A imagem partilhada várias vezes nas últimas horas tem como fundo as cores da bandeira brasileira — provavelmente porque foi lá que surgiu a primeira vez esta publicação —, e a mensagem é clara: há que “fazer campanha para acabar com todos os privilégios dos políticos”, seguindo o exemplo do que os países nórdicos Suécia e Noruega fizeram.

Mas que base tem a publicação? Uma pesquisa através do Google Images permite perceber que a imagem começou a circular inicialmente em 2016, no Brasil. Há várias partilhas no Facebook, Twitter e em blogues numa altura em que no país se debatia a retirada de privilégios à classe política depois do Projeto de Decreto Legislativo 295/2015 para reduzir os benefícios do presidente, vice-presidente e ministros de Estado ter sido aprovado no final de 2015.

Publicação no Facebook sobre privilégios de políticos

E o que é que essa realidade tem que ver com a portuguesa? Nada. A imagem volta a circular baseada na ideia de que Suécia e Noruega tiraram os privilégios aos políticos.

A ideia cola com a mensagem de um livro publicado em 2014 pela jornalista Claudia Wallin, intitulado “Um País Sem Excelências e Mordomias” onde faz o contraste entre a realidade Sueca e Brasileira. Numa publicação no portal de notícias G1 a autora do livro enumera vários pontos que, considerava à data, separavam o Brasil do país nórdico. “A Suécia não oferece luxo ou privilégios aos seus políticos, ao contrário do Brasil. Parlamentares suecos vão de autocarro para o trabalho, e viram manchete de jornal quando se atrevem a pegar um táxi com o dinheiro do contribuinte. Vivem em apartamentos funcionais que chegam a ter 18 metros quadrados, e onde não há comodidades como máquina de lavar – as lavandarias são comunitárias”, detalhava considerando depois que “a real motivação de qualquer cidadão para entrar na política deve ser o poder de influenciar os rumos de uma sociedade e as decisões que beneficiam o interesse coletivo”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Não há qualquer registo que quer a Suécia, quer a Noruega tenham “retirado todos os privilégios aos políticos”, apenas a notícia no G1 onde a jornalista Claudia Wallin afirma que “a Suécia não oferece luxo ou privilégios aos seus políticos, ao contrário do Brasil”. Para exemplificar a autora fala de viagens de autocarro, pequenos apartamentos ou a utilização de máquinas comunitárias, mas não explica em que momento é que essas características derivam de “privilégios retirados” ou não são apenas características da própria sociedade, independentemente de se tratarem de políticos, médicos, professores ou qualquer outra profissão.

Já em relação à Noruega, segundo um ranking da LoveMoney, citado pelo Dinheiro Vivo, o ordenado dos políticos era em 2019 o mais alto da escandinávia. Com um ordenado que ronda os 90 mil euros anuais, a Noruega era considerada a ‘Melhor democracia do mundo’ pelo Índice de Democracia 2018 da EconomistIntelligenceUnit. Já em Portugal, no mesmo ano, o vencimento anual era de cerca de 45 mil euros, praticamente metade do mesmo valor que os deputados noruegueses recebiam.

Na Suécia o vencimento anual bruto dos políticos era de cerca de 71.500 euros, também bastante superior aos 45 mil pagos em Portugal. Fora destas contas estão as ajudas de custo que os parlamentares podem auferir. Recentemente o Observador publicou um fact check relativo aos vencimentos dos deputados, que pode ser lido aqui.

Fact Check. Deputados têm um salário mensal de 8.700 euros?

Sendo que já em abril de 2018, com base no recibo de vencimento tinha feito um trabalho detalhado sobre o que ganham ou não os deputados.

Um ordenado, cinco abonos: afinal quanto pode ganhar um deputado

Conclusão

Não há qualquer base que sustente a informação veiculada pela publicação de que Suécia e Noruega “tiraram privilégios aos políticos”. A imagem que surge agora partilhada já tem, pelo menos, cinco anos de existência online e teve origem no Brasil. Baseada num paralelo estabelecido por uma jornalista, num livro por ela lançado, de que os privilégios dos políticos brasileiros eram muito superiores aos dos suecos, dando para isso exemplos do dia a dia dos políticos nórdicos. Não há informação pública que permita atribuir as características descritas pela autora do livro exclusivas à classe política, ou que derivem dessa condição, podendo tratar-se apenas de traços distintivos da sociedade sueca por comparação à brasileira. Em relação a Portugal, basta olhar para os vencimentos anuais brutos de portugueses, suecos e noruegueses para ficarem claras as diferenças de base. Os noruegueses ganham o dobro dos portugueses, sendo contabilizados ainda os extras como ajudas de custo ou similares que os parlamentares portugueses auferem, não é suficiente para chegar ao ordenado base dos nórdicos.

Segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

IFCN Badge