Luís Montenegro “não tem sido bem sucedido” até ao momento, Marcelo Rebelo de Sousa é o grande responsável pelo facto de o país não “ter particular interesse naquilo que o PSD tem para dizer à sociedade” e Pedro Passos Coelho continua a ser a grande referência à direita porque, ao contrário de outros líderes, “as pessoas sabem o que representa e o que quer para o país”. “Mas o PSD não pode estar constantemente a olhar para Passos. Não tem o direito de pedir esse tipo de sacrifício”, sublinha Vasco Rato.
Em entrevista ao Observador, no programa Vichyssoise, o antigo dirigente do PSD, apoiante de sempre de Pedro Passos Coelho e ex-presidente da FLAD, não esconde o desânimo com o rumo que o país vai seguindo e com a ausência de alternativa oferecida pelos sociais-democratas. “O PSD e Luís Montenegro têm uma coisa a fazer: preparar uma alternativa para apresentar ao país. Já deveriam ter começado a fazê-lo. O PSD tem de estar pronto a ir a eleições a qualquer momento”, antecipa.
Falando sobre Pedro Passos Coelho, que começou a ser apontado como possível cabeça de lista do PSD às europeias, Vasco Rato diz preferir não acreditar que alguém na direção do partido esteja a tentar tirar o antigo primeiro-ministro do caminho de Luís Montenegro. “Espero que não estejam a fazer isso. Acho que Passos Coelho traz apoio e prestígio ao PSD. Soma, não diminui. Não vejo necessidade de afastar seja quem for”, diz.
Muito crítico da atuação de Marcelo Rebelo de Sousa, sugerindo que “o Presidente da República tem contribuído para enfraquecer todas as lideranças do PSD” desde que assumiu o cargo, Vasco Rato não deixa também de se referir com alguma acidez a Carlos Moedas, presidente da Câmara Municipal de Lisboa e apontando com insistência à liderança do partido. “Não tenho dado muito pelo trabalho [de Carlos Moedas]. Avaliação? Nem boa, nem má, não tenho ligado a esse assunto. Tenho andado ocupado com outros assuntos”, corta.
Ainda sobre futuro, no caso o futuro do próprio PSD, o antigo dirigente social-democrata deixa um aviso à navegação: “Por este caminho, nem sei se o partido tem futuro. Os partidos têm futuro quando vão ao encontro dos problemas dos portugueses. Ou o PSD vai a esse encontro e dá aos portugueses uma alternativa e soluções ou deixa de ter futuro”.
[Ouça aqui a Vichyssoise com Vasco Rato]
“Montenegro não tem sido bem sucedido até ao momento”
É inevitável começar pela entrevista de Marcelo Rebelo de Sousa. Não lhe vamos pedir que comente as críticas ao Governo, presumindo que concorde com elas, mas antes que avalie as observações do Presidente da República sobre a inexistência de um PSD suficientemente forte para liderar uma maioria de direita. Concorda? Luís Montenegro está a desiludi-lo?
Não sei a qual entrevista se refere. O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa dá uma entrevista praticamente todos os dias. Portanto, li uma hoje [sexta-feira] no Público, não sei se é essa. No essencial, volta a dizer aquilo que tem vindo a afirmar nos últimos anos. O Professor Marcelo Rebelo de Sousa não vê de facto o PSD como alternativa. Se calhar, a menos que fosse ele a liderar o partido, não vê ninguém capaz de o fazer.
Marcelo não consegue admitir outro cenário que não ser o próprio a conduzir o partido nos bastidores?
Não sei o que consegue admitir ou não. Sei que tem contribuído para enfraquecer todas as lideranças do PSD desde que assumiu a Presidência da República. Parece-me evidente.
Mas centrando em Luís Montenegro. Está a desiludir enquanto líder do PSD?
A mim não me desilude. Acho que está a tentar construir um caminho, uma alternativa, mas parece-me evidente que não tem sido bem sucedido até ao momento.
Em que sentido?
O país não está a demonstrar interesse particular naquilo que o PSD tem para dizer à sociedade portuguesa. Isso é notório. E não digo isto como crítica a Luís Montenegro — isto verificou-se também durante a liderança de Rui Rio. Acho que há aqui um problema que já começa a ser demasiado frequente, independentemente das lideranças, que é uma descolagem do país em relação ao PSD. Não atribuo culpas específicas a Luís Montenegro. Aliás, atribuo uma maior parte da culpa a Marcelo Rebelo de Sousa.
De todo modo, acredita que Luís Montenegro vai conseguir aguentar-se na liderança do PSD até às próximas legislativas?
Não sabemos quando são as próximas legislativas.
Vamos centrar no cenário mais provável: se a legislatura for até ao fim, Luís Montenegro, que tem umas eleições europeias muito difíceis pelo caminho, conseguirá manter-se líder do PSD?
