Quase um mês depois de Chico Buarque ter estado em Portugal para receber das mãos de Lula da Silva e de Marcelo Rebelo de Sousa o Prémio Camões, são várias as publicações a circular nas redes sociais que alegam que o cantor brasileiro confessou recorrer a autores anónimos para comprar músicas. Os posts são acompanhados de um vídeo que mostra, supostamente, Chico Buarque a afirmar que algumas pessoas o “abordam na rua e vão-lhe vendendo música” e ele vai “comprando”. Acrescenta também o músico que “compra” temas dos compositores que já conhece “há mais tempo” e que, “quando está na hora de gravar discos“, liga a esses mesmos autores (usa mesmo um alegado exemplo, alguém chamado Ahmed). Neste vídeo, Chico Buarque revela ainda que tem “uns oito ou nove compositores habituais” que são “compositores anónimos”.
Numa das publicações que se têm tornado virais, o autor incluiu uma legenda que diz: “Chico Buarque, poeta falso, na maior cara de pau e salafrário!” Num outro post, que também partilha este vídeo, o cantor brasileiro é apelidado de “falso como uma nota de R$ 3,00”.
Utilizando o Google Images, uma ferramenta de pesquisa da Google que permite pesquisar imagens em vez de palavras, percebemos que o vídeo original está incluído no documentário Desconstrução, de 2006, que retrata os bastidores da gravação do álbum “Carioca”, editado nesse mesmo ano. O documentário, realizado por Bruno Natal, está, de resto, disponível na íntegra na plataforma Youtube.
Num excerto desse documentário, também partilhado no Youtube, Chico Buarque aparece a rir, enquanto se refere a “Ahmed”, um homem que, refere o músico, o teria feito “assinar uma cláusula a dizer que não pode mexer na harmonia dele”. Chico Buarque afirma ainda que, “quando é hora de gravar o disco,” liga e pergunta se alguém “tem samba bom para vender, tem uma canção, tem não sei o que? Alguma novidade?”. Remata dizendo que o seu “trabalho é buscar”.
Olhando para as imagens, e para a naturalidade com que Chico Buarque estaria alegadamente a admitir recorrer a outros músicos para gravar discos, é fácil perceber que se trata de uma brincadeira do compositor brasileiro. Ou seja, que as imagens não mostram uma confissão clandestina de Chico Buarque, mas sim uma piada feita pelo artista — e mantida na edição deste documentário que, importa recordar, está acessível a todos. Aliás, vários meios de comunicação social brasileiros, como o jornal Folha de S. Paulo, já fizeram referência a este episódio no passado, dando conta da “brincadeira” levada a cabo por Chico Buarque.
Fact Check. Poema “Solidão” foi mesmo escrito por Chico Buarque?
Questionada pelo Observador, a Canivello Comunicação — agência de comunicação que representa Chico Buarque — confirma que se trata de uma “brincadeira” presente no DVD do documentário Desconstrução, onde “[Chico] fala sobre supostos compositores anónimos dos quais compraria música”. Inclusive, acrescenta a empresa que assessoria o músico, “Chico faz uma piada com essa história” na nova digressão ‘Que tal um samba?’, desmentindo assim o boato que se espalhou na internet e reafirmando que “não compra música”. A agência de comunicação acrescenta ainda que não é a primeira vez que este episódio se torna viral, uma vez que ainda há pouco tempo “circulou um vídeo distorcido com a cena retirada do contexto” e no qual “colocaram um máscara no vídeo, como se estivesse a ser filmado escondido”, quando na verdade, lembra a Canivello Comunicação, “a cena é pública”.
De resto, importa sublinhar que esta publicação já foi desmentida por vários factcheckers internacionais, como, por exemplo, o G1.
Conclusão
O vídeo que mostra Chico Buarque a dizer que compra músicas de autores anónimos é verdadeiro, mas está descontextualizado. Na verdade, o músico brasileiro está apenas a fazer uma brincadeira durante as gravações do documentário “Desconstrução”. O vídeo completo pode ser encontrado online.
Igualmente, a assessoria de Chico Buarque confirma ao Observador que se trata de uma piada feita pelo compositor, recordando que este vídeo já foi várias vezes partilhado sem contexto e acompanhado de informação falsa.
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.