para dar algum apoio.

Da parte do presidente do clube, apesar das várias tentativas de contacto feitas pelo Observador, as únicas palavras foram inscritas no sítio onde o projeto foi anunciado — nas redes sociais. “Lamento que o meu sonho vos tenha arrastado para as notícias e lamento que tenham de ler tudo o que foi escrito, em notícias ou em comentários negativos e, por vezes, agressivos. Eu continuo a ter o sonho do desporto e do futebol como oportunidade para jovens ou para todos aqueles que são tão apaixonados como eu”, escreveu Fábio Lopes esta semana, acrescentando uma nota final: “Nunca foi um negócio. Mas foi o negócio do futebol que o destruiu.”

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