A “notícia” tornou-se viral no Brasil e chegou também a Portugal — foi vista por mais de nove mil pessoas no espaço de um dia. Revelava que a cantora brasileira Preta Gile estava infetada com o novo coronavírus e que, mesmo assim, tinha ido para os desfiles de Carnaval, dando um concerto para mais de 320 mil pessoas. A acompanhar esta mensagem, estava uma fotografia da cantora no corso carnavalesco, rodeada por milhares de brasileiros.
Contudo, esta informação é falsa: é verdade que a cantora testou positivo para a Covid-19, mas o último desfile de Carnaval em que esteve presente decorreu a 1 de março, antes de o surto ter rebentado no Brasil, e muito antes de a própria saber que estava infetada.
Segundo a Agência Lupa, agência de verificação de notícias certificada do Brasil, a última vez que a cantora atuou no “Bloco da Preta”, o seu número de atuação do Carnaval, foi no domingo, 1 de março, em São Paulo. Nessa altura, havia apenas dois casos confirmados de coronavírus no Brasil — nenhum dizia respeito à cantora –, e não se falava sequer em transmissão na comunidade.
Uma semana depois, no dia 7, a cantora ainda atuou num casamento, num resort na Bahia, e só a 11 de março é que sentiu os primeiros sintomas da Covid-19. Também alguns dos convidados dessa festa de casamento revelaram ter sintomas e estar infetados. Ou seja, acredita-se que possa ter sido aí que a cantora contraiu a doença. Dois dias depois, a 13 de março, Preta Gil teve a confirmação de que estava infetada. Desde aí, não há mais registos de que a cantora tenha aparecido em público.
A conta de Instagram da cantora Preta Gile mostra isso mesmo: que tem estado em isolamento em casa, sendo que a última publicação refere que este é já o 13º dia em que está nessas condições.
https://www.instagram.com/p/B-IefHMBp6k/
A comparação que é feita entre a cantora e Bolsonaro também é abusiva. A publicação que se tornou viral no Facebook sugere que, enquanto no caso de Preta Gil a opinião pública nada diz sobre o alegado comportamento indevido da cantora, no caso de Bolsonaro bastou tirar três selfies para ser logo “massacrado”. Mas os dois casos são muito diferentes.
É que o presidente brasileiro esteve, a 7 de março, nos EUA, numa visita de Estado, tendo 14 membros da sua comitiva sido testados positivamente para Covid-19. Logo quando se soube que o seu porta-voz, Fábio Wajngarten, estava infetado, depois de ambos terem estado na reunião com Donald Trump, a Casa Branca convocou uma reunião de emergência e foram ordenados testes.
JairBolsonaro chegou a aparecer de máscara num vídeo em direto no Facebook, onde conversava com o ministro da Saúde brasileiro, defendendo que estava de “máscara porque, nessa recente viagem aos EUA, uma das pessoas que” tinha estado com Bolsonaro no avião, “quando desceu em São Paulo, foi fazer os exames habituais e deu positivo ao coronavírus”. Bolsonaro também foi testado e, apesar de o primeiro teste ter dado indícios positivos, o segundo deu negativo.
Ainda assim, dado o alarme da situação, a recomendação das autoridades de saúde foi no sentido de o presidente brasileiro ficar em isolamento profilático. Isto porque a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que quem tiver contacto com pessoas infetadas deve passar 14 dias em isolamento, sendo esse o tempo estimado para a incubação do vírus.
Só que Jaird Bolsonaro não só não tem respeitado o isolamento social profilático como tem desvalorizado consecutivamente as medidas preventivas contra o surto da Covid-19. Esta semana voltou a criticar a “histeria coletiva” por causa de uma “gripezinha”. O seu comportamento, portanto, tem sido coincidente com as atitude de desvalorização: ainda no passado domingo esteve nas manifestações contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, tendo cumprimentado muita gente e tirado fotografias com os apoiantes. Tudo sem respeitar as recomendações das autoridades de saúde.
O Brasil tem atualmente mais de 2.200 casos de infeção e um total de 47 mortes.
Conclusão:
A publicação que foi partilhada centenas de vezes no Facebook é falsa: a cantora Preta Gil está de facto infetada mas não esteve no Carnaval do Rio depois de ter a suspeita de que estaria infetada com o novo coronavírus. O concerto que deu no Carnaval decooreu a 1 de março, muito antes de saber que estava infetada e numa altura em que a pandemia ainda não tinha chegado em força ao Brasil, não havendo por isso restrições de ajuntamentos. Quando teve sintomas deixou de aparecer em público e está em isolamento profilático, em casa, há 13 dias. Já o caso de Jair Bolsonaro é diferente: o presidente brasileiro esteve em contacto direto com pessoas que testaram positivo e, apesar disso, não tem respeitado as recomendações das autoridades de saúde.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
De acordo com o sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Nota 1: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook
Nota 2: O Observador faz parte da Aliança CoronaVirusFacts / DatosCoronaVirus, um grupo que junta mais de 100 fact-checkers que combatem a desinformação relacionada com a pandemia da COVID-19. Leia mais sobre esta aliança aqui.