Circulam nas redes sociais imagens de painéis solares que, de acordo com a legenda que as acompanha, terão sido mandados construir pelo presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, “em cima do canal de transposição do [rio] São Francisco”. “Não toma espaço útil, evita a evaporação da água e produz energia elétrica para os pequenos produtores”, diz a publicação, que refere que “a quadrilha de esquerda” vai morrer de “raiva” por causa da construção.

A transposição do rio São Francisco, um dos cursos de água mais importantes do Brasil, é um projeto de deslocamento de águas para irrigar a região do nordeste do Brasil. Este prevê a construção de mais de 700 quilómetros de canais ao longo de dois grandes eixos (norte e leste) e de quatro estados (Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte) e de nove estações de bombeamento.

Em 2019, o governo federal, responsável pelo projeto, ponderou instalar painéis solares ao longo dos canais, mas até há data não há registo de qualquer montagem de placas de energia solar no rio São Francisco, refere a Agência Lupa. A informação contida na publicação é, assim, falsa.

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Além disso, as imagens não mostram uma construção brasileira, mas uma instalação feita no estado costeiro de Gujarat, na Índia. Esta foi inaugurada a 11 de janeiro de 2015 perto da cidade de Vadodara, no estado de Gujarat, numa cerimónia que contou com a presença do então secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, e da sua mulher, Yo Soon-taek. Algumas fotografias do evento foram disponibilizadas pela ONU no seu site.

Foi o primeiro projeto de produção de energia verde a ser construído sem necessidade de ocupar terreno. A sua localização estratégica, sobre canais de irrigação, permite também salvar milhões de litros de água da evaporação, explica a construtura MEIL, responsável pelo projeto, no seu site, onde é possível ver fotografias semelhantes às que foram publicadas nas redes sociais. Os “canais solares” fizeram ainda chegar pela primeira vez a luz uma pequena aldeia com apenas 40 casas, uma das muitas comunidades da Índia rural onde até então não havia eletricidade.

Em agosto de 2020, a BBC publicou uma reportagem da jornalista Kalpana Sunder sobre os “canais solares” de Gujarat, que um ano depois, em junho de 2021, foi partilhada no Twitter pelo ex-ministro norueguês do Ambiente, Erik Solheim, que classificou o projeto como um passo importante para a industria da energia solar. O tweet inclui as imagens que circulam nas redes sociais, que podem ser também vistas numa publicação de janeiro de 2021 do perfil de Instagram Engineering and Architecture, que partilha conteúdos relacionados com engenharia, arquitetura e tecnologia.

Nenhuma das publicações indica o nome do autor das fotografias.

São estas fotografias, tal como foram partilhadas no Engineering and Architecture, ostentando a marca de água do perfil no canto inferior direito, que apareceram nas redes sociais em associação a Jair Bolsonaro. A publicação do Instagram não refere, porém, o nome do presidente brasileiro, dizendo apenas que se trata de “canais solares” construídos na Índia. As mesmas imagens foram também partilhadas em diferentes sites de memes, nomeadamente no 9GAG e no Reddit. Tanto num como no outro, as imagens são acompanhadas da mesma informação: a de que os painéis solares foram construídos sobre canais na Índia.

Conclusão

Os painéis solares construídos sobre canais de irrigação que aparecem nas imagens partilhas nas redes sociais não foram construídos por ordem de Jair Bolsonaro. Trata-se de um projeto desenvolvido na Índia, mais especificamente na região de Vadodara, no estado de Gujarat. As fotografias foram divulgadas em vários sites, sem qualquer referência ao autor, mas sempre com a indicação de que se trata de um projeto indiano e não brasileiro.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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