Não sei se o prazo normal é esse. Com a desagregação do Governo, e perante algumas declarações do Presidente da República, não excluiria daqui a um ano e pouco estarmos em eleições. Independentemente do timing concreto das eleições, parece-me muito claro que o PSD e Luís Montenegro têm uma coisa a fazer: preparar uma alternativa para apresentar ao país. Já deveriam ter começado a fazê-lo. O PSD tem de estar pronto a ir a eleições a qualquer momento, tem de ter um conjunto de ideias, linhas-mestras sobre o futuro do país capazes de mobilizar a sociedade portuguesa.
“Passos Coelho é o líder político mais bem colocado à direita”
Tem-se falado com muita insistência de um eventual regresso de Pedro Passos Coelho. Seria vantajoso para o PSD voltar a ter Passos como líder do partido?
Seria vantajoso para o PSD ter alguém como Passos Coelho como líder, com tudo o que já fez pelo país, pelo partido e pela direita. Agora, o PSD não pode estar constantemente e permanentemente a olhar para Passos Coelho. Sobretudo, não tem o direito de pedir esse tipo de sacrifício.
Conhece bem Pedro Passos Coelho. Acredita genuinamente que o antigo primeiro-ministro tem condições para voltar e vencer umas eleições legislativas? Apesar de ter vencido por duas vezes, Passos deixou o partido já com um enorme desgaste e com um resultado desastroso em autárquicas; os eleitores já ultrapassaram essa imagem?
Acho que é um pouco excessivo atribuir o resultado de eleições autárquicas a um líder.
Olhemos então para o quadro mais geral. Pedro Passos Coelho teria condições em termos de imagem para voltar a disputar uma candidatura a São Bento?
As sondagens parecem indicar isso mesmo. À direita, Pedro Passos Coelho é o líder político mais bem colocado. Reúne o maior consenso à direita. Se há uma pessoa capaz de federar a direita, é Passos Coelho. Se quer fazê-lo ou não, terá de lhe perguntar. Agora, que Passos Coelho é pessoa mais bem situada e a referência da direita. Se não fosse, não haveria este interesse todo.
Mas isso também não é um sintoma evidente de que o PSD está numa crise profunda? Não há mais ninguém capaz além de Passos?
Também não acho isso desejável. Por isso é que acho que o PSD tem de começar a definir rapidamente o que quer para o país. Penso genuinamente que esse é o problema: os partidos, de uma forma geral, não estão a analisar o país, as complexidades do país e desenvolver respostas. Andamos todos aqui a fazer de conta.
E no entretanto Pedro Passos Coelho é apontado a vários cargos.
Sabe porquê? Porque pelo menos as pessoas sabem o que Pedro Passos Coelho representa e o que quer para o país.
Não sabem o que Montenegro representa?
Ainda não sabem bem o que representa. Parece-me não controverso. Tenho algum receio porque depois parece logo que estou a criticar. Não estou a criticar; estou a constatar. Parece-me relativamente óbvio. Admito que na cabeça da liderança do PSD existam tempos diferentes. Se calhar pensam que daqui a seis meses, um ano, é que devem apresentar algumas dessas ideias. Discordo. As ideias têm de ser apresentadas já. O país está desesperar por ideias. Temos um primeiro-ministro que não as traz e nunca trouxe. O país está à deriva. Era bom que os partidos à direita chegassem a uma convergência programática para afastar o PS. Se não conseguem fazer isso, não sei o que andam aqui a fazer.
Mas sobre esta sugestão de Passos Coelho poder ser cabeça de lista às europeias. Entende que alguém da direção do PSD está a tentar tirar Passos Coelho do caminho de Luís Montenegro?
Não faço ideia nenhuma. Estou fora da direção do partido.
É um espectador atento ao que se vai passando no PSD
Espero que não estejam a fazer isso. Acho que Passos Coelho traz apoio e prestígio ao PSD. Soma, não diminui. Não vejo necessidade de afastar seja quem for.
Podendo estar próxima uma mudança de ciclo político, o fim de 10 nos de poder socialista, entende que Pedro Passos Coelho pode ser melhor candidato a primeiro-ministro do que Luís Montenegro?
Não acho que as personalidades sejam o problema principal. Neste momento, o Luís Montenegro é candidato a primeiro-ministro. É isso que significa ser presidente do PSD. Um candidato a primeiro-ministro tem que ter ideias muito claras para o país e é isso que se espera, não daqui a dois, seis ou oito meses. O país quer saber quais são essas ideias.
“Tirar PS do poder é mais importante que cerca sanitária ao Chega”
Uma das posições que não está clara por parte da direção do PSD é a questão do Chega e o que fará depois das eleições legislativas, se juntos formarem uma maioria. Esse tabu que o PSD está a alimentar parece-lhe um atitude inteligente?
Não me parece. Era útil que existisse alguma clareza sobre como é que o PSD vê os outros partidos. Isto não significa que se deva ir a eleições com o Chega, a Iniciativa Liberal ou qualquer outro partido. Cada um irá com as suas próprias listas. Mas há um questão essencial: qual é o principal objetivo estratégico dos partidos à direita do PS? Se o objetivo é tirar o PS do poder, isso é mais importante do que estes tabus e estas cercas sanitárias. Parte do problema com este tabu é saber qual é que é a prioridade. Se o PSD e os demais partidos à direita acham que o PS levou o país a um beco sem saída, o objetivo primeiro é tirar o PS do Governo. Nenhum partido à direita o vai fazer sozinho, isto é relativamente claro.
Sente-se confortável em ver o PSD coligado com o partido liderado por André Ventura?
Mais confortável com esse tipo de situação do que com a continuação do PS no poder por mais cinco ou dez anos.
Há uma análise partilhada por muitos de que foi precisamente o risco percecionado de uma eventual coligação do PSD com Chega que contribuiu de forma significativa para a maioria absoluta do PS. Assumir essa possível aliança não seria um tiro no pé para o PSD?
Não porque nunca se fez. Não sei por que é que as pessoas dizem isso, não há dados, mas mesmo que fosse verdade há dois ou três anos não me parece que assim seja no futuro. Não tenho nada essa convicção.
Não lhe causa qualquer urticária que o PSD se junte a um partido que diz o que diz sobre determinadas comunidades, que tem as propostas que tem em matéria de imigração, que defenda abertamente a castração química… Uma aliança com um partido destes não beliscaria o património do PSD?
Não é disso que estamos a falar. Estamos a falar de um programa comum, eventualmente. O cenário é o de um eventual programa de governo onde as coisas são negociadas. Há umas que são aceitáveis e outras que não. A premissa de que um programa de governo teria a castração química é falsa. Um programa de governo é negociado pelas partes.
Mas André Ventura já disse que não abdica de muitas das bandeiras do Chega. Estas bandeiras não beliscam o património do PSD?
De algumas terá de abdicar porque há bandeiras que são simplesmente inaceitáveis para o PSD. Como imagino que haverá bandeiras da IL e do PSD que são inaceitáveis para o Chega. É esse trabalho que terá de ser feito.
O Chega não é uma linha vermelha, mas algumas das ideias do Chega são?
Por que é que há de ser uma linha vermelha? É evidente que o Chega tem posições nas quais não me revejo, mas essas posições têm de ser concertadas e terão de ser abandonadas antes de um qualquer programa de governo, outras não, naturalmente. O Chega não irá para o governo com todas as suas propostas a menos que tenha uma maioria absoluta, que não me parece provável.
“Trabalho de Moedas? Não tenho dado muito por isso”
Vê alguém em condições de vir a lutar pela liderança do PSD no futuro? Fala-se muito de Carlos Moedas. Faz uma boa avaliação do mandato do presidente da Câmara Municipal de Lisboa?
Nem boa nem má, não tenho ligado a esse assunto.
Não tem ligado ao assunto Carlos Moedas na Câmara Municipal de Lisboa?
Não, tenho andado ocupado com outras coisas.
Noto um tom crítico em relação ao antigo comissário europeu.
Não, não é. É uma constatação. Não tenho dado muito por isso.
Acha que o futuro do partido não passará por Carlos Moedas?
Não sei. Por este caminho, nem sei se o partido tem futuro. Os partidos têm futuro quando vão ao encontro dos problemas dos portugueses. Ou o PSD vai a esse encontro e dá aos portugueses uma alternativa e soluções ou deixa de ter futuro, como outros partidos deixaram de ter futuro.
Acha que existe o risco real de o PSD se transformar num partido médio?
Acho e acho que em larga medida já o é porque Rui Rio levou o PSD a ser um partido médio com a sua estratégia dos últimos anos. Não quero que se entenda o que estou a dizer como críticas a Montenegro, talvez sejam mais críticas à forma como o partido foi conduzido nos últimos anos. Acho que essa situação tem de ser invertida, caso contrário o PSD deixa de ser relevante. Começa a haver um problema com a marca.
“Melo? Preferia comer um hambúrguer com Ventura”
Vamos ao nosso segmento carne ou peixe, onde só pode escolher uma de duas opções. Preferia descer o Chiado ao lado do candidato presidencial Luís Marques Mendes ou Paulo Portas?
Ao lado de Winston Churchill, mas como isso não é possível… Marques Mendes.
Com quem voltaria a viajar até à Geórgia: Luís Montenegro ou Carlos Moedas?
Luís Montenegro.
Quem levaria a comer um hambúrguer no Five Guys: André Ventura ou Nuno Melo?
André Ventura porque não conheço pessoalmente.
Quem levaria a Alvalade: Joe Biden ou Donald Trump?
Nem um nem outro. Acho que não compreendem bem as regras do jogo.