Se na parte aberta da reunião o epidemiologista Henrique Barros já tinha falado no assunto, à porta fechada sublinhou-o com afinco: é preciso vacinar as crianças. Quando foi questionado sobre este assunto e as reservas europeias que ainda existem, o especialista focou-se apenas nas vantagens desta opção. Perante os líderes políticos e conselheiros de Estado, Henrique Barros enfatizou que são mais os benefícios do que os riscos em avançar com esta vacinação numa altura em que o aumento das infeções disparou precisamente na faixa etária até aos 9 anos (a vacinação em Portugal só começa aos 12).
Depois das intervenções iniciais, que foram abertas ao público, fecharam-se as portas da reunião de especialistas em saúde pública no Infarmed e começaram as perguntas. Foram muito poucas, desta vez, com apenas o deputado do Iniciativa Liberal, João Cotrim Figueiredo, e o representante da Confederação dos Agricultores, a intervirem. O segundo mais preocupado com as medidas que possam vir aí — sem respostas além das orientações que foram dadas nas apresentações gerais, já que o primeiro-ministro se manteve em silêncio e as medidas virão do Governo — e o primeiro com questões focadas nas variantes e na vacinação das crianças.
Henrique Barros explicou que, de acordo com um dos participantes nesta reunião, o aumento de incidências nas crianças se deve ao facto de a restante população estar vacinada, com o vírus a acabar por concentrar-se neste grupo. As crianças até aos nove anos são, neste momento, o grupo com maior incidência e em todas as regiões as escolas e universidades estão entre as principais origens de novos surtos.
O especialista ainda referiu, em defesa da vacinação infantil, que é certo que o risco de letalidade é menor neste grupo etário, mas que as complicações respiratórias também existem. “Foi muito categórico”, diz uma fonte que esteve na reunião. Os outros especialistas não se pronunciaram sobre este assunto, mas Henrique Barros foi mesmo detalhado e chegou a argumentar também que ter mais de 86% da população vacinada não significa, na prática, que seja essa a percentagem de população protegida, já que a efetividade vai diminuindo com o avançar do tempo. Ou seja, o especialista disse que a estimativa é que a população protegida esteja à volta dos 70%. Mais um argumento para que seja alargada a população elegível para a vacina contra a Covid-19. A lógica é mais de proteção coletiva.
Na apresentação que fez no início da reunião — e que foi possível acompanhar pelo público — Henrique Barros afirmou que “é muito importante vacinar as crianças e quando as vacinas estiverem inequivocamente aprovadas, a vacinação das crianças seguramente é uma prioridade.
Outra das questões levantadas, também pelo IL, foi sobre as mutações do vírus e nesta parte quem respondeu foi o especialista na matéria João Paulo Gomes, que entrou na reunião por via remota, para dizer que uma vigilância sobre a “sublinhagem” da variante Delta e que é predominante no Reino Unido.
O especialista explicou que se prevê que esta sublinhagem, a AY.4.2, atinja 50% da população naquele país até ao fim do ano e que já está em Portugal, sobretudo no Algarve, um dado que já tinha sido avançado esta sexta-feira pelo pelo Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge. Na parte fechada da reunião, João Paulo Gomes advertiu que esta sublinhagem é mais transmissível do que a Delta, mas não é mais grave.
O que se sabe sobre a AY.4.2, a nova variante que nasceu da Delta?
Nem o Presidente da República, nem o primeiro-ministro ou o presidente da Assembleia da República quiseram, desta vez, colocar questões. À saída, Marcelo Rebelo de Sousa destacou um dado apresentado por Henrique Barros, sobre as mortes, infeções e hospitalizações que foram evitadas por causa da vacinação. O especialista tinha dito que “desde maio até agora a vacina e a adesão dos portugueses à vacina terá poupado à volta de 200 mil infeções, 135 mil internamentos em enfermaria, 55 mil em UCI e 2.300 vidas”.
Quanto ao anúncio de novas medidas ficará para o Governo e deverá ser feito na próxima quinta-feira, dia em que habitualmente se reúne o Conselho de Ministros. Antes disso, na próxima terça-feira, o primeiro-ministro vai ouvir os partidos políticos com assento parlamentar. Depois anuncia as suas decisões, sendo certo que não está a ponderar que seja necessário um nível de restrição elevado. Esta semana, António Costa disse que não antecipava ter de “adotar medidas que impliquem um estado de emergência” e Marcelo Rebelo de Sousa também rejeitou esse cenário nesta altura.