O vídeo ganhou recentemente grande popularidade no Facebook: durante um minuto e dez segundos, uma mulher percorre os corredores de um supermercado em Bruxelas apontando a câmara do telemóvel para as prateleiras vazias e vai narrando, em português do Brasil, a situação que está a ver, salientando a falta de praticamente todo o tipo de produtos na loja.

O vídeo já foi partilhado vezes sem conta por diferentes perfis e páginas na rede social, com legendas diferentes, mas convergentes na mensagem: a falta de produtos é uma consequência das medidas de confinamento adotadas para combater a pandemia da Covid-19 e, segundo algumas versões da publicação, uma situação semelhante não sucedeu no Brasil devido às opções políticas de Jair Bolsonaro, um conhecido opositor da rigidez dos confinamentos sanitários.

“Comida aqui no Brasil tá cara?? Sim… Mas, olha o Carrefour em Bruxelas (Bélgica) na Europa… País riquíssimo, como a Bélgica, *não está tendo comida suficiente*…”, lê-se numa das publicações que partilharam aquele vídeo. “Vamos cuidar da saúde… a economia a gente vê depois…’ Esse é o resultado disso!!!“, prossegue a legenda do vídeo, criticando diretamente a implementação de políticas sanitárias com consequências negativas para a economia.

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“Agradeça ao Produtor Rural brasileiro, porque ainda que os alimentos tenham ficado mais caros, ainda há comida para se comprar. Viva o nosso Brasil”, termina a legenda. Noutras versões desta publicação, o vídeo foi acompanhado de legendas que incluíam a hashtag #BolsonaroTemRazão.

Porém, a informação difundida nesta publicação é falsa — e para perceber porquê é preciso destrinçar o que está em causa na história.

Em primeiro lugar, é efetivamente verdade que os supermercados Carrefour na Bélgica passaram recentemente por sérias dificuldades no abastecimento das suas lojas. A imprensa belga deu conta disso mesmo no mês passado, mas explicando o que se passou: uma greve na empresa de logística que presta serviços de transporte de mercadorias à Carrefour Bélgica.

A história remonta a meados de setembro, quando a empresa de logística Kuehne+Nagel anunciou o encerramento da sua unidade Logistics Nivelles, um importante centro logístico a partir do qual são abastecidos os supermercados Carrefour na Bélgica. Segundo o The Brussels Times, o anúncio surpreendeu os 549 funcionários da unidade, que responderam com uma greve prolongada que, na prática, parou uma grande parte das operações logísticas da cadeia de supermercados (e criou agitação política a nível nacional).

A greve terminaria alguns dias depois, mas o efeito da falta de produtos fez-se sentir durante mais algum tempo nos supermercados. Além disso, a Bélgica tem enfrentado graves problemas nas suas cadeias de transporte de mercadorias, devido à gritante falta de camionistas — tanto que o governo belga tem desenvolvido esforços para atrair mais motoristas, com um discurso de valorização da importância da profissão na sociedade.

Por outro lado, também é um erro associar a falta de produtos nas prateleiras dos supermercados às restrições impostas para combater a Covid-19 por um outro motivo: a Bélgica tem vindo a aligeirar as medidas de confinamento desde maio deste ano e, atualmente, são poucas as restrições impostas no país. A maioria dos serviços já está aberta e a funcionar normalmente, sendo ainda necessária a apresentação do certificado de vacinação para o acesso a alguns espaços.

Conclusão

As notícias da imprensa belga deixam pouca margem para dúvidas: sim, houve falta de produtos num Carrefour de Bruxelas, mas não, não foi devido às medidas de combate à pandemia da Covid-19, como a publicação tenta argumentar. Houve uma greve numa empresa de logística que afetou a distribuição de produtos, situação que foi assumida pela própria empresa e que tem sido tópico de debate no país.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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