A tese começou a circular nas redes sociais horas depois do frente-a-frente de António Costa e João Cotrim Figueiredo, no último sábado: “Costa usa auricular nos debates e é ajudado pelas TV’s. Corrupção.” A alegada denúncia nasce de um momento do debate em que o líder do PS está a explicar o modelo para o IRS Jovem que constava da proposta de Orçamento do Estado para 2022 e se refere a enquadramento fiscal previstos para os “quarto e quinto anos de atividade”. Ouve-se uma voz que interrompe o socialista e que sussurra a indicação “terceiro e quarto”, António Costa corrige o que tinha acabado de dizer e o debate prossegue.

A tese é a de que essa voz que se ouve em direto, e que ainda pode ser escutada na gravação do debate (aos 8 minutos e 41 segundos), prova que o líder socialista usava um “auricular” durante o frente-a-frente com o presidente da Iniciativa Liberal e que, de alguma forma, estaria a ser “ajudado” pela TVI, estação onde o debate decorreu.

Num dos posts que propagam a suposta denúncia, surge um frame do debate com a imagem de António Costa, a indicação do momento do debate em que a “indicação” é passada ao líder socialista e a interrogação: “António Costa usa auricular durante os debates?”. O autor refere na legenda da publicação que foi “ver as várias fontes do vídeo (incluindo nas próprias gravações de 7 dias das operadoras) e é mesmo verdade…Estamos perante um verdadeiro discípulo de José Sócrates…”

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Noutro post, a mesma acusação, com uma adenda: “COSTA USA AURICULAR NOS DEBATES E É AJUDADO PELAS TVS. CORRUPÇÃO!” Neste caso, a publicação remete para um vídeo no Youtube, protagonizado pelo cabeça de lista do Chega por Viseu, nas eleições legislativas de 30 de janeiro, que mostra o excerto do momento já descrito e em que a mesma acusação é repetida.

Para verificar se a tese difundida nestas publicações tem alguma validade, o Observador começou por falar com a Iniciativa Liberal. Fonte oficial do partido de João Cotrim Figueiredo assume, sem rodeios, que foi o deputado e cabeça-de-lista por Lisboa nas eleições de 30 de janeiro quem dá a indicação a António Costa de que o que estava em causa eram o terceiro e quarto escalões do IRS Jovem.

“Mais uma vez, João Cotrim Figueiredo teve de corrigir António Costa e demonstrar que o primeiro-ministro não sabe pôr o país a crescer”, diz fonte oficial do partido.

Mas o Observador também falou com a TVI para perceber se é comum os protagonistas políticos que se participam nestes debates usarem um auricular, se têm por hábito solicitar esse apoio técnico quando estão a debater com os adversários e se tinham conhecimento de qual a origem daquele sussurro que potenciou a tese aqui verificada.

O diretor de informação da estação de Queluz disse que “nunca um responsável político usou um auricular” nestes debates e que “nenhum deles solicitou” que lhe fosse disponibilizado esse tipo de apoio. “Os auriculares não são admissíveis, exceto em situações muito excecionais, quando um dos participantes não está no mesmo estúdio”, sublinha Anselmo Crespo ao Observador.

Situações excecionais são, por exemplo, aquela que aconteceu no debate entre Rui Rio e Rui Tavares. O líder do PSD estava no Porto, o candidato do Livre estava em Lisboa e, nessa situação, ambos usavam um auricular, mas apenas por uma necessidade logística. “E, mesmo nesses casos, os participantes estão apenas a ouvir a emissão, os auriculares não têm qualquer ligação direta à regie, ouvem apenas o som que está a ser transmitido”, ou seja, ouvem o mesmo que as pessoas que estão a acompanhar o debate pela televisão. “Toda a gente que está a regie só fala com os operadores e com os moderadores, nunca fala com entrevistados”, acrescenta o diretor de informação da TVI.

Fora este tipo de situações pontuais, quando se realizam debates à distância, “o único apoio que as televisões dão aos candidatos é a maquilhagem e, quando são mulheres, algum penteado que seja necessário”.

E sobre o sussurro da polémica nas redes sociais, Anselmo Crespo garante também que “é João Cotrim Figueiredo quem faz o reparo”. Até porque “um debate tem três microfones abertos — o do moderador e os dos participantes — e qualquer candidato pode interromper o outro, porque o que está ali em causa é um debate, não é uma entrevista, e é natural que se ouçam os apartes e as intervenções” dos protagonistas políticos.

Conclusão

É falso. Nem António Costa está a ser “ajudado pelas TVs” nos debates em que tem participado com os adversários nas legislativas nem o líder do PS “usa um auricular” quando está em estúdio. Só em “situações muito excecionais” os participantes nos debates usam estes equipamentos e em caso algum recebem informações do exterior.

Assim, segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